Infohabitar, Ano XV, n.º 703
Notas prévias editoriais importantes:
(i) Com a presente edição inicia-se uma temática editorial nova/renovada, que é especificamente dirigida para a reflexão sobre novas formas de habitar, com destaque para soluções habitacionais e urbanas intergeracionais e participadas.
(ii) Alguns problemas críticos de visualização das imagens de muitos dos artigos da Infohabitar (mais antigos/primeiros anos editoriais), que nos são alheios, têm vindo a ser, sistematicamente, resolvidos.
Adequação, diversidade e inovação
nas soluções de habitar; da casa à cidade – Infohabitar 703
por António Baptista Coelho (texto e imagens)
“A esta cidade sempre chegarás.”
Em “A cidade”, de
Konstandinos Kavafis
Há
que considerar que os estudos sobre áreas e outros aspectos mais objectivos
estão hoje estabilizados, enquanto o caminho da resolução de grandes problemas
que se mantêm, por exemplo os da habitação para minorias e do contínuo abandono
do uso do espaço público, tem de passar também por outros objectivos
qualitativos menos mensuráveis, mas igualmente vitais.
“Há certas qualidades que podem ser consideradas
essenciais em todos os géneros de casas: sossego, encantamento, simplicidade,
largueza de vistas, vivacidade e sobriedade, sentido de protecção e abrigo,
expressiva economia na manutenção, harmonia com a envolvente natural e a
vizinhança, ausência de lugares escuros e ao abandono, conforto e uniformidade
de temperatura, e a possibilidade de cada casa poder ser o adequado quadro doméstico
dos seus habitantes. Ricos e pobres, uns e outros, apreciarão estas qualidades” (Voysey C. F.
A “The English Home” 1911).
Fig. 01: no conjunto do Telheiro, uma promoção
de Habitação a Custos Controlados da C.M. de Matosinhos, um projecto coordenado
pelo Arq. Manuel Correia Fernandes (2002), desenvolveu-se uma tipologia
unifamiliar em bandas contínuas, com pátios/quintais privados posteriores, uma
tipologia que associa muito do carácter do unifamiliar a uma fortíssima
presença urbana unitária e regeneradora.
ENQUADRAMENTO SOBRE O HABITAR
Este
texto sobre o potencial de inovação e de adequação no habitar foi iniciado no
já longínquo mês de Março de 1999, a propósito de um debate/seminário de
reflexão já então realizado no âmbito do movimento cooperativo e designadamente
pela Nova Habitação Cooperativa (NHC).
O
referido texto foi então e em parte “recuperado”, passados cerca de oito anos;
fizeram-se alguns comentários e algumas reflexões, juntaram-se muitos outros
aspectos, mas a matéria antes desenvolvida mantém toda a actualidade.
Um
tal potencial de inovação e adequação habitacional deve privilegiar:
·
casas e edifícios adaptáveis a famílias muito diversas e a indivíduos com
múltiplos gostos próprios;
· e
vizinhanças residenciais exteriores que estimulem os valores do convívio, hoje
tão esquecidos, aliando-os, designadamente, a objectivos de recreio e desporto.
Nada
disto é impossível ou caro, é sim exigente em termos de projecto – incluindo-se
o respectivo enquadramento e diálogo técnico por parte do respectivo promotor.
Fig. 02: no conjunto de Habitação a Custo
Controlado da Gala, promovido por uma empresa com o apoio da C. M da Figueira
da Foz com projecto coordenado pelos Arquitectos Duarte Nuno Simões, Nuno
Simões e Joana Barbosa (2005), concretizou-se uma tipologia
multifamiliar com acessos directos ao exterior (directamente ao espaço exterior
ajardinado ou indirectamente através de galeria/varanda), cuja caracterização
tem muito a ver com a imagem e a funcionalidade de uma agregação de
unifamiliares.
