Dois textos de Nuno Teotónio Pereira
Nota prévia do editor
Editam-se, em seguida, dois textos que foram, recentemente, enviados pelo amigo e colega Nuno Teotónio Pereira para publicação no nosso Infohabitar.
O interesse da temática justifica, plenamente, a interrupção do artigo “Realojamento e (des)contentamento: a integração da «habitação social», estigmas e êxitos”, cuja segunda e última parte, sobre a “integração social e experiências adquiridas” será editada no próximo dias 27 de Julho de 2008 - na noite de domingo como habitualmente.
E não quero deixar aqui de registar, em relação directa com o conteúdo das palavras de Nuno Teotónio, que a qualidade arquitectónica com um sentido amplo, bem informado e socialmente empenhado é, sem dúvida, um aspecto fundamental para a melhor integração cultural, social e física de um qualquer grupo humano, proporcionando agrado e mesmo um verdadeiro potencial de felicidade seja numa perspectiva individual, seja numa perspectiva colectiva ligada ao bom fazer da cidade.
Assim aconteceu em Alvalade, cerca de 1950, assim aconteceu em Olivais Norte – Encarnação, cerca de 1960, e assim aconteceu, sem qualquer dúvida, em muitos pequenos bairros e outros conjuntos de habitação de interesse social, que, desde então, têm sido criados em Portugal, e cujo êxito social, arquitectónico e urbano, não surge, infelizmente, nos meios de comunicação social; porque, de certa forma, como prova desse êxito fala uma integração natural, afectiva e afectiva, que não “grita”, que não se quer evidenciar, porque se faz na continuidade urbana e no gozar de uma afirmada qualidade do meio edificado.
Dá vontade de ir repetindo que a boa Arquitectura (habitacional) poderá não resolver problemas sociais, mas ajuda muito nessa resolução, não haja dúvidas, pois os exemplos estão aí para serem visitados e comentados; de certa forma é a via da procura da felicidade, também na configuração e na qualificação dos espaços onde decorre a nossa vida diária. Mas não haja dúvidas que estamos a visar uma fasquia qualitativa claramente elevada; mas, afinal, é a vida das pessoas e a viabilidade da cidade que estão, eventualmente, em risco.
O editor do Infohabitar
António Baptista Coelho
PS: as imagens juntas são da responsabilidade da edição do Infohabitar
Nos 60 anos do 1.º Congresso Nacional de Arquitectura
Fig 1: um pormenor de Alvalade, projecto urbano de Faria da Costa e de edifícios de Miguel Jacobetty.
Introdução explicativa de Nuno Teotónio Pereira
A Ordem dos Arquitectos tomou louvavelmente a iniciativa de comemorar os 60 anos do 1º Congresso, dado que se tratou de um acontecimento muito marcante para a Arquitectura no nosso país e no qual tive o privilégio de participar. Assim, foram organizadas sessões em Lisboa e no Porto, e ainda publicada uma edição fac-similada das Actas do Congresso, incluindo as comunicações apresentadas e a lista dos inscritos.
Nesta nova edição foi incluído um artigo da minha autoria sobre a importância do Congresso (intitulado QUE FAZER COM ESTES 50 ANOS?) e ainda um documento muito interessante, que não fora incluído na 1ª edição e que eu possuía no meu arquivo (intitulado I CONGRESSO NACIONAL DE ARQUITECTURA - Manifesto do grupo da ODAM lido no Congresso e distribuído em folheto sobre o Problema da Habitação). Trata-se de um vigoroso manifesto, muito datado mas também com uma ampla visão do futuro, que é acompanhado de algumas notas de esclarecimento, que também redigi.
Penso que seria interessante divulgar estes textos no “Infohabitar”, já que muitas pessoas não terão adquirido a edição agora publicada.
Nuno Teotónio Pereira
Fig 2: uma zona de Alvalade, projecto urbano de Faria da Costa e de edifícios de Miguel Jacobetty.
QUE FAZER COM ESTES 50 ANOS?
Falar do Congresso de 48 é voltar atrás meio século e evocar o tempo em que não havia mais do que 150 arquitectos em Portugal — quase todos concentrados em Lisboa e Porto — e que acorreram com entusiasmo à magna reunião, ficando a conhecer-se todos uns aos outros. O contraste com a realidade de hoje, quando caminhamos para os 10 mil, estamos espalhados pelo País, e cada um de nós não conhece mais do que um por cento do corpo profissional, não deixa de ser impressionante.
