Infohabitar,
Ano XV, n.º 687
As janelas e o interior doméstico – Infohabitar 687
Artigo da Série “Habitar e Viver
Melhor”
por António Baptista Coelho (texto e imagens)
Sequem-se algumas notas sobre a relação entre o
interior doméstico e os respectivos vãos de janela, considerados estes vãos
como importantes elementos de construção, acabamento, e qualidade
arquitectónica do interior doméstico.
Pensar as janelas como elementos de composição dos alçados/volumetrias, mas também como elementos multifuncionais e de composição do interior doméstico.
Quando abordamos as janelas domésticas, do ponto
de vista da respectiva concepção, parece haver, frequentemente, uma tendência
para as considerarmos, de forma privilegiada, essencialmente como elementos de
composição dos respectivos alçados e volumetrias.
Naturalmente, que esta é uma perspectiva genérica,
mas é interessante considerá-la no que se refere ao relativo “esquecimento” que
ela pode induzir, seja, numa primeira linha, no que se refere aos diversos
conteúdos funcionais que podem e devem ser assegurados por uma janela, seja no
que se refere à própria integração e ao papel formal das janelas na
estruturação e na composição dos interiores domésticos.
É, basicamente, este lembrete o que corresponde
à matéria tratada nos textos que se seguem, que devem, no entanto, ser tomados,
basicamente, como uma reflexão muito livre sobre o assunto; e que decorre de
alguma prática profissional de projectista e de uma muito longa prática
profissional como agente de análise pormenorizada de centenas de casos práticos
de edifícios habitacionais.
Breves notas sobre as janelas domésticas como elementos de composição dos alçados/volumetrias
Não sendo, aqui, o sítio adequado para uma
reflexão alongada sobre o papel das janelas domésticas como elementos de
composição dos respectivos alçados/volumetrias, pois estamos, agora, no mundo
do interior doméstico e não nos níveos da vizinhança residencial, importará, no
entanto, considerar que a formalização pormenorizada das janelas de peito e de
sacada, bem como as associadas pormenorizações de varandas e balcões, não
respeita, frequentemente, um equilíbrio formal e funcional marcado por
significativos aspectos de integração local, escala humana e caracterização
residencial.
A opção faz-se, frequentemente, por soluções
normalizadas e pouco harmonizadas com a escala e o carácter do respectivo
edifício residencial, e o que dizer de uma ausência de uma pormenorização que,
para além de servir tais preocupações de integração e de escala, pudesse
realmente valorizar a solução global de alçados e de volumetria numa
perspectiva de solução verdadeiramente global, integrada nos seus elementos e
na envolvente e expressivamente caracterizadora daquele edifício ou conjunto
edificado específicos: sendo esta última opção, naturalmente, aquela que é
marcada por uma adequada qualidade arquitectónica.
Sabemos, evidentemente, que uma tal opção tem
importantes implicações económicas (ex., pormenorização específica para um dado
edifício), mas por vezes até em soluções sem expressivas preocupações de
economia ela não existe e, em outros casos, fica muito evidente não ter havido
uma adequada pesquisa das múltiplas soluções-tipo disponíveis e não tenhamos
dúvida que, hoje em dia (ao contrário do que acontecia há algumas dezenas de
anos), há inúmeras soluções de catálogo disponíveis para se poderem “montar” soluções
específicas de fenestração bem integradas e valorizadoras da respectiva solução
arquitectónica global.
Fig. 01: janela com ampla luz natural, com enquadramento de vistas do exterior, com vão de correr manobrável, com vidro de segurança abaixo do parapeito ...
Notas sobre a multifuncionalidade das janelas domésticas
Um outro aspecto que importa, sempre, lembrar
quando se aborda a temática da fenestração doméstica, refere-se à fundamental
multifuncionalidade que deve marcar a respectiva concepção, considerando-se,
designadamente, os seguintes aspectos formais/funcionais:
- adequadas condições de relação com o
exterior, a partir do interior doméstico e também, um pouco, “vice-versa”,
através de adequadas “transparências” e expressões funcionais dos espaços
interiores domésticos sobre as respectivas vizinhanças de proximidade;
- adequadas condições de conforto ambiental
interior – boa luz natural e adequadas condições de obscurecimento, bom
isolamento térmico e sonoro e boa ventilação natural;
- adequadas condições de segurança: no uso,
designadamente, por crianças e idosos, e visando-se, especificamente, riscos de
queda no uso normal e quando em acções de manobra e manutenção; e por previsão
do respectivo encerramento (segurança contra intrusões);
- e adequadas condições de possibilidade de uso
de espaços exteriores e interiores contíguos; seja de forma independente (ex.,
só espaços exteriores, ou só espaços interiores); seja de forma integrada,
através de estimulantes continuidades entre interiores e exteriores domésticos.
Fig. 02: uma janela dupla perfeitamente enquadrada com móvel aparador, estruturando a sala-comum.
