Infohabitar, Ano XV, n.º 673
Pequenos espaços exteriores e
interiores/exteriores privados - Infohabitar 673
Artigo da Série “Habitar e Viver
Melhor”
por António Baptista Coelho (texto e desenhos)
Sobre uma habitação feita mais por sítios
específicos do que por espaços ditos de/para actividades e funções domésticas.
Aproveitando para lembrar, entre outros autores
Arquitectos, o grande Christopher Alexander e a sua incontornável “linguagem de
padrões”, que tanto influenciou tanta gente e é tão poucas vezes citada ou
referenciada, podemos referir que uma habitação, um mundo doméstico que, para o
ser, tem de integrar, potencialmente, os vários mundos domésticos específicos
dos respectivos habitantes, mais o respectivo agregado comum e convivial, muito
mais do que um “simples” complexo funcional – e ainda assim o número de funções
é extenso – deveria ser constituído e constituível por uma potencial e muito
extensa diversidade de “cantos”, “recantos” e “sítios” adequados a uma enorme
variedade de misturas funcionais e apropriações pessoais e de grupo específicas
e dinâmicas.
Sobre a previsão destes tipo de “cantos”, “recantos”
e “sítios” domésticos, que são, em boa
parte, os grandes responsáveis pela criação de um grande mundo pessoal e
familiar, destacam-se alguns aspectos muito variados e, designadamente, de
agradabilidade e de conforto ambiental, de adaptabilidade, de funcionalidade
com sentido lato e de adequada, rica e apropriável pormenorização
arquitectónica, que, em seguida, muito brevemente se apontam – não exaustivamente
(trata-se de um texto naturalmente dinâmico).
Sobre os pequenos espaços exteriores e interiores/exteriores privados – considerações estruturantes
Antes de passar a alguns, pouco, comentários
específicos sobre a caracterização e a importância que podem ter alguns tipos
de espaços privados exteriores e de relação interior/exterior, numa adequada
vivência dos nossos espaços domésticos pessoais e familiares, importa
abordá-los, resumidamente, de uma forma geral e introdutória àqueles
comentários.
Em primeiro lugar um aviso, talvez desnecessário mas
sempre útil, que não se irão apontar aqui aspectos sistemáticos de projecto
destes espaços, mas sim considerá-los numa perspectiva de concepção muito
aberta e estimulante de boas e renovadas formas de habitar os nossos espaços
domésticos, sendo que a primeiríssima consideração a registar é que estes tipos
de espaços de fruição directa do exterior e de afirmada (física) relação com o
interior doméstico, têm de se constituir em verdadeiros elementos estruturantes
dos respectivos projectos de Arquitecturas, marcando seja o
carácter/qualificação dos seus interiores, seja o carácter/imagem da sua face
pública. E tudo o que seja menos do que isto não deve chegar, pois será sempre
referido a colagens, mais ou menos, postiças de tais elementos/espaços nas
fachadas dos edifícios e no prolongamento “automático” dos respectivos
interiores contíguos.
Tal condição é essencial e está provada/garantida em
múltiplos testemunhos de grandes Mestres Arquitectos, que a ela se referem,
sublinhando, por vezes, que a própria essência da Arquitectura é o “jogo” de
relações entre espaços e, designadamente, entre espaços interiores, exteriores
e de transição/graduação ou de aberturas visuais mútuas.
Naturalmente que esta condição será tanto mais
importante, quanto mais “liberta” de condicionantes envolventes e de agregação
estiver a solução arquitectónica residencial, sendo básica, por exemplo, na
concepção de moradias unifamiliares isoladas; mas ela é, também, fundamental
mesmo, por exemplo, como bem sabemos, em grandes edifícios multifamiliares
integrados em centros urbanos densos, que podem basear boa parte do seu
carácter arquitectónico próprio/único no manejar da sua vertente de, eventuais,
“cascatas”, mais ou menos naturalizadas de grandes varandas domésticas.
