terça-feira, setembro 04, 2012

406 - Viver intensamente, também o exterior (artigo); e notícias do 2.º CIHEL - Infohabitar 406


Infohabitar N.º 406

Notícias do 2.º Congresso Internacional da Habitação no Espaço Lusófono – 2.º CIHEL.

As duas Chamadas de Comunicações decorreram com grande êxito até 1 julho de 2012, tendo sido submetidos um significativo total de 225 resumos de comunicações (182 na 1.ª Chamada e 43 na 2.ª).
A entrega de propostas de resumos/comunicações está, portanto, encerrada, aproximando-se a data de envio das comunicações completas, EXCLUSIVAMENTE, para o seguinte endereço eletrónico, Email: comunicacoes2cihel@lnec.pt

. Comunicação da análise/aceitação das propostas da 2.ª Chamada a partir de 14 de setembro de 2012 - será tentada a possível antecipação a esta data.
. Abertura das inscrições: data a definir em breve.
. Envio do texto das comunicações, resumo alargado e dados complementares até 22 de outubro de 2012.
. Selecção final e eventual solicitação de revisões das comunicações até 30 novembro de 2012.
. Entrega da revisão final (quando aplicável): até 15 dezembro de 2012.

Na presente edição do Infohabitar continua-se a publicação corrente da série habitar e viver melhor.

ARTIGO DA SEMANA - ARTIGO DA SEMANA - ARTIGO DA SEMANA

VIVER INTENSAMENTE, TAMBÉM O EXTERIOR
Artigo XVII, da série “habitar e viver melhor”

António Baptista Coelho

Segundo Ken Kern, "o processo de planificação da casa e do lugar deve ser conjunto, havendo a mesma consideração no desenho de cada metro quadrado de espaço interior e exterior", e o autor sintetiza esta ideia de uma forma magistral quando nos diz que"ajuda pensar na habitação e no local como um grupo coordenado de compartimentos interiores e exteriores" (1).

E é bem nesta perspectiva que Gordon Cullen lança a muito estimulante noção de "paisagem interior e compartimento exterior" (2), e parece estar aqui bem lançada a ideia de uma caracterização residencial desejavelmente interior e exterior; de certa forma uma ideia de um pequeno mundo residencial de cada um em sua casa e de pequenos mundos residenciais comuns.

É interessante pensar nesta matéria do viver intensamente, também o exterior, como uma extensão, natural, da ideia que, há alguns anos, incidiu sobre o exterior urbano, recomendando que ele fosse pormenorizado e equipado com todo o cuidado; uma ideia que esteve frequentemente associada aos muitos casos de inacabamento crítico de conjuntos urbanos e habitacionais de interesse social que aconteceram (e ainda acontecem) em Portugal, onde apenas se proporcionava “alojamento” em edifícios, esquecendo-se a componente verdadeiramente urbana do habitar, mas uma ideia que, na prática e realmente, deveria marcar todas as intervenções urbanas, associando-lhes uma componente de projecto “do negativo”, ou “do espaço entre” edifícios, que tem de ter a sua aprendizagem específica e fundamental na oferta urgente de espaços urbanos agradáveis para serem vividos – numa referência directa ao título e tema de um excelente livro que, sobre esta matéria, foi realizado por Michel de Sablet e que merece ser relido e redescoberto (3).



Fig.01: ruas de Alvalade, Lisboa; urbanismo de Faria da Costa.

E, julga-se a propósito, temos de considerar que mesmo esse objectivo “central/estratégico”de vivência plena e intensa do exterior está, entre nós, em Portugal, por regra, longe de ser atingido, quer por haver ainda muitos casos de conjuntos urbanos em que o espaço público tem o seu acabamento ou “arranjo” sistematicamente adiado, pelas mais diversas “razões”, quer por haver grandes confusões, para não dizer até ignorâncias, sobre as técnicas básicas e as soluções funcionais e formais realmente adequadas para um exterior público que tem de ser, obrigatoriamente, muito mais do que um elemento de enquadramento visual dos respectivos edifícios e/ou um espaço fundamentalmente rodoviário; e que só o sendo poderá transformar-se num exterior com claro potencial de uso.

E não é possível deixar aqui de apontar que provavelmente o principal fio condutor desse repensar urgente da importância e do papel do espaço urbano público e de uso público é a sua essencial continuidade física ao serviço dos peões, intimamente ligada à sua agradabilidade e vitalidade no uso e à sua atractividade e “imagibilidade”.

Considerando-se, assim, que o caminho não está percorrido, mas até já está traçado, é importante avançar aqui, um pouco mais, nesta matéria do viver intensamente, também o exterior, e recordemos que imediatamente antes desta matéria – em outros artigos desta série - pensámos, um pouco, nos jogos das entradas e no jogo urbano, assim como num certo jogo, no sentido lúdico e de satisfação directa, que o verde urbano traz, sem dúvida, a estes jogos, seja por mérito próprio, seja por um mérito de grande capacidade associativa com os outros elementos do jogo.



Fig.02: conjunto de realojamento na Travessa do Sargento Abílio, CM de Lisboa; projecto de Paulo Tormenta Pinto.

