- Infohabitar 182
É com especial satisfação que o Infohabitar acolhe mais um grande artigo de uma nova colaboradora da nossa revista; Maria Tavares é arquitecta, mestre em arquitectura da habitação e Assistente da cadeira de Projecto III (5º ano) na Faculdade de Arquitectura e Artes da U. Lusíada V. N. de Famalicão.
É com especial satisfação que o Infohabitar acolhe mais um grande artigo de uma nova colaboradora da nossa revista; Maria Tavares é arquitecta, mestre em arquitectura da habitação e Assistente da cadeira de Projecto III (5º ano) na Faculdade de Arquitectura e Artes da U. Lusíada V. N. de Famalicão.
Não seria possível deixar de referir a importância que se atribui à divulgação das experiências de habitação de interesse social que marcaram o século XX português, pois muito do que se avançou e poderá/deverá ainda avançar, nestes e em todos os domínios, depende de uma cuidadosa análise e de uma informada divulgação das experiências anteriores; e nestas matérias da arquitectura do habitar, quando tais experiências são servidas por excelentes projectos de Arquitectura, então há realmente tudo a ganhar com um tal processo de contínuas contribuições e desenvolvimentos sobre/ou considerando as experiências anteriores.
ABC
UM PERCURSO NA HABITAÇÃO EM PORTUGAL: O CASO DA FEDERAÇÃO DE CAIXAS DE PREVIDÊNCIA – HABITAÇÕES ECONÓMICAS
artigo de Maria Tavares
Este artigo tem como base a dissertação de mestrado em Arquitectura da Habitação Federação de Caixas de Previdência – Habitações Económicas, Um percurso na História da Arquitectura da Habitação em Portugal defendida na Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa em 2003.
fig. 1
Bairro do Ramalde, Porto I Plano Geral (proposto); de Fernando Távora [Fernando Távora, Lisboa: Editorial Blau, 1993]
RESUMO
O artigo aborda a arquitectura da habitação promovida pela Federação de Caixas de Previdência - Habitações Económicas (HE), contextualizada política e culturalmente, considerando-se essencialmente dois momentos de intervenção: as Casas de Renda Económica (CRE) e as Casas Construídas Através de Empréstimo (CCAE). Pretende-se identificar a forma como este organismo, inserido num percurso crítico da arquitectura em Portugal, ajudou a sedimentar essa mesma arquitectura, através de um grupo de incentivadores motivados para as várias disciplinas que envolvem as questões do habitar.
INTRODUÇÃO / CONTEXTUALIZAÇÃO
As experiências desenvolvidas no âmbito da habitação social e da produção da arquitectura moderna em Portugal, não podem deixar de referenciar o trabalho desenvolvido pelas HE entre os anos 40 e 70. Por mais de 20 anos, as HE serão a maior promotora de habitação não lucrativa, em que todo o trabalho e respectiva metodologia projectual, contribuem por um lado para a resolução da necessidade de habitação em Portugal e, por outro, para a investigação a nível da projecção social, abordando uma nova forma de encarar a habitação.
Retrocedendo cerca de uma década, contextualizando a fundação das HE, está-se em presença de uma nova constituição política que marca o início do Estado Novo. Uma série de consequências assinalam de forma determinante a história e política da habitação em Portugal, conduzindo mais tarde à compreensão das acções adoptadas pelas HE nos que diz respeito aos seus programas de CRE.
No pós-guerra, as questões decorrentes da falta de habitação assumem novas proporções, consequência da capacidade de atracção que os grandes centros urbanos e industriais exercem sobre as populações. Face à dimensão do problema, o regime de O. Salazar aposta agora no bloco de habitação colectiva, que por razões de ordem económica, dá uma resposta efectiva às questões sociais (ao contrário dos programas implementados na 1ª fase do Estado Novo, com a dominante ideologia da casa unifamiliar, a casa de família, formalizada nos numerosos bairros de Casas Económicas).
Rodeada de acontecimentos políticos significativos decorrentes da 2ª guerra, a fundação das HE coincide também com o 1º Congresso Nacional de Arquitectura. Promovido pelo então Sindicato Nacional dos Arquitectos em Maio e Junho de 1948 e, com iniciativa por parte do Governo no quadro da exposição “Quinze Anos de Obras Públicas”, o Congresso apresenta na nossa cultura arquitectónica uma importância incontornável, sendo tema de eleição, a habitação enquanto problema à escala nacional.
