“Libertar” a habitação das instalações – infohabitar # 780
Infohabitar, Ano XVII, n.º 780
Edição:
terça-feira, 22 de junho de 2021
Caros leitores da Infohabitar,
Continuamos a série editorial da
Infohabitar especificamente dedicada a uma viagem sistemática pelos diversos
espaços do habitar, que iniciámos na vizinhança, avançando, depois para os
edifícios e seus espaços comuns (disponível no catálogo interativo da
Infohabitar, no seu tema 6 intitulado “Série habitar e viver melhor”) e “terminando” numa reflexão sobre os diversos tipos
de organizações, opções e espaços domésticos; reflexão esta que aqui será
desenvolvida ainda durante bastantes semanas editoriais.
Lembra-se,
novamente, que serão sempre muito bem-vindas eventuais ideias comentadas sobre
os artigos aqui editados e propostas de novos artigos (a enviar para abc.infohabitar@gmail.com
, ao meu cuidado).
Considerando a nova evolução da pandemia,
sublinha-se, mais uma vez, a vital importância de não perdermos, agora, o que
ganhámos, dando-se agora tempo e cuidado até estarmos todos, em boa parte,
imunizados.
Despeço-me, até à próxima semana, enviando saudações
calorosas e desejos de força e de muito boa saúde para todos os caros leitores
e seus familiares,
Lisboa/Encarnação e Azambuja/Casais de Baixo, em 21
de junho de 2021
António Baptista Coelho
Editor da Infohabitar
“Libertar” a habitação das instalações – infohabitar # 780
António Baptista Coelho
(texto e imagem)
Resumo
Neste artigo,
dedicado a um tema que poderá levantar algumas dúvidas iniciais sobre o
significado da “libertação” do espaço doméstico relativamente às máquinas e
instalações que o devem servir, desenvolve-se, primeiro, uma reflexão sobre o equilíbrio
entre o bem-habitar e a temática geral das instalações domésticas, define-se,
depois, como objetivo, o desenvolvimento da adaptabilidade doméstica ao serviço
de uma essencial domesticidade e aborda-se a matéria da desejável racionalidade
e estratégia que deve caracterizar a integração das instalações domésticas, na
sua globalidade.
No que se
pode designar como uma segunda parte do artigo defende-se um significativo
incremento da funcionalidade doméstica, mas harmonizada com a manutenção do
próprio carácter “doméstico” da solução habitacional, avança-se na temática
“central” do artigo, referida à “libertação” do espaço de habitar na sua
relação com as instalações e apontam-se algumas notas de remate sobre as casas
inteligentes, desigmente, dentro desta mesma faceta de compatibilização emter
maximização da funcionalidade sem “custos” para o essencial sentido
confortável, envolvente e apropriável da habitação.
1. Equilíbrio entre o bem-habitar e a temática geral das instalações domésticas
Em primeiro
lugar há que apontar que aqui nos dedicamos a esta reflexão sobre o que pode e
deve ser uma boa integração doméstica das variadas instalações que servem os
espaços que habitamos, apropriamos e cuidamos/arranjamos no dia-a-dia,
considerando-as como uma grande “unidade” de máquinas, tubagens, aparelhos e
elementos funcionais e decorativos (ex., luminárias), que, estando mais ou
menos visíveis ou mais ou menos “embutidos”, têm como função essencial a
garantia de um amplo leque de serviços de apoio à vida diária, à funcionalidade
e ao bem-estar e conforto na nossa habitação.
E no que se
refere ao desenvolvimento desta noção de natural aliança entre
maximização funcional e verdadeiro sentido/carácter doméstico, ou
“domesticidade”, há que a harmonizar, designadamente, contra excessos
funcionalistas gerais e de monofuncionalidade de cada espaço ou compartimento,
pois uma habitação não é uma máquina ou dispositivo mecanizado que nos permite
“habitar”, mas sim, em primeira linha, um remanso de agradabilidade e de
apropriação, capaz de nos “envolver” como um verdadeiro pequeno mundo: um
espaço doméstico sensível, caloroso, diversificado e ricamente apropriável,
servido por dispositivos que lhe garantam extrema funcionalidade; e não o
contrário: uma “máquina” de habitar, que proporcione condições mínimas de
identidade e apropriação e/ou um espaço habitacional excessiva e caracterizadamente
marcado por elementos maquinais e funcionais.
