terça-feira, julho 06, 2021

Variedade espacial/ambiental e funcionalidade doméstica ou sobre as importantes e diversas facetas dessa mesma funcionalidade – infohabitar # 782

Ligação direta (clicar) para:  760 Artigos Interactivos, edição revista, ilustrada e comentada em janeiro de 2021- 38 temas e mais de 100 autores

Variedade espacial/ambiental e funcionalidade doméstica ou sobre as importantes e diversas facetas dessa mesma funcionalidade  – infohabitar # 782

 

Infohabitar, Ano XVII, n.º 782

Edição: terça-feira, 6 de julho de 2021

Artigo integrado na série editorial da Infohabitar “Habitar e viver melhor”

 

Caros leitores da nossa Infohabitar,

Continuamos a série editorial da Infohabitar especificamente dedicada a uma viagem sistemática pelos diversos espaços do habitar, que iniciámos na vizinhança, avançando, depois para os edifícios e seus espaços comuns (disponível no catálogo interativo da Infohabitar, no seu tema 6 intitulado Série habitar e viver melhor”) e “terminando” numa reflexão sobre os diversos tipos de organizações, opções e espaços domésticos; reflexão esta que aqui está a ser, e será, desenvolvida ainda durante mais algumas semanas editoriais.

Lembra-se, novamente, que serão sempre muito bem-vindas eventuais ideias comentadas sobre os artigos aqui editados e propostas de novos artigos (a enviar para abc.infohabitar@gmail.com , ao meu cuidado).

Considerando a mais recente evolução da pandemia, sublinha-se, mais uma vez, a vital importância de não perdermos, agora, uma parte significativa do que ganhámos, dando-se agora tempo e cuidado até estarmos todos, em boa parte, imunizados; há que cumprir com rigor os protocolos de vacina (n.º de doses e períodos temporais posteriores às mesmas) e continuar com os cuidados de proteção próprios e dos outros, até esta presente vaga estar vencida.

Despeço-me, até à próxima semana, enviando saudações calorosas e desejos de força e de muito boa saúde para todos os caros leitores e seus familiares,    

 

Lisboa/Encarnação e Azambuja/Casais de Baixo, em 5 de julho de 2021

António Baptista Coelho 

Editor da Infohabitar 


Variedade espacial/ambiental e funcionalidade doméstica ou sobre as importantes e diversas facetas dessa mesma funcionalidade  – infohabitar # 782

António Baptista Coelho

(texto e imagem)

Resumo

Neste artigo, dedicado à temática geral da relação entre uma desejável variedade espacial e uma renovada e bem fundamentada funcionalidade doméstica, abordam-se as seguintes, e consideradas, importantes facetas desta mesma funcionalidade: uma funcionalidade expressiva, mas dirigida para certas funções domésticas e não para determinados compartimentos; funcionalidade doméstica privilegiando o convívio na habitação; funcionalidade doméstica expressivamente aplicada à arrumação; funcionalidade doméstica, apropriação pessoal e desafogo; e, finalmente, a temática da funcionalidade doméstica no âmbito da relação interior-exterior

 

Variedade espacial/ambiental e funcionalidade doméstica ou sobre as importantes e diversas facetas dessa mesma funcionalidade  – infohabitar # 782

António Baptista Coelho

abc.infohabitar@gmail.com

 

Nota introdutória

No presente artigo visa-se, essencialmente, uma “primeira” abordagem, pelo menos aqui nesta revista, da bem conhecida matéria da funcionalidade doméstica, mas numa perspectiva de consideração específica de diversas facetas dessa mesma funcionalidade, procurando-se “desviar” o foco na funcionalidade, como qualidade importante em si própria, para um leque de funcionalidades ao serviço de objetivos domésticos, familiares e pessoais mais específicos.

1. Funcionalidade expressiva, mas dirigida, especificamente, para certas funções domésticas e não para determinados compartimentos

Tal como se tem apontado nesta série de artigos, as matérias da funcionalidade doméstica deverão ser específica e criteriosamente consideradas, designadamente, nas zonas de cozinha, tratamento de roupa e de instalações sanitárias, que são aquelas que suportam boa parte dos mais intensos serviços de apoio domésticos com os seus variados equipamentos, dispositivos e instalações, muitas vezes associados a variados aparelhos mecânicos e instalações, habitualmente regulados por normas específicas e balizados por importantes aspetos de segurança no uso e de custos de instalação.