Mas o mundo também já é bem outro, dominado pelas realidades virtuais e a caminho acelerado da globalização. Nas notas que se seguem procurar-se-á dar uma ideia do que foi esse tempo distante e arriscar-se-ão algumas pistas no sentido de buscar, perante situações e contextos tão diferentes, uma linha de continuidade nos rumos da profissão.
Mas o mundo também já é bem outro, dominado pelas realidades virtuais e a caminho acelerado da globalização. Nas notas que se seguem procurar-se-á dar uma ideia do que foi esse tempo distante e arriscar-se-ão algumas pistas no sentido de buscar, perante situações e contextos tão diferentes, uma linha de continuidade nos rumos da profissão.
O contexto mundial: construir um mundo novo
Nas cidades devastadas por arrasadores bombardeamentos aéreos, os governos e os povos empenhavam-se arduamente na reconstrução. Mas, tanto ou mais que a reconstrução material, todo o clima que se vivia clamava por uma reconstrução social e moral que apagasse os ódios passados, com base na solidariedade e na fraternidade. Da rica América, através do Plano Marshall, chegavam biliões para os ciclópicos trabalhos de reconstrução, não distinguindo vencedores e vencidos. Em S. Francisco era fundada a ONU, destinada a acabar com as guerras no mundo. E até antes, em 1942, ainda no auge dos combates, o governo de coligação inglês publicava o Plano Beveridge, da autoria de um conceituado economista liberal (!), o qual viria a ser o modelo do Estado-Providência nas democracias ocidentais, assegurando a todos o direito à educação, à saúde e à segurança social. Ao mesmo tempo a reconstrução das cidades arrasadas era integrada num quadro abrangente de dinamização economico-social, inspirado tanto no New-Deal rooseveltiano, de que o paradigma era a Tenessee Valley Authority, como nos planos quinquenais soviéticos.
Foi neste contexto que os arquitectos foram naturalmente chamados a um papel de primeiro plano. E estavam bem preparados para isso, com a doutrina messiânica da Carta de Atenas e as propostas redentoras de Le Corbusier, fazendo apelo a um “Espírito Novo”. O Movimento Moderno conhecia a sua grande oportunidade histórica: era preciso rejeitar tudo o que se considerava caduco, convencional ou simplesmente académico.
Enquanto o Estado Novo procurava sobreviver, os arquitectos organizavam-se em torno dos novos ideais.
Com a derrota do nazi-fascismo em 1945, as ditaduras ibéricas viram-se seriamente ameaçadas — interna e externamente — e Salazar foi obrigado a operações de cosmética com a adopção, meramente formal, de alguns figurinos democráticos. Fortes movimentos de contestação, como as greves operárias de 1944 e o Movimento de Unidade Democrática, lutavam pelos direitos dos trabalhadores e por eleições livres e sérias, a ponto de o ditador ter pela primeira vez admitido, nas eleições para deputados em 1945, a participação da oposição e o abrandamento temporário da censura à imprensa.
No campo profissional, as revistas de arquitectura europeias, que tornavam a publicar-se após um longo interregno, eram lidas com avidez e o livro “Brazil Buils”, editado em 1943 pelo Museu de Arte Moderna de Nova York, mostrava a realidade pujante de uma arquitectura moderna fora do espaço centro-europeu.
Enquanto a revista “Técnica” do IST publicava a tradução do articulado principal da Carta de Atenas, era constituída em Lisboa uma associação de arquitectos designada “Iniciativas Culturais Arte e Técnica, ICAT”, liderada por Keil Amaral. Quase ao mesmo tempo, um grupo de arquitectos do Porto criava a “ODAM, Organização dos Arquitectos Modernos”.
Fortemente politizados, pugnando pela Arquitectura Moderna, os dois grupos iriam juntar esforços para dar cabo do chamado “português suave”, a arquitectura dita nacional que a ditadura de Salazar, a exemplo de outros regimes totalitários, utilizava como instrumento de inculcação ideológica para fortalecer o seu poder. Uma arquitectura marcadamente cenográfica que, por ter sido desejada, programada, promovida e, quando necessário, imposta pelo regime, merece bem a designação de “arquitectura do Estado Novo” — porque as outras, desde o Modernismo dos anos 30 até ao Moderno dos 50 e 60, desenvolveram-se livremente, perante a indiferença e sem interferências do poder, ao longo do quase meio século que durou a ditadura.