E há que
lembrar que se até em escritórios, equipamentos de saúde e mesmo fábricas se tem
descoberto a importância de um ambiente “domesticado”/humanizado, então nos
pequenos mundos que habitamos o caminho preferencial em termos de
caracterização fica bem evidente.
Nestas
matérias importa, também, sublinhar, desde já, que o que aqui se quer definir
por “instalações” se refere a todo um conjunto de "aparatos"
técnicos, associados a redes técnicas diversas, com especial enfoque nas águas,
esgotos, electricidade, e redes de telecomunicações, que são fundamentais para
o habitar doméstico e cujas ligações ou “pontos” de serviço devem estar
disseminados pelos vários espaços da habitação, proporcionando padrões de uso
das respectivas instalações que devem ser eficazes no sentido das respectivas
utilidades, mas assegurando, simultaneamente:
·
quer um tipo de
serviço caraterizadamente residencial – há, por exemplo, tipologias de máquinas
mais integráveis em ambientes domésticos, e soluções de “calhas técnicas” que
para serem bem aceites num ambiente doméstico devem ser objecto de adequada
integração e mesmo intervenção formal/de aspecto;
·
quer uma máxima
capacidade de adaptabilidade dos respetivos espaços do habitar doméstico a um
significativo leque de usos e a uma ampla diversidade de arranjos de
mobiliário.
E, rematando-se esta reflexão, fica a sensação que talvez
haja ainda um diversificado e amplo caminho a percorrer nesta “domesticação” de
máquinas e redes associadas ao serviço de espaços da habitação; um caminho
duplo, porque incluindo, quer a sua adequada e multifacetada integração em
diversos espaços e elementos de mobiliário fixo , quer mesmo o seu design
específico, que poderá ter em conta, por exemplo, uma sua capacidade de
integração mais direta e atraente nos espaços e ambientes da habitação.
2. O objetivo da adaptabilidade doméstica ao ser viço de uma verdadeira domesticidade
Recheamos as
nossas habitações com um leque de instalações que, há algum tempo, tinham
estritas e até evidenciadas conotações funcionais e funcionalistas, com reflexo
até na designação de compartimentos, como foi e é o caso das “instalações
sanitárias”, em vez da “velha” designação de “casa de banho”, mas não podemos
esquecer que estamos a passar para lá do “cabo funcionalista”, visando-se uma
consolidada recuperação da flexibilidade das ocupações e dos usos domésticos,
numa perspectiva de crítica construtiva aos excessos de hierarquização e de
monofuncionalidade.
Enquanto isto
acontece surgem numerosas novas aplicações de instalações ao serviço,
designadamente, do conforto ambiental, das comunicações e da conversão funcional
simplificada e reversível dos diversos espaços da habitação; por exemplo, as
TIC multifuncionais estão já bem presentes e os robots de limpeza começam a
marcar a nossa vida diária.
Desenvolve-se
assim, também, a própria “inteligência doméstica”, radicada em inúmeros
equipamentos e dispositivos específicos, com funções próprias e de coordenação
das condições ambientais e de segurança da globalidade do espaço da habitação.
A tudo isto
se ligam exigências velhas e novas em termos de instalações e redes algumas
delas ainda muito físicas em termos de ramificações e pontos de serviço
necessários – embora muitas vezes desenvolvidas de modo pouco planeado e aberto
às sempre incontornáveis posteriores intervenções de manutenção e de reparação
– e outras cada vez mais associadas a
redes sem fios, mas exigindo, também, bases funcionais adequadas e escolhas
realmente inteligentes e domesticamente adequadas em termos, designadamente, de
tipologias de mecanismos e de controlo dos mesmos – matérias estas que bem merecem
urgentes desenvolvimentos, pois continuam a ser muito pouco consideradas face
ao “novo-riquismo” das novas tecnologias emergentes; uma matéria onde é sempre
essencial lembrarmo-nos que estamos a conceber e rechear funcionalmente espaços
domésticos, e não oficinas onde só trabalham robots (o exagero da imagem foi,
evidentemente, premeditado).
