- Infohabitar 67
É com uma muito especial satisfação que se edita hoje, no Infohabitar, um artigo de Guilherme Vilaverde, Presidente da Federação Nacional de Cooperativas de Habitação Económica (FENACHE) e da grande cooperativa de habitação As Sete Bicas, e um grande amigo e sócio fundador do Grupo Habitar.
É com uma muito especial satisfação que se edita hoje, no Infohabitar, um artigo de Guilherme Vilaverde, Presidente da Federação Nacional de Cooperativas de Habitação Económica (FENACHE) e da grande cooperativa de habitação As Sete Bicas, e um grande amigo e sócio fundador do Grupo Habitar.
Este seu muito oportuno artigo trata a temática da ADMINISTRAÇÃO DO PARQUE PUBLICO DE ARRENDAMENTO HABITACIONAL, assunto este que tem estado ultimamente na ordem do dia designadamente no que se refere à passagem de parcelas antigas do parque habitacional do estado para a propriedade e responsabilidade de Instituições Particulares de Solidariedade Social, algumas delas ligadas a Cooperativas.
É um assunto sobre o qual muito há a dizer pois a garantia e a responsabilidade da gestão desses bairros e conjuntos essencialmente habitacionais, numa perspectiva justa, completa e duradoura, é algo muito sério e fundamental para a sua respectiva sustentabilidade, considerando nela, naturalmente, o bem-estar das famílias que neles moram.
Deixo-vos então com as palavras de Guilherme.Vilaverde,
A.B.Coelho.
A ADMINISTRAÇÃO DO PARQUE PÚBLICO DE ARRENDAMENTO RESIDENCIAL
(A propósito do Bairro das Amendoeiras, em Lisboa)
Por GuilhermeVilaverde
Muito se tem escrito e falado a propósito das movimentações e protestos dos Moradores do Bairro das Amendoeiras, em Lisboa, por causa dos aumentos das rendas de casa que lhes foram recentemente aplicados pela nova entidade que, recentemente, passou a deter a propriedade dos imóveis anteriormente pertencentes ao Instituto de Gestão e Alienação do Património Habitacional do Estado (IGAPHE), no caso concreto a Fundação D. Pedro IV.
De tal forma tem sido o “ruído” provocado pelos factos que têm vindo a público através da comunicação social, nomeadamente com a mediatização que aos nossos canais televisivos sempre incumbe assegurar e desenvolver, que, até nós, que conhecemos bem de perto de que realidade se trata e estamos mesmo por dentro do processo encetado pelo Estado para que este tipo de património publico passasse a ser gerido por entidades da sociedade vocacionadas e devidamente preparadas para o gerir, ficamos de alguma forma interrogados acerca da justeza das propostas adoptadas e dos caminhos que de há muito temos defendido para este domínio.
Assim, se por um lado é facto que tão desmedidos aumentos de renda, ainda que legalmente suportados, quando aplicados de uma só vez estejam naturalmente condenados á reprovação geral e muito especialmente por parte daqueles que são os directamente visados, também não é menos verdade que a expressão quantitativa das rendas de casa que permaneceram (incorrecta e ilegalmente) inalteradas por tão longos anos de modo nenhum se afiguram justas e muito menos equitativas com os padrões vigentes no que á relação renda/rendimento diz respeito.
Esta questão, apesar das suas múltiplas e complexas envolventes, é para nós muito clara e de há muito que pelo menos de uma coisa estamos certos: - Não há mesmo que arrepiar caminho quanto ao processo encetado que visa, julgamos nós, colocar um definitivo ponto final nas práticas de administração e gestão habitacional por parte do aparelho do Estado que, invariavelmente, sempre nos impõem, mais cedo ou mais tarde, que todos sejamos chamados a “pagar com língua de palmo” os infindáveis custos das debilidades e insuficiências de um sistema mais do que ultrapassado.
O mesmo acontece, consideramos nós, em maior ou menor escala, com as administrações municipais. Chegado que seja (ainda não chegou?) o momento em que se proceda a uma adequada avaliação e ao necessário balanço económico e social dos resultados alcançados e dos encargos futuros dos Municípios com os vultuosos investimentos efectuados no campo da promoção e gestão habitacional, se tirarão sem dúvida as devidas conclusões acerca do percurso realizado e dos novos caminhos necessariamente a prosseguir neste domínio.
