segunda-feira, fevereiro 08, 2016

568 - Renovada abordagem das casas de banho domésticas - II, Infohabitar 568

Infohabitar, Ano XII, n.º 568

Verdadeiras casas de banho e não simples e frias “instalações sanitárias” - II

Artigo LXXXVI da Série habitar e viver melhor
António Baptista Coelho

Aspectos motivadores em casas de banho


No estudo do LNEC que editei em 1998 e que, nesta série editiria, se tem referido, frequentemente (“Do bairro e da vizinhança à habitação”), salientavam-se as seguintes características como as mais desejáveis nas casas de banho (fez-se, apenas, um reordenamento dos aspectos apontados e juntaram-se alguns comentários):

·         Facilitarem o uso seguro das peças sanitárias (banheiras, duches, sanitas, lavatórios e bidés) pelos habitantes e, nomeadamente, por pessoas com dificuldades na movimentação (crianças, idosos e doentes). Uma exigência que tem actualmente suporte regulamentar, mas onde se julga haver ainda um caminho a fazer em termos da melhor ergonomia no uso dessas peças, considerando-se, especificamente, aspectos de uma aprofundada segurança no respectivo uso, pois as casas de banho continuam a ser locais onde frequentemente ocorrem acidentes domésticos (por exemplo, escorregamentos, colisões com peças sanitárias cerâmicas e envenenamento por acesso não controlado a drogas e mdeicamentos).
·         Permitirem grande facilidade de limpeza geral e particularizadamente dos equipamentos sanitários e dos espaços entre eles, e entre eles e as paredes, caracterizando-se por terem revestimentos e pinturas duráveis, impermeáveis, à prova de humidade e "anti-fungos". Uma matéria em que também se julga haver um caminho a seguir em termos da ergonomia dessa mesma acção de limpeza e das influências que tem na própria escolha das peças sanitárias (por exemplo previsão destas peças em consola, quando as casas de banho sejam estreitas).
·         Terem excelentes condições de luz e de ventilação naturais (janelas de abrir) ou "forçada" (grelhas de entrada e saída de ar). E nesta matéria há que sublinhar que, sem dúvida, são preferenciais as condições de iluminação e ventilação naturais, aliás com importância claramente acentuada numa altura em que se procura uma maior sustentabilidade ambiental habitacional (e aqui há que sublinhar que, por vezes, se faz o mais complicado nestas matérias da sustentabilidade ambiental e se esquece o mais simples e igualmente importante como é o caso. E, ainda nesta matéria, há que salientar que, muitas vezes, a famosa ventilação forçada é claramente deficiente ou corresponde a sistemas cuja eficácia de ventilação é claramente duvidosa ou que obrigam, mesmo, a soluções mecânicas que gastam energia para a resolução de uma situação que pode e deve ter uma resolução “natural”.
·         Serem em número adequado ao número de habitantes da casa, considerando-se, como base de provisão, que para mais de quatro(4) pessoas devem existir, para além de uma casa de banho completa (sanita, bidé, lavatório e banheira), mais uma casa de banho, que pode ter apenas um duche, uma sanita e um lavatório (isto será muito importante quando todas as pessoas da casa tiverem de acordar e fazer a sua higiene pessoal, de manhã, praticamente, às mesmas horas). E esta é uma matéria cuja importância é evidente, mas que deve ter em conta: por um lado o risco de se exagerar no número de casas de banho, devido ao peso financeiro que uma tal situação tem quando se pensa nas correntes casas de banho “revestidas a cerâmica” e distribuídas por toda a casa (em vez de soluções com acabamentos racionalizados e concentradas nos chamados “blocos-água”), e entende-se a diferença que estas situações implicam em termos das redes de águas e de esgotos em cada piso e em diversas prumadas; e, por outro lado, deve apostar em soluções de desmultiplicação dos espaços funcionais das casas de banho, proporcionando, por exemplo, o seu uso simultâneo (exemplo, zona de banho e zona “sanitária” autonomizadas).
·         Poderem receber algumas peças de mobiliário (armários e "cestos" para roupa e atoalhados) e facilitarem a instalação dos diversos acessórios de casa de banho (cortinas de duche e toalheiros); uma matéria cuja importância foi já, aqui, devidamente sublinhada.