ADEQUAÇÃO, DIVERSIDADE E INOVAÇÃO NO MEIO URBANO
Continua
a notar-se nos espaços públicos uma crítica dificuldade ao nível da sua
essencial qualificação, desde o projecto urbano e paisagístico a uma adequada
execução e equipamento, visando a sua durabilidade e o estímulo a uma ampla
diversidade de actividades exteriores.
O que
importa salientar é que, hoje em dia, não há um conhecimento verdadeiramente
adequado e muito menos sedimentado sobre como fazer, por exemplo, uma praceta
ou rua residencial, verdadeiramente amigável e apropriável. Os conhecimentos
estão, a este nível, mais dirigidos, designadamente, para os aspectos
funcionais do tráfego de veículos; e estamos agora a ultrapassar esta estrita e
fictícia funcionalidade numa perspectiva de simples defesa da segurança
pedonal, falta-nos todo um caminho de humanização de conteúdos funcionais e de imagens;
e é neste caminho que se encontrarão muitas das virtualidades em termos de
novas ou renovadas soluções tipológicas.
Em
todas estas matérias é fundamental tornar o exterior residencial útil, portanto
equipado, apelativo, portanto adequadamente projectado e executado e, também,
naturalmente convivial, porque afinal o convívio na vizinhança é motivo e
consequência de muitas actividades exteriores, desde o recreio infantil, ao
desporto e ao simples, mas fundamental, lazer.
Um
último aspecto, a este nível, refere-se à exigência de uma perfeita e contínua
manutenção do espaço público, condição extremamente favorecida pelas referidas
condições de uso intenso e de sentido efectivo de vizinhança.
Solidificando
tais conclusões esquemáticas há que considerar que, muitas vezes, os terrenos
disponíveis já têm pseudo-projectos definidos e que, frequentemente, os sítios
possíveis não são os melhores (ex. vizinhanças complexas, terrenos pouco
regulares). No entanto, em muitos casos o refazer qualificado de um projecto,
quando tal é possível e quando essa revisão abrange o espaço público de
vizinhança, é uma medida essencial para a qualidade final.
Há
aqui, portanto, uma nova chamada de atenção para a necessidade de se poder
intervir à escala urbana da vizinhança, não apenas através de edifícios, mais
ou menos isolados, mas também através de um afirmado espaço público de lazer,
recreio e convívio que tem de ligar os edifícios; múltiplos exemplos de
excelente qualidade residencial cooperativa devem-se a esta aliança entre um
excelente projecto e uma excelente vizinhança de proximidade.
E há
aspectos muito interessantes de conjugação entre exigências económicas de
rentabilização de estaleiro e obra (com grupos entre 100 e 150 fogos) e de
números preferenciais de vizinhos considerando-se o estímulo natural do
convívio, com grupos preferenciais entre cerca de 60 a 120 fogos, servidos por
agradáveis e úteis espaços públicos residenciais numa aposta na pequena
dimensão, o conhecido “small is
beautiful”; faz-se notar que cerca de 60 fogos é um número
que proporciona boas condições para a criação de pequenos “grupos de recreio”
infantil com idades idênticas.
O “small
is beautiful” liga-se
obrigatoriamente a uma cuidadosa pormenorização das vizinhanças de proximidade
(espaços comuns e espaços públicos), porque os espaços exteriores de vizinhança
são espaços muito próximos do nosso olhar directo e do olhar a partir das
habitações e estamos a abordar escalas comuns e públicas com exigências
fortíssimas, entre as quais se destaca o privilegiar da global funcionalidade e
da convivialidade natural, a introdução do “verde urbano” e a clara definição
de zonas de influência/gestão.
