Infohabitar, Ano XV, n.º 680
Pormenorização da arrumação doméstica –
Infohabitar 680
Artigo da Série “Habitar e Viver
Melhor”
por António Baptista Coelho (texto e imagem)
Nota editorial:
continua-se, com este artigo, a publicação da Série editorial “Habitar e Viver Melhor”,
cujo último artigo foi publicado, aqui na Infohabitar, em fevereiro último, com o título: “O
cromatismo residencial - Infohabitar 676”.
Pormenorização da arrumação doméstica
A arrumação doméstica já foi estudada, nesta série
editorial, naturalmente integrada na abordagem dos espaços domésticos de uso
basicamente comum, desta forma e em seguida apenas se irão referir alguns
aspectos da arrumação muito associados a matérias de pormenorização.
Tal como salienta Claude Lamure "a disposição dos volumes de arrumação fixos e a sua incorporação no edifício permitem melhorar muito a economia de espaço habitável, a facilidade de manutenção e o conforto nas circulações". (1)
Fig. 01: a pormenorização da arrumação doméstica pode e deve ser uma forma de caracterização positiva dos respectivos espaços.
A arrumação relaciona-se com a área da habitação: cresce em fogos maiores e menores
A necessidade de arrumação cresce, naturalmente, consoante
cresce a ocupação da habitação; uma condição raramente cumprida, tendendo-se a
manter a capacidade de arrumação doméstica muito constante.
De certa forma a arrumação deve ser proporcional ao número de quartos da habitação, à semelhança do que acontece, regulamentarmente, com o número de casas de banho.
Interessa, ainda, considerar que, no caso das habitações
serem muito reduzidas, em termos de número de compartimentos e da sua área
verdadeiramente habitável, também há que exigir a existência de uma
significativa capacidade de arrumação, neste caso talvez mais “embutida” (ex.,
roupeiros integrados, mobiliário fixo), pois, de outra forma, essa reduzida
espaciosidade poderá ficar, rapidamente, “obstruída” e infuncional, pela
disposição dos mais diversos elementos de uso diário e ocasional.
Uma arrumação formalmente neutral
A capacidade de arrumação deve ser disponibilizada, por
regra, através de soluções formais e funcionais extremamente neutrais e de
grande sobriedade ou então de forma "camuflada", ou mesmo escondida,
sendo sobriamente disponibilizada nos sítios certos e com as condições
funcionais adequadas. Uma condição que deveria ser generalizada pois, por
vezes, um determinado elemento de arrumação condiciona o tipo de arranjo doméstico
do respectivo espaço, o que faz pouco sentido, afectando o potencial de
apropriação da habitação, a partir da sua “mobilaridade”.
E, nesta perspectiva, sublinha-se, por exemplo, a integração entre portas normais e portas de roupeiros, que resulta, habitualmente, em soluções de grande continuidade e sobriedade, desenvolvendo-se um ambiente agradavelmente unificado e íntimo, por exemplo, no acesso a quartos e a casas de banho realizados como que através de roupeiros, como se se tratasse de passagens secretas.
Esta é uma matéria que pode inaugurar uma outra pequena faceta de desenvolvimento destas temáticas que influenciam um habitar mais feliz, pois trata-se de uma possibilidade de se conceberem habitações muito lúdicas no sentido de proporcionarem usos bem apropriados e múltiplos, e o desenvolvimento de vários níveis de uso gradativamente mais secretos, ou então inusitados na sua conjugação com outros espaços domésticos.
Uma arrumação atraente
Mas, no entanto, é sabido que uma boa capacidade de
arrumação judiciosa e atraentemente disseminada pelos diversos compartimentos,
com "pontes fortes" e tipologicamente bem distintos, na cozinha,
copa, casas de banho, entrada, quartos e escritório, é um forte argumento na
atractividade de uma dada proposta doméstica.
Teremos assim uma arrumação sóbria e atraente, o que nos conduz, com naturalidade, a soluções caracterizadamente funcionais ou mesmo funcionalistas.
A arrumação no mobiliário
Nunca será excessivo registar que a principal parte de uma
arrumação doméstica deve ser cumprida, de forma integrada, em diversos
elementos de mobiliário que equipam os diversos compartimentos e espaços
domésticos; sendo que o principal factor para uma boa capacidade de mobiliário,
na habitação, tem a ver com a disponibilidade de muitos metros de paredes
lineares, sem vãos próprios e livres de manobras de vãos contíguos.