Reflexões sobre as janelas como elementos de composição do interior doméstico
As janelas domésticas devem ser encaradas como
elementos cujas características formais e funcionais estejam adequadamente
harmonizadas com a caracterização global de um ambiente/quadro doméstico e com
um muito amplo leque de opções em termos de arranjos domésticos, condição esta
que obrigará a um sensível cuidado em termos de soluções formais de janelas que
sejam, pelo menos, compatíveis com esse amplo leque de arranjos.
Há, no entanto, aspectos básicos a considerar
na fenestração, de forma privilegiada ou estruturadora da organização doméstica
e entre estes sobressai a capacidade de
mobilar os diversos compartimentos e espaços, associada, designadamente, à
expressiva disponibilização de paredes para encostar mobiliário, mas também
associada a questões de dimensionamentos versáteis, que proporcionem, por
exemplo, mobilar e circular, e ainda associada a adequadas relações geométricas
entre paredes e vãos de janela e de porta, proporcionando a sua respectiva
manobra mas também a boa integração de mobiliário (ex., aproveitando bem os
cantos dos compartimentos).
Um exemplo interessante deste tipo de preocupações
encontra-se em tradicionais soluções de fenestração, cujas folhas envidraçadas
e portadas de segurança ficam praticamente “embebidas” na espessura das
paredes, em vãos tão funcionais como fortemente expressivos pela sua capacidade
simbólica e marcante de uma relação interior/exterior bem enquadrada e
enquadradora.
É essencial pensar, pelo menos, na
materialidade das soluções de fenestração e na sua expressão formal mais
marcante; uma preocupação que nos pode levar a escolher vãos de janela com
perfis de caixilharia reduzidos, material e cromaticamente neutros (no que se
refere ao seu potencial de harmonização com variados arranjos interiores) e com
superfícies envidraçadas maximizadas; opções estas que, no entanto, não devem
comprometer outras exigências a ter com os vãos exteriores, essencialmente no
que se refere ao conforto ambiental interior, designadamente, no que se refere
ao sombreamento e à ventilação natural.
Uma das soluções historicamente consolidadas em
termos da harmonização interior de soluções de fenestração liga-se ao uso,
nesta fenestração e nos seus elementos associados, de materiais, texturas e
acabamentos naturais (ex., aço, madeira, tecidos naturais e “lisos”, etc.),
sendo que, com sentido contrário, as soluções marcadas pela artificialidade
(ex., plásticos) podem comprometer significativamente a referida harmonização
interior doméstica entre fenestração e os mais diversos tipos e conteúdos de
arranjos.
Há, ainda, um aspecto essencial a considerar na
previsão da fenestração doméstica, “pelo interior”, que é a fundamental
adequação dos vãos relativamente à sua orientação solar, tendo-se em conta a
necessidade de dispositivos específicos de controlo da insolação, da luz
natural e da ventilação natural, muito ligados às características específicas
de orientação de cada vão e que também devem cumprir as referidas condições de
harmonização com um amplo leque de potencias arranjos interiores domésticos.
Também um importante aspecto a ter em conta na
boa integração da fenestração nas diversas soluções de espaços domésticos
interiores, refere-se às respectivas condições de “securização” dos vãos contra
intrusões; matéria sensível e complexa, pois as soluções de portadas interiores
deixaram de ter, actualmente, expressiva aplicabilidade e sendo que as soluções
baseadas em alarmes acabam por ser diversas nas condições disponibilizadas, não
proporcionando uma clara expressão de um sentido de segurança directa contra
intrusões.
Notas editoriais:
(i) Embora a edição dos
artigos editados na Infohabitar seja ponderada, caso a caso, pelo corpo
editorial, no sentido de se tentar assegurar uma linha de edição marcada por um
significativo nível técnico e científico, as opiniões expressas nos artigos e
comentários apenas traduzem o pensamento e as posições individuais dos
respectivos autores desses artigos e comentários, sendo portanto da exclusiva
responsabilidade dos mesmos autores.
(ii) De acordo com o mesmo
sentido, de se tentar assegurar o referido e adequado nível técnico e
científico da Infohabitar e tendo em conta a ocorrência de uma quantidade muito
significativa de comentários "automatizados" e/ou que nada têm a ver
com a tipologia global dos conteúdos temáticos tratados na Infohabitar e pelo
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respetiva moderação, pelos editores; uma moderação que se circunscreve, apenas
e exclusivamente, à verificação de que o comentário é pertinente no sentido do
teor editorial da revista; naturalmente , podendo ser de teor positivo ou
negativo em termos de eventuais críticas, e sendo editado tal e qual foi
recebido na edição.
Infohabitar, Ano XV, n.º 687
As janelas e o interior doméstico – Infohabitar 687
Infohabitar
Editor: António Baptista Coelho
Arquitecto/ESBAL, doutor em
Arquitectura/FAUP – Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto,
Investigador Principal com Habilitação em Arquitectura e Urbanismo/LNEC – Laboratório
Nacional de Engenharia Civil
Revista do GHabitar (GH) Associação
Portuguesa para a Promoção da Qualidade Habitacional Infohabitar – Associação
com sede na Federação Nacional de Cooperativa de Habitação Económica (FENACHE).
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