terça-feira, janeiro 19, 2021

Sobre a oferta de diversas propostas organizativas para as zonas domésticas – Infohabitar # 761

Importante: ligação direta (clicar) para:  760 Artigos Interactivos, edição revista, ilustrada e comentada em janeiro de 2021- 38 temas e mais de 100 autores

 

Infohabitar, Ano XVII, n.º 761

Edição: terça-feira, 19 de janeiro de 2021

 

 Caros leitores da Infohabitar,

A viagem pelos espaços do habitar e designadamente pelos espaços domésticos continua e continuará a ser feita na Infohabitar, integrando uma série editorial já com assinalável extensão na nossa revista.

Avisam-se, no entanto, os leitores que a edição desta série irá, provavelmente, ser interrompida durante algumas semanas, pois está, atualmente, em preparação uma nova série editorial muito focada nos aspetos mais desejáveis a desenvolver, especificamente, na promoção de habitação de interesse social .

Lembra-se, novamente, que serão sempre muito bem-vindas eventuais ideias comentadas sobre os artigos aqui editados e propostas de novos artigos (a enviar para abc.infohabitar@gmail.com , ao meu cuidado).

Considerando a atual e muito crítica evolução da pandemia, sublinha-se a vital importância do máximo confinamento e do distanciamento social, conseguidos, designadamente, através do teletrabalho, bem como do respeito por todas as medidas de higiene e proteção amplamente divulgadas.

Não tenhamos dúvida de que boa parte do combate ao vírus passa pelos nossos esforços sistemáticos, pessoais e familiares, que terão de se enraizar nos nossos hábitos diários, mesmo quando temos já entre nós as vacinas, mas quando simultaneamente a pandemia está numa fase muito dura.

Despeço-me, até à próxima semana, enviando saudações calorosas e desejos de força e de boa saúde para todos os caros leitores e seus familiares,    

 

Lisboa, Encarnação, em 18 de janeiro de 2021

António Baptista Coelho

Editor da Infohabitar


Sobre a oferta de diversas propostas organizativas para as zonas domésticas – Infohabitar # 761

António Baptista Coelho

(texto e imagem)

Resumo

No artigo desenvolve-se uma reflexão, de certa forma, introdutória sobre o interesse da exploração e do subsequente aprofundamento de uma razoável variedade de propostas organizativas para as zonas e subzonas  da habitação, numa perspetiva que encara criticamente uma, ainda preponderante, preocupação essencialmente funcional, e que visa a melhor adequação a necessidades e desejos habitacionais específicos num quadro de expressiva qualidade arquitectónica.


Sobre a oferta de diversas propostas organizativas para as zonas domésticas – Infohabitar # 761

1. Para lá das principais propostas domésticas organizativas e funcionalistas

Provavelmente, há alguns anos, esta temática, associada globalmente aos aspetos de organização funcional doméstica, seria das mais importantes em termos de um apoio prático ao desenvolvimento de melhores soluções habitacionais.

Tratava-se, então, afinal, de um relativo culminar de toda uma tradição de uma aplicação prática e afinada ao longo de decénios, de zonamentos funcionais ou funcionalistas, zonamentos estes que, infelizmente, ajudaram a destruir bairros de cidades e a uniformizar a globalidade dos “novos” espaços domésticos no sentido do serviço a uma pessoa “média” e a uma família “média”; provavelmente a tal que deseja a habitação do “Tipo 3” (com 3 quratos “de dormir”, o conhecido T3), mas que acaba por se contentar com uma habitação do Tipo 2, incluindo uma pequena cozinha, quartos dimensionados para “mobílias completas”, mas mínimas, e uma “sala-comum” – teoricamente integrando funções de estar e de refeições formais – mas onde, freqientemente, quase nem há espaço para encaixar um catálogo mínimo de mobiliário, quanto mais para aceitar toda uma vida doméstica que aí se deveria poder concentrar de uma forma, pelo menos, minimamente adequada a todos os respetivos intervenientes.

A culpa não foi apenas de quem promoveu estes espaços, mas também do encarar , frequentemente, a regulamentação mínima como regulamentação básica e corrente, e de um frequente manejar de tais mínimos regulamentares espaciais e funcionais por projetistas com reduzida capacidade para ultrapassar tais condições mínimas através de excelentes projetos de Arquitetura habitacional.

