Infohabitar, Ano XIII, n.º 619
Espaços exteriores privados: novo artigo e links para outros 5 artigos sobre o tema
Espaços exteriores privados: novo artigo e links para outros 5 artigos sobre o tema
por António Baptista Coelho
São os
seguintes os cinco (5) artigos disponibilizados sobre a temática dos “espaços
exteriores privados” (basta clicar sobre cada um para aceder ao respectivo
texto):
Importância dos pequenos espaços exteriores privados
Repensar os espaços exteriores privados
Motivar o uso dos espaços exteriores privados
Problemas, apropriação e caracterização do exteriores privado
Inovar no exterior privado
(novo artigo)
É
interessante recordar que, por regra, a habitação esteve sempre associada a um
espaço exterior, que era mais ou menos privatizado e onde decorriam muitas
actividades directa e indirectamente domésticas, tendo sido o edifício multifamiliar
a solução que tendeu a realizar a separação entre habitação e exterior privado,
uma invenção, que embora tendo tido casos de referência em antigas cidades,
como foi o caso da velha Roma ( com as insula/insulae
que consistiam em grandes edifícios em andares, verdadeiros quarteirões que
integravam apartamentos insalubres e inseguros no que se refere a incêndios) e
talvez mesmo em outras civilizações da antiguidade, só teve, como é sabido, uma
aplicação generalizada, extensiva e massiva a partir de finais do século XIX e
especialmente ao longo do século XX, com destaque especial para os processos
massivos de realojamento que marcaram a Europa na segunda metade do século
passado.
Não
iremos fazer aqui qualquer aprofundamento deste assunto, aliás bem sensível, interessante
e rico, tendo sido objectivo deste breve apontamento focarmo-nos nessa separação
entre habitação e espaço exterior privado térreo, e partir daqui para se anotar
que a relação com o exterior privado se manteve, então, depois, no âmbito das
soluções multifamiliares, em pátios/quintais relativamente reduzidos, varandas,
balcões e terraços.
Fig.01: é extremamente interessante o potencial funcional e ambiental proporcionado por adequados espaços exteriores privados; neste caso uma varanda funda.
É um pouco óbvia esta reflexão, mas é interessante pois, como sabemos, esta “evolução” tipológica realizou-se não só por ser quase tão caro fazer varandas como fazer espaço interior doméstico, preferindo quase sempre os moradores e as entidades responsáveis por grandes processos de realojamento este último, mas também, por vezes, numa “evolução” de afastamento da relação com o solo, que é quase uma negação das velhas tipologias habitacionais fortemente ligadas à terra e, frequentemente, de histórias pessoais e familiares marcadas por expressiva e prolongada pobreza.
E,
no limite, “esta evolução” influenciou, frequentemente, a geração de espaços
pseudo-urbanos em que blocos de
apartamentos sem varandas, ou com patéticas varandas, patologicamente repetidas,
tantas vezes quase de cima abaixo dos edifícios, estavam e estão rodeados de
espaços “ditos públicos”, expressivamente residuais, porque sem utilidade aparente
e, tantas vezes, ao abandono ou equipados para usos que pouco ou nunca aí
acontecerão. Naturalmente, que esta não será a regra geral, mas é, infelizmente
situação muito frequente e que, por vezes, tem variações marcadas pelo
desenvolvimento de espaços públicos exageradamente extensos e mal concebidos,
obrigando a grandes despesas de manutenção.
Mas
voltando ao tema-base desde artigo, os espaços exteriores privados, o que se
retira desta última reflexão é que, com a aplicação massiva do edifício multifamiliar
em altura, os espaços exteriores privados foram, por regra, extremamente
reduzidos ou mesmo anulados, sendo, de certa forma, substituídos por espaços públicos
que apenas em casos de referência, resultantes de excelentes práticas urbanas,
terão de algum modo substituído ou compensado a significativa ausência desses
exteriores privados; e entre nós Alvalade e Olivais Norte, mutuamente
distintos, são excelentes casos de referência que nunca será demais visitar e
estudar - embora Olivais Norte esteja, desde há anos, remetido a um inexplicável
esquecimento em termos de manutenção básica.
Naturalmente
que estamos aqui a “agudizar”, apenas um pouco, estas notas, exactamente, para
tentarmos chegar a algumas ideias mais significativas e práticas, que passamos a
apontar.
Em
primeiro lugar salientam-se os muitos casos em que houve a total anulação de
espaços exteriores privados, “arrumando-se” as pessoas em espaços domésticos
patologicamente interiorizados em que nem é possível colocar um pé “fora de
casa” (nem em simples e baratas pequenas varandas de assomar, aliás arquitectonicamente
muito ricas), num contraste total e perigoso com uma tradição doméstica com
cerca de 10.000 anos; e tal situação será mesmo patológica e potencialmente “explosiva”,
quando a habitação é imposta ao morador e este acaba de sair de soluções
habitacionais térreas e ligadas directamente ao exterior (ex., casos de
realojamento em altura).