Nestas
matérias de uma constante batalha por uma cuidada e ponderada maximização
da adaptabilidade e da funcionalidade domésticas há, ainda, que ter presente que
a vida doméstica de hoje e de amanhã está a ser e será marcada por novos
hábitos, alguns já conhecidos e outros ainda incipientes e mutantes, sendo que
tudo isto é cada vez mais muito pouco compatível com os espaços funcionalmente
rígidos das “velhas/novas” habitações funcionalistas, em que, por exemplo, a
cozinha era apenas para cozinhar – e para uma atividade de cozinhar realizada
por alguém especializado nesse trabalho), a sala para um estar muito pouco
associado às inúmeras e diversas atividades de estar e de lazer hoje existentes
e sem falar no atual “teletrabalho”, e o quarto essencialmente para dormir
(exagerando-se, aqui, um pouco, é evidente), sendo que as respetivas
instalações são/eram, então, programadas de acordo com tais “peias” funcionais;
e isto sem se entrar em verdadeiras “confusões” funcionais que, por exemplo,
associavam e associam, frequentemente, o tratamento de roupas à contiguidade
com a zona de cozinha, tratando-se de atividades tão distintas e apenas tendo
como elemento comum a necessidade de abastecimento de água – a tão conhecida
zona húmida funcionalista, que tem evidentes e importantes razões económicas de
concentração das canalizações, mas que tem de ser tratada de modo adequado em
termos de compatibilizações funcionais e ambientais.
A ideia que aqui se quer deixar é que tudo o que se faça, na habitação,
com o objetivo de uma maior adaptabilidade no arranjo e na ocupação dos espaços
domésticos – adaptabilidade esta de extrema
importância seja numa perspectiva de adequação aos usos e desejos, seja numa
outra perspectiva de continuada e periódica adaptação de uma dada
habitação à evolução global e pormenorizada das necessidades e dos
desejos dos seus ocupantes – , e, naturalmente, também tudo o que se
faça em prol de uma maior capacidade de apropriação destes espaços pelos seus
habitantes, pode ser extremamente afectado, por redes, padrões de serviço e
elementos de instalações funcionalmente “rígidos”, pouco adaptáveis e, tantas
vezes, negativamente localizados.
Nisto tudo há
que salientar que a adaptabilidade doméstica, sendo sempre objectivo
essencial, deve ser bem obrigada pela constante evolução das instalações com
aplicações e funcionalidades domésticas, uma evolução hoje em dia bem marcada;
tem, portanto, de haver expressiva abertura na previsão das instalações
domésticas e da sua eventual evolução e alteração.
Talvez que um
caminho adequado, nestes sentidos, inclua, por exemplo, a previsão de um
“armário” de centralização de diversas instalações, com capacidade evolutiva e
caminhos e difusores de instalações bem disseminados por toda a habitação e
também com clara capacidade de acesso e evolução; numa perspetiva em que
sinceramente teria vontade de incluir algumas redes “clássicas”, como as de
água e eletricidade, em prol da maximização da adaptabilidade e apropriação no
uso da habitação, mas garantindo-se, naturalmente, todos os aspetos de
segurança no respetivo uso.
De certa forma quem sabe se o
presente/futuro da estruturação e do recheio funcional e ambiental doméstico
não passará por uma relativa “independentização” entre espaços habitáveis e
instalações e afins, quase que numa reinterpretação dos velhos tempos
domésticos em que as instalações surgiram e foram “apostas” aos espaços da
habitação, um pouco como elementos complementares e relativamente soltos (bem
visíveis ou invisíveis) dos espaços que serviam; uma releitura e
reinterpretação dos velhos espaços das boas habitações (nunca esquecer que
muitos então viviam acumulados em condições menos que mínimas), com a sua
caracterização multifuncional mas agora servidos pelas melhores tecnologias.
3. Racionalidade e estratégia na integração das instalações domésticas
Vala sempre a
pena lembrar que este tipo de preocupações, associadas a uma bem adequada integração
das instalações domésticas na concepção “da casa”, não são novas,
designadamente, quando nos referimos a uma arquitectura residencial
qualificada, aquela que nunca esqueceu as preocupações de funcionalidade,
quando esta qualidade era rara e que também nunca esqueceu os aspetos de
adequada caracterização doméstica/habitacional, num sentido muito amplo e
humano da mesma, quando a funcionalidade foi tomada como realidade “essencial”.