Importa
privilegiar edifícios geradores de ruas equipadas enquanto no interior dos
quarteirões permitem humanizados espaços públicos de convívio e recreio, numa
eficaz aliança com os sempre estimulantes pátios privados (servindo os pisos
mais baixos, e não apenas o R/C), proporcionando ainda extensões térreas
privativas bem enquadradas (ex. para espaços conviviais dos condomínios como
salas de jogos), e proporcionando, ainda, eventualmente, o aproveitamento
inferior como garagem comum. Este tipo de espaços é também ideal para se
desenvolver um arranjo "natural" dos espaços exteriores: com menos
asfalto e zonas impermeáveis, com grande variedade de plantas povoando fachadas
varandas e terraços e criando um microclima muito favorável em zonas urbanas.
Deixa-se à reflexão o interesse de se privilegiarem, sempre que
possível, espaços exteriores de vizinhança ligados aos edifícios residenciais,
assim como a sua caracterização considerada mais desejável em termos de: acesso
público, medianamente condicionado ou totalmente condicionado; tipo de arranjo
global, que pode ser mais ajardinado ou menos ajardinado; tipo de conteúdos em
termos de actividades recreativas que podem ser mais dirigidas para crianças,
para jovens e adultos e para seniores e que podem ou não privilegiar elementos
de apoio a actividades desportivas; e tipos de conteúdos em termos de
equipamentos de vizinhança de apoio à vida urbana (nos seus ritmos diários e
ocasionais).
Fig. 03: no conjunto de habitação a Custos
Controlados do Monte Espinho, promovido pela C. M. de Matosinhos, com projecto
coordenado pela Arq.ª Paula Petiz (2005), criaram-se pequenos multifamiliares
com quatro fogos - uma tipologia intermediária - em que todos eles têm acesso
directo ao exterior, mas os fogos térreos possuem um pequeno quintal
ajardinável, sendo os fogos superiores em duplex; desta forma e para além da
adequação ao vários usos e desejos de habitar. cria-se uma imagem urbana
intensa e contínua não se abdicando da caracterização unifamiliar.
TIPOS DE EDIFÍCIOS E DE CONJUNTOS DE EDIFÍCIOS
Vamos
então a uma viagem muito rápida por um conjunto de aspectos de adequação que
podem ser proporcionados por diversos tipos de edifícios e de conjuntos de
edifícios, e para sermos claros vamos tratar, primeiro, de algumas escolhas de
ordem geral (por exemplo entre tipos distintos de habitação) e, depois, de
alguns aspectos de pormenor que, no entanto, podem fazer grande diferença no
resultado final.
Opções gerais
(atente-se
que muitas opções podem ser determinadas por razões de custos, por
regulamentação local ou por condições locais específicas)
1 - Unifamiliares isolados (moradia isolada):
em lote espaçoso; ou em lote funcional (lote constituído por um conjunto bem definido de diversas áreas funcionais).2 - Unifamiliar geminado
(consegue-se frequentemente a imagem de uma grande moradia): em lote espaçoso; ou em lote funcional.3 - Unifamiliares em bandas curtas
(consegue-se, por vezes, a imagem de grande moradia); com, ou sem, pátios frontais; e com, ou sem, quintais posteriores curtos ou alongados.4 - Unifamiliares em bandas longas;
com, ou sem, pátios frontais; e com, ou sem,
quintais posteriores curtos ou alongados.
5 - Unifamiliares em bandas longas e costas com costas;
com, ou sem, pátios frontais; e com, ou sem, quintais posteriores curtos ou pátios posteriores.6 - Tipologias de transição entre a moradia e o multifamiliar;
proporcionam, por exemplo, desde pequenas jardinetas representativas, a pátios murados e terraços de lazer nos pisos mais elevados. É uma tipologia extremamente versátil podendo variar entre as seguintes imagens-limite:
.
pequeníssimo “prédio” esquerdo/direito;
. grande
“moradia” que agrega diversas habitações cada uma com um acesso próprio e bem
identificado e cada uma com características espaciais e funcionais próprias.