E a propósito deste aspecto, ou desta importante qualidade doméstica ligada à respectiva capacidade para integrar mobiliário, há que sublinhar que ela é cumulativamente determinante da capacidade de apropriação que toda a habitação deve proporcionar e em “quantidade”; sendo que, no limite, ela poderá ser suficiente para as necessidades de arrumação domésticas, afinal, cumprindo-se a velha tradição de não haver grandes elementos fixos, sendo tudo ou quase tudo arrumado em “móveis”.
E ainda a propósito deste assunto não se resiste a comentar que mesmo um aspecto “tão funcional” como a arrumação doméstica, tem uma dimensão tão humana e qualitativa como aquela associada à apropriação.
E, porque não, uma arrumação multifuncional?
Esta é uma temática cuja abordagem terá de ficar, aqui, um
pouco pelos aspectos mais gerais, mas será sempre interessante reflectir em
soluções espaço-funcionais em que determinados “recantos” domésticos possam ser
apropriados por arrumações ou por outros usos domésticos, numa opção que pode
marcar períodos específicos da “vida” da habitação, e que deve ter suporte em
soluções construtivas que sejam facilmente reversíveis.
A arrumação: habitual parente pobre, mas, realmente, o grande aliado de uma boa estruturação doméstica
Embora a arrumação tenda a ser um pouco esquecida nas
soluções domésticas importa sublinhar que uma sua adequada e estratégica
provisão proporciona o adequado funcionamento da habitação e confere-lhe um
elevado potencial de adaptabilidade funcional e a diversos modos de vida.
E nunca é de desperdiçar, tal como sublinha Christopher Alexander, o reforço do isolamento acústico entre compartimentos e espaços contíguos (quartos/quartos, quartos/salas, quartos/circulações e circulações/salas) que pode ser proporcionado pela interposição de roupeiros embutidos. (2)
Nas pequenas habitações, dimensionalmente muito contidas, será aconselhável que a integração dos dispositivos de arrumação se faça numa total aliança com a pormenorização arquitectónica responsável pela própria configuração da espacialidade e da ambiência interior.
Referimo-nos s uma estruturação doméstica que seja verdadeiramente “resiliente”, apoiando e facilitando excelentes e bem evidentes condições de arrumação e “limpeza” espacial, associadas a estimulantes condições de clareza e atractividade na leitura dos diversos espaços e subespaços; e que aceite um grau bastante sensível de desarrumação corrente (resultante de uma casa bem “vivida”), mas sem perder o essencial dessa clareza e atractividade de leitura de espaços razoavelmente arrumados e estruturados.
Notas:
(1) Claude Lamure, "Adaptation du
Logement à la Vie Familiale", p. 195.
(2) Christopher Alexander; Sara
Ishikawa; Murray Silverstein; et al, "A Pattern Language/Un Lenguaje de
Patrones", pp. 799 e 800.
Notas editoriais:
(i) Embora a edição dos
artigos editados na Infohabitar seja ponderada, caso a caso, pelo corpo
editorial, no sentido de se tentar assegurar uma linha de edição marcada por um
significativo nível técnico e científico, as opiniões expressas nos artigos e
comentários apenas traduzem o pensamento e as posições individuais dos
respectivos autores desses artigos e comentários, sendo portanto da exclusiva
responsabilidade dos mesmos autores.
(ii) De acordo com o mesmo
sentido, de se tentar assegurar o referido e adequado nível técnico e
científico da Infohabitar e tendo em conta a ocorrência de uma quantidade muito
significativa de comentários "automatizados" e/ou que nada têm a ver
com a tipologia global dos conteúdos temáticos tratados na Infohabitar e pelo
GHabitar, a respetiva edição da revista condiciona a edição dos comentários à
respetiva moderação, pelos editores; uma moderação que se circunscreve, apenas
e exclusivamente, à verificação de que o comentário é pertinente no sentido do
teor editorial da revista; naturalmente , podendo ser de teor positivo ou
negativo em termos de eventuais críticas, e sendo editado tal e qual foi
recebido na edição.
Infohabitar, Ano XV, n.º 680
Pormenorização da arrumação doméstica –
Infohabitar 680
Infohabitar
Editor: António Baptista Coelho
Arquitecto/ESBAL, doutor em Arquitectura/FAUP
– Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto, Investigador Principal
com Habilitação em Arquitectura e Urbanismo/LNEC – Laboratório Nacional de Engenharia
Civil
Revista do GHabitar (GH) Associação
Portuguesa para a Promoção da Qualidade Habitacional Infohabitar – Associação
com sede na Federação Nacional de Cooperativa de Habitação Económica (FENACHE).
Apoio à Edição: José Baptista Coelho -
Lisboa, Encarnação - Olivais Norte.
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