Fig. 04: uma casa de banho que alia funcionalidade e simplicidade de equipamento e de arranjo (formal, cromático, textural) a excelentes condições de conforto ambiental, designadamente, com luz e ventilação naturais, e a um certo sentido de agradabilidade doméstica (grande espelho, zonas de cor e de texturas adequadamente diversificadas, um interessante "móvel" com lavatório e algum espaço livre, para uma cadeira; Interior de habitação do conjunto urbano "Bo01 City of Tomorrow", desenvolvido no âmbito da exposição que teve lugar em Malmö em 2001 (ver nota final) - H33, Arq.º Greger Dahlström.

Problemas correntes em casas de banho

Os problemas mais correntes em casas de banho domésticas, estão ligados, numa primeira linha ao mau funcionamento das respectivas instalações, à falta de privacidade no uso destes espaços e designadamente no acesso a estes espaços e a eventuais influências negativas do uso destes espaços nos espaços domésticos contíguos – más influências estas que têm a ver com a falta de isolamento em termos de cheiros e de ruídos.


Numa segunda linha, de maior pormenor, os problemas mais correntes em casas de banho domésticas, estão ligados ao não cumprimento ou à deficiente satisfação das condições acima referidas como aspectos motivadores no uso destes espaços e designadamente: a dificuldade no uso das peças sanitárias – situação esta que incrivelmente nem é pouco corrente; a falta de espaciosidade crítica no uso das mesmas peças e a ocorrência de associações funcionais negativas e que possam concorrer para acidentes domésticos; a dificuldade de limpeza dos espaços e das peças sanitárias; a ausência de agradáveis condições de luz e de ventilação naturais, ou mesmo a ocorrência de más condições de ventilação forçada (por exemplo, através de condutas); as casas de banho e as respectivas peças sanitárias serem em número insuficiente e/ou estarem mal distribuídas na habitação; e não haver desafogo mínimo para se poderem arrumar algumas peças de mobiliário.

E é interessante sublinhar que o primeiro conjunto de problemas está associado a um projecto e construção deficientes e que este segundo conjunto de problemas é, simplesmente, resolvido com casas de banho razoavelmente espaçosas e com janelas exteriores.

Questões dimensionais (e outras) em casas de banho

Há matérias fundamentais em termos de agradabilidade no uso de uma habitação e nestas sublinha-se a importância de as casas de banho servirem, no mesmo nível, cada um dos pisos de uma dada habitação, desenvolvida por exemplo em dois pisos, uma exigência que deveria ser extensível a um quarto, proporcionando-se uma vivência “de nível”, por exemplo, a um idoso; trata-se de um aspecto que tem, naturalmente, implicações críticas na concepção residencial, mas chama-se a tenção para se estar aqui a tentar construir uma ideia de habitação que seja muito satisfatória, e tudo o que evite usos únicos e zonamentos domésticos rígidos, dando alternativas de vivência, é claramente muito positivo para uma vida doméstica diversificada e adaptável.

No que se refere à recorrente questão, que está devidamente regulamentada, da relação entre número de quartos (de dormir) e número e características das respectivas casas de banho, ela coloca questões sensíveis quando uma das casas de banho e, frequentemente, a melhor desenvolvida, está reservada a um uso privativo. A questão destes usos privativos merece ser bem equacionada quando se trata de habitação de interesse social, avançando-se que nos parece que uma única casa de banho, espaçosa, bem equipada e com luz e ventilação naturais continua a ser uma excelente solução para estes casos, suportando, julga-se uma razoável pressão de uso e podendo ser, até, eventualmente, subdividida em zona de banhos e zona sanitária.
A questão do dimensionamento, frequentemente mínimo, das casas de banho merece uma atenção específica pois, por um lado não se julga que, numa casa de banho, o mais caro seja propriamente o espaço, mas sim as instalações e as peças sanitárias, pelo que um relativo desafogo espacial permitirá, de certa forma rentabilizar e tornar mais útil o investimentos feito nesses aspectos, melhorando, realmente, a habitabilidade da casa e, complementarmente, tornando as casas de banho muito mais amigáveis e confortáveis quer para o cada vez maior número de idosos, quer para um amplo leque de usos, ainda muito pouco servidos, e que aí podem encontrar excelente sítio de realização, como é por exemplo o caso do banho de crianças. Naturalmente que um pouco espaço suplementar, onde se pode arrumar uma cadeira e um vão de janela que pode abrir em dias agradáveis, são também condições fundamentais para casas de banho realmente mais felizes, e que nada tenham a ver com os cubículos sanitários que nos são frequentemente oferecidos.
E, finalmente, é possível, numa casa de banho, distribuir o respectivo equipamento ao longo de um período temporal alongado, proporcionando-se, por exemplo, inicialmente, equipamentos mínimos, que depois possam vir a ser substituídos por outros mais elaborados e com maiores dimensões, mas isto exige que o espaço esteja lá desde o início e que a opção seja por equipamentos facilmente desmontáveis e substituídos por outros, o que também favorece a sempre bem-vinda apropriação.
E é interessante pensar na casa de banho, também, como um espaço da habitação onde se pode estar em privacidade e com satisfação e durante período relativamente alongados, por exemplo num banho imersão, lendo; uma opção bem diferente de um banho de chuveiro rápido, mas que deve ser igualmente possível no nosso espaço doméstico.




