Infohabitar, Ano XIV, n.º 637
Artigo da Série “Habitar e Viver Melhor” n.º CX
Caracterização
geral dos vãos exteriores II
por António Baptista Coelho (texto e imagens)
Segurança
contra quedas a partir de vãos e de guardas de pisos elevados
Esta é uma matéria que nem deveria ser aqui
apontada, pois é evidente que este tipo de segurança, contra quedas a partir de
vãos exteriores e varandas/terraços, deveria ser acautelada, ao máximo, por
disposições específicas sobre a alturas dos peitoris e sobre a pormenorização e
constituição da parte dos vãos inferior a esses peitoris, ou, em alternativa,
mecanismos legais que acautelem as situações de responsabilidade civil
associadas às quedas de altura que podem, infelizmente, ocorrer - pensa-se, por exemplo, e se tal for
legalmente possível, na existência de uma declaração assinada por quem assuma
gostar de viver em determinadas condições, que podem ser arriscadas no que se
refere a quedas.
Não faz, evidentemente, qualquer sentido
desenharem-se vãos e guardas que não tenham em conta a protecção contra quedas,
mas também fazem pouco sentido normas que obriguem a soluções únicas. Será
portanto necessário identificar soluções que garantam, o mais possível, essa
segurança, mas contribuindo para a qualidade arquitectónica da solução global e
não desperdiçando as potencialidades de vistas e de conforto ambiental desses
vão e espaços elevados; e haverá, aqui, matéria para posteriores
desenvolvimentos, designadamente, em termos de simples e úteis colectâneas de
soluções pormenorizadas.
Segurança
contra intrusões físicas e visuais em vãos exteriores térreos ou pouco
elevados.
A questão da segurança contra intrusões em vãos
exteriores térreos ou pouco elevados é uma matéria que tem de ser considerada,
à partida, na solução de fenestração de um dado edifício, pois não faz sentido
"esquecer" que essa será logo uma das preocupações dos respectivos habitantes. E atente-se que
haverá, com certeza, uma associação entre estes aspectos de segurança contra
intrusão e os de protecção da privacidade doméstica.
Não faz sentido que assim não aconteça pois a segurança
contra intrusões tem de ser bem acautelada, em pisos térreos ou acessíveis
directamente do exterior ou através de galerias comuns, através da consideração
de vários aspectos entre os quais se salientam: a altura de janelas, muros e
vedações; a visibilidade a partir de sítios muito usados; e a previsão de
gradeamentos, gelosias, portadas e fechaduras de segurança.
Naturalmente não faz qualquer sentido que tais
cuidados nãos sejam integrados com as respectivas exigências de privacidade
visual e de agradabilidade, caso contrário a habitação transforma-se num fortim
...
E, evidentemente, tais cuidados de segurança e
privacidade têm de ser integrados no projecto da habitação e do edifício, e
desejavelmente devem contribuir para a sua qualidade global, pois são aspectos
indissociáveis de boas condições habitacionais.
Vãos exteriores "estanques" e com abertura controlada
É fundamental que os vãos exteriores sejam estanques
ao ar, à água da chuva e ao ruído (janelas de peito e de sacada, portas,
respectivos peitoris, soleiras e ligações aos quadros dos vãos).
Esta é uma exigência básica, seja considerando todos
os aspectos de relação visual e de conforto ambiental (isolamento térmico e
impermeabilização), seja considerando o bem-estar doméstico, que tudo tem a
ganhar com a possibilidade de nos podermos isolar de ruídos exteriores
desagradáveis e incómodos (por exemplo o ruído do tráfego intenso, do vento e
da chuva).
Mas é igualmente fundamental que os vãos exteriores
não desperdicem a possibilidade de serem elementos de captação de luz, sol e ar
renovado e fresco, e para tal é fundamental que existam elementos de controlo
dessa luz, dessa radiação solar e desse ar, e que tais dispositivos sejam
realmente eficazes e fáceis de usar.
E é também muito importante que os vãos exteriores
envidraçados tenham uma manutenção e uma limpeza simplificadas, pois caso
contrário os benefícios de uma boa fenestração ficarão muito diminuídos; e não
tenhamos dúvida que o projecto tem de prever tais condições de manutenção e
limpeza.
As janelas peito e de sacada podem ser de variados
tipos funcionais e dimensionais, apresentarem diferentes características gerais
de aspecto, disposição e configuração e estarem conjugadas com diversos tipos
de elementos complementares (ex., bandeiras superiores ou laterais
manobráveis). Não faz qualquer sentido é considerar-se "um vão" como
um simples "buraco envidraçado", sem se contemplar a sua solução de
funcionamento, seja em termos de controlo de luz e de capacidade de ventilação,
seja considerando a sua manutenção e limpeza.
Tal como já se referiu uma janela não é apenas um
vão transparente, é também o seu aproveitamento e controlo em termos de luz,
insolação, ventilação, vistas exteriores, privacidade interior e segurança no
uso e contra intrusões; só janelas em que todas estas facetas estejam
adequadamente solucionadas, em termos funcionais e de imagem arquitectónica,
serão janelas bem projectadas, e não é fácil.
Escolha
e enquadramento da vistas sobre o exterior.