Em 1947 o ICAT compra a decadente revista “Arquitectura”, fazendo dela porta-voz para a divulgação das ideias e das realizações do Movimento Moderno. E pouco depois, já nas vésperas do Congresso, Keil Amaral é eleito Presidente do Sindicato, cargo de que só viria a tomar posse após a sua realização, mercê da demora na homologação governamental. Esta homologação, obrigatória para todos os cargos associativos de qualquer natureza — pois vivia-se em ditadura — acabou por ser concedida, mas foi retirada mais tarde, demitindo Keil Amaral do cargo para que fôra eleito pelos seus colegas.
Fig 4: Alvalade, que também é moderno, projecto urbano de Faria da Costa e de edifícios por Jorge Segurado.
O Congresso foi palco do combate pela Arquitectura Moderna, o qual se inscrevia na luta mais geral contra a ditadura.
Iam assim já longe os tempos em que os arquitectos se sentiam agradecidos ao governo pelo facto de o regime lhes ter dado, pela mão de Duarte Pacheco e das suas Obras Públicas, oportunidades de trabalho inusitadas, ao mesmo tempo que o reconhecimento da importância social da sua profissão. Isto mesmo não se esqueceu de lembrar o então ministro José Frederico Ulrich (que sucedera a Pacheco após a morte deste em 1943) na sessão de encerramento do Congresso: “a classe dos arquitectos ainda deve mais a este período de ressurgimento nacional do que a classe dos engenheiros”. E até era verdade.
Mas tudo tinha mudado.
Mas tudo tinha mudado.
Efectivamente, tinham passado escassos oito anos após a grandiosa exposição de 1940, mas um enorme cataclismo mundial tinha virado uma página da História. E se os tempos eram assim bem outros, os arquitectos portugueses também, impulsionados por uma nova geração plena de convicções e de combatividade.
Duas circunstâncias decisivas estiveram na base do terramoto que o Congresso 48 provocou ao nível da profissão: por um lado, a garantia dada pelo governo ao presidente do Congresso Cottinelli Telmo, de que as comunicações não seriam censuradas; por outro, o facto de se ter admitido a participação plena de estudantes finalistas, então chamados tirocinantes.
Foi assim, num país onde existia um apertadíssimo contrôlo de tudo o que era publicado, que a liberdade de expressar ideias que iam contra a retórica oficial foi aproveitada ao máximo, nos dois temas propostos para discussão: “A Arquitectura no plano nacional” e “O problema português da Habitação”.
Promovidos pelo governo a propósito da exposição “Quinze Anos de Obras Públicas”, destinada a glorificar o regime, os dois Congressos de Engenharia e de Arquitectura conheceram desenvolvimentos bem diferentes. Enquanto o primeiro decorreu bemcomportadamente sem surpresas, o de Arquitectura transformou-se num clamor de contestação que surpreendeu o poder. A vaga foi irresistível: a velha-guarda modernista que se tinha tão docilmente rendido ao “portuguesismo” apenas dez anos antes, na onda dos fascismos que assolaram a Europa, via-se de repente obrigada a alinhar com as posições de vanguarda que se impunham em todo o mundo (com a muito escondida então excepção da União Soviética) com reflexos nos ambientes de trabalho e de ensino — administração pública, gabinetes de arquitectura e escolas — em que os Mestres eram contestados por jovens diplomados e estudantes.
Assim, no Congresso, a construção em altura e a Carta de Atenas foram erigidas como modelos a adoptar, mas não só: falou-se também de reajustamento social (pois seria temerário falar em revolução), em habitação proletária, em unidades de vizinhança, num Novo Humanismo e nas catedrais dos Tempos Modernos, citando Le Corbusier.
E rejeitou-se “a imposição, ou sequer a sugestão, de qualquer subordinação a estilos arquitectónicos”, proclamando-se que “o portuguesismo da obra de arquitectura não pode continuar a impôr-se através de imitação de elementos do Passado”.