Importa salientar nesta matéria que, embora a funcionalidade doméstica esteja muito radicada em tais zonas, mais marcadas pelas instalações, ela deve qualificar, também, toda a habitação, designadamente, em aspetos ligados à facilidade de manutenção e à adequada durabilidade e influência no bem-estar habitacional, considerando-o em termos verdadeiros e amplos; mas, naturalmente, nesta matéria, uma tal funcionalidade geral ou “funcionalização”, não pode colocar em risco o sentido doméstico, agradável, apropriado, confortável e mesmo sensível, que, este sim, deve sempre marcar a habitação.

Nesta matérias é, no entanto,  fundamental destacar, desde já, que a funcionalidade doméstica não pode ser aplicada “cegamente” aos referidos compartimentos/espaços, mas especificamente às funções de preparação de refeições, de higiene pessoal e de tratamento de roupas que aí se desenvolvem, considerando-se que há muito mais vida doméstica para lá de tais funções nestes mesmos compartimentos e é deste “para lá” das funções que decorrerá boa parte do interesse das soluções domésticas, e será neste caminho que surgirão as “cozinhas salas de família”, os “quartos de banho” e os espaços de roupas domésticos; e atenção que não se está aqui a tratar de “habitação de luxo”, pois por vezes é uma questão de larguras úteis e do tal suplemento espacial estratégico.

Nesta temática salienta-se, ainda, que uma das ideias que continuam a estruturar as preocupações funcionais domésticas é o facilitar ao máximo a “lide da casa” nos seus variados aspectos e numa altura em que, cada vez mais, não há ninguém especificamente dedicado a uma tal lide, passando a ser algo que é partilhado praticamente por todos os habitantes de cada fogo, e essa facilitação encontra já um excelente apoio em muitos estudos funcionais e designadamente nos estudos que desde há muitos anos foram desenvolvidos pelo Núcleo de Arquitectura e Urbanismo do LNEC e editados por este Laboratório Nacional.

Finalmente e nesta matéria será sempre útil e adequado referir que a “funcionalização” doméstica, mesmo estrategicamente concentrada, por exemplo, nas chamadas “zonas de água ou húmidas” deve estar submetida a uma expressiva caracterização doméstica, opção esta que se julga tem sido muito pouco seguida, designadamente, pelos produtores de equipamentos, revestimentos e dispositivos de instalações aplicáveis; como se o referido sentido de “funcionalização” marcasse, sempre, indelevelmente e muito mais tais soluções do que o seu essencial carácter doméstico – e o exemplo disto está evidente, por exemplo, frequentemente na concepção pormenorizada das designadas “instalações sanitárias”, tantas vezes interiores, “frias” e impessoais.

2. Funcionalidade doméstica privilegiando o convívio na habitação

Nos restantes compartimentos habitacionais, que muitos são, a funcionalidade tem de ser devidamente conjugada com as outras qualidades domésticas e expressivamente embebida nos mais diversos elementos que integram o espaço doméstico.

Ainda nestas temáticas importa sublinhar que devem existir condições, mutuamente harmonizadas e mesmo mutuamente dinamizadas, de funcionalidade e agradabilidade do estar/lazer da família e das actividades domésticas diárias, que na vida actual, das zonas urbanas, constituem as principais oportunidades de convívio entre os elementos do mesmo agregado familiar (ex., preparar e tomar refeição da noite/lavar e arrumar louça e utensílios/ver TV/conversar).

De certa forma o que aqui se propõe é que as zonas da habitação onde há um maior investimento em tarefas domésticas possam ser também as zonas com um potencial de convivialidade acrescido, uma condição que tem implicações seja numa funcionalidade maximizada das tarefas “obrigatórias” e funcionalmente mais exigentes, seja na protecção do convívio familiar relativamente a aspectos de desagradabilidade que lhes estejam habitualmente associados, e que deverão ser, assim, adequadamente tratados, como é o caso dos ruídos de máquinas e outros e dos cheiros e vapores produzidos.

Finalmente nesta matéria importa relevar que uma verdadeira consideração destas matérias levará a mudanças “estruturais” na organização doméstica, aplicadas, designadamente, numa localização mais nobre e dimensionalmente folgada da principal casa de banho e num desenvolvimento multifuncional e, potencialmente, muito significativo da zona dedicada à preparação de refeições, refeições e convívio informal.