Importa
salientar nesta matéria da integração das instalações domésticas uma opção frequentemente
utilizada na concepção residencial, referida à concentração maximizada e
estratégica de instalações e serviços em determinadas zonas “técnicas”,
estrategicamente localizadas e, portanto, muito funcionais, libertando-se o
máximo de espaço doméstico restante para uma ampla diversidade de ocupações por
usos e conjuntos de mobiliário diversificados. Esta opção, na sua versão mais
aplicada, resume-se a uma concentração de zonas de águas e esgotos, ou zonas
designadas como “húmidas” ou “de águas”, proporcionando-se a económica redução do
traçado de instalações (sempre caras), a concentração racionalizada de
revestimentos mais impermeáveis e , eventual, centralização de elementos e
espaços “técnicos” com acesso facilitado (ex., ductos de passagem de
canalizações, armários técnicos, etc.); este tipo de estratégica concentração e
delimitação de “zonas de água” deve ser acompanhado por uma adequada marcação
da passagem das instalações.
É
interessante reflectir, nesta matéria, sobre o interesse que ainda marca os
“velhos” cuidados de concentração de “zonas de água”, que nasceram
essencialmente de objectivos de economia em habitações de interesse social,
através do encurtamento das respectivas redes de águas e esgotos, mas que podem
ter também excelentes resultados no sentido de proporcionarem um excelente
“capital” de adptabilidade ao restante espaço doméstico.
Uma outra
forma de garantir os objectivos de boa integração das instalações é
proporcionar uma grande flexibilidade de escolha dos pontos de ligações a
redes, mediante intervenções simples e pouco dispendiosas que possam
disponibilizar praticamente um serviço “a la carte” , que se vá
adaptando, muito facilmente seja à evolução de determinada redes –
designadamente de telecomunicações – seja à evolução da ocupação e dos arranjos
de mobiliário domésticos. E nesta linha de reflexão há, ainda, naturalmente que
ter em conta as atuais redes sem fios; matéria que por si só merece tratamento
específico e especializado.
As novas e as
futuras “redes de instalações e de equipamentos” associadas a aspectos de
sustentabilidade ambiental na habitação, e, por exemplo, ligadas à gestão dos
lixos domésticos, ao máximo aproveitamento da energia solar por estratégias
passivas e activas, à poupança de energia eléctrica e ao adequado isolamento
acústico deverão ser objecto de uma aplicação estratégica no espaço doméstico,
marcada pela maximização da sua eficácia técnica e pela compatibilização desta
eficácia com o adequado desenvolvimento da estruturação e mesmo de uma adequada caracterização doméstica.
É, assim, fundamental uma clarificação e “simplificação” das características
técnicas destas instalações e equipamentos ao nível doméstico, “reduzindo-os”,
de certa forma, ao seu papel técnico específico e harmonizando este papel no
âmbito de um qualificado desenho do espaço habitacional, em que estas novas
facetas técnicas deixem de assumir uma presença protagonista, assumindo, sim, a
sua presença necessária e adequada em termos da criação de um ambiente doméstico
agradável, envolvente e "pacífico".
E não
tenhamos qualquer dúvida, que uma habitação adequada não é, nem nunca será
realmente comparável a uma máquina e, por exemplo, a um automóvel com
visores recheados de gadgets técnicos, mas é fundamental que,
hoje em dia, a habitação possa acolher, funcional e integradamente, as novas
redes e instalações, proporcionando-se ligações a redes nos mais diversos
sítios, e ampliando-se, assim, ao máximo a ampla utilidade do mundo doméstico.
E daí a
ideia, defendida neste artigo, da “libertação” do espaço doméstico
relativamente às suas instalações.
Fig. 1: “ ... sempre, sempre sem se perder de vista que estamos a
conceber espaços habitacionais, espaços com expressiva capacidade de
apropriação, espaços especialmente sensíveis em termos da sua capacidade de atractividade ...”
4. Mais funcionalidade, mas manutenção e mesmo reforço do sentido doméstico
Na sequência da presente reflexão apontamos,
assim, para espaços domésticos muito adequadamente servidos pelas melhores
tecnologias em termos de instalações mais clássicas/correntes e mais
inovadoras, tendo-se, evidentemente, em conta os custos de tais opções, pois o
que sempre de deve visar é a habitação para o maior número e tendo-se sempre
presente a fundamental exigência de adaptabilidade a diversas formas e gostos
de usar a habitação – por diversas pessoas e pelas mesmas pessoas ao longo do
tempo – e um máximo de versatilidade na incorporação de novas tecnologias, visando-se,
aqui, o que poderemos designar como um suplemento de reserva de adaptabilidade;
e não tenhamos dúvida de que muito desta adequada versatilidade se joga ao
nível de um desenho globalmente estruturado e bem pormenorizado da arquitectura
residencial.