Em
segundo lugar há que referir um conjunto de aspectos interligados:
- um
certo desinteresse pelos espaços exteriores privados e em zonas climáticas em
que eles são muito adequados durante um largo período do ano, como é o caso de
Portugal;
- uma
frequente ausência de adequação climática dos mesmos (ex., abertura de varandas
a Norte);
- um,
frequente, mau entendimento dos seus amplos potenciais em termos de apropriação
pelos moradores, evitando-se, por exemplo, a criação de pequenos pátios/quintais
privados térreos, porque há riscos da sua má utilização – e os riscos são
reais, mas devem ser previstos, reduzidos e combatidos e não serem tomados como
razão para não se desenvolverem estas excelentes soluções;
- uma
frequente, para não dizer quase genérica, ausência de conhecimento sobre as
importantes virtudes das varandas como “climatizadoras” dos compartimentos contíguos
(sombreando-os e protegendo-os), sendo sabido que uma boa varanda, associada a
uma boa estratégia de ventilação interior, pode ter um resultado, em termos de
conforto ambiental, idêntico ou melhor do que uma solução de climatização mecânica;
- e,
finalmente, mesmo uma cultura doméstica que subalterniza o exterior privado, não
o mobilando e equipando e, frequentemente, fechando-o, tantas vezes com péssimas
soluções de marquises, que prejudicam o conforto ambiental interior e destroem
a arquitectura da fachada do edifício, e que, tantas vezes, são depois
utilizadas como arrumações de trastes, visíveis do exterior.
Fig 02: e é igualmente muito interessante o potencial ambiental, genérico, em termos de conforto ambiental, mas também de caracterização arquitectónica e doméstica, que é proporcionado, ao interior da habitação, por adequados espaços exteriores privados; neste caso uma varanda funda.
Uma
matéria que importa sublinhar é que numa sociedade cada vez mais marcada por
actividades privadas e interiores, e por pessoas fechadas em si próprias e
servidas por ofertas que estimulam essa “reclusão” (ex-, tv, TICs), tudo o que
se possa disponibilizar no sentido de incentivar o contacto das pessoas com o
exterior, através de estimulantes zonas e espaços de transição, é um caminho
arquitectónico a privilegiar, pois assim se pode amenizar essa tendência, hoje
tão forte, de termos muitas pessoas fechadas em suas casas e em si mesmas.
E a
propósito dessa função de relação/transição entre interior e exterior que é
fortemente assumida pelos espaços exteriores privados, é também interessante
registar que é possível desenvolver vãos de janelas, cujas características
sejam quase de estimulantes espaços “bolha”, que sendo basicamente interiores,
são também ambientalmente exteriores; e entre estas soluções há que destacar as
interessantes e entre nós tão pouco aplicadas bay-windows.
Um
outro aspecto que pode ser servido por uma adequada concepção de espaços
exteriores privados na contiguidade dos respectivos espaços domésticos,
corresponde ao desenvolvimento de um leque conjugado de relacionamentos, mais
fortes/próximos e mais ténues/afastados/profundos, entre os ambientes domésticos
e os espaços de uso público contíguo; um processo que corresponde,
naturalmente, a “boa arquitectura”, tal como muito do que aqui tem sido apontado,
e que nada tem a ver com a “robótica”
repetição de inúmeras varandas, sobrepostas, perfeitamente iguais e mal
concebidas (ex., será possível desenvolver uma gradação de relações entre
espaço público e privado/interior, começando com profundos pátios/quintais, que
passam, superiormente, a terraços, depois a varandas fundas, e ainda depois a
varandas menos fundas, etc.).
Naturalmente,
é fácil e estimulante imaginar que todos este processo de concepção espacial e
construtiva pode e deve ser aliada com uma estratégia de integração de
elementos naturais, conseguindo-se, “no limite”, soluções de extrema integração
entre grandes massas de construção e grandes “capas” naturais, baseadas, tanto
na envolvente de uso público, como nos espaços privados exteriores ou semi-interiores
e mutuamente agregados, em altura e horizontalmente.
E
nunca será excessivo salientar a importância que tem a relação com a natureza,
designadamente, no que se refere a urbanitas cada vez mais ligados à cidade e a
tecnologias desligadas da natureza; e neste aspecto os espaços exteriores
privados podem e devem ser verdadeiros contentores de uma natureza “limitada”,
mas vital em termos de saúde/bem-estar e de capacidade de apropriação pelos
moradores – o verde doméstico é um dos principais aspectos de exercício de uma
capacidade de apropriação e identificação com a sua habitação, e que,
cumulativamente, pode melhorar muito a qualidade visual do respectivo edifício.
