Continuamos a Série editorial sobre "habitar e viver melhor", na
qual temos acompanhado uma sequência espacial desde a vizinhança de proximidade
urbana e habitacional até ao edifício multifamiliar, e neste os seus espaços
comuns. Estamos agora a abordar , com algum detalhe, os espaços que constituem
os nossos “pequenos” mundos domésticos e privativos, refletindo sobre as diversas
facetas que os qualificam; e continuamos
na sala-comum.
A sala-comum: diversos hábitos e usos
Artigo LXIX da Série habitar e viver melhorAntónio Baptista Coelho
Sala comum: associações frequentes e interessantes
A principal associação que
caracteriza a sala é desenvolvida com a mais importante zona de refeições
domésticas, passando, assim, da designação de sala de estar para a de
sala-comum, o que corresponderá a uma certa vulgarização das funções desta
sala, e que, na prática, acaba por tender a fazer menorizar as funções de estar
sempre que há limitações de áreas, o que é frequente, pois as mesas de refeições não podem
“encolher” significativamente, enquanto o estar pode reduzir-se de um conjunto
de vários sofás até, por exemplo, um simples sofá duplo frente à incontornável
TV.
Esta situação dá que pensar e
poderá levar à previsão, de forma mais sistemática, de uma alternativa à zona
de refeições integrada na sala-comum, por exemplo, num espaço próprio, ou numa
cozinha ampla e convivial, permitindo-se, assim, a possibilidade do exercício
de um verdadeiro estar.
Uma outra frequente relação da
sala acontece com a entrada na habitação, situação que obriga a uma efetiva
privatização visual destas entradas diretas, sem o que se perderá,
praticamente, a totalidade das funções de estar em sossego e em convívio
familiar que devem caracterizar as salas, mantendo-se, apenas, as funções de
convívio mais alargado, que não se ressentem com tais acessos diretos.
Nesta matéria há ainda que referir que quanto menor for o espaço disponível, mais cuidado deve ser investido na privatização das entradas diretas na habitação, através da sala-comum, pois o desafogo espacial é uma condição que pode substituir, em boa parte, as soluções de privatização e de encerramento.
Fig. 01: Sala espacialmente estimulante em termos de
sub-espaços e relações com outras zonas domésticas de uma habitação do conjunto
urbano "Bo01 City of Tomorrow", desenvolvido no âmbito da
exposição que teve lugar em Malmö em 2001 (ver nota final) - H 13-14,
Arquitetura: Charles Moore, Ruble, Yudell, Bertil Öhrström.
Continuando nesta perspetiva de uma sala-comum que serve também como espaço de comunicação, ela pode servir de acesso aos quartos, através de uma zona de circulação obrigatória que, tal como foi atrás comentado, não inviabilize a adequada vivência de diversas zonas da sala-comum; uma solução que dificilmente se harmoniza com espaços pouco desafogados e que, por outro lado, inviabilizará um acesso aos quartos recatado e independente do uso da zona de estar.
Esta situação será, no entanto, aceitável em situações de reduzidos números de quartos numa dada habitação, de certo modo configurando soluções de grande relação entre a sala-comum e um quarto, uma solução que é sempre muito interessante numa perspetiva de eventual conversão destes dois espaços num único e amplo compartimento multifuncional.
Naturalmente, quando existe um compartimento aberto para a sala, as suas utilizações devem ser bem ponderadas (por exemplo, prolongamento da sala, quarto de reserva, sala de jantar, escritório, etc.).
Em termos de pormenor há que garantir uma comunicabilidade muito específica da sala com o exterior, nomeadamente, através de peitoris baixos e de janelas de sacada para varandas (1); e esta é uma daquelas condições de conceção que, por vezes, parecem ser inacreditavelmente esquecidas pelos projetistas.
Sala comum: hábitos frequentes
A sala-comum é, de certo modo, o lugar onde tudo pode/poderia acontecer e onde, frequentemente, pouco acontece:
· porque nela se
concentram múltiplas atividades – poderá haver alguma diversificação de espaços
de estar);
· porque o espaço não é, frequentemente, abundante – condição que é difícil de contornar, mas que tem a ver com espetos dimensionais otimizados;
· e porque a omnipresente televisão anula muito do que poderia acontecer na sala seja em termos de convívio, seja em termos de multiplicidade de atividades – o que levará a imaginar por um lado que é positivo a disponibilização de diversos monitores de TV e que será de ponderar a própria estruturação da sala-comum favorecendo-se decididamente duplos espaços que proporcionem a simultaneidade de outras actividades com o ver televisão.
Fig. 02: Sala espacialmente estimulante em termos de
sub-espaços e relações com outras zonas domésticas de uma habitação do conjunto
urbano "Bo01 City of Tomorrow", desenvolvido no âmbito da
exposição que teve lugar em Malmö em 2001 (ver nota final) - H 13-14,
Arquitetura: Charles Moore, Ruble, Yudell, Bertil Öhrström.
Sala comum: aspetos motivadores
Tal como apontei num livro editado no LNEC - "Do bairro e da vizinhança à habitação - ITA2 - que tenho citado com frequência nesta série editorial, entre as características mais desejáveis nas salas ou zonas de estar salientam-se as seguintes:
· Possibilitarem
variadas conjugações de peças de mobiliário (atender às dimensões e tipos de
sofás e de estante de sala existentes ou pretendidos, se são de corpo único ou
por elementos) e a correta instalação dos equipamentos e aparelhos para lazer e
tempos livres (por exemplo a posição ideal da televisão não deve refletir a luz
das janelas).