As
tipologias residenciais de transição uni/multifamiliar (ex., bi, tri e
tetrafamiliares), quando bem projectadas:
(i)
podem aliar muitas das vantagens de apropriação e de relativa “independência”
dos unifamiliares;
(ii)
podem densificar estrategicamente o espaço urbano, animando-o localmente e
proporcionando intervenções economicamente equilibradas (desde que o projecto
seja especialmente bem desenvolvido);
(iii)
proporcionam uma enorme variedade de soluções, o que as torna muito adequadas
para as cada vez mais necessárias operções de preenchimento urbano – um aspecto
que, mais uma vez, põe em relevo o apuro de projecto que é aqui necessário;
(iv)
e podem aliar importantes potencialidades conviviais (no espaço público assim
recriado) e funcionais (disponibilizar necessidades locais em equipamento) à
manutenção do carácter unifamiliar.
Os
pequenos multifamiliares ainda proporcionam a sua associação em bandas urbanas
de modo a que um número significativo dos respectivo fogos possam ter quintais,
pátios e grandes terraços privativos.
7 - Multifamiliares com acesso por patim tipo esquerdo/direito sem elevador (até 3 pisos).
8 - Multifamiliares tipo esquerdo/direito com elevador.
10 - Multifamiliares com ou sem elevador (até 3 pisos) e com mais de dois fogos por nível;
acesso por patim amplo ou por galeria: interior curta ou longa; exterior curta ou longa.11 - Multifamiliares com elevador e com mais de dois fogos por nível;
acesso por patim amplo ou por galeria galeria: interior curta ou longa; exterior curta ou longa.12 - Multifamiliares caracterizados por soluções específicas de espaços comuns,
por exemplo, dos tipos: jardim envolvente; grande átrio interior ou pátio exterior; galeria larga como se fosse rua elevada; ...13 - Edifícios de habitação com um perfil específico e designadamente para séniores;
multifamiliar relativamente corrente, mas com habitações especialmente desenhadas para pessoas sós ou casais de “meia idade” com significativas exigências de áreas e equipamentos.14 - Edifício de habitação colectiva ou habitação/hotel
que disponibilize um determinado menu de serviços e que integre fogos tendencialmente pequenos.15 - Solução idêntica à anterior mas privilegiando, especificamente, fogos pequenos (ex., T0 e T1) para pessoas sós e casais,
destinados ou não a grupos etários específicos; sugere-se uma mistura etária mas estruturada por regras de conduta exigentes em termos de usos e ruídos.16 - Residência assistida em termos de cuidados sociais e/ou de saúde,
que poderá chegar a ter opções específicas de verdadeiro hospital de rectaguarda.17 - Multifamiliares caracterizados por soluções específicas de espaços privados exteriores,
por exemplo, dos tipos: grandes terraços; pequenos jardins elevados (“suspensos”).
18
- ... e, naturalmente, é bem possível alargar e aprofundar e diversificar ainda
mais esta listagem, embora pareça ser útil a proposta de quadros tipológicos
como este aqui proposto ...
Desde
já se refere que muito mais do que optar, caso a caso, por esta ou aquela
solução geral, importa produzir soluções “mistas” que sirvam bem seja a
diversidade da procura e as necessidades do mercado, seja as características e
as exigências e carências de cada local e tendo em conta os problemas
potenciais que se podem identificar em cada solução e em cada mistura de
soluções – e há já experimentações cooperativas nestas áreas que é possível ter
em conta.
Na
criação de soluções “mistas” será sempre mais crítica a associação de
residências assistidas com cuidados de saúde, seja pelos custos associados,
seja pela sensível relação que este tipo de assistência irá ter com os
restantes núcleos habitacionais não assisitidos e que estejam próximos. Nesta
perspectiva uma resposta poderá ser uma associação mais autonomizada e urbana
entre diversos edifícios com distintas valências.