2. Notas sobre a importância de uma “regulamentação” essencial

Em primeiro lugar há que justificar o apontar, no título deste item, de regulamentação entre aspas, pois com esta designaçãoo pretende-se incluir não só a clássica prática regulamentar, mas também práticas recomendativas e de projeto e apreciação habitacional, privilegiando-se, aqui, naturalmente, a habitação de interesse social, por ser a mais condicionada e obrigar à aplicação de financiamentos públicos.

Nas áreas habitacionais, tal como em muitas outras áreas temáticas, há, evidentemente, matérias que têm de ser rigorosamente regulamentadas, destacando-se, evidentemente, os aspetos ligados à segurança e nestes, sublinhando-se, os associados à segurança no uso corrente da habitação, e tendo-se em conta, especificamente, o uso por pessoas com diversos condicionamentos – etários, de mobilidade, de perceção, em termos de hábitos socioculturais, etc.

E estes aspetos de segurança no uso normal deverão abranger cuidados de segurança em termos de saúde e bem-estar físico e psicológico; matérias estas de elevada exigência, complexidade e diversidade temática – integrando, designadamente, desde as conhecidas mas ainda pouco respeitadas exigências de múltiplo conforto ambiental, às matérias vitais da qualidade do ar, da ausência de produtos nocivos para a saúde, de redução de acidentes domésticos, e da vital ligação com as exigências de sustentabilidade ambiental.

Mas as preocupações regulamentares ainda atualmente mais praticadas são as “simplesmente dimensionais”, ainda por cima mal associadas a áreas mínimas consideradas como áreas a aplicar (tal como acima se referiu), pouco ou nada articuladas com as essenciais dimensões mais versáteis em termos de habitabilidade, que não são, evidentemente, as “mínimas regulamentares” e, muitas vezes, criticamente associadas a organizações funcionais domésticas rigidamente “monofuncionalistas”, criticamente hierarquizadas e, portanto, muito pouco adaptáveis a diversas necessidades domésticas e muito menos a diversos modos e desejo de habitar a casa de cada um e de cada agregado familiar.

Acresce, ainda, a esta situação a realidade de quanto menores as áreas disponíveis maior a complexidade projetual, evidentemente, no sentido de se obter uma adequadamente versátil solução doméstica; uma situação que deveria obrigar a elevadas exigências na escolha dos projetistas de habitação de interesse social, e que deveria passar por um exigente e amplo crivo de apreciação dos respetivos projetos, numa análise muito mais elaborada e qualificada do que a que é simplesmente baseada nos referidos critérios de áreas mínimas/razoáveis e de mais alguns aspetos já constantes de alguns corpos recomendativos, como é o caso das Recomendações Técnicas para Habitação Social (RTHS), que marcaram a sua época e tiveram excelente influência na melhoria da qualidade da Habitação de Interesse Social.

Parece haver, portanto, aqui uma quádrupla frente de intervenção:

·      na melhoria regulamentar do que é essencial, designadamente, em termos de ampla segurança no uso corrente;

·      de melhoria recomendativa em termos de um habitar mais versátil, mais adaptável e mais apropriável;

·      de um privilegiar de projetos com assinalável qualidade arquitectónica – incluindo variadas facetas, entre as quais a da racionalidade construtiva e económica e a da adequada e valorizadora integração local –, designadamente, quando estejam “em jogo” fundos públicos e assinaláveis condicionalismos projetuais;

·      e do desenvolvimento de uma melhorada capacidade de apreciação e validação da referida adequação e qualidade arquitetónica residencial, designadamente, quando estejam “em jogo” fundos públicos e assinaláveis condicionalismos projetuais.

3. Do funcional ao pessoal e familiar na habitação

O título deste item também poderia ser: “há mais habitação para lá do espaço e da função!”, sempre houve, designadamente, naquelas habitações onde dá realmente gosto habitar

Se considerarmos que os amplos aspetos de segurança e de adequação em termos de versatilidade e  adaptabilidade estão garantidos, então parece que  à matéria da qualidade arquitectónica, nas suas variadas facetas, poderia/deveria ser dada  ampla liberdade criativa, designadamente, numa sensível conformação dos espaços interiores habitacionais.

Afinal a função tem de se harmonizar com a forma e vice-versa, mas a “forma” pode inovar, pode variar e deve induzir interesse e atratividade, mas também apropriação e afinidade; e por isso acima se referiu o desenvolvimento de uma “sensível” conformação dos espaços interiores habitacionais; sensibilidade esta que, evidentemente, depende da qualidade arquitectónica do respetivo projeto, necessariamente validada pela sua respetiva apreciação (pois “de boas intençoes ...”)