Tal como apontou Charles Moore: "As vistas
existem já, a única habilidade está na sua captura através de janelas
(quadros), a partir do interior. As vistas de exteriores assemelham-se às
perspectivas que podemos apreciar em quadros pendurados nas paredes, mas mudam
com as estações do ano e constantemente (estão vivas)...permitem a entrada do
habitante na perspectiva exterior...". (1)
E esta é uma frase fundamental, que associa aos
aspectos de conforto ambiental, assegurados pelos vãos exteriores, uma outra
carga conceptual com idêntica importância: a captura, o enquadramento e a
valorização de vistas exteriores, proporcionando a sua fruição pelos
habitantes. Mas, infelizmente, todos conhecemos casos de janelas ou de
"não-janelas" que, nem proporcionam "sol, luz e ar", nem
nos facultam vistas e estimulantes; e há ainda aquelas famigeradas grandes paredes
"cegas", que tão bem ficam nos desenhos de projecto e que, por acaso,
são contíguas a vistas excepcionais, e ainda por cima a orientação de tais
janelas seria óptima - tal não se compreende e não se deveria aceitar.
Considerando agora um certo carácter mais formal que
pode existir no desenvolvimento dos vãos domésticos gostaria de referir que o
único limite ao seu desenvolvimento deveria ser a boa “mobilaridade” do interior; mas aqui até há
situações contrárias, em que o ritmo de uma dada solução de fachada/janelas
produz compartimentos domésticos quase inúteis - enfim!
Sobre o partido formal da fenestração ele já foi
aproximado nos aspectos da apropriação através do interessante povoamento de
vãos profundos e amplos com variados objectos, numa opção que tanto identifica
o interior doméstico, como o projecta um pouco sobre a respectiva vizinhança.
Quanto a outras matérias formais e construtivas associadas ao tratamento
exterior. e também interior, dos vãos elas são de grande importância
arquitectónica, mas ligam-se essencialmente ao muno da concepção de cada
solução, pelo que não serão aqui comentadas.
Gradação
e melhor reflexão da luz no interior
Segundo Christopher Alexander, os vãos de janelas
com arestas interiores ortogonais e aguçadas produzem desagradáveis
(encandeantes) contrastes de luz (muito brilho/linha de escuridão) (2); e este autor considera que vãos
de janela "fundos", cerca de 0.25/0.30m de profundidade e não
ortogonais (ângulos de 50/60º com os planos das paredes interiores),
proporcionam zonas de luz natural com intensidades intermédias, que reduzem os
contrastes bruscos de luz e aumentam a reflexão da luz natural, tornando o
espaço interior mais agradavelmente visível nos seus pormenores.
E cá estamos na aproximação aos referidos e tão
apropriáveis vãos fundos, e salienta-se que, ultimamente, com as crescentes exigências de isolamento térmico, tais
profundidades voltaram a poder ser correntes; e então nas áreas da reabilitação
elas são casos correntes.
Sobre
a racionalidade ou a subdivisão das zonas envidraçadas
Segundo Christopher Alexander as janelas amplas e
com grandes chapas de vidro contínuas proporcionam vistas uniformes, enquanto
várias janelas relativamente estreitas e verticais oferecem vistas diferentes.
Embora esta reflexão seja interessante, julga-se que
ela pode ser tomada numa perspectiva ampla, direccionada para uma orgânica
previsão da fenestração exterior, que também tem de levar em conta o custo
inicial e de eventual substituição de grandes superfícies envidraçadas, assim
como os custos iniciais de protecção (contra intempéries e contra intrusão) dos
grandes vãos envidraçados.
Notas:
(1) Charles Moore; Gerard Allen; Donlyn Lyndon,
"La Casa: Forma y Diseño", p. 101.
(2) Christopher Alexander; Sara Ishikawa; Murray
Silverstein; et al, "A Pattern Language/Un Lenguaje de Patrones", pp.
913 e 914.
Notas editoriais:
(i)
Embora a edição dos artigos editados na Infohabitar seja ponderada,
caso a caso, pelo corpo editorial, no sentido de se tentar assegurar uma
linha de edição marcada por um significativo nível técnico e
científico, as opiniões expressas nos artigos e comentários apenas
traduzem o pensamento e as posições individuais dos respectivos autores
desses artigos e comentários, sendo portanto da exclusiva
responsabilidade dos mesmos autores.
(ii)
De acordo com o mesmo sentido, de se tentar assegurar o referido e
adequado nível técnico e científico da Infohabitar e tendo em conta a
ocorrência de uma quantidade muito significativa de comentários
"automatizados" e/ou que nada têm a ver com a tipologia global dos
conteúdos temáticos tratados na Infohabitar e pelo GHabitar, a respetiva
edição da revista condiciona a edição dos comentários à respetiva
moderação, pelos editores; uma moderação que se circunscreve, apenas e
exclusivamente, à verificação de que o comentário é pertinente no
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positivo ou negativo em termos de eventuais críticas, e sendo editado
tal e qual foi recebido na edição.
Infohabitar, Ano XIV, n.º 637
Caracterização geral dos vãos exteriores II
Infohabitar
Editor: António Baptista Coelho
abc.infohabitar@gmail.com
abc@lnec.pt
Infohabitar, Revista do GHabitar (GH) Associação Portuguesa para a Promoção da Qualidade Habitacional – Associação com sede na Federação Nacional de Cooperativa de Habitação Económica (FENACHE).
Editado nas instalações do Núcleo de Estudos Urbanos e Territoriais (NUT) do Departamento de Edifícios (DED) do LNEC.
Apoio à Edição: José Baptista Coelho - Lisboa, Encarnação - Olivais Norte.
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