Neste quadro, em que foram apresentadas mas rejeitadas conclusões mais moderadas ao tema “A Arquitectura no Plano Nacional”, até os arquitectos mais ligados ao regime fizeram a sua auto-crítica, como Cottinelli, reconhecendo que “temos lançado cá para fora frutos raquíticos e dessorados de uma conciliação impossível entre juizes sem idoneidade e o nosso desejo anemizado pela transigência connosco próprios e com os outros.” Ou, como Jorge Segurado, que desenterrou uma expressão arcaica para justificar a aceitação da solução vertical na habitação colectiva sem renegar o seu portuguesismo: o “aposentamento”, como alternativa ao internacionalista “apartamento”.
Foi assim que os arquitectos reunidos em Congresso trocaram as voltas ao Poder e reconquistaram a sua liberdade de expressão. Obrigado a envergar uma máscara democrática, o Estado Novo de Oliveira Salazar desembaraçava-se do que considerava secundário para a sua sobrevivência, conservando porém ciosamente o essencial: a censura à imprensa, a polícia política, as restrições ao direito de associação, as eleições fraudulentas. E, entre o secundário, encontrava-se o contrôlo da expressão arquitectónica, cujas normas apertadas começaram a ser suavizadas.
Com o impulso do Congresso e os novos ventos que sopravam no mundo, os arquitectos portugueses forjaram uma consciência profissional que inspirou a prática associativa e a sua própria intervenção cívica e cultural ao longo dos anos que se seguiram. Durante este meio século, primeiro o Sindicato corporativo imposto em 1933 e a seguir a AAP, criada após o 25 de Abril, enquadraram todo o processo de expansão da actividade profissional e de afirmação plena dos arquitectos na sociedade portuguesa que se verificou durante este período.
Fig 5: Olivais Norte, o miolo jardim do bairro, hoje em dia: à esquerda um projecto de Pedro Cid, à direita um projecto de Pires Martins e Palma de Melo.
Um desafio a assumir: tornar efectivo para todos o direito à Arquitectura, mandando os amadores fazer outra coisa, apurando o desempenho profissional e dando trabalho a todos os arquitectos
Todos estaremos de acordo em que as comemorações do passado só ganham sentido se ajudarem a melhorar o presente e a construir o futuro. Caso contrário só servem para alimentar saudosismos estéreis. Agora que a AAP passou a Ordem, com competências acrescidas, agora que já somos tantos e em breve seremos muitos mais, agora que já há arquitectos em todo o território e nos quadros superiores da Administração e das empresas, agora que a Arquitectura portuguesa é enaltecida pela crítica internacional, o que é que faz falta?
Se olharmos para o interior da profissão é uma evidência que muitos arquitectos têm dificuldade em arranjar trabalho ou são obrigados a desempenhar tarefas fóra do quadro profissional; e que estas dificuldades vão acentuar-se com a proliferação desmesurada de cursos de Arquitectura a que se vem assistindo. E se olharmos para a produção do espaço edificado entre nós, não só persiste uma elevada percentagem de projectos feitos por curiosos ou técnicos não qualificados, como até alguns dos que levam porventura a assinatura de arquitecto não ultrapassam uma triste mediocridade: a qualidade continua a ser uma excepção e o nível da produção corrente é claramente insatisfatório — o que significa que o direito à (boa) Arquitectura não está ao alcance de todos. Colmatar este défice — eis aqui um desafio bem digno de ser assumido pela profissão nesta celebração dos 50 anos do Congresso de 48, em prol do interesse público e da qualidade de vida dos portugueses. E este desiderato, que implica obrigatoriamente, sem porém nesta se esgotar, a revogação do tristemente célebre 73/73, poderá fazer com que tantos jovens arquitectos à procura de trabalho possam encontrar oportunidade de se devotarem à profissão que com tanto entusiasmo escolheram, constituindo um estímulo para o aperfeiçoamento da prática de todos nós.
Nuno Teotónio Pereira, arquitecto, 24.8.98
Fig 6: Olivais Norte, pormenor do excelente conjunto super-económico, com modalidades de auto-acabamento, projecto de Braula Reis e João Matoso.