Tudo isto tem a ver com estarmos, agora, em pleno “mundo” privado, um mundo onde o que há a regulamentar pode/deve estar “automaticamente” embebido na respetiva pormenorização de divisórias, instalações, vãos, equipamentos e acabamentos, proporcionando-se, para lá de todo esse pequeno/grande mundo do detalhe, variadas espacialidades formais, diversas relações entre variados espaços/ambientes e uma afirmada potencialidade evolutiva e/ou natural versatilidade dos espaços e seus mútuos relacionamentos.

E, assim, a ideia que se perfilha, aqui, no interior doméstico é a de um muito amplo leque de soluções espaciais, funcionais e formais, verdadeiramente versáteis e positivamente caraterizadoras de cada solução, para lá de todo um necessário conjunto de soluções “embebidas”, ligadas a aspectos essenciais de funcionalidade, acessibilidade, segurança, saúde e higiene, aspectos estes muito concentrados em “zonas de água” (bancadas de cozinha, espaços de tratamento de roupa e casas de banho) e nas zonas de relação entre diversos ambientes (ex., interior/exterior, comum/privado, etc.).

Quanto aos “velhos” aspectos de organização dita “funcional” da casa, tal como ainda são considerados, designadamente, no “mercado habitacional”, como por exemplo as “clássicas” “zonas íntimas” e outras zonas mais ou menos funcionais, julga-se que a estruturação doméstica será tanto mais negativa, no que se refere à sua assimilação por diversas famílias, quanto mais “hierarquizada”, "rígida" e “em árvore” for a respectiva organização.

O resto, e o resto que é quase tudo no espaço doméstico, deveria ser deixado a uma ampla liberdade de concepção, embora tal liberdade seja, como sabemos, uma condição gémea de uma muito apertada exigência de qualidade de Arquitectura.

Fig. 1: entre preocupações de funcionalidade, segurança, versatilidade, apropriação e até alguma domesticidade se vão construindo os ambientes habitacionais  positivamente mais marcantes.

4. Ideias de organização da habitação

Dito isto, que será um tema geral orientador desta reflexão sobre habitações que possam influenciar, realmente, uma vida doméstica mais feliz, apontam-se e comentam-se, brevemente, em seguida, algumas ideias de organização da habitação que podem informar as diversas soluções de organização domésticas, mesmo quando consideradas apenas a título de quadros organizativos genéricos – e regista-se que boa parte destas referências estão apontadas no meu estudo intitulado “Do bairro e da vizinhança à habitação”, editado pelo LNEC (ITA 2), e foram baseadas, frequentemente, nas opiniões de de um amplo leque de autores.

·      Espaços tipologicamente distintos em termos de socialização, privacidade e funcionalidade geral.

Matéria que, interessantemente ,conjuga aspetos que por vezes são considerados de forma desagregada, provocando “organizações” domésticas muito discutíveis ou mesmo muito negativas; de certa forma há que tê-los em conta, mas, subsequentemente, reinterpretá-los, fundi-los, quase apagar (aparentemente) um ou outro, recriar “novos” espaços a partir de elementos bem conhecidos, reinterpretar velhas tipologias, etc., etc.

·      Habitações “divididas” pela barreira entre usos essencialmente noturnos ou diurnos.

Matéria que parece que não deve ser considerada “à letra”, em termos da referida “divisão”, mas sim numa aproximação a estruturações domésticas que salvaguardem aspetos essenciais de conforto e de privacidade, assim como alguma estimulante diversidade de arranjos e de ambientes gerais, que são proporcionados – contrariamente a quadros domésticos monótonos, repetitivos e sem capacidade de atração e de apropriação.

·      Zonas mais formais e mais informais da habitação – ou domínios das crianças, domínios dos adultos e domínios comuns.

Esta matéria é muito ampla e proporciona inúmeros desenvolvimentos específicos e combinações entre eles; a  questão da boa aceitação doméstica, em termos de estruturação e pormenorização, a modos de vida mais formais ou mais informais poderá ser  essencial quando se pretende dotar a habitação de uma boa capacidade em termos de adaptabilidade e de apropriação.

·      Habitação que se vai adaptando à evolução etária e da composição da família e dos respetivos usos e desejos domésticos.

Uma habitação que se possa ir razoavelmente adaptando, em termos de processos mais passivos ou mais ativos, à evolução etária e da composição da família e dos respetivos usos e desejos domésticos, é uma qualidade essencial, seja na máxima valia de cada habitação relativamente a diversos grupos de utentes e de agregados familiares que a usem ao longo de gerações, seja na sua versatilidade de resposta ao uso pela mesma família ao longo dos anos e designadamente por pessoas que vão envelhecendo, mas que devem poder continuar a contar com a “sua” habitação.