Fig. 01: interpretação livre do conjunto residencial da Cooperativa UGTimo, no Zambujal - projecto do Arq.º José Alves Bicho
Oito aspectos de concepção a ter em conta no desenvolvimento de pequenos espaços exteriores privados
Para além da consideração básica que acabou de ser
apontada, existem, pelo menos, oito “famílias” de aspectos, igualmente estruturantes
da concepção de pequenos espaços domésticos privados exteriores ou de transição
interior/exterior, que importa aqui registar, de forma sintética:
Exterior privado e janelas domésticas
Parece óbvio, mas tantas vezes excelentes pequenos
espaços domésticos privados exteriores ou de transição interior/exterior têm a
sua presença muito menorizada por soluções de vãos pouco adequadas em termos de
más influências na funcionalidade dos espaços contíguos, pormenorização visual
inadequada, pouca segurança contra intrusões, etc.
E tal condição é extremamente crítica, por exemplo,
quando, por exemplo, se desenvolvem, de raiz, varandas envidraçadas; cuja
caracterização arquitectónica pode variar entre a excelência e a extrema
dissonância, mercê de soluções de vãos bem diferentes na sua pormenorização.
As vistas no exterior privado
Desenvolver qualquer pequeno espaços doméstico
privados exterior ou de transição interior/exterior, implica programar e
assegurar as respectivas estratégias de vistas: sobre o exterior público; sobre
o interior privado, a partir deste último e através do exterior privado, etc.
E mesmo que tais vistas não existam ou seja muito
condicionadas, como é, por exemplo, o caso de um pequeno pátio privativo, tais
vistas têm de ser consideradas e devidamente trabalhadas, neste caso, no
sentido de se proporcionar um interessante sentido intimista e protegido.
A criatividade volumétrica e pormenorizada no exterior privado
A matéria, acima apontada, do papel estruturante que
os pequenos espaços domésticos privados exteriores ou de transição
interior/exterior assumem na concepção arquitectónica residência, liga-se a um
aspecto, talvez mais “fino” na sua consideração, referido à grande criatividade
volumétrica, multilateral e pormenorizadamente diversificada que pode e deve
ser proporcionada por tais espaços.
Uma condição bem evidente na diferença que existe,
por exemplo, entre varandas muito abertas e balcões expressivamente mais
encerrados ou resguardados, e, naturalmente, entre a grande variedade que é
possível seja entre varandas – desde a pequeníssima varanda apenas de assomar,
à mais profunda e orgânica varanda/sala – e entre a expressiva diversidade
tipológica e volumétrica que é possível no desenvolvimento de pequenos pátios
privados, mais ou menos encerrados, mais ou menos tratados como pátio
construído ou como pequeno jardim.
Usos reais do exterior privado
Evidentemente que condição de proporcionarem, ou
não, usos reais, é marcante na caracterização e na adequada viabilidade dos
pequenos espaços domésticos privados exteriores ou de transição
interior/exterior.
Talvez basta apontar que um uso real pode ser
“apenas” o proporcionar a possibilidade de “colocar os pés na rua”, de “estar
cá fora”, em pequeníssimas varandas de assomar. Mas o uso real pode ser, por
exemplo, proporcionar um variado conjunto de funções de estar, lazer e
elaboração e toma de refeições numa
ampla e bem equipada varanda/sala. Talvez o que não faça qualquer sentido são
as situações dimensionalmente “neutras” e inadequadas que proporcionem um pouco
mais de espaço para estar “cá fora” em pé e nada mais, designadamente, quando
em quadros habitacionais com controlo de custos.
Exterior privado e relação com aspectos de segurança
Não sendo, talvez, aqui o sítio para o desenvolvimento
desta essencial matéria, que obriga a uma atenção específica e desenvolvida,
não faria sentido não registar e sublinhar que a concepção global e
pormenorizada dos espaços, equipamentos, elementos de pormenorização e soluções
de manutenção dos pequenos espaços domésticos privados exteriores ou de
transição interior/exterior têm de cumprir exigentes condições de segurança no
uso, designadamente, em espaços elevados e no que se refere ao risco de queda
dos habitantes, com natural destaque para crianças e idosos.
Outro aspecto de segurança a considerar tem a ver
com a defesa relativamente a intrusões em espaços exteriores privados térreos
ou próximos do nível térreo, pois, não existindo tais condições, originam-se,
frequentemente, iniciativas dos habitantes procurando solucionar esta situação,
frequentemente inadequadas em termos funcionais e de imagem pública.