I CONGRESSO NACIONAL DE ARQUITECTURAManifesto do grupo da ODAM lido no Congresso e distribuído em folheto sobre o Problema da Habitação
Algumas notas de esclarecimento
1. Por ter sido redigida fora do prazo, a intervenção não foi incluída nas comunicações apresentadas ao Congresso e por isso não figura na publicação final do mesmo. Foi lida durante as sessões, não me recordo por quem, embora com a omissão de uma página que assinalei no folheto. Trata-se de um verdadeiro manifesto, tal o seu carácter combativo.
2. Subscrito no folheto por 22 dos mais activos arquitectos do Porto, ligados à ODAM (Organização dos Arquitectos Modernos), os nomes desses subscritores estão impressos num pedaço de papel colado na última página do folheto. Ao observar-se à transparência essa folha, verifica-se que no original figurava apenas o nome de Artur Andrade, significando isso ter sido ele o autor único do texto.
3. O teor da intervenção constitui um tremendo requisitório sobre a gravidade do problema da habitação no nosso país e sobre a qualidade da arquitectura e os constrangimentos que sobre ela pesavam. Ao mesmo tempo, são propostas medidas para solucionar esses problemas, muito influenciadas pelas doutrinas de Le Corbusier, profundamente inovadoras e algumas até com características premonitórias, como a da criação do Instituto Português da Casa Popular.
4. Abarcando todo o universo da actividade do arquitecto, incluindo o planeamento urbanístico, contextualizado na realidade da sociedade portuguesa de então, nomeadamente na cidade do Porto, o documento constitui um vibrante apelo aos congressistas para uma intervenção decidida no sentido de “olhar os problemas de frente e sem pusilanimidades”. Creio que o desenrolar do Congresso e as respectivas conclusões não terão desiludido Artur Andrade, que aliava a combatividade – mais uma vez provada dez anos depois como responsável no Porto da candidatura de Humberto Delgado – à qualidade da sua arquitectura.
5. Logo no início do texto é feita uma referência à Federação das Caixas de Previdência e à intenção de serem construídas no Porto 5.000 casas de renda económica por essa entidade, que estava no início da sua actividade. A este propósito, Artur Andrade manifesta os maiores receios de que tais construções venham a ser “as falsas construções modernas, a indiferença pela investigação e as novas tentativas, a solução-carimbo, a solução arcaica”.
Curiosamente, eu havia sido admitido na Federação no início do ano, sendo o único arquitecto deste organismo, já que os projectos dos novos empreendimentos seriam, em regra, encomendados fora, quase sempre dependendo de sugestões da minha parte e privilegiando arquitectos residentes na região. Foi assim que o primeiro conjunto a ser construído no Porto foi o bairro de Ramalde, projectado por Fernando Távora, o que, posso crer, terá afastado os receios do autor do texto.
6. Entretanto, estavam já a ser construídos em Lisboa os primeiros empreendimentos da Federação, aos quais Artur Andrade se refere, com a designação de “Alferes Malheiro” – designação inicialmente adoptada por Faria da Costa para o Plano de Urbanização de Alvalade. Isto, por a zona abrangida se situar a sul da avenida à data com aquele nome, e que mais tarde se passou a chamar do Brasil.
Aconteceu que, tanto ao nível dos projectos, como das tecnologias utilizadas, esses empreendimentos, cuja construção acompanhei, primeiro como técnico da Câmara de Lisboa e, depois, já da Federação, não podiam estar menos de acordo com os negros presságios do manifesto. Quanto aos projectos, foram os mesmos objecto de uma comunicação no Congresso feita pelo seu autor, Miguel Jacobetty, que utilizou uma metodologia inovadora para os estudar. Quanto às técnicas de contratação e construção, foram também utilizadas concepções muito avançadas, trazidas pelo eng. Guimarães Lobato da reconstrução em Inglaterra após a 2ª guerra mundial.
Nuno Teotónio Pereira, arquitecto, Lisboa, 30 de Maio de 2008
Fig 7: Olivais Norte, uma das “torres” Prémio Valmor – o único atribuído a “habitação social” – projecto de Nuno Teotónio Pereira, Pinto de Freitas e Nuno Portas.
PS (da edição): e são algumas imagens desses primeiros empreendimentos da Federação e, portanto, de Alvalade, continuando com imagens de um outro excelente bairro que lhe sucedeu, Olivais Norte (bem junto à Encarnação), igualmente um excelente exemplo de aliança entre qualidade arquitectónica e integração social, uma aliança à qual voltaremos em outros artigos aqui no Infohabitar.
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