Altura do edifício (alguns elementos de reflexão, numa aliança
entre uso e custo):
. 1
piso, custo elevado
. de
2 até 4 pisos o custo diminui, atingindo um mínimo absoluto para 4 pisos; as
crianças dos três primeiros pisos de edifícios altos são as que vão muito mais
frequentemente brincar à rua.
. de
4 para 5 pisos o custo cresce muito (instalação de elevador);
.
Acima de seis pisos as crianças são afectadas por perderem a percepção da
proximidade do solo; nestes casos a varanda é um elemento que ganha importância
como espaço de contacto com o exterior.
. de
5 até 8 pisos o custo diminui, novamente, atingindo um novo valor favorável
para 8 pisos.
. de
8 para 9 pisos o custo cresce muito (instalação de equipamentos específicos,
nomeadamente, para segurança contra risco de incêndio); é de notar que em
Portugal este patamar será porventura um pouco mais elevado, pensando-se na
altura máxima de 28.00m para uso de escadas de bombeiros - indicação
esta que carece de confirmação técnica;
. de
9 até 12 pisos o custo diminui ligeiramente, atingindo um novo valor
relativamente favorável para 12 pisos;
a
partir de 12 pisos o custo "dispara" rapidamente.
Opções de pormenor :
(algumas
notas muito informais)
Unifamiliares ou pequenos multifamiliares em conjugações densas e
orgânicas têm imagens
ricas, têm vantagens da agregação numa comunidade alargada e convivial e mantêm
todas as principais características do unifamiliar, designadamente no que se
refere ao acesso independente ao espaço público, à disponibilização de espaços
exteriores privativos e à eventual possibilidade de garagens de estacionamento
em boxes privativas – aspectos muito valorizados.
Em
qualquer opção é possível e desejável privilegiar a melhoria de todas as condições onde
seja possível actuar ao nível dos espaços comuns dos multifamiliares:
luz natural; ventilação; marcação e apropriação de zonas e paredes específicas;
criação de alguns pequenos recantos funcionais; ajardinamento. Sublinha-se que
todas estas condições são possíveis mesmo num edifício maximizado em termos de
economia.
As opções por tipos de acesso (escadas, galerias, elevadores) têm
muito a ver com a qualidade visual e de uso que pode caracterizar esses acessos (ex., há degraus de escada que são muito
confortáveis para subir, há galerias exteriores que são verdeiras varandas, há
elevadores e patins de elevadores muito atraentes).
Há
grande potencialidade – em termos de atractividade de vista exterior do
edifício e de usos proporcionados – na aplicação de diversificadas soluções de espaços
exteriores e semi-exteriores privativos ou comuns: varandas
fundas ou só de assomar, terraços murados ou abertos, pátios murados ou
abertos, jardinetas e pequenos jardins. E importa referir que muitas destas
soluções são aplicáveis em edifícios multifamiliares.
Bandas densas de pequenos edifícios criando ruas, pracetas e
quarteirões, fazem cidade animada, por um lado, enquanto
no interior dos quarteirões é possível criar todo um mundo residencial
intimista com carácter comum e/ou com carácter privado, em cada fogo.
Em
qualquer escolha tipológica é sempre possível uma opção “suplementar” e de
certa forma “paralela” por uma solução mais naturalizada, com mais verde urbano, ou
mais “mineral”.
Fig. 04: no exemplo que aqui se ilustra, um
pequeno conjunto/quarteirão habitacional em Malmö, desenvolvido no âmbito da
exposição habitacional e urbana Bo01, o quintal/jardim comum, na zona posterior
do edifício multifamiliar, serve também uma pequena banda de unifamiliares; e
há aqui todo um leque de possibilidades de associação seja entre tipologias bem
distintas, como é o caso, seja entre formas de habitar e apoios e complementos
habitacionais (ex., os mais diversos tipso de serviços comuns e de complmenetos
habitacionais, como por exempo quartos para uma utilização eventual). É no
entanto fundamental que a eventual oferta de serviços comuns diversificados não
corresponda a uma efectiva menorização dos espaços domésticos; e são possíveis
excelentes equilíbrios.