Toda uma geração de arquitectos, reivindica os princípios do Movimento Moderno e da Carta de Atenas, como condição necessária para a solução das carências habitacionais.
A habitação unifamiliar deixa de fazer sentido como resposta, recuperando a habitação colectiva uma nova dignidade.
Neste contexto, assiste-se à formação de dois movimentos associativos, o ICAT (Iniciativas Culturais Arte e Técnica) em Lisboa e o ODAM (Organização dos Arquitectos Modernos) no Porto, cujas organizações e espaços de debate de valores inerentes à arquitectura, contribuem para a formação desta nova mentalidade.
As respostas apresentadas por estes arquitectos, seguem por um lado, uma visão internacionalista assente nos princípios da Carta de Atenas e, por outro, uma preocupação de ordem cultural, procurando o estabelecimento de pontes com a “casa popular” e uma arquitectura mais vernácula, distanciando-se dos propósitos do discurso oficial.
Estas preocupações conduzem à realização do “Inquérito à Arquitectura Regional Portuguesa” definido em 1949 pelo Sindicato, sob a égide de Keil do Amaral. Acaba por se realizar entre 56 e 61 com o patrocínio do Governo. Participam cerca de duas centenas de arquitectos e consiste numa ampla pesquisa e recolha de exemplos de construções vernaculares em todo o país. O resultado contribui para reinterpretar os conceitos modernos.
Local de ensaio para novas formas de habitar, as HE conseguem adquirir o empenho destes profissionais, através do estudo de inovadoras tipologias funcionais, tomando consciência do contexto social e cultural dos projectos.
É neste quadro de luta pela afirmação de uma arquitectura moderna, que são realizados os agrupamentos de CRE, por esta geração que desenvolve uma arquitectura mais actual.
A produção da arquitectura da habitação moderna em Portugal, entre os anos 40 e 60, coincide assim com o momento de criação e sedimentação das HE, para o que este organismo é essencial.
OS PROGRAMAS HABITACIONAIS / METODOLOGIA DE ACÇÃO E ESPÍRITO DE ATELIER
O trabalho realizado pelas HE nos seus 25 anos de existência, sofre uma evolução significativa tanto no que respeita aos programas habitacionais implementados, como no acumular de experiências por parte daqueles que fazem com que este projecto se torne possível.
O contexto em que assentam as bases de intervenção das HE, está directamente relacionado com dois momentos distintos:
1. Casas de Renda Económica (CRE)
O programa das CRE formaliza-se através da Lei 2007 de 7 de Maio de 1945, e não é mais do que uma resposta pragmática por parte do Estado à grave crise habitacional que se faz sentir com o pós-guerra.
Na prática e numa primeira fase, os agrupamentos de CRE são realizados através de encomendas directas a arquitectos que exercem profissão liberal, visto as HE não terem capacidade para as realizar.
Nuno Teotónio Pereira, figura de destaque deste organismo, foi o primeiro arquitecto a fazer parte dos quadros, orientando o que seria a partir dos anos 50, o principal promotor público de habitação social.
Como figura fundamental pelo empenho que demonstra, Nuno Teotónio Pereira entra ainda como estudante para trabalhar directamente no Bairro de Alvalade como assessor de Miguel Jacobetty, fazendo assistência às obras que então se iniciam.
Segundo o próprio, o Bairro de Alvalade é a “rampa de lançamento” das HE, com a construção inicial de 2 das 8 células constituintes do plano de Faria da Costa. É a primeira realização feita com capitais da previdência na habitação.
fig. 2
fig. 3
(figg. 2 e 3) Construção de Casas de Renda Económica do Bairro de Alvalade
[Arquivo Fotográfico da CML]
Mais tarde, em 1959 é criado o GTH – Gabinete Técnico de Habitação, com o objectivo de promover operações de grande dimensão. Surgem os planos dos Olivais (Norte e Sul), retomando de algum modo as experiências de Alvalade, através da integração de diferentes modalidades de habitação social, em que mais uma vez um grande volume de construção de CRE é assegurado pelas HE.
