Infohabitar, Ano X, n.º 469
Infohabitar a
revista semanal na WWW sobre o habitat humano
Mundos domésticos e pessoais: habitação e espaços da habitação, temas de desenvolvimento
Artigo XLIV da Série habitar e viver melhor
António Baptista Coelho
Retomando
o excelente parágrafo do arquiteto P. Céleste, citado no último artigo desta
série, é essencial que nos interiores domésticos possamos “estar em sua(nossa) casa” (o “nossa” é
responsabilidade do autor destas linhas) e numa “habitação calorosa”, sendo que “o contexto é o que nos anima” e, nesse contexto, o “exterior deve fazer sonhar”,
e há que privilegiar uma “distribuição simples que proporcione dar um
nome a cada peça e que se ligue a comportamentos habitacionais muito flexíveis”
e “é preciso encontrar uma certa
forma de deambulação, estar atento à arte de colocar uma porta, uma
janela, atento aos gestos quotidianos.” (1)
E esta “repetição” sincopada das palavras do citado autor são de grande interesse pois sintetizam muito daquilo que ser irá tentar fazer nos próximos artigos desta série e salienta-se, desde já, que em 10 aspetos considerados no texto acima (referidos em seguida na mesma ordem usada no referido parágrafo), apenas dois se podem considerar com natureza mais objetiva e mesmo assim a questão de uma “distribuição simples” e da adequação aos “gestos quotidianos” incluem, também, aspetos menos objetivos:
(i) apropriação geral;
(ii) atratividade e domesticidade;
(iii) integração;
(iv) comunicabilidade e estímulo ao desejo/sonho no habitar;
(v) racionalidade e acessibilidade – “distribuição simples”;
(vi) apropriação específica e reforço da identidade de cada espaço;
(vii) adaptabilidade;
(viii) acessibilidade flexível, adaptável e apropriada.
(ix) criatividade projetual e capacidade de pormenorizar
(x) funcionalidade e adequação à multiplicidade dos “gestos quotidianos”.
Não se trata aqui de aprofundar qualquer conflito/despique entre aspetos mais qualitativos e eventualmente mais subjetivos ou mais quantitativos e objetivos, pois ambos têm natural presença no quadro de uma adequada e ampla qualidade residencial e arquitetónica, mas apenas sublinhar que, quando estamos em presença de uma boa conceção de arquitetura residencial (e sublinhou-se expressivamente esta condição), a essencial mistura qualitativa e quantitativa ou mais subjetiva e mais objetiva, referida aos diversos aspetos de projeto e vivência a ter em conta, não parace favorecer os aspetos habitualmente considerados como mais objetivos, funcionais e racionalistas, e, aliás, isto acontece, quer devido à fulcral importância dos outros aspetos, em boa parte responsáveis pelo fazer das habitações de que realmente gostamos – tal como aponta P. Céleste –, quer devido à frequente circunstância de tais aspetos mais funcionais estarem, habitualmente, tão intimamente embebidos no “partido” geral e no quadro de pormenorização da habitação, que acabem por não ser entendidos de forma específica e esolada por quem a habita e mesmo por quem a visita.
Dito isto apontam-se e comentam-se, muito brevemente,
em seguida as matérias em que se dividiu a abordagem do grande tema dos “mundos
domésticos e pessoais”, que irá ser publicada, ao longo de vários meses, na
Infohabitar e nesta série editorial (Série habitar e viver melhor),
naturalmente de forma intercalada com outros artigos, de outros autores e sobre
outros temas, e sempre procurando que cada artigo tenha a sua máxima autonomia
temática.
Grandes Opções Domésticas.
A organização e a caracterização de um espaço
doméstico pode seguir determinados hábitos de organização domésticos, alguns
dos quais decorreram da evolução da vivência doméstica ao longo de alguns
milénios, e outros que, praticamente, acabaram de nascer pois foram inventados
em finais do séc. XIX e no séc. XX, ou então a organização e a caraterização de
um espaço doméstico pode passar por uma verdadeira reinvenção bem fundamentada das
respectivas funções, ambientes, associações espaciais e diversos espaços de
actividade e de cena, numa perspetiva de aplicação discutida do que podemos
designar como “Grandes Opções Domésticas”.
Espaços de ligação habitação-edifício e habitação-rua.
Sobre a ligação
habitação-rua importa aprofundar as possibilidades vivenciais e arquitetónicas
que uma diversidade de relacionamento entre esses dois mundos de privacidade e
convivialidade pode e deve proporcionar com o duplo objectivo de uma cidade
mais variada, atraente e mesmo equilibradamente surpreendente, e de uma
habitação marcada pela identidade
A existência de residências térreas, dispondo de
espaços exteriores privativos, liga-se a uma oferta, directa, de condições de
vida diária potencialmente muito semelhantes ao viver em edifícios
unifamiliares e pode, até, ser conveniente para potenciar a continuidade da
presença humana e a animação urbana.