E sempre,
sempre sem se perder de vista que estamos a conceber espaços habitacionais,
espaços com expressiva capacidade de apropriação, espaços especialmente
sensíveis em termos da sua capacidade de atractividade, de expressiva e ampla
empatia, e de favorecimento da múltipla sensibilidade de quem os vais habitar;
todas estas qualidades bem distintas de um ambiente maquinal e “caixotesco” –
no sentido de existência de compartimentos sem escala, sem pormenorização e sem
verdadeira relação com o exterior (três temas cruciais na concepção do habitar).
De certa
forma o que aqui se aponta está, por exemplo, definitivamente contra uma
descaracterização como espaço “frio” e “maquinal” do ambiente e da
pormenorização de uma cozinha e de uma casa de banho domésticas, recheando-as,
sim, de sinais de conforto e de escala e mesmo de “calor” humanos; e também se
refere, aqui, uma estratégica organização/distribuição e, eventualmente,
“camuflagem” ou assumida e atraente visualização (ex., canalizações à vista) de
instalações domésticas, não as afectando funcionalmente, mas reduzindo, ao máximo,
a sua presença e protagonismo visual no interior da habitação,
proporcionando-se os melhores e mais completos serviços com a maior sobriedade
e racionalidade, numa acção que tudo tem a ganhar com contribuições
multidisciplinares, designadamente, nas áreas da Arquitectura, das Engenharias,
do Design e mesmo das Ciências Sociais e Humanas, considerando-se, aqui,
designadamente, a importância dos estudos de satisfação em pós-ocupação
(espaços habitados há mais de 5 anos), mas também de estudos associados a uma
amostragem direcionada de soluções concretas diversificadas, pois, muitas
vezes, muitos habitantes não conhecem a riqueza de soluções existentes e
possíveis, estando limitados a um leque mínimo, pobre e “estafado” de
soluções-tipo.
5. Sobre a “libertação” do espaço de habitar relativamente às instalações
E assim se abordou, globalmente, a
matéria da “libertação” dos espaços domésticos relativamente às suas
instalações, uma ideia-base que se pode, talvez, sintetizar duas seguintes
considerações:
·
por um lado que possamos
ter uma máxima capacidade de apropriação dos espaços mais habitáveis sem nos
preocuparmos com aspectos ditos funcionais ou maximizando mesmo tais aspectos
no apoio directo à referida apropriação e adaptabilidade – teremos assim, por exemplo,
salas e quartos extremamente versáteis no que se refere ao funcionamento, à
ligação e à instalação dos mais variados tipos de equipamentos domésticos
(exemplo, elementos de iluminação);
·
e que, por outro
lado, haja sempre como que uma recuperação ou mesmo um redimir, como espaços
fortemente habitáveis e dignos, de compartimentos da habitação cujas
instalações e associados aspectos de funcionalidade os relegaram frequentemente,
durante os últimos decénios, para uma sua caracterização fria, impessoal e
quase não doméstica, como acontece por exemplo em tantas cozinhas (por vezes,
ditas “de preparação”) e casas de banho (tantas vezes qualificadas como
“instalações sanitárias”).
Nesta(s)
matéria(s) é bem interessante ter presente a noção de que acabámos por gastar
mais de um século para integrar as instalações clássicas da água, dos esgotos e,
finalmente, da electricidade nos espaços domésticos, que antes não as tinham,
mas que é já tempo de elas assumirem o seu papel de serviços prestados a um
espaço doméstico cuja caracterização se irá deles servir e nunca o contrário.
Só assim teremos, novamente, espaços domésticos verdadeiramente redimidos no
seu fundamental papel de espaços do habitar, com sentido muito amplo, e,
naturalmente, bem servidos pelas instalações; e não espaços domésticos feitos
quase que para evidenciarem “a chegada” da água, dos esgotos e da própria
electricidade.
Teremos,
assim, uma habitação, um espaço doméstico agradável “em continuidade”,
extremamente impactante e versátil, em termos positivos, cujos espaços nos ajudam
a viver bem e nos facilitam o uso das melhores instalações e aplicações de
apoio doméstico e ao trabalho e lazer conhecidas e prováveis; mas sempre um
espaço doméstico servido e não, quase que, ao serviço de um grande leque de
instalações e dos seus inúmeros “gadgets”.