fig. 4: Casas de Renda Económica da FCP-HE nos Olivais-Norte I plano do GTH, construídas e em construção até Agosto de 1966 [Casas de Renda Económica – Casas Construídas Através de Empréstimo, s.l.: HE-FCP, 1966]
fig. 5: CRE I Olivais-Norte, Nuno Teotónio Pereira e Pinto de Freitas [Boletim do GTH da CML, vol. 3, n.º 20, 1º semestre de 1971]
fig. 6: Casas de Renda Económica da FCP-HE nos Olivais-Sul I plano do GTH construídas e em construção até Agosto de 1966 [Casas de Renda Económica – Casas Construídas Através de Empréstimo, s.l.: HE-FCP, 1966]
fig. 7: CRE I Olivais-Sul; Vasco Croft I Justino Morais I Joaquim Cadima [Fotografia original]
Destaca-se também nesta primeira fase das HE, entre outros, o Bairro do Ramalde no Porto, projectado por Fernando Távora, em que são evidentes os conceitos e princípios da Carta de Atenas, através da rígida implantação dos vários edifícios e sua volumetria, concretizando uma proposta inovadora do ponto de vista da concepção urbanística.
(fig. 9)
(figg. 8 e 9) CRE no bairro do Ramalde, Porto I Plano Geral (construído)
Fernando Távora [Fotografia original]. [FERNANDEZ, Sérgio, Percurso, Arquitectura Portuguesa, Lisboa: Livros Cotovia, 1993]
Em agrupamentos de menor escala, no Bairro de Barcelos de Nuno Teotónio Pereira com Nuno Portas, é clara a aproximação a uma escala que se relaciona com a arquitectura popular. Inserido em contexto rural, o bairro vive da relação interior/exterior da habitação, assentando a sua estrutura essencialmente em fundamentos sociais.
(figg. 8 e 9) CRE no bairro do Ramalde, Porto I Plano Geral (construído)
Fernando Távora [Fotografia original]. [FERNANDEZ, Sérgio, Percurso, Arquitectura Portuguesa, Lisboa: Livros Cotovia, 1993]
Em agrupamentos de menor escala, no Bairro de Barcelos de Nuno Teotónio Pereira com Nuno Portas, é clara a aproximação a uma escala que se relaciona com a arquitectura popular. Inserido em contexto rural, o bairro vive da relação interior/exterior da habitação, assentando a sua estrutura essencialmente em fundamentos sociais.
(fig. 11)
(figg. 10 e 11) CRE em Barcelos I Planta dos fogos Tipo 2, de Nuno Teotónio Pereira I Nuno Portas [Arquivo Nuno Teotónio Pereira]
[Fotografia original]
Em Vila do Conde, também de Nuno Teotónio Pereira com Nuno Portas, consideram-se os mesmos princípios projectuais.
(figg. 10 e 11) CRE em Barcelos I Planta dos fogos Tipo 2, de Nuno Teotónio Pereira I Nuno Portas [Arquivo Nuno Teotónio Pereira]
[Fotografia original]
Em Vila do Conde, também de Nuno Teotónio Pereira com Nuno Portas, consideram-se os mesmos princípios projectuais.
(fig. 13)
(fig. 12 e 13) CRE em Vila do Conde I Planta das bandas com tipologias T2 Planta dos blocos com tipologias T3, de Nuno Teotónio Pereira I Nuno Portas
[Arquivo Nuno Teotónio Pereira]
A construção de CRE, afirma-se assim como uma actividade em expansão e, como a modalidade de habitação social mais importante em termos de promoção de habitação.
Geralmente encomendados por Nuno Teotónio Pereira, que também prepara concursos, dá pareceres e lança adjudicações, estes conjuntos de dimensões variáveis, inserem-se numa linha de resposta ao problema social da habitação.
As HE asseguram sempre a respectiva coordenação e execução em obra.
Desenvolve-se a experimentação tipológica, criando-se equipes de trabalho qualificadas para a execução dos conjuntos.
São vários os arquitectos responsáveis pelos projectos. Nomes como Nuno Teotónio Pereira, Nuno Portas, Bartolomeu Costa Cabral, Vasco Croft de Moura, Fernando Távora, João Adersen, Filipe Figueiredo, entre outros, participam activamente nesta fase. Sendo-lhes dada grande autonomia projectual, permite-se a criação de propostas com várias escalas de linguagem, colaborando assim para o enriquecimento da nossa arquitectura.
(fig. 12 e 13) CRE em Vila do Conde I Planta das bandas com tipologias T2 Planta dos blocos com tipologias T3, de Nuno Teotónio Pereira I Nuno Portas
[Arquivo Nuno Teotónio Pereira]
A construção de CRE, afirma-se assim como uma actividade em expansão e, como a modalidade de habitação social mais importante em termos de promoção de habitação.