·      Influência da ocupação habitacional no dimensionamento doméstico.

As questões ligadas à ocupação tendencial específica de um dado espaço doméstico, por exemplo, por uma família com crianças, por um jovem sozinho, ou por um casal de idosos, pode/deve influenciar a “tipologia” do respetivo dimensionamento (ex., maior ou menor espaciosidade) e, naturalmente, a sua estruturação e os seus conteúdos funcionais.

·      Hierarquização espacial e funcional.

Embora a bem conhecida hierarquização espacial e funcional seja criticável, designadamente, quando aplicada de forma rígida e pouco sensível a aspetos de adaptabilidade e multifuncionalidade domésticos, ela pode continuar a ter aspetos positivos muito associados a exigências e desejos de privacidade e/ou sossego e mesmo algum isolamento, pelo que será sempre uma ideia de organizaç\ão habitacional a considerar e aplicar. 

·      Microzonamento doméstico.

De certa forma numa recuperação parcial, particularizada e muito diversificada da criticada ideia de expressivo zonamento doméstico em diversas áreas de atividade, podemos avançar no que se poderá designar de microzonamento doméstico, numa perspetiva que passa para espaço/compartimento a possibilidade/capacidade de integrar umconjunto de pequenas, diversificadas, interpenetráveis e temporalmente mutantes “micro” áreas funcionais ou de atividade(s).

·      Importância da socialização na estruturação e na espaciosidade domésticas.

Finalmente, nesta pequena súmula de aspetos que influenciam as propostas organizativas para as zonas domésticas, salienta-se a importância que sempre deverá ter o apoio ao convívio/socialização na respetiva estruturação e espaciosidade domésticas; uma matéria, frequentemente, esquecida ou criticamente menorizada por estarmos a tratar do designado “espaço privado”.

 

Nota final:

Num próximo texto serão um pouco mais desenvolvidas estas matérias, mas desde já se aponta a sua importância, designadamente, quando aplicadas a soluções habitacionais espacialmente muito condicionadas, como é o caso das soluções de habitação de interesse social.


O presente artigo corresponde a uma edição ampliada, modificada e revista do artigo que foi editado na Infohabitar, em 21/07/2014, com o n.º 492.

Notas editoriais:

(i) Embora a edição dos artigos editados na Infohabitar seja ponderada, caso a caso, pelo corpo editorial, no sentido de se tentar assegurar uma linha de edição marcada por um significativo nível técnico e científico, as opiniões expressas nos artigos e comentários apenas traduzem o pensamento e as posições individuais dos respectivos autores desses artigos e comentários, sendo portanto da exclusiva responsabilidade dos mesmos autores.

(ii) No mesmo sentido, de natural responsabilização dos autores dos artigos, a utilização de quaisquer elementos de ilustração dos mesmos artigos, como , por exemplo, fotografias, desenhos, gráficos, etc., é, igualmente, da exclusiva responsabilidade dos respetivos autores – que deverão referir as respetivas fontes e obter as necessárias autorizações.

(iii) Para se tentar assegurar o referido e adequado nível técnico e científico da Infohabitar e tendo em conta a ocorrência de uma quantidade muito significativa de comentários "automatizados" e/ou que nada têm a ver com a tipologia global dos conteúdos temáticos tratados na Infohabitar e pelo GHabitar, a respetiva edição da revista condiciona a edição dos comentários à respetiva moderação, pelos editores; uma moderação que se circunscreve, apenas e exclusivamente, à verificação de que o comentário é pertinente no sentido do teor editorial da revista; naturalmente , podendo ser de teor positivo ou negativo em termos de eventuais críticas, e sendo editado tal e qual foi recebido na edição.


Infohabitar, Ano XVII, n.º 761

 

Sobre a oferta de diversas propostas organizativas para as zonas domésticas – Infohabitar # 761

 

Infohabitar

Editor: António Baptista Coelho

Arquitecto/ESBAL – Escola Superior de Belas Artes de Lisboa –, doutor em Arquitectura/FAUP – Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto –, Investigador Principal com Habilitação em Arquitectura e Urbanismo no Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), em Lisboa.

 

abc.infohabitar@gmail.com

abc@lnec.pt

 

Revista do GHabitar (GH) Associação Portuguesa para a Promoção da Qualidade Habitacional Infohabitar – Associação com sede na Federação Nacional de Cooperativas de Habitação Económica (FENACHE).

 

Sem comentários :