Exterior privado e relação com o conforto
Naturalmente que o desenvolvimento de pequenos
espaços domésticos privados exteriores ou de transição interior/exterior só faz
sentido quando a respectiva orientação solar e eólica lhes proporcione
adequadas condições de conforto ambiental; sendo que as respectivas condições
de pormenorização poderão apoiar tais condições, designadamente, no seu controlo
ao longo do dia e no decorrer das estações do ano.
Exterior privado e relação com a natureza
Evidentemente que os pequenos espaços domésticos
privados exteriores ou de transição interior/exterior são locais estratégicos
de integração de elementos naturais em soluções muito diversificadas e
perfeitamente integradas na solução arquitectónica global, conseguindo-se
efeitos globais muito interessantes, por sequências de imagens, com dois
sentidos, entre verde público e verde privado e obtendo-se um muito importante
factor de apropriação residencial e doméstica, através de um verde privado que
cada morador poderá “manejar” e recriar a seu gosto.
Exterior privado, relação com a acessibilidade e caracterização tipológica
Um aspecto de grande interesse na geração de
variadas tipologias de edifícios residenciais de baixa altura e/ou de transição
entre o uni e o multifamiliar e, também, de importante relação com variados
gostos e hábitos residenciais refere-se à possibilidade de pequenos espaços
domésticos privados exteriores ou de transição interior/exterior proporcionarem
acessos directos (devidamente controlados) entre os espaços privados e espaços
públicos ou de uso público (ex., caminhos pedonais de vizinhança) ou entre
espaços privados e espaços públicos (ex., galerias de acesso comum elevadas).
Fig. 02: interpretação livre de um conjunto residencial da Cooperativa COOHAFAL, Funchal, projecto coordenado pelo Arq.º João Francisco Caires.
Consideração complementar sobre o equilíbrio de aéreas domésticas interiores e exteriores
Tratando-se de uma matéria que, por si só,
justificará cuidadosas reflexões, regista-se aqui, apenas, que não se considera
poder-se concluir, basicamente, por uma tendência de anular os pequenos espaços
domésticos privados exteriores ou de transição interior/exterior, quando se
desenvolvem habitações com áreas e custos controlados.
Considera-se que, pelas razões acima apontadas, o
papel destes espaços é de grande importância na qualificação de uma adequada
habitabilidade residencial, embora, naturalmente, existam situações onde, por
exemplo, é preciso optar entre um interior um pouco menos exíguo e a
disponibilização de uma varanda razoável. Mas há muitas soluções possíveis e
importa sempre ter em conta que quando os edifícios são baixos e o exterior
residencial público é agradável e convidativo, será possível reduzir
“estrategicamente” o exterior privado.
Em próximas edições serão abordadas algumas
tipologias de pequenos espaços domésticos privados exteriores ou de transição
interior/exterior.
Notas editoriais:
(i) Embora a edição dos
artigos editados na Infohabitar seja ponderada, caso a caso, pelo corpo
editorial, no sentido de se tentar assegurar uma linha de edição marcada por um
significativo nível técnico e científico, as opiniões expressas nos artigos e
comentários apenas traduzem o pensamento e as posições individuais dos
respectivos autores desses artigos e comentários, sendo portanto da exclusiva
responsabilidade dos mesmos autores.
(ii) De acordo com o mesmo
sentido, de se tentar assegurar o referido e adequado nível técnico e
científico da Infohabitar e tendo em conta a ocorrência de uma quantidade muito
significativa de comentários "automatizados" e/ou que nada têm a ver
com a tipologia global dos conteúdos temáticos tratados na Infohabitar e pelo
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respetiva moderação, pelos editores; uma moderação que se circunscreve, apenas
e exclusivamente, à verificação de que o comentário é pertinente no sentido do
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negativo em termos de eventuais críticas, e sendo editado tal e qual foi
recebido na edição.
Infohabitar, Ano XV, n.º 673
Pequenos espaços exteriores e
interiores/exteriores privados - Infohabitar 673
Artigo da Série “Habitar e Viver
Melhor”
Infohabitar
Editor: António Baptista Coelho
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