Geralmente encomendados por Nuno Teotónio Pereira, que também prepara concursos, dá pareceres e lança adjudicações, estes conjuntos de dimensões variáveis, inserem-se numa linha de resposta ao problema social da habitação.
As HE asseguram sempre a respectiva coordenação e execução em obra.
Desenvolve-se a experimentação tipológica, criando-se equipes de trabalho qualificadas para a execução dos conjuntos.
São vários os arquitectos responsáveis pelos projectos. Nomes como Nuno Teotónio Pereira, Nuno Portas, Bartolomeu Costa Cabral, Vasco Croft de Moura, Fernando Távora, João Adersen, Filipe Figueiredo, entre outros, participam activamente nesta fase. Sendo-lhes dada grande autonomia projectual, permite-se a criação de propostas com várias escalas de linguagem, colaborando assim para o enriquecimento da nossa arquitectura.
fig. 15: CRE I Peniche, Victor Figueiredo [Fotografia original]
Dos grandes agrupamentos aos conjuntos rurais, o percurso é enriquecido por experiências pioneiras sobre a forma de pensar, desde o fogo como célula familiar, ao grande agrupamento ou conjunto habitacional, considerando-se todas as escalas de vivências.
Passados 3 anos da sua fundação, as HE sofrem uma alteração significativa, alargando-se o seu corpo técnico. Nuno Teotónio Pereira sugere o nome do então jovem João Braula Reis, para ficar à frente do Gabinete de Arquitectura. Aceite o desafio, Braula Reis avança com o projecto, escolhendo colaboradores jovens (no núcleo inicial, Bartolomeu Costa Cabral e Vasco Croft de Moura) e criando equipes de trabalho capazes de intervir, mantendo sempre um espirito de atelier, escola de discussão e, conservando liberdade de acção e de concepção.
Como metodologia de trabalho, aposta por um lado, em individualizar cada caso através de um projecto dirigido e contextualizado, dizendo não aos projecto-tipo e por outro, estudar com exactidão todos os aspectos referentes à construção económica da habitação, através do estudo dos seus componentes.
Surgem os projectos experimentais, projectos simples mas individualizados, apostando nas vivências do espaço por parte dos utilizadores.
Com a acumulação e sistematização de experiências neste campo da habitação social, cabe às HE – mais especificamente a Nuno Teotónio Pereira e João Braula Reis – a realização do Plano Intercalar de Fomento para 1965/67, sendo 1ª vez contemplado no planeamento nacional, um capítulo destinado à habitação e ao urbanismo.
2. Casas Construídas Através de Empréstimo (CCAE)
Num segundo momento, com o acumular dos capitais da previdência, torna-se possível a concessão de empréstimos para a Construção, Aquisição ou Beneficiação de casa própria, cuja característica essencial reside no apoio a particulares que sejam beneficiários da previdência e que respondam a um certo numero de requisitos que a lei estipula.
Surgem assim com a Lei 2092 em 1958, as CCAE. A lei aplica-se também à concessão de empréstimos dentro dos mesmos pressupostos, a empresas e casas do povo que possuam terrenos viáveis para a construção de bairros.
Nesta segunda fase, as HE assumem um grande dinamismo. Partindo de uma grande mais valia técnica, expandem equipe e criam uma intervenção adequada com o desenvolvimento dos já mencionados projectos experimentais.
Ampliam-se significativamente os instrumentos de intervenção e monta-se uma estrutura de apoio à construção pelo próprio, elaborando projectos e fiscalizando obras.
Estamos assim em presença de mais um momento significativo na história das HE. com um núcleo de arquitectura já formado e coordenado por João Braula Reis. Ao fornecerem projectos aos beneficiários, controlam a sua qualidade estética e construtiva, assim como o custo dos seus investimentos.
Surge a necessidade de criar uma rede de arquitectos regionais, exercendo a sua acção nas diferentes regiões do Norte ao Sul do país, criando-se equipes de projecto e desenvolvendo-se investigações sobre necessidade, contextos e vivências.
Nomes como Bartolomeu Costa Cabral, Vasco Croft de Moura, Justino Morais, Alcino Soutinho, Victor Figueiredo, Manuel Bagulho, Octávio Filgueiras, são arquitectos regionais das HE.