Sobre a adaptabilidade doméstica
Sobre a importância, hoje em dia crucial, da
adaptabilidade das soluções domésticas salientam-se alguns aspectos que são
considerados essenciais tendo em vista, essencialmente, o desenvolvimento de
habitações adequadas a diversos tipos de famílias, modos de vida e de uso e
apropriação, e o combate a "layouts" e configurações pormenorizadas
com características funcionais e ambientais "rígidas" (pouco
adaptáveis e versáteis); de certo modo e mais uma vez é apagar, de vez, a ideia
de que as habitações podem ser concebidas, apenas, como soluções funcionais,
e/ou que essa possibilidade é algo que pode ser, até, considerado como um
aspeto positivo na conceção.
Fig. 03
Bons espaços e ambientes domésticos.
A ideia que se quer aqui sublinhar é a importância
determinante do conforto ambiental, com destaques específicos para a insolação,
a luz natural, a ventilação, o isolamento de ruídos e o isolamento térmico,
para uma verdadeira satisfação com o espaço doméstico.
Zonas domésticas: (novas) ideias organizativas.
Provavelmente, há alguns anos, esta parte do trabalho
seria das mais importantes em termos de um apoio prático ao desenvolvimento de
melhores soluções habitacionais. Tratava-se, então, afinal, de um relativo
culminar de toda uma tradição de zonamentos funcionais ou funcionalistas,
zonamentos estes que, infelizmente, ajudaram a destruir bairros de cidades e a
uniformizar espaços domésticos no sentido do serviço a uma pessoa “média” e a
uma família “média”, que raramente existem.
Equilíbrios dimensionais e de privacidade.
Desenvolvem-se, neste
tema, considerações sobre o equilíbrio com que se distribui o espaço na
habitação e as respectivas consequências na adequação aos tipos de família e a
diversos modo de vida.
Opções domésticas de compartimentação.
Trata-se de
desenvolver a matéria da junção e divisão de compartimentos e espaços, da
escolha entre ter mais compartimentos mais pequenos ou menos compartimentos
maiores e da separação entre zonas mais sociais ou mais íntimas.
“Libertar” a habitação das instalações.
A ideia que quer aqui
evidenciar é que tudo o que se faça para favorecer uma maior capacidade de
apropriação e de adaptabilidade dos espaços domésticos relativamente aos seus
habitantes, pode ser extremamente afetado, por redes e padrões de serviço de
instalações rígidos e pouco adaptáveis.
Oferta diversificada de espaços domésticos específicos.
Nesta parte da
temática abordam-se, globalmente, os compartimentos, cantos e recantos
domésticos e os espaços tendencialmente intimistas onde se processa a vida
diária das famílias, um leque variado de espaços habitualmente com funções
específicas, mas desejavelmente com uma equilibrada flexibilidade funcional, que
devem ser espaços privilegiados da apropriação familiar e individual.
Em próximo artigo desta série iremos, então, avançar para as “Grandes Opções Domésticas”.
Notas:
(1) Monique
Eleb, Anne Marie Chatelet, “Urbanité, sociabilité et intimité des logements
d’aujourd’hui”, 1997, p. 238.
Notas:
Notas
editoriais:
(i) Embora a edição dos artigos editados no Infohabitar seja ponderada, caso a caso, pelo corpo editorial, no sentido de se tentar assegurar uma linha de edição marcada por um significativo nível técnico, as opiniões expressas nos artigos apenas traduzem o pensamento e as posições individuais dos respectivos autores.
(i) Embora a edição dos artigos editados no Infohabitar seja ponderada, caso a caso, pelo corpo editorial, no sentido de se tentar assegurar uma linha de edição marcada por um significativo nível técnico, as opiniões expressas nos artigos apenas traduzem o pensamento e as posições individuais dos respectivos autores.
Editor: António Baptista Coelho
- abc@lnec.pt
INFOHABITAR Ano IX, nº469
Artigo XLIV da Série habitar e viver melhor
INFOHABITAR Ano IX, nº469
Artigo XLIV da Série habitar e viver melhor
Mundos domésticos e privados:
temas de desenvolvimento
Grupo Habitar (GH)
Associação Portuguesa para a Promoção da Qualidade Habitacional
e Núcleo de Estudos Urbanos e Territoriais (NUT)
do LNEC
Edição: José Baptista Coelho - Lisboa, Encarnação -
Olivais Norte.
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