TIPOS DE ESPAÇOS E DE SERVIÇOS COMUNS HABITACIONAIS
Passamos,
agora, às soluções práticas de auto-organização de habitantes oferecendo todo
um conjunto de serviços e actividades que são difíceis, caras ou mesmo quase
impossíveis de proporcionar exclusivamente a cada fogo.
A dimensão, o carácter e o equipamento dos espaços comuns
variará consoante os objectivos de cada solução. Uma variação que, a título de exemplos relativamente extremo, poderá referir-se:
(i)
seja a uma sala ou conjunto de zonas de estar/convívio/jogos do condomínio, e
que poderá, eventualmente, até assumir um carácter de "casa comum"
multifuncional. (ex. sala de convívio equipada, por ex. com bar/TV
panorâmica/jogos de mesa/bilhar/ténis de mesa, recintos de desporto, jardim,
etc.), mas sempre numa total distinção relativamente ao espaço dos fogos, que
poderão ter uma distribuição e acesso “clássicos”.
(ii)
seja a uma solução do tipo átrio comum muito amplo para o qual abrem todos os
níveis dos respectivos fogos, criando-se um carácter de grande unidade; uma
solução que poderá ter virtualidades ao nível dos aspectos de conforto
ambiental.
Em termos de serviços comuns
poderão ser centralizados certos serviços de apoio prestados por pessoal próprio (exº recepção, segurança geral e controlo de acessos, manutenção corrente), bem como os contactos actualizados com variados e eficazes serviços exteriores (exº manutenção geral e especializada, emergência, apoio doméstico). Sobre estes aspectos será talvez preferível prever, sempre, apenas aquilo que possa ter viabilidade real, reforçando a imagem e o carácter funcional do agrupamento "em torno" dessas actividades e serviços; poderá ser, por exemplo, apenas um hall comum com serviço de portaria e um jardim bem arranjado.
Considerando
que estas soluções têm, frequentemente,
objectivos de estímulo à convivialidade
e que esta matéria é de grande sensibilidade, desenvolvem-se algumas reflexões complementares:
(i)
Soluções visando objectivamente o incentivo ao convívio em espaços públicos ou
comuns poderão iniciar-se nos grupos de recreio de crianças e jovens em
exteriores com condições motivadoras de variadas actividades, desde o recreio
livre ao recreio estimulado por equipamentos.
(ii)
Nos níveis etários superiores o convívio poderá desenvolver-se: (i) em
consequência de um acompanhamento de crianças pequenas ao parque infantil (ii)
a partir de actividades desportivas comuns, e (iii), naturalmente, com a
apetência para a continuidade de hábitos diários de pequenos períodos de
estadia e permanência em espaços bem situados relativamente às principais zonas
de acessibilidade.
(iii)
A ideia-base éque não se deverá tentar suscitar directamente o convívio como
objectivo específico, mas sim favorecê-lo no desenrolar de um grande leque de
actividades, estas sim objectivamente estimuladas/apoiadas.
Relativamente
às
soluções de habitação realmente colectiva
considera-se que elas deverão disponibilizar serviços e espaços comuns suplementares ou complementares das actividades em cada habitação, mas sempre como opção livre e muito dirigida para serviços de apoio eventuais, caracterizando-se os espaços comuns, fundamentalmente, por um papel representativo e convivial, ou contando-se com serviços de apoio completos e eventualmente opcionais e abertos a não residentes. Uma pequena nota sobre estas últimas soluções colectivas; sublinha que que elas terão naturalmente tanto mais sentido, quanto mais integradas nas restantes soluções.