Ao abrigo desta lei e com base em toda a experiência seguida pelas HE, é possível descentralizar os projectos por pequenos gabinetes em todas as regiões do país, revestindo-se de características pioneiras, segundo Nuno Teotónio Pereira.
Os projectos mais representativos desta fase, são exactamente os que se realizam para as empresas contribuintes e casas do povo, por serem projectos de conjuntos e por isso mais complexos em termos de planeamento.
Geralmente com uma escala adaptada ao sítio e buscando imagens na arquitectura popular, aproximam-se o mais possível de valores humanos, explorando organicamente o espaço a partir do interior.
Dos grandes agrupamentos aos conjuntos rurais, o percurso é enriquecido por experiências pioneiras sobre a forma de pensar, desde o fogo como célula familiar, ao grande agrupamento ou conjunto habitacional, considerando-se todas as escalas de vivências.
Passados 3 anos da sua fundação, as HE sofrem uma alteração significativa, alargando-se o seu corpo técnico. Nuno Teotónio Pereira sugere o nome do então jovem João Braula Reis, para ficar à frente do Gabinete de Arquitectura. Aceite o desafio, Braula Reis avança com o projecto, escolhendo colaboradores jovens (no núcleo inicial, Bartolomeu Costa Cabral e Vasco Croft de Moura) e criando equipes de trabalho capazes de intervir, mantendo sempre um espirito de atelier, escola de discussão e, conservando liberdade de acção e de concepção.
Como metodologia de trabalho, aposta por um lado, em individualizar cada caso através de um projecto dirigido e contextualizado, dizendo não aos projecto-tipo e por outro, estudar com exactidão todos os aspectos referentes à construção económica da habitação, através do estudo dos seus componentes.
Surgem os projectos experimentais, projectos simples mas individualizados, apostando nas vivências do espaço por parte dos utilizadores.
Com a acumulação e sistematização de experiências neste campo da habitação social, cabe às HE – mais especificamente a Nuno Teotónio Pereira e João Braula Reis – a realização do Plano Intercalar de Fomento para 1965/67, sendo 1ª vez contemplado no planeamento nacional, um capítulo destinado à habitação e ao urbanismo.
2. Casas Construídas Através de Empréstimo (CCAE)
Num segundo momento, com o acumular dos capitais da previdência, torna-se possível a concessão de empréstimos para a Construção, Aquisição ou Beneficiação de casa própria, cuja característica essencial reside no apoio a particulares que sejam beneficiários da previdência e que respondam a um certo numero de requisitos que a lei estipula.
Surgem assim com a Lei 2092 em 1958, as CCAE. A lei aplica-se também à concessão de empréstimos dentro dos mesmos pressupostos, a empresas e casas do povo que possuam terrenos viáveis para a construção de bairros.
Nesta segunda fase, as HE assumem um grande dinamismo. Partindo de uma grande mais valia técnica, expandem equipe e criam uma intervenção adequada com o desenvolvimento dos já mencionados projectos experimentais.
Ampliam-se significativamente os instrumentos de intervenção e monta-se uma estrutura de apoio à construção pelo próprio, elaborando projectos e fiscalizando obras.
Estamos assim em presença de mais um momento significativo na história das HE. com um núcleo de arquitectura já formado e coordenado por João Braula Reis. Ao fornecerem projectos aos beneficiários, controlam a sua qualidade estética e construtiva, assim como o custo dos seus investimentos.
Surge a necessidade de criar uma rede de arquitectos regionais, exercendo a sua acção nas diferentes regiões do Norte ao Sul do país, criando-se equipes de projecto e desenvolvendo-se investigações sobre necessidade, contextos e vivências.
Nomes como Bartolomeu Costa Cabral, Vasco Croft de Moura, Justino Morais, Alcino Soutinho, Victor Figueiredo, Manuel Bagulho, Octávio Filgueiras, são arquitectos regionais das HE.
Ao abrigo desta lei e com base em toda a experiência seguida pelas HE, é possível descentralizar os projectos por pequenos gabinetes em todas as regiões do país, revestindo-se de características pioneiras, segundo Nuno Teotónio Pereira.
Os projectos mais representativos desta fase, são exactamente os que se realizam para as empresas contribuintes e casas do povo, por serem projectos de conjuntos e por isso mais complexos em termos de planeamento.
Geralmente com uma escala adaptada ao sítio e buscando imagens na arquitectura popular, aproximam-se o mais possível de valores humanos, explorando organicamente o espaço a partir do interior.