Fig. 05: casa de banho como verdadeiro espaço de banho de lazer, numa reconquista do banho com esse sentido, como sempre foi e só deixou de ser quando surgiu o funcionalismo "fundamentalista" e mesmo, frequentemente, muito pouco conhecedor do grande leque de funções domésticas; Interior de habitação do conjunto urbano "Bo01 City of Tomorrow", desenvolvido no âmbito da exposição que teve lugar em Malmö em 2001 (ver nota final) - H33, Arq.º Greger Dahlström.

Novidades e tendências em casas de banho

Ao longo deste pequeno exercício de reflexão sobre o que são e o que poderão ser as casas de banho domésticas já se foram apontando aspectos de inovação e tendências actuais no desenvolvimento destes espaços.

No entanto será interessante considerar aqui como uma opção fundamental a escolha entre soluções mais ou menos divididas, e, portanto, tendencialmente, menos e mais desafogadas, sublinhando-se que este desafogo será sempre sinónimo de mais funções lúdicas e de saúde das casas de banho (ex., banho e brincadeiras de crianças, repouso e descontracção de adultos) e da sua maior capacidade de uso por utentes com reduzidas capacidades de movimentação. Resolvendo um pouco esta opção Sven Thiberg aponta a possibilidade de se desenvolver uma concentração das instalações em blocos equipados e subdivididos de tal maneira que fiquem facilitadas as futuras acções potenciais de fusão entre diversos compartimentos (3), numa adaptabilidade que poderá ser estratégica, por exemplo, na relação com o envelhecimento dos habitantes.

Outras tendências referem-se à “tradicional” grande separação dos espaços que incluem as instalações sanitárias relativamente aos restantes espaços domésticos, alternativamente, a uma nova tendência em que se fazem misturas diversificadas, embora naturalmente cuidadas em termos de relações de privacidade, mas aceitando-se, por exemplo contiguidades que podem ainda chocar espíritos mais habituados a uma vivência doméstica muito hierarquizada e repartida em zonas “funcionais”, associando-se, por exemplo, uma pequena casa de banho à cozinha, uma banheira ao quarto, etc.

Sobre estas perspectivas considera-se que é fundamental  proporcionar uma grande diversidade de modelos de habitar pormenorizados, que se colam muito melhor às nossas vidas que são bem distintas umas das outras e que as tornam mais estimulantes e curiosas; ao contrário da oferta única, sempre, quase da mesma habitação, com as mesmas zonas funcionais e com os mesmos espaços.

De certa forma, a casa de banho, porque é o compartimento doméstico mais crítico em termos de privacidade, é talvez o espaço que pode ser “chave” numa experimentação mais activa de novas organizações e ideias domésticas, pois inovando-se, de forma fundamentada, nas casas de banho, será sempre mais fácil inovar também em outros espaços da casa.

E não tenhamos dúvidas de que o compartimento de que tantas vezes falamos como “casa de banho”, não o é, realmente, reduzindo-se, sim, a um repositório de sanitários de catálogo num cenário frio e muito pouco doméstico, e, portanto, não há que ter dúvidas em inovar no sentido de acabar, de vez, com este tipo de soluções, que foram afinal soluções que serviram, numa primeira linha, vendedores de apartamentos e de peças sanitárias.

E, portanto, e pelo menos, no domínio da higiene pessoal e da saúde pela água há que assegurar a reconquista do ambiente da casa de banho tradicional, relativamente espaçosa, onde se atribui uma real importância ao banho de imersão (com virtudes terapêuticas físicas e psíquicas, hoje em dia, perfeitamente reconhecidas) e dispondo até de algum mobiliário com utilidade prática específica e fundamental na apropriação e na humanização da casa de banho. E o banho e as outras funções habitualmente sediadas nas casas de banho poderão invadir diversificadamente o espaço doméstico, sempre que este espaço ganhe dimensões mais desafogadas e zonas mais diversificadas.