Ainda
outro importante aspecto a ter em conta nesta matéria, refere-se à condição de a
diversidade das soluções de espaços exteriores privados serem, muito
provavelmente, uma das principais ferramentas do desenvolvimento da urgente
diversificação tipológica habitacional e urbana, pois eles funcionam, entre
outros aspectos, como verdadeiras “charneiras e capas” potencialmente
transformadoras das tipologias habitacionais e urbanas, seja nos seus aspectos
de conteúdo espaço-funcional próprios, seja nos seus mecanismos de agregação e
integração mútua, seja nos seus aspectos de caracterização visual exterior e pública;
e esta é daquelas matérias que justificará desenvolvimento em artigos próprios.
Uma
tal diversificação tipológica pode produzir excelentes soluções de transição
uni/multifamiliar, associáveis a unifamiliares densificados e a multifamiliares
caracterizados por baixa/média altura e alta densidade; e em todos estes tipos
de agregações os diversos tipos de espaços exteriores privados são elementos
arquitectonicamente protagonistas (ex., pequenos quintais, pátios, terraços,
balcões, varandas fundas, varandas salientes, varandas de assomar e cuidadosos
vãos de janela).
E,
naturalmente, todos este caminho conceptual tem relação directa com os actuais
caminhos de densificação estratégica e de acentuação de uma adequada imagem
urbana; mais uma matéria a desenvolver em futuros artigos.
Ainda
antes de concluir esta reflexão faz-se aqui referência à complexidade
conceptual do desenvolvimento desta diversificada tipologia de agregados
espaciais, uma complexidade que será, no entanto, suavizada, pela utilização
dos actuais processos informatizados de projecto.
E
para concluir, importa, assim, sublinhar a importância do desenvolvimento de
pequenos e diversificados espaços exteriores privados, que há que repensar e
redescobrir, nos seus usos tradicionais e em novos e estimulantes usos
residenciais (ex, no Brasil é, actualmente, frequente a previsão de
grandes/fundas varandas protegidas, naturalizadas e equipadas para a preparação
e o tomar de refeições em grupo), sendo essencial garantir a sua boa apropriação,
combatendo-se activamente os usos indevidos e inovando-se, seja nos próprios
espaços e seus conteúdos espaço-funcionais, seja no seu protagonismo na criação
de renovadas tipologias habitacionais e urbanas.
e a
estas matérias relativas aos “espaços exteriores privados”, voltaremos (mas nos
artigos acima disponibilizados encontrarão, desde já, um conjunto interessante
de reflexões).
Notas editoriais:
(i)
Embora a edição dos artigos editados na Infohabitar seja ponderada, caso a
caso, pelo corpo editorial, no sentido de se tentar assegurar uma linha de
edição marcada por um significativo nível técnico e científico, as opiniões
expressas nos artigos e comentários apenas traduzem o pensamento e as posições
individuais dos respectivos autores desses artigos e comentários, sendo
portanto da exclusiva responsabilidade dos mesmos autores.
(ii)
De acordo com o mesmo sentido, de se tentar assegurar o referido e adequado
nível técnico e científico da Infohabitar e tendo em conta a ocorrência de uma
quantidade muito significativa de comentários "automatizados" e/ou
que nada têm a ver com a tipologia global dos conteúdos temáticos tratados na
Infohabitar e pelo GHabitar, a respetiva edição da revista condiciona a edição
dos comentários à respetiva moderação, pelos editores; uma moderação que se
circunscreve, apenas e exclusivamente, à verificação de que o comentário é pertinente
no sentido do teor editorial da revista; naturalmente , podendo ser de teor
positivo ou negativo em termos de eventuais críticas, e sendo editado tal e
qual foi recebido na edição.
Infohabitar, Ano XIII, n.º 619
Espaços
exteriores privados: 5 artigos sobre o tema e um novo texto
Infohabitar
Editor: António Baptista Coelho
abc.infohabitar@gmail.com
Editado nas instalações do Núcleo de Estudos Urbanos e
Territoriais (NUT) do Departamento de Edifícios (DED) do LNEC; Infohabitar,
Revista do GHabitar (GH) Associação Portuguesa para a Promoção da Qualidade
Habitacional – Associação com sede na Federação Nacional de Cooperativa de
Habitação Económica (FENACHE).
Apoio à Edição: José Baptista Coelho - Lisboa,
Encarnação - Olivais Norte.
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