(fig. 17)
(fig. 16 e 17) CCAE I Bairro da Companhia da Fiação, Torres Novas, de Victor Figueiredo [“Victor Figueiredo / Arquitecto”, Arquitectura, n.º 135, Lisboa: Outubro de 1979] [Fotografia original]
Destacam-se os bairros da Chamusca de Bartolomeu Costa Cabral e Vasco Croft e Benavente e Stº Estevão de Victor Figueiredo. De uma assinalável qualidade projectual em contexto rural, estes exemplos apresentam um completa adequação ao meio e rigor na utilização dos materiais e processos construtivos.
Verifica-se um diálogo entre as premissas modernas e uma aproximação às raízes, dando-se valor às questões do contexto, do sítio e dos materiais e técnicas tradicionais.
É um momento de reflexão, em que se procuram referências locais relacionadas com uma arquitectura mais vernácula.
(fig. 16 e 17) CCAE I Bairro da Companhia da Fiação, Torres Novas, de Victor Figueiredo [“Victor Figueiredo / Arquitecto”, Arquitectura, n.º 135, Lisboa: Outubro de 1979] [Fotografia original]
Destacam-se os bairros da Chamusca de Bartolomeu Costa Cabral e Vasco Croft e Benavente e Stº Estevão de Victor Figueiredo. De uma assinalável qualidade projectual em contexto rural, estes exemplos apresentam um completa adequação ao meio e rigor na utilização dos materiais e processos construtivos.
Verifica-se um diálogo entre as premissas modernas e uma aproximação às raízes, dando-se valor às questões do contexto, do sítio e dos materiais e técnicas tradicionais.
É um momento de reflexão, em que se procuram referências locais relacionadas com uma arquitectura mais vernácula.
(fig. 20)
(figg. 18, 19 e 20) CCAE, Planta de Localização I Bairro Económico na Chamusca de Bartolomeu Costa Cabral I Vasco Croft
[CROFT, Vasco, Arquitectura e Humanismo, O papel do arquitecto, hoje, em Portugal, Lisboa: Terramar, 2001]
[Fotografias originais]
As experiências do domínio da habitação social desenvolvidas em realidades exteriores aos grandes centros, tendem a aproximar-se da arquitectura rural. Neste contexto, a arquitectura italiana do pós-guerra, influencia de modo determinante a procura de modelos para a habitação social. (Mais uma vez, Nuno Teotónio Pereira, desenvolve desde cedo, um importante papel na divulgação da arquitectura moderna, estabelecendo importantes contactos com outras realidades fora do país. Desde delegado de Portugal durante vários anos no Comité do Habitat do UIA, às reconstruções do pós-guerra efectuadas pela INA-CASA em Itália).
(figg. 18, 19 e 20) CCAE, Planta de Localização I Bairro Económico na Chamusca de Bartolomeu Costa Cabral I Vasco Croft
[CROFT, Vasco, Arquitectura e Humanismo, O papel do arquitecto, hoje, em Portugal, Lisboa: Terramar, 2001]
[Fotografias originais]
As experiências do domínio da habitação social desenvolvidas em realidades exteriores aos grandes centros, tendem a aproximar-se da arquitectura rural. Neste contexto, a arquitectura italiana do pós-guerra, influencia de modo determinante a procura de modelos para a habitação social. (Mais uma vez, Nuno Teotónio Pereira, desenvolve desde cedo, um importante papel na divulgação da arquitectura moderna, estabelecendo importantes contactos com outras realidades fora do país. Desde delegado de Portugal durante vários anos no Comité do Habitat do UIA, às reconstruções do pós-guerra efectuadas pela INA-CASA em Itália).
(fig. 22)
(fig. 21 e 22) CCAE, Planta de Localização I Bairro Económico em Stº Estêvão, de Victor Figueiredo [“Victor Figueiredo / Arquitecto”, Arquitectura, n.º 135, Lisboa: Outubro de 1979] [Fotografia original]
Importa destacar ainda neste período, um exaustivo trabalho de investigação sobre os diferentes tipos de edificação e de habitação desenvolvidos a partir de estudos sobre várias formas de vida e respectiva recolha de dados, aproveitando-se também, da experiência realizada aquando do Inquérito à Arquitectura popular e defendendo principalmente uma linguagem de continuidade com o meio.
