domingo, maio 03, 2015

531 - Projeto de cozinhas, algumas questões - Infohabitar 531





O 3.º CIHEL recebeu 118 propostas de artigos, estamos todos de parabéns.

Infohabitar, Ano XI, n.º 531

Cozinha: algumas questões de projeto

Artigo LXXIII da Série habitar e viver melhor

António Baptista Coelho



Continuamos, em seguida, a Série editorial sobre "habitar e viver melhor", na qual temos acompanhado uma sequência espacial desde a vizinhança de proximidade urbana e habitacional até ao edifício multifamiliar, e neste os seus espaços comuns. Estamos agora a abordar , com algum detalhe, os espaços que constituem os nossos “pequenos” mundos domésticos e privativos, refletindo sobre as diversas facetas que os qualificam; e continuamos com alguns aspetos sobre e algumas questões que aí se colocam.


Orientação preferencial das cozinhas


Um outro espeto relativo às cozinhas e que é, constantemente, motivo de dúvida na fase inicial da conceção residencial, tem a ver com a sua orientação preferencial, que é, habitualmente, referida aos quadrantes mais a Norte.
Esta é uma matéria sobre a qual há, no entanto, ma reflexão a fazer que tem a ver, designadamente, com os seguintes dois tipos de aspetos:
com a situação de ter de haver compartimentos expostos a esses quadrantes, quando se consideram habitações com ventilação cruzada e duas frentes, sendo uma delas mais a Sul – condição esta que parece ser a ideal –, e com a preferência que nestes casos deve ser dada aos quartos e salas na orientação mais a Sul, pois estes compartimentos e, designadamente, os quartos muito ganharão ao serem naturalmente aquecidos, no Inverno, durante o dia, para depois serem usados ao final da tarde e à noite;
não podemos esquecer que na quase totalidade dos casos são os próprios habitantes a usarem a cozinha para prepararem as suas refeições e assim há que ter em conta o seu conforto nesses espaços, não sendo, de todo adequado, que eles sejam concebidos como sendo destinados a alguém que ali estaria a realizar uma função “maquinal” e “de serviço”; hoje em dia tal não faz qualquer sentido, pois mesmo em situações de "cozinhas-laboratório" ou de recantos de cozinha, tais espaços devem ser expressivamente confortáveis, para além de serem funcionais e seguros na sua utilização.

Fig. 01: Cozinha de habitação do conjunto urbano "Bo01 City of Tomorrow", desenvolvido no âmbito da exposição que teve lugar em Malmö em 2001 (ver nota final) - H29 - H31, Arquitetura: Gert Wingardh, Monica Riton.

Portanto, o que haverá a concluir desta questão?
Talvez que a cozinha deva poder ser, tendencialmente, associada às condições ambientais que caracterizam a zona de estar doméstica, por exemplo, desenvolvendo-se na sua contiguidade, desde que tal condição não seja significativamente responsável pela disposição dos quartos orientados, de forma expressiva, a quadrantes Norte.
Por outras palavras, se há algum espaço a “sacrificar” a essa orientação mais a Norte, a cozinha deverá ser o primeiro, até porque durante o Verão essa mesma disposição será um fator específico de conforto no seu uso próprio e da sua boa influência ambiental no resto da casa, pois será um espaço tendencialmente fresco, com vantagens seja para a conservação dos alimentos, seja para o desenvolvimento da preparação de refeições, com uso do fogão – uso este que, afinal, será, também um fator de equilíbrio ambiental da vivência da cozinha em tempo frio.
Uma outra questão ambiental a considerar na conceção do espaço de cozinha liga-se com o erro, frequente, de se considerar que esta zona doméstica se deve ligar ao exterior de forma diversa do que acontece nas restantes zonas de estar – afinal, como tem ficado claro o espaço de cozinha deverá ser, sempre, e também uma zona de estar.


Fig. 02: Sala de habitação do conjunto urbano "Bo01 City of Tomorrow", desenvolvido no âmbito da exposição que teve lugar em Malmö em 2001 (ver nota final) - H29 - H31, Arquitetura: Gert Wingardh, Monica Riton - o tipo de fenestração é idêntico na sala e na cozinha.


Na prática faz muito pouco sentido tratar as janelas das zonas de cozinha apenas como sendo vãos funcionais, por exemplo, de acesso a estendais de roupa, assim como não faz qualquer sentido “enclausurar” o espaço de cozinha “atrás” de um espaço de tratamento de roupas (lavar e secar), interiorizando-o e prejudicando fortemente as suas condições de conforto ambiental (ventilação e iluminação natural), e mesmo “entristecendo-o” de forma crítica.

Iluminação natural de cozinhas 

Em termos de segurança e eficácia nas tarefas do cozinhar é fundamental que elas se desenvolvam em espaços e bancadas muito bem iluminados naturalmente, e, além disto, e porque somos nós os habitantes que estamos no espaço de cozinha a cozinhar e em outras atividades associadas, também será bem interessante que aí possamos ter boas vistas sobre o exterior.
E atente-se a que este tipo de cuidados podem e devem ser determinantes na estruturação doméstica e ajudam, até, por exemplo, na fundamental autonomização do tratamento de roupas relativamente à preparação de refeições; atividades estas (cozinhar e tratar a roupa), que afinal nada têm em comum em termos funcionais e ambientais, apenas eram, habitualmente, realizadas pelas mesmas pessoas: as “donas de casa” e as empregadas; mas esta é uma situação que parece ter mudado radicalmente.