· Poderem receber o
mobiliário necessário e uma ou outra peça de mobília mais volumosa, sem ficarem
com um "ar atravancado" e sem
prejudicarem a circulação das pessoas.
· Terem um carácter
polivalente (em ambiente e zonas de atividade), permitindo diversos tipos de
ocupação; sala só para estar e conviver ou também para atividades de leitura,
jogo, ouvir música e ver televisão, estudo e trabalho em "recantos"
próprios e, até, brincadeiras de crianças, quando a casa é pequena.
· Aceitarem
variados números de ocupantes; salas adaptáveis e espaçosas que acolham tão bem
a respetiva família, no seu dia a dia, como, esporadicamente, as festas e as
reuniões alargadas.
· Serem
relativamente independentes do resto dos compartimentos da casa, não recebendo
nem transmitindo ruídos incómodos.
· Serem servidas
por casas de banho, sem que para isso as visitas sejam obrigadas a penetrar nas
zonas mais íntimas (quartos) da habitação.
· Estarem próximas
dos vestíbulos de entrada nas casas e formando, com eles, amplos conjuntos de
espaços de receção e convívio.
Notas:
(1) MHOP; LNEC, "Instruções para Projectos de Habitação
Promovidos pelo EStado - IPHPE/Fundo de Fomento da Habitação - FFH, Documento
5", p. 29.
Nota importante sobre as imagens que
ilustram o artigo:
As imagens que acompanham este artigo e que irão, também, acompanhar outros
artigos desta mesma série editorial foram recolhidas pelo autor do artigo na
visita que realizou à exposição habitacional "Bo01 City of
Tomorrow", que teve lugar em Malmö em 2001.
Aproveita-se para lembrar o grande interesse desta exposição e para
registar que a Bo01 foi organizada pelo “organismo de exposições
habitacionais sueco” (Svensk Bostadsmässa), que integra o Conselho Nacional de
Planeamento e Construção Habitacional (SABO), a Associação Sueca das Companhias
Municipais de Habitação, a Associação Sueca das Autoridades Locais e quinze
municípios suecos; salienta-se ainda que a Bo01 teve apoio financeiro da
Comissão Europeia, designadamente, no que se refere ao desenvolvimento de
soluções urbanas sustentáveis no campo da eficácia energética, bem como apoios
técnicos por parte do da Administração Nacional Sueca da Energia e do Instituto
de Ciência e Tecnologia de Lund.
A Bo01 foi o primeiro desenvolvimento/fase do novo bairro de Malmö,
designado como Västra Hamnen (O Porto Oeste) uma das principais áreas urbanas
de desenvolvimento da cidade no futuro.
Mais se refere que, sempre que seja possível, as imagens recolhidas pelo
autor do artigo na Bo01 serão referidas aos respetivos projetistas dos
edifícios visitados; no entanto, o elevado número de imagens de interiores
domésticos então recolhidas dificulta a identificação dos respetivos projetistas
de Arquitetura, não havendo informação adequada sobre os respetivos designers
de equipamento (mobiliário) e eventuais projetistas de arquitetura de
interiores; situação pela qual se apresentam as devidas desculpas aos
respetivos projetistas e designers, tendo-se em conta, quer as frequentes
ausências de referências - que serão, infelizmente, regra em relação aos
referidos designers -, quer os eventuais lapsos ou ausência de referências aos
respetivos projetistas de arquitetura.
Notas
editoriais:
(i) Embora a edição dos artigos editados na Infohabitar seja ponderada,
caso a caso, pelo corpo editorial, no sentido de se tentar assegurar uma linha
de edição marcada por um significativo nível técnico e científico, as opiniões
expressas nos artigos e comentários apenas traduzem o pensamento e as posições
individuais dos respectivos autores desses artigos e comentários, sendo
portanto da exclusiva responsabilidade dos mesmos autores.
(ii) De acordo com o mesmo sentido, de se tentar assegurar o referido e adequado
nível técnico e científico da Infohabitar e tendo em conta a ocorrência de uma
quantidade muito significativa de comentários "automatizados" e/ou
que nada têm a ver com a tipologia global dos conteúdos temáticos tratados na
Infohabitar e pelo GHabitar, a respetiva edição da revista condiciona a edição
dos comentários à respetiva moderação, pelos editores; uma moderação que se
circunscreve, apenas e exclusivamente, à verificação de que o comentário é
pertinente no sentido do teor editorial da revista; naturalmente , podendo ser
de teor positivo ou negativo em termos de eventuais críticas, e sendo editado
tal e qual foi recebido na edição.
Infohabitar, Ano XI, n.º 520
Artigo
LXIX da Série habitar e viver melhor
A
sala-comum: diversos hábitos e usos
Editor: António Baptista
Coelho
abc@lnec.pt e abc.infohabitar@gmail.com
abc@lnec.pt e abc.infohabitar@gmail.com
GHabitar (GH) Associação Portuguesa para a Promoção da Qualidade
Habitacional
Edição: José Baptista Coelho - Lisboa, Encarnação -
Olivais Norte.
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