Torna-se positiva a relação estabelecida entre a produção das HE e os resultados do Inquérito, repondo de algum modo, a questão da tradição, reactualizando os materiais e formas de construir, apelando a formas simples e a projectos muito realistas.
REFLEXÃO
As experiências realizadas pelas HE, são projectadas por um grupo de arquitectos pertencentes a uma 2ª geração do Movimento Moderno, ou geração do pós-guerra, que aparecem com uma consciência de grupo, socialmente comprometidos e culturalmente conscientes que é necessário rever posturas face à metodologia projectual.
Fazendo parte de um período muito rico na produção arquitectónica portuguesa, verifica-se que as HE ajudam na implementação de uma nova arquitectura, através das oportunidades que dão aos arquitectos de realizarem propostas no âmbito da habitação económica, já que dispõem dos meios e propósitos para tal.
Relativamente aos aspectos qualitativos das propostas, estas inserem-se no movimento da arquitectura dos anos 50, adoptando-se os princípios do Movimento Moderno, com respostas funcionalistas a novos programas, integrando o valor de uma função social.
Um momento importante de encontro e reflexão, é o “Colóquio sobre o Habitat” realizado em Lisboa em 1960, por iniciativa do então Sindicato Nacional dos Arquitectos, em participa o sociólogo francês Chombart de Lawe. Aponta-se para a responsabilidade dos arquitectos sobre o bem estar das populações e apresentam-se os resultados das intervenções realizadas pelas HE com todas as suas experimentações tipológicas, as diferentes organizações espaciais e o contacto directo com as diferentes situações rurais.
Por forma a garantir-se a manutenção de uma paisagem urbana ou rural humanizada, as HE apostam para cada caso em particular, numa relação entre a construção e o seu ambiente construído ou natural. São sempre recusados os projectos de construção aplicáveis aos conjuntos habitacionais a partir dos projecto-tipo.
Reunindo todas as condições para fomentar a habitação, as HE sabem organizar as fontes de uma forma original e pioneira em Portugal no âmbito da habitação social, criando equipes de trabalho pluridisciplinares, uma actualização profissional, empreendendo pesquisas tipológicas e construtivas e ainda importantes relacionamentos internacionais.
Deste modo, é possível contribuir para o fomento da habitação social ao mesmo tempo que , para a revelação de uma classe profissional.
Referências das figuras:
(fig. 21 e 22) CCAE, Planta de Localização I Bairro Económico em Stº Estêvão, de Victor Figueiredo [“Victor Figueiredo / Arquitecto”, Arquitectura, n.º 135, Lisboa: Outubro de 1979] [Fotografia original]
Importa destacar ainda neste período, um exaustivo trabalho de investigação sobre os diferentes tipos de edificação e de habitação desenvolvidos a partir de estudos sobre várias formas de vida e respectiva recolha de dados, aproveitando-se também, da experiência realizada aquando do Inquérito à Arquitectura popular e defendendo principalmente uma linguagem de continuidade com o meio.
Torna-se positiva a relação estabelecida entre a produção das HE e os resultados do Inquérito, repondo de algum modo, a questão da tradição, reactualizando os materiais e formas de construir, apelando a formas simples e a projectos muito realistas.
REFLEXÃO
As experiências realizadas pelas HE, são projectadas por um grupo de arquitectos pertencentes a uma 2ª geração do Movimento Moderno, ou geração do pós-guerra, que aparecem com uma consciência de grupo, socialmente comprometidos e culturalmente conscientes que é necessário rever posturas face à metodologia projectual.
Fazendo parte de um período muito rico na produção arquitectónica portuguesa, verifica-se que as HE ajudam na implementação de uma nova arquitectura, através das oportunidades que dão aos arquitectos de realizarem propostas no âmbito da habitação económica, já que dispõem dos meios e propósitos para tal.
Relativamente aos aspectos qualitativos das propostas, estas inserem-se no movimento da arquitectura dos anos 50, adoptando-se os princípios do Movimento Moderno, com respostas funcionalistas a novos programas, integrando o valor de uma função social.
Um momento importante de encontro e reflexão, é o “Colóquio sobre o Habitat” realizado em Lisboa em 1960, por iniciativa do então Sindicato Nacional dos Arquitectos, em participa o sociólogo francês Chombart de Lawe. Aponta-se para a responsabilidade dos arquitectos sobre o bem estar das populações e apresentam-se os resultados das intervenções realizadas pelas HE com todas as suas experimentações tipológicas, as diferentes organizações espaciais e o contacto directo com as diferentes situações rurais.