Fig. 03: Pormenor de cozinha de habitação do conjunto urbano "Bo01 City of Tomorrow", desenvolvido no âmbito da exposição que teve lugar em Malmö em 2001 (ver nota final) - H29 - H31, Arquitetura: Gert Wingardh, Monica Riton.


Condições de conforto ambiental em cozinhas

E finalmente uma última questão ambiental: é essencial que as cozinhas tenham excelentes condições de luz e de ventilação naturais (janelas de abrir) ou "forçada" (grelhas de entrada e saída de ar).
E nesta matéria há que sublinhar que, sem dúvida, são preferenciais as condições de iluminação e ventilação naturais, aliás com importância claramente acentuada numa altura em que se procura uma maior sustentabilidade ambiental habitacional; e aqui há que sublinhar que, por vezes, se faz o mais complicado nestas matérias da sustentabilidade ambiental e se esquece o mais simples e igualmente importante como é o caso.
E, ainda nesta matéria, há que salientar que, muitas vezes, a famosa ventilação forçada é claramente deficiente ou corresponde a sistemas cuja eficácia de ventilação é claramente duvidosa ou que obrigam, mesmo, a soluções mecânicas que gastam energia para a resolução de uma situação que pode e deve ter uma resolução “natural”.

References

Referências/notas


Nota importante sobre as imagens que ilustram o artigo:

As imagens que acompanham este artigo e que irão, também, acompanhar outros artigos desta mesma série editorial foram recolhidas pelo autor do artigo na visita que realizou à exposição habitacional "Bo01 City of Tomorrow", que teve lugar em Malmö em 2001.

Aproveita-se para lembrar o grande interesse desta exposição e para registar que a Bo01 foi organizada pelo “organismo de exposições habitacionais sueco” (Svensk Bostadsmässa), que integra o Conselho Nacional de Planeamento e Construção Habitacional (SABO), a Associação Sueca das Companhias Municipais de Habitação, a Associação Sueca das Autoridades Locais e quinze municípios suecos; salienta-se ainda que a Bo01 teve apoio financeiro da Comissão Europeia, designadamente, no que se refere ao desenvolvimento de soluções urbanas sustentáveis no campo da eficácia energética, bem como apoios técnicos por parte do da Administração Nacional Sueca da Energia e do Instituto de Ciência e Tecnologia de Lund.

A Bo01 foi o primeiro desenvolvimento/fase do novo bairro de  Malmö, designado como Västra Hamnen (O Porto Oeste) uma das principais áreas urbanas de desenvolvimento da cidade no futuro.

Mais se refere que, sempre que seja possível, as imagens recolhidas pelo autor do artigo na Bo01 serão referidas aos respetivos projetistas dos edifícios visitados; no entanto, o elevado número de imagens de interiores domésticos então recolhidas dificulta a identificação dos respetivos projetistas de Arquitetura, não havendo informação adequada sobre os respetivos designers de equipamento (mobiliário) e eventuais projetistas de arquitetura de interiores; situação pela qual se apresentam as devidas desculpas aos respetivos projetistas e designers, tendo-se em conta, quer as frequentes ausências de referências - que serão, infelizmente, regra em relação aos referidos designers -, quer os eventuais lapsos ou ausência de referências aos respetivos projetistas de arquitetura.

Notas editoriais:
(i) Embora a edição dos artigos editados na Infohabitar seja ponderada, caso a caso, pelo corpo editorial, no sentido de se tentar assegurar uma linha de edição marcada por um significativo nível técnico e científico, as opiniões expressas nos artigos e comentários apenas traduzem o pensamento e as posições individuais dos respectivos autores desses artigos e comentários, sendo portanto da exclusiva responsabilidade dos mesmos autores.
(ii) De acordo com o mesmo sentido, de se tentar assegurar o referido e adequado nível técnico e científico da Infohabitar e tendo em conta a ocorrência de uma quantidade muito significativa de comentários "automatizados" e/ou que nada têm a ver com a tipologia global dos conteúdos temáticos tratados na Infohabitar e pelo GHabitar, a respetiva edição da revista condiciona a edição dos comentários à respetiva moderação, pelos editores; uma moderação que se circunscreve, apenas e exclusivamente, à verificação de que o comentário é pertinente no sentido do teor editorial da revista; naturalmente , podendo ser de teor positivo ou negativo em termos de eventuais críticas, e sendo editado tal e qual foi recebido na edição.

Infohabitar, Ano XI, n.º 531
Artigo LXXIII da Série habitar e viver melhor

Cozinha: algumas questões de projeto

Editor: António Baptista Coelho 
abc@lnec.pt e abc.infohabitar@gmail.com
GHabitar (GH) Associação Portuguesa para a Promoção da Qualidade Habitacional

Edição: José Baptista Coelho - Lisboa, Encarnação - Olivais Norte.



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