3. Funcionalidade doméstica expressivamente aplicada à arrumação  

Outra das ideias que importa aprofundar e que, muitas vezes, é pouco atendida refere-se à oferta de uma (muito) boa capacidade de arrumação doméstica, tanto ao nível de arrumações especializadas, pormenorizadamente concebidas e estrategicamente localizadas (ex., roupeiros gerais e de quarto, despensa ou armário-despensa de cozinha), como ao nível da capacidade de disposição de elementos de mobiliário.

Nesta matéria é muito importante sublinhar que a capacidade geral de arrumação tem duas importantes consequências na habitabilidade e no bem-estar doméstico:

-  pois liberta realmente espaço habitável, como espaço livre entre mobiliário, proporcionando, suplementarmente, alternativas de arrumação e de escolha de mobiliário;

-  e porque ao proporcionar tais condições se constitui talvez no principal elemento de apropriação da habitação pelos seus habitantes, o que é, sem dúvida, algo de fundamental para uma profunda satisfação residencial.

E lembremos que é sempre desejável a proposta de soluções alternativas de arrumação de mobiliário numa dada solução de habitação; um factor de apopriação directa e de adaptabilidade no uso do espaço doméstico que é importante:

-  seja para a adequação de uma habitação a vários habitantes, com variados gostos e necessidades;

-  seja para a mutação, no tempo, da ocupação e do arranjo da habitação pelos mesmos habitantes, aspetos este que tem grande importância na satisfação habitacional e que é, ainda, pouco considerado.

4. Funcionalidade doméstica, apropriação pessoal e razoável desafogo espacial

Nestas “velhas” áreas, não só mas sempre bastante arquitectónicas, da funcionalidade doméstica importa ter em conta que ela não se pode limitar a “funções básicas”, do tipo comer, dormir, “estar”, etc., pois o habitar não pode ter este tipo de limitações se o quisermos realmente adequado e factor de bem-estar e verdadeiro interesse habitacional.

Sendo assim importa considerar que a espaciosidade dos espaços e compartimentos domésticos deve permitir a personalização espacial (ex., partes de parede livres para afixação de quadros e desenhos, pequena varanda com prateleiras ou poial para constituir uma colecção de plantas em vasos, etc.).

E ainda no mesmo sentido há que privilegiar, em cada espaço doméstico, a existência de "espaço livre" verdadeiramente protagonista, seja para funções concretas (ex., circulação e recreio infantil), seja para a fruição do próprio espaço livre, que é fundamental para um sentido de espaço agradavelmente unificado; e há que considerar, esta perspectiva de “espaço livre” doméstico em relação com compartimentos e espaços ocupados pelas "mobílias completas" que são habitualmente usadas. Um espaço livre que é especialmente importante nos casos de habitantes jovens e idosos.

Segundo Sven Thiberg ("Housing Research and Design in Sweden", p. 157), a existência de espaços livres de mobiliário nos compartimentos habitacionais (livres) é importante:

-  tanto para o recreio das crianças e o lazer e o trabalho em casa;

-  como para aumentar a flexibilidade dos espaços a diversos arranjos de mobiliário e simplificar os arranjos temporários (ex., festas familiares).

E, por outro lado, a existência de espaços livres de mobiliário, amplos e bem proporcionados, nomeadamente, em vestíbulos e casas de banho, facilita os cuidados com crianças e doentes e a movimentação de idosos e deficientes.

Fig. 1: ... aumentar a flexibilidade dos espaços a diversos arranjos de mobiliário e simplificar os arranjos temporários ...

5. Funcionalidade doméstica e relação interior-exterior

Em termos de ideia geral e estruturadora de uma adequada organização doméstica salienta-se, agora, o interesse de se privilegiar um estimulante relacionamento entre todos os elementos e espaços de relação entre o interior doméstico e as zonas exteriores ao fogo, sejam elas os espaços comuns do edifício ou tratando-se do próprio espaço exterior (privado, comum e público) e ambiente de vizinhança.

Esta é uma matéria que, por si só pede um amplo desenvolvimento, no entanto há aqui temas de grande sensibilidade e potencial formal/funcional como são as condições de segurança bem integradas na imagem do edifício – isto é ganhar a relação com o exterior não a perdendo na pormenorização da segurança contra intrusão (o que não é fácil) [fig.] – e o integral aproveitamento da possibilidade de relação directa ou indirecta com o exterior e o máximo aproveitamento das melhores condições de insolação, iluminação natural e ventilação, equilibradamente compatibilizadas com os diversos conteúdos funcionais dos compartimentos.