Notas de remate sobre alguma da atualidade
das “casas inteligentes”
Já abordámos
esta matéria das novas Tecnologias de Informação e Comunicação com aplicação
doméstica, ao de leve, a propósito deste tema das instalações e não iremos
fazer aqui qualquer desenvolvimento do mesmo, pois trata-se de tema que carece
de um urgente e aturado trabalho de investigação, sistematização e
(re)estruturação dos seus aspetos mais marcantes no que se refere mesmo ao
desenho específico e arquitectónico dos espaços domésticos; e numa perspetiva
aberta pois trata-se de matéria em muito rápida evolução; mas importa, desde já,
deixar aqui algumas considerações, essencialmente, a título de alertas.
A importância
que as novas tecnologias têm e terão num uso mais seguro, confortável,
simplificado e mesmo lúdico do espaço doméstico e o seu papel estratégico na
vivência habitacional de pessoas com condicionamentos de mobilidade e/ou de
percepção, como acontece, designadamente, com os habitantes mais idosos.
O apuramento
estratégico de soluções e dispositivos considerados essenciais em termos de
aspetos de garantia de máxima segurança no uso da habitação e de apoio diário a
pessoas com grandes limitações de mobilidade.
A adequada e
sistemática harmonização entre estas novas soluções “inteligentes” e “velhas”
soluções de pormenorização que confluem para os mesmos objetivos de segurança.
Acessibilidade, comunicação, etc.
As principais
influências que as novas tecnologias têm na estruturação, na configuração e na
pormenorização domésticas; isto, evidentemente, no sentido de uma sua
aplicação mais eficaz (funcional e económica).
A necessidade
urgente de uma clarificação e de uma hierarquização dos aspetos, das
tecnologias e dos elementos que se possam considerar mais importantes e
prioritários, evitando-se uma inflação de soluções e de gadgets.
E atenção
para que, quando estamos a começar a voltar a preencher as nossas casas com
novas instalações, ligadas, por exemplo, às casas inteligentes e às tecnologias
da sustentabilidade ambiental, não cometamos os mesmos erros de colocar as
casas ao serviço e como montras dessas novas tecnologias esquecendo as suas
funções essenciais, que serão sempre muito ligadas à domesticidade e à apropriação.
Notas editoriais ao artigo:
O presente artigo corresponde a uma edição muito ampliada,
modificada e revista do artigo que foi editado na Infohabitar, em 19/08/2014,
com o n.º 496.
Notas editoriais gerais:
(i) Embora a edição dos artigos editados na Infohabitar seja
ponderada, caso a caso, pelo corpo editorial, no sentido de se tentar assegurar
uma linha de edição marcada por um significativo nível técnico e científico, as
opiniões expressas nos artigos e comentários apenas traduzem o pensamento e as
posições individuais dos respectivos autores desses artigos e comentários,
sendo portanto da exclusiva responsabilidade dos mesmos autores.
(ii) No mesmo sentido, de natural responsabilização dos
autores dos artigos, a utilização de quaisquer elementos de ilustração dos
mesmos artigos, como , por exemplo, fotografias, desenhos, gráficos, etc., é,
igualmente, da exclusiva responsabilidade dos respetivos autores – que
deverão referir as respetivas fontes e obter as necessárias autorizações.
(iii) Para se tentar assegurar o referido e adequado nível
técnico e científico da Infohabitar e tendo em conta a ocorrência de uma
quantidade muito significativa de comentários "automatizados" e/ou
que nada têm a ver com a tipologia global dos conteúdos temáticos tratados na
Infohabitar e pelo GHabitar, a respetiva edição da revista condiciona a edição
dos comentários à respetiva moderação, pelos editores; uma moderação que se
circunscreve, apenas e exclusivamente, à verificação de que o comentário é
pertinente no sentido do teor editorial da revista; naturalmente , podendo ser
de teor positivo ou negativo em termos de eventuais críticas, e sendo editado
tal e qual foi recebido na edição.
Infohabitar, Ano XVI, n.º 780
“Libertar” a habitação das instalações – infohabitar # 780
Infohabitar
Editor: António Baptista
Coelho
Arquitecto/ESBAL – Escola
Superior de Belas Artes de Lisboa –, doutor em Arquitectura/FAUP – Faculdade de
Arquitectura da Universidade do Porto –, Investigador Principal com Habilitação
em Arquitectura e Urbanismo no Laboratório Nacional de Engenharia Civil
(LNEC), em Lisboa.
Revista do GHabitar (GH) Associação Portuguesa para a Promoção da Qualidade Habitacional Infohabitar – Associação com sede na Federação Nacional de Cooperativas de Habitação Económica (FENACHE).
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