Por forma a garantir-se a manutenção de uma paisagem urbana ou rural humanizada, as HE apostam para cada caso em particular, numa relação entre a construção e o seu ambiente construído ou natural. São sempre recusados os projectos de construção aplicáveis aos conjuntos habitacionais a partir dos projecto-tipo.
Reunindo todas as condições para fomentar a habitação, as HE sabem organizar as fontes de uma forma original e pioneira em Portugal no âmbito da habitação social, criando equipes de trabalho pluridisciplinares, uma actualização profissional, empreendendo pesquisas tipológicas e construtivas e ainda importantes relacionamentos internacionais.
Deste modo, é possível contribuir para o fomento da habitação social ao mesmo tempo que , para a revelação de uma classe profissional.
Referências das figuras:
fig. 1: Bairro do Ramalde, Porto, Plano Geral (proposto), Fernando Távora, Lisboa: Editorial Blau, 1993.
fig. 2 e fig. 3: Construção de Casas de Renda Económica do Bairro de Alvalade, Arquivo Fotográfico da CML.
fig. 4: Casas de Renda Económica da FCP-HE nos Olivais-Norte, plano do GTH,
construídas e em construção até Agosto de 1966; Casas de Renda Económica – Casas Construídas Através de Empréstimo, s.l.: HE-FCP, 1966.
fig. 5: CRE, Olivais-Norte, Nuno Teotónio Pereira, Boletim do GTH da CML, vol. 3, n.º 20, 1º semestre de 1971.
fig. 6: Casas de Renda Económica da FCP-HE nos Olivais-Sul, plano do GTH
construídas e em construção até Agosto de 1966; Casas de Renda Económica – Casas Construídas Através de Empréstimo, s.l.: HE-FCP, 1966.
fig. 7: CRE, Olivais-Sul, Vasco Croft, Justino Morais, Joaquim Cadima, Fotografia original.
fig. 8: CRE no bairro do Ramalde, Porto I Plano Geral (construído), Fernando Távora; FERNANDEZ, Sérgio, Percurso, Arquitectura Portuguesa, Lisboa: Livros Cotovia, 1993.
fig. 9: CRE no bairro do Ramalde, Porto, Fernando Távora, Fotografia original.
fig. 10: CRE em Barcelos, Planta dos fogos Tipo 2, Nuno Teotónio Pereira, Nuno Portas; Arquivo Nuno Teotónio Pereira.
fig. 10: CRE em Barcelos, Nuno Teotónio Pereira, Nuno Portas; Fotografia original.
fig. 12: CRE em Vila do Conde, Planta das bandas com tipologias T2, Nuno Teotónio Pereira, Nuno Portas; Arquivo Nuno Teotónio Pereira.
fig. 13: CRE em Vila do Conde, Planta das bandas com tipologias T3, Nuno Teotónio Pereira, Nuno Portas; Arquivo Nuno Teotónio Pereira.
fig. 14: CRE, Parede, Ruy Athouguia, Fotografia original.
fig. 15: CRE, Peniche, Victor Figueiredo, Fotografia original.
fig. 16: CCAE, Bairro da Companhia da Fiação, Torres Novas, Victor Figueiredo; “Victor Figueiredo / Arquitecto”, Arquitectura, n.º 135, Lisboa: Outubro de 1979.
fig. 17: CCAE, Bairro da Companhia da Fiação, Torres Novas, Victor Figueiredo, Fotografia original.
fig. 18: CCAE, Planta de Localização, Bairro Económico na Chamusca, Bartolomeu Costa Cabral, Vasco Croft; CROFT, Vasco, Arquitectura e Humanismo, O papel do arquitecto, hoje, em Portugal, Lisboa: Terramar, 2001.
fig. 19 e fig. 20: CCAE, Planta de Localização, Bairro Económico na Chamusca, Bartolomeu Costa Cabral, Vasco Croft, Fotografias originais.
fig. 21: CCAE, Planta de Localização, Bairro Económico em Stº Estevão, Victor Figueiredo; “Victor Figueiredo / Arquitecto”, Arquitectura, n.º 135, Lisboa: Outubro de 1979.
fig. 22: CCAE, Bairro Económico em Stº Estevão, Victor Figueiredo, Fotografia original.
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