Neste sentido a configuração e a localização dos vãos exteriores deve atender, nomeadamente, aos seguintes aspectos:

-  relação com as funções mais prováveis em cada compartimento;

-  insolação desejável e protecção da radiação solar, considerando a respectiva orientação;

-  ventilação desejável e, mesmo em condições adversas, bem controlável;

-  vistas exteriores próximas e paisagísticas funcionais e/ou interessantes (por exemplo de um piso térreo sobre um maciço de vegetação, ou sobre uma animada zona urbana);

-  privacidade, que tem a ver com a natureza do compartimento em causa;

-  e iluminação natural adequada aos usos dominantes de cada espaço ou compartimento, definida considerando a importância fundamental da iluminação na satisfação residencial.

E ainda nesta matéria da relação entre interior e exterior e aspetos de funcionalidade doméstica há que ter em conta os importantes aspetos de conforto ambiental geral dos diversos espaços e compartimentos domésticos harmonizando-os com as seguintes exigências básicas:

-  a cozinha deve receber boa luz natural ao longo de todo o dia;

-  a sala deve receber Sol de manhã ou a partir do meio da tarde;

-  os quartos devem receber Sol de manhã e estarem protegidos do Sol poente;

-  as casas de banho devem ter janelas ou, no mínimo, um excelente processo de ventilação forçada;

-  a entrada do fogo e os corredores devem receber luz do dia.

Breves notas conclusivas

E assim se abordou, novamente, o inesgotável tema da funcionalidade doméstica, mas numa perspetiva muito imbricada com outras matérias da concepção doméstica e não de uma forma autonomizada, forma esta que apenas terá sentido em espaços/fábrica apenas ocupados por robots.

 

Notas editoriais ao artigo:

O presente artigo corresponde a uma edição muito ampliada, modificada e revista do artigo que foi editado na Infohabitar, em 2/09/2014, com o n.º 498.

 

Notas editoriais gerais:

(i) Embora a edição dos artigos editados na Infohabitar seja ponderada, caso a caso, pelo corpo editorial, no sentido de se tentar assegurar uma linha de edição marcada por um significativo nível técnico e científico, as opiniões expressas nos artigos e comentários apenas traduzem o pensamento e as posições individuais dos respectivos autores desses artigos e comentários, sendo portanto da exclusiva responsabilidade dos mesmos autores.

(ii) No mesmo sentido, de natural responsabilização dos autores dos artigos, a utilização de quaisquer elementos de ilustração dos mesmos artigos, como , por exemplo, fotografias, desenhos, gráficos, etc., é, igualmente, da exclusiva responsabilidade dos respetivos autores – que deverão referir as respetivas fontes e obter as necessárias autorizações.

(iii) Para se tentar assegurar o referido e adequado nível técnico e científico da Infohabitar e tendo em conta a ocorrência de uma quantidade muito significativa de comentários "automatizados" e/ou que nada têm a ver com a tipologia global dos conteúdos temáticos tratados na Infohabitar e pelo GHabitar, a respetiva edição da revista condiciona a edição dos comentários à respetiva moderação, pelos editores; uma moderação que se circunscreve, apenas e exclusivamente, à verificação de que o comentário é pertinente no sentido do teor editorial da revista; naturalmente , podendo ser de teor positivo ou negativo em termos de eventuais críticas, e sendo editado tal e qual foi recebido na edição.

 

Variedade espacial/ambiental e funcionalidade doméstica ou sobre as importantes e diversas facetas dessa mesma funcionalidade  – infohabitar # 782


Infohabitar

Editor: António Baptista Coelho

Arquitecto/ESBAL – Escola Superior de Belas Artes de Lisboa –, doutor em Arquitectura/FAUP – Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto –, Investigador Principal com Habilitação em Arquitectura e Urbanismo no Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), em Lisboa.

 

abc.infohabitar@gmail.com

abc@lnec.pt

 

Revista do GHabitar (GH) Associação Portuguesa para a Promoção da Qualidade Habitacional Infohabitar – Associação com sede na Federação Nacional de Cooperativas de Habitação Económica (FENACHE).

 


Sem comentários :