Fig. 05: ainda no âmbito da referida exposição
em Malmö, em 2001, apresenta-se uma imagem relativa ao interior profusamente
ajardinado de um peqeno quarteirão residencial cujo projecto teve uma forte
contribuição do Arq. Charles Moore e e em que há um evidente reforço da
presença de cada fogo no "colectivo" edificado, mas propondo-se,
simultaneamente, uma solução geral caracterizada pela possibilidade de intensas
vistas mútuas entre fogos e entre estes e o jardim comum.
ELEMENTOS DE INOVAÇÃO NO MULTIFAMILIAR
A
inovação no edifício multifamiliar liga-se, frequentemente, à aliança entre as
vantagens dos pequenos edifícios residenciais, isto é, entradas separadas e
privadas, organizações domésticas variadas, soluções de fachada diversificadas
e áreas exteriores de lazer muito ligadas ao edifício, e as vantagens do
multifamiliar, como são o carácter urbano, as áreas comuns, a economia das
soluções e a possibilidade de integração com actividades não habitacionais
vitalizadoras e geradoras de convívio.
É
possível pensar em muitos elementos funcionais, tais como, por exemplo, pequeno
ginásio, terraço comum, quartos de reserva, sítios de jogo infantil, festas e
reuniões privadas, local de estar agradável e bem equipado etc.; mas há que
basear tais ideias numa adequada localização centralizada e bem acessível
destes espaços, no seu apropriado equipamento, na sua total compatibilização
com a habitação e na sua adequada programação, organização e gestão diária;
numa perspectiva que deve prever a possibilidade de um mau funcionamento da
comunidade ou grupo de condóminos.
Anotam-se,
em seguida, informalmente, alguns tópicos de
inovação no multifamiliar:
.
Desenvolver a adaptabilidade doméstica passiva, designadamente, através de:
espaços multifuncionais; e de contiguidades geradoras de fusões e subdivisões
entre compartimentos.
.
Desenvolver a adaptabilidade doméstica activa, designadamente, através de:
diversidade de oferta de soluções de fogos nas mesmas localizações; oferta de
fogos “feitos à medida”; oferta de soluções com serviços (água, esgotos, gás)
fixos e compartimentação flexível.
.
Variar alturas e profundidades conjugando fogos grandes e pequenos (simplex e
duplex), áreas comuns variadas, espaços profissionais e comerciais e variados
tipos de acessos comuns e eventualmente privativos.
.
Desenvolver melhorias ambientais, funcionais e de estadia muito significativas
em escadas, patins e galerias de acesso, tornando-os propícios ao convívio
natural.
.
Privilegiar sotãos e mansardas habitacionais, diversificando-se os espaços
domésticos (ex. fogos duplex, zonas com pés direitos altos, estúdios) e
assegurando-se a constante manutenção das coberturas.
.
Disponibilizar locais para uso profissional fora dos fogos, assumindo neste
caso uma perspectiva de adequada funcionalidade em termos de espaço de
escritório com usos multifuncionais.
.
Disponibilizar locais para uso profissional dentro dos fogos,caracterizando-os
com um mínimo de funcionalidade e autonomia funcional – aspecto este que deverá
ter reflexos nos espaços comuns.
.
Desenvolver soluções edificadas específicas caracterizadas por combinações de
fogos, espaços de trabalho e espaços para actividades de lazer.
.
Desenvolver combinações variadas entre: escadas interiores, escadas exteriores,
elevadores, galerias exteriores, galerias quase ruas e varandas de acesso.
.
Privilegiar a variedade de espaços exteriores privativos (desde a varanda de
assomar ao grande terraço ajardinado e ao pátio ou grande quintal térreo).
.
Assumir cada nível e mesmo cada fogo com um equilibrado, mas afirmado,
potencial de diversidade espacial e funcional, mas numa perspectiva que
respeite a economia de custos.