E pensando em tudo isto, e lembrando pequenos pedaços de cidade habitada que nos parecem felizes, pois são sítios onde o passeante errante se imagina a morar com agrado, a ideia principal que se destaca é que estamos a imaginar habitar aqueles espaços públicos específicos; e é assim que, mais do que “entrar” nas habitações que os rodeiam, imaginamo-nos a circular e a viver aqueles passeios, aquelas pracetas, aquelas esquinas e passagens e, finalmente, aquelas entradas e aquelas janelas, sempre numa relação forte e directa com aqueles espaços públicos onde existem, ainda que deficientemente, tais tipos de relações.

E esta reflexão só poderá parecer um lugar-comum, no sentido desta procura de se identificarem as principais matérias constituintes de um habitar mais adequado ou mesmo mais feliz, ou a quem não tenha, infelizmente, a sensibilidade para se imaginar viver ali, naquele agradável pedaço de bairro, naquela sossegada margem de cidade, naquela ilha de alguma paz, “perdida” no bulício urbano; ou então a quem não queira fazer um exercício simples que é imaginar a diferença que separa uma dessas situações, que nos atraem no sentido de nos levar, naturalmente, a imaginarmos poder ali viver, de tantas outras situações cujos cenários urbanos nos afastam e mesmo repugnam, ou pelos quais não sentimos qualquer tipo de simpatia ou empatia.



Fig. 03: Residencial Alexandre Mackenzie, para realojamento de parte da favela Nova Jaguaré, Prefeitura da Cidade de São Paulo / Secretaria Municipal de Habitação / Superintendência de Habitação Popular; projecto de Boldarini Arquitetura e Urbanismo - Marcos Boldarini e Sergio Faraulo (autores); paisagismo de Marcos Boldarini, Melissa Matsunaga e Simone Ikeda (autores).

E não tenhamos dúvida de que o que estamos, realmente, a apreciar e a visualizar é a perspectiva de como poderíamos viver aqueles espaços públicos, nas suas características específicas e nos seus relacionamentos, sempre “duplos”, com os caminhos ligados aos acessos às habitações e com aqueles que privilegiam as relações com a cidade mais central/viva.

Sendo assim, ficará, portanto, em evidência a importância que tem, para o nosso objectivo de sermos mais felizes com determinadas condições habitacionais, a possibilidade que podemos ter, ou que pensamos poder ter, de viver intensa e agradavelmente cada conjunto de espaços exteriores públicos que serve e integra cada agregado de habitações; e pensando assim somos quase levados a inverter prioridades em termos do investimento no habitar, o que evidentemente não é aconselhável; mas esta é, muito provavelmente, a razão que baseia o enorme impacto positivo que sempre têm acções de requalificação exterior, mesmo quando a Arquitectura da edificação tem claro sinal negativo, seja como pré-existência, seja como realidade não intervencionada.

Para concluir esta matéria da importância de se viver intensamente o exterior urbano, importa sublinhar dois aspectos: o primeiro é que este objectivo tem de incidir sobre toda a estratégia de melhor fazer o habitar e a cidade, não sendo assunto que se possa tratar num dado ítem conceptual mais específico ou confinado, pois liga-se a todo o processo de concepção urbana; e o segundo decorre disto mesmo e tem a ver com a urgente necessidade de uma renovada produção tipológica (i) do edificado (escala micro-urbana) e (ii) do espaço urbano a uma escala macro, que tem, obrigatoriamente, de dar uma nova e muito afirmada importância ao como é possível e extremamente oportuno e desejável estimular uma vida mais intensa do exterior urbano, ou dos espaços públicos e de uso público das nossas cidades e povoações – uma possibilidade que não convive com alianças fingidas entre velhas e negativas tipologias edificadas e reconversões “cegas” de espaços públicos, exigindo-se projectos realmente integrados e tipologicamente reinterpretados.

E lembrando-nos que vivemos o século das cidades e das mega-cidades, assim como o século das cidades informais, potencialmente tão marcadas por este tipo de intervenções, os referidos objectivos de vivência intensa e agradável do espaço urbano, recolhem, ainda, uma oportunidade e urgência muito acrescidas e que merecem posterior desenvolvimento.

Notas:
(1) Ken Kern, "La Casa Autoconstruida", p. 23.
(2) Gordon Cullen, "Paisagem Urbana", p. 30.
(3) Michel de Sablet, “Des espaces urbains agréables à vivre – Places, Rues, Squares et Jardins”, Editions du Moniteur, Paris, 1988.

Notas editoriais:
(i) A edição dos artigos no âmbito do blogger exige um conjunto de procedimentos que tornam difícil a revisão final editorial designadamente em termos de marcações a bold/negrito e em itálico; pelo que eventuais imperfeições editoriais deste tipo são, por regra, da responsabilidade da edição do Infohabitar, pois, designadamente, no caso de artigos longos uma edição mais perfeita exigiria um esforço editorial difícil de garantir considerando o ritmo semanal de edição do Infohabitar.
(ii) Por razões idênticas às que acabaram de ser referidas certas simbologias e certos pormenores editoriais têm de ser simplificados e/ou passados a texto corrido para edição no blogger.
(iii) Embora a edição dos artigos editados no Infohabitar seja ponderada, caso a caso, pelo corpo editorial, no sentido de se tentar assegurar uma linha de edição marcada por um significativo nível técnico, as opiniões expressas nos artigos apenas traduzem o pensamento e as posições individuais dos respectivos autores.



Infohabitar a Revista do Grupo Habitar
Infohabitar, Ano VIII, n.º 406
Editor: António Baptista Coelho
Edição de José Baptista Coelho
Lisboa, Encarnação - Olivais Norte

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