Notas
(1)      Ernest Neufert, "Arte de Projetar em Arquitetura", p. 184.
(2) Como indica Sven Thiberg ("Housing Research and Design in Sweden", p. 180), a maioria das casas de banho não têm um espaço de arrumações bem organizado, e um simples recanto com cerca de 0.60x0.60m de área permite a instalação de um armário alto com variadas e úteis utilizações (ex., toalhas, papel, artigos de higiene e beleza, roupa suja, etc.); caso não se use para este fim, o referido espaço permite a instalação de uma cadeira, sempre útil no apoio aos banhos e a outros usos da casa de banho.
(3) Sven Thiberg (Ed.), "Housing Research and Design in Sweden", p. 181.

Nota importante sobre as imagens que ilustram o artigo:

As imagens que acompanham este artigo e que irão, também, acompanhar outros artigos desta mesma série editorial foram recolhidas pelo autor do artigo na visita que realizou à exposição habitacional "Bo01 City of Tomorrow", que teve lugar em Malmö em 2001.

Aproveita-se para lembrar o grande interesse desta exposição e para registar que a Bo01 foi organizada pelo “organismo de exposições habitacionais sueco” (Svensk Bostadsmässa), que integra o Conselho Nacional de Planeamento e Construção Habitacional (SABO), a Associação Sueca das Companhias Municipais de Habitação, a Associação Sueca das Autoridades Locais e quinze municípios suecos; salienta-se ainda que a Bo01 teve apoio financeiro da Comissão Europeia, designadamente, no que se refere ao desenvolvimento de soluções urbanas sustentáveis no campo da eficácia energética, bem como apoios técnicos por parte do da Administração Nacional Sueca da Energia e do Instituto de Ciência e Tecnologia de Lund.

A Bo01 foi o primeiro desenvolvimento/fase do novo bairro de  Malmö, designado como Västra Hamnen (O Porto Oeste) uma das principais áreas urbanas de desenvolvimento da cidade no futuro.

Mais se refere que, sempre que seja possível, as imagens recolhidas pelo autor do artigo na Bo01 serão referidas aos respetivos projetistas dos edifícios visitados; no entanto, o elevado número de imagens de interiores domésticos então recolhidas dificulta a identificação dos respetivos projetistas de Arquitetura, não havendo informação adequada sobre os respetivos designers de equipamento (mobiliário) e eventuais projetistas de arquitetura de interiores; situação pela qual se apresentam as devidas desculpas aos respetivos projetistas e designers, tendo-se em conta, quer as frequentes ausências de referências - que serão, infelizmente, regra em relação aos referidos designers -, quer os eventuais lapsos ou ausência de referências aos respetivos projetistas de arquitetura.

Notas editoriais:
(i) Embora a edição dos artigos editados na Infohabitar seja ponderada, caso a caso, pelo corpo editorial, no sentido de se tentar assegurar uma linha de edição marcada por um significativo nível técnico e científico, as opiniões expressas nos artigos e comentários apenas traduzem o pensamento e as posições individuais dos respectivos autores desses artigos e comentários, sendo portanto da exclusiva responsabilidade dos mesmos autores.
(ii) De acordo com o mesmo sentido, de se tentar assegurar o referido e adequado nível técnico e científico da Infohabitar e tendo em conta a ocorrência de uma quantidade muito significativa de comentários "automatizados" e/ou que nada têm a ver com a tipologia global dos conteúdos temáticos tratados na Infohabitar e pelo GHabitar, a respetiva edição da revista condiciona a edição dos comentários à respetiva moderação, pelos editores; uma moderação que se circunscreve, apenas e exclusivamente, à verificação de que o comentário é pertinente no sentido do teor editorial da revista; naturalmente , podendo ser de teor positivo ou negativo em termos de eventuais críticas, e sendo editado tal e qual foi recebido na edição.

Infohabitar, Ano XII, n.º 568
Artigo LXXXVI da Série habitar e viver melhor

Verdadeiras casas de banho e não simples e frias “instalações sanitárias” - II, Infohabitar n.º 568

Editor: António Baptista Coelho – abc@lnec.pt e abc.infohabitar@gmail.com
GHabitar (GH) Associação Portuguesa para a Promoção da Qualidade Habitacional

Edição: José Baptista Coelho - Lisboa, Encarnação - Olivais Norte.

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