Fig. 06: o multifamiliar é um campo muito amplo
para uma inovação fundamentada e que, de facto, proporcione um grande leque de
opções de "como viver", de "como habitar"; e neste conjunto
em Hamburgo projectados pelos Arq.os Czerner und Czerner (2001), de certa forma
avançou-se na geminação de dois edifícios através da cobertura e extenso
equipamento residencial (ex., mesas e cadeiras, e até sofás) do respectivo
espaço intermediário.
UNIFAMILIARES INOVADORES
A
inovação no unifamiliar liga-se essencialmente a quatro aspectos organizativos
gerais:
(i) A
forma de agregação dos fogos; pois afinal o limite será a imaginação do
projectista e a fronteira de custos.
(ii)
Os serviços e equipamentos comuns que sejam eventualmente disponibilizados;
pois não é por se tratar de uma solução unifamiliar que não pode ser associada,
por exemplo, a um completo e funcionalmente diversificado pólo convivial e de
equipamentos de vizinhança; e esta é uma condição pouco interiorizada embora se
refira a uma situaão possível e muito adequada, designadamente, às
características da promoção cooperativa (há exemplos funcionais em Portugal).
Nesta
perspectiva há que salientar o interesse que tem, por exemplo, a aliança entre
um conjunto coeso de pequenos unifamiliares térreos e um pólo de equipamentos
de vizinhança funcionalmente diversificado; e atente-se na adequação que uma
tal solução oferece, por exemplo, para uma vizinhança de casais de isosos e
idosos que vivam sozinhos, que, assim, de certa forma possam finalmente
concretizar um eventual sonho de uma “casa” relativamente isolada, ganhando,
simultaneamente, um funcional leque de serviços e de espaços comuns (onde por
exemplo poderão fazer, com facilidade, festas e reuniões famíliares).
(iii)
A expressiva grande diversidade de soluções de desenvolvimento de espaços
privados interiores, exteriores e de transição exterior/interior que são
possíveis; naturalmente a liberdade a este nível organizativo é muito maior do
que no multifamiliar e muita dessa liberdade nem corresponderá a críticos
aumentos de custo.
Nota final editorial: este artigo
constitui a reedição revista do artigo Infohabitar n.º 169, editado em 16 de
Novembro de 2007.
Notas editoriais:
(i) Embora a edição dos
artigos editados na Infohabitar seja ponderada, caso a caso, pelo corpo
editorial, no sentido de se tentar assegurar uma linha de edição marcada por um
significativo nível técnico e científico, as opiniões expressas nos artigos e
comentários apenas traduzem o pensamento e as posições individuais dos
respectivos autores desses artigos e comentários, sendo portanto da exclusiva
responsabilidade dos mesmos autores.
(ii) De acordo com o mesmo
sentido, de se tentar assegurar o referido e adequado nível técnico e
científico da Infohabitar e tendo em conta a ocorrência de uma quantidade muito
significativa de comentários "automatizados" e/ou que nada têm a ver
com a tipologia global dos conteúdos temáticos tratados na Infohabitar e pelo
GHabitar, a respetiva edição da revista condiciona a edição dos comentários à
respetiva moderação, pelos editores; uma moderação que se circunscreve, apenas
e exclusivamente, à verificação de que o comentário é pertinente no sentido do
teor editorial da revista; naturalmente , podendo ser de teor positivo ou
negativo em termos de eventuais críticas, e sendo editado tal e qual foi
recebido na edição.
Infohabitar, Ano XV, n.º 703
Xxxx e qualidade arquitectónica
interior – Infohabitar 703
Infohabitar
Editor: António Baptista Coelho
Arquitecto/ESBAL, doutor em
Arquitectura/FAUP – Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto,
Investigador Principal com Habilitação em Arquitectura e Urbanismo no LNEC –
Laboratório Nacional de Engenharia Civil, em
Lisboa
Revista do GHabitar (GH) Associação
Portuguesa para a Promoção da Qualidade Habitacional Infohabitar – Associação
com sede na Federação Nacional de Cooperativa de Habitação Económica (FENACHE).
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