O parque habitacional afecto a politicas de fomento e de acesso ao direito elementar á habitação por parte daqueles que só o conseguem alcançar através do arrendamento social com o apoio (mais ou menos forte) do Estado, tem forçosamente que ver melhores dias no que á sua administração, gestão, conservação, manutenção e utilização diz respeito.
É necessária e urgente a clarificação e o alcançar de uma melhor reorientação de aspectos essenciais da “definição, promoção e gestão de um parque publico de arrendamento habitacional” onde sejam condignamente alojados, mas sempre com carácter temporário e nunca a titulo definitivo, aqueles que, por razões conjunturais especifícas, não reúnam num dado momento as condições económicas indispensáveis para o conseguirem pelos seus próprios meios.
A partir de uma adequada inventariação do património actualmente existente, a quantificação, caracterização e localização das necessidades que efectivamente existam para a composição desse “parque”, seguida de uma realista definição das politicas e instrumentos para a sua implementação e gestão a um ritmo e num dado horizonte temporal, a par da contratualização entre os organismos da Administração Central e Local e os agentes da sociedade de um “programa de desenvolvimento sustentável” para este segmento habitacional, traria certamente inegáveis vantagens para todos e para o País.
E, de uma vez por todas, que a todos os responsáveis do sector seja proibido pensar mais em “estratégias suicidas” do tipo das que, infelizmente, continuamos a ver defendidas e até mesmo praticadas tais como:
1) Alienação, seja a que pretexto for, de habitações construídas e/ou afectas a este “parque publico de arrendamento habitacional”;
2) Não actualização permanente das rendas de acordo com os parâmetros legalmente fixados;
3) Não implementação de uma adequada estratégia de conservação e manutenção dos edifícios, habitações, equipamentos e espaços públicos.
Por outro lado, e a par das proibições assinaladas, é hoje necessário que se estruture e implemente uma reforma legal indispensável para o sucesso de uma politica mais equitativa e socialmente justa do Estado para os cidadãos. É que, como atrás ficou dito, o acesso de quem quer que seja a uma habitação deste “parque” não pode continuar a sê-lo a título (em termos práticos) definitivo, mas antes e sempre com um carácter excepcional e temporário; isto é, a manter-se válido apenas e só durante o período de tempo em que “estejam comprovadamente reunidas as condições socio-económicas que o justifiquem”, tendo mesmo como princípio a fixação de um prazo limite máximo de permanência do inquilino nessa ou noutra habitação do “parque”, por forma a que este seja sempre ocupado por quem dele efectivamente careça e não por quem entretanto já reúna condições para dispensar o apoio do Estado a favor de outra família.
Isto é, só com medidas deste tipo se poderá definir, estabilizar e gerir adequadamente um parque habitacional com estas características e intenções, fazendo (um dia) reduzir ou mesmo cessar a sempre permanente necessidade de construir mais e mais fogos, tantas vezes á custa de pressões urbanísticas e de ordenamento do território perfeitamente inadequadas, reduzindo substancialmente e/ou gastando da melhor forma os avultados recursos financeiros que todos nós pagamos para suportar as despesa do Estado com o sector.
Finalmente, a “construção de um novo tempo para este sector”passará também por uma maior mobilização e responsabilização da sociedade no seu todo para podermos alcançar com sucesso este desiderato, apostando de uma forma muito decisiva nas “entidades sem fins lucrativos” mais vocacionadas para essa função como são, de facto, as cooperativas de habitação.
A propósito, diremos mesmo que só o modelo cooperativo garante neste tipo de processos a questão essencial da participação directa e democrática (um homem um voto) dos próprios interessados no seu alojamento habitacional, tornando todo o processo “mais eficientemente dialogado” através das relações de cooperação e de confiança que naturalmente se estabelecem entre a cooperativa e os seus membros.
De resto e para terminar, não será mesmo por acaso que em Bairros da mesma natureza e exactamente com os mesmos problemas do já referenciado Bairro das Amendoeiras, em que a entidade receptora do património do IGAPHE não foi uma Fundação mas sim uma Cooperativa (neste caso a NHC), um adequado processo geral de informação, de activo diálogo e envolvimento de todos os interessados suportou e desenvolve tranquilamente a fase mais complexa de transição dos contratos de arrendamento, de actualização gradual das rendas e de inicio de um programa de reabilitação de edifícios, habitações e espaços públicos, afirmando e confirmando no terreno a qualidade da intervenção cooperativa neste domínio como mais um efectivo caso de sucesso no seio do sector.
É pois, este, o caminho a seguir.
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