terça-feira, abril 07, 2020

Desenhos a sépia de velhos/novos espaços urbanos e naturais (II) – Infohabitar # 725


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Infohabitar, Ano XVI, n.º 725

Desenhos a sépia de velhos/novos espaços urbanos e naturais (II) – Infohabitar # 725

Por António Baptista Coelho (imagens e textos)
Notas prévias:

Muito estimados leitores da Infohabitar, caros amigos,
continuamos a “batalha” contra o inimigo invisível, julgo, agora um pouco mais habituados ao teletrabalho e ao confinamento doméstico e talvez com um sentido de esperança e de confiança no futuro próximo mais afirmado, tendo-se em conta os últimos dados da pandemia em Portugal.
É, agora, a altura de manter a força e procurar reforçar o cumprimento das indicações para “estar em casa” e manter a distância social (por afastamento e por máscara); só assim poderemos proteger-nos e proteger os outros.
E não tenhamos dúvida de que quem sai de casa sem ser por razões plenamente justificadas está, realmente, a  colocar em risco o esforço de confinamento que todos estamos a fazer e, no mínimo, a contribuir para o prolongamento desta situação.
Realmente, nestes tempos tão difíceis para todos e verdadeiramente inacreditáveis (até para velhos amadores de ficção, como é o meu caso e, por favor, não considerem este último comentário menos respeitoso, pois trata-se, apenas, de colocar, por escrito, um pensamento que, provavelmente, tem ocorrido, a muitos de nós, nestas últimas semanas), é fundamental, por um lado, e tal como acima se referiu, atender e cumprir, fielmente, entre outros aspetos, as indicações de confinamento doméstico – e não tenhamos quaisquer dúvidas de que “ficar em casa” é a única forma de nos protegermos, de protegermos os outros e de facilitarmos o heroico esforço dos profissionais de saúde e de tantos outros que não podem estar em teletrabalho (e são muitos e importantes os testemunhos que destacam a importância vital do isolamento doméstico no combate ao vírus) – e, por outro lado, procurar construir, gradual, mas seguramente, uma fundamental rotina de atividades, entre as quais : (i) os cuidados de higienização própria e do espaço doméstico, (ii) os cuidados de distância social no espaço de uso público (distância física e máscara) e mesmo, sempre que possível, no próprio espaço doméstico, (iii)a prática das mais variadas atividades complementares e de lazer adequadas ao espaço doméstico e (iv) o desenvolvimento de uma razoável e bem saudável disciplina de teletrabalho doméstico.
E é com este sentido que iremos procurar assegurar a continuidade das edições semanais da Infohabitar, tanto com novos artigos sobre aspetos teórico práticos que se poderão, talvez, designar como mais “consistentes” – por exemplo, o retomar da Série “Habitar e Viver Melhor” e o desenvolvimento de uma nova Série editorial dedicada à “Habitação Colaborativa Intergeracional” –, como através da reedição, eventualmente comentada, de artigos editados nos primeiros anos da Infohabitar, e ainda através da continuidade de uma edição comentada de esquissos/desenhos, seja numa perspectiva da própria prática do desenho livre, seja considerando, especificamente, os aspectos de arquitectura e de habitar que estejam, eventualmente, associados a cada tema desenhado.
Finalmente, faz-se um apelo sincero:
. a novos artigos que nos possam ser enviados com o objetivo da respetiva edição, que poderão ser de variada índole, desde que referidos ao grande tema do habitat humano  - ex., desde temas estruturados e/ou inovadores, a reflexões específicas sobre determinada matérias (e o confinamento doméstico proporciona sem dúvida muita matéria de reflexão teórico-prática sobre o que são e o que poderiam ser os nossos “mundos” domésticos);
. a recensões sobre livros ou filmes, conjuntos de imagens, pelo menos, minimamente apresentadas e/ou comentadas, como fotos e esboços (cuidado com a autoria), etc.
. e a “simples” comentários relativos a determinados artigos, comentários estes que deverão ser acompanhados pela referência de autorização para divulgação editorial (caso assim o desejem).
E tais submissões de propostas de artigos poerão ser feitas para o mail: abc.infohabitar@gmail.com ao meu cuidado.
Para já é tudo, desejos de boas leituras e na próxima semana voltaremos.

Com saudações calorosas e desejos de muita força e de boa saúde,
Lisboa, Encarnação, em 6 de abril de 2020
António Baptista Coelho
Editor da Infohabitar (em teletrabalho doméstico)

Introdução explicativa
Como referência prática de apoio à leitura, lembra-se que no artigo Infohabitar n.º 711, intitulado “Uma primeira reflexão sobre velhos/novos espaços urbanos”, se procurou desenvolver, esquematicamente, a ideia de que, nos tempos de hoje, quando se pretende imprimir ao espaço urbano uma renovada marca pedonal e de meios “suaves” de deslocação, facilitados, designadamente, pelas novas tecnologias de informação e comunicação e pelo crescimento do uso dos veículos pouco poluentes, será talvez altura de podermos reavaliar e reintroduzir soluções de Arquitetura urbana, que integrem, e profundamente – portanto, no “pleno uso” dos respetivos e muito amplos leques de tipologias de espaços e aspetos de pormenor – morfologias de edifícios e de espaços públicos, sendo ambas, expressivamente, marcadas pela escala humana, e pela diversidade e mutação de agradáveis e atraentes sequências de imagens, verdadeiramente catalizadoras do movimento e da permanência.
No referido artigo Infohabitar n.º 711, intitulado “Uma primeira reflexão sobre velhos/novos espaços urbanos”, realizou-se, então, uma abordagem de enquadramento da temática dos velhos/novos espaços urbanos, seguindo-se o apontamento de  alguns desenvolvimentos recentes e de referência, que apoiam estas ideias, desenvolvendo-se, sequencialmente a matéria do que se considera poder ser uma estratégica variabilidade urbana, que se julga poder ser até facilitada pelas novas e potentes ferramentas de projeto e de visualização do mesmo.
E salienta-se, finalmente, que se julga que boa parte destas reflexões ilustradas poderão ser úteis em termos de apoio à prática, quer no contexto de novas intervenções, quer no âmbito de regeneração urbana, respeitando-se, naturalmente, a essencial adequação e/ou adaptação a cada situação específica e a estratégica caraterização de cada operação.
Alguns desenhos comentados
Em seguida e tendo-se por base a apresentação de alguns desenhos à mão livre (7 esboços coloridos a sépia), comentam-se as matérias da Arquitetura do habitar, associáveis às temáticas que acabaram de ser referidas, mas não se descurando alguns brevíssimos comentários relativos ao desenvolvimento dos respetivos desenhos.


Fig. 01: tal como se referiu na primeira parte deste artigo (parte “I”), ilustra-se, neste esboço, um pormenor do caminho pedonal que que serpenteia no agradável jardim urbano que rodeia a igreja de Santo Eugénio na Encarnação, um espaço que se julga ter sido uma das primeiras obras do arq.º paisagista Gonçalo Ribeiro Telles (Jardim da Praça de Santo Eugénio ou Jardim da Encarnação, Bairro da Encarnação, Lisboa, 1951).
Temos aqui, novamente, o “encenar” da natureza no âmbito de um quadro físico limitado – retângulo de cerca de 100x150m, mas incluindo-se aqui uma grande zona de implantação da Igreja e de estacionamento; e daqui se retira ser possível proporcionar esta natureza encenada e intensificada através de espaços que nem são especialmente grandes, que foram pormenorizados no sentido de se menorizarem os cuidados de manutenção e onde, além disso, se integrarm diversos tipos de equipamentos – neste caso: Igreja, zona de jardim com razoável continuidade, espaços de sentar diversificados e, mais recentemente, um excelente parque infantil.
Um desenho a sépia clara que privilegiou um tratamento a linha fina e a aguadas “livres”; como que uma “brincadeira” de apontamento a linhas e aguadas.


Fig. 02: continuamos no Jardim da Praça de Santo Eugénio, neste caso através de uma vista que realça, especificamente, o referido sentido de “cena” natural intensificada pelo próprio projeto urbano e de arquitectura paisagista, designadamente, através de uma quase-passagem sob os ramos de duas pequenas árvores e de um reforço do sentido de profundidade, que é também intensificado pelo colear do caminho pedonal, que vai permitindo uma sequência estimulantemente variada de pontos de vista, e pela judiciosa plantação de variadas árvores e arbustos, cujos troncos vão reafirmando esse sentido de profundidade e de perspetiva.
Um desenho que procurou afirmar a força do esboço, seja em linha seja a “negro” (pontualmente), servindo-se esses sentido de profundidade e de perspetiva, também com a estratégica aplicação de zonas bem escuras mais em primeiro plano; e a propósito lembrar o sábio conselho do saudoso amigo, grande mestre e grande amador do desenho, o arquitecto Raúl Hestnes Ferreira, que uma vez me disse que em cada desenho devem sempre existir zonas bem brancas e pelo menos uma zona de negro/negro (a expressão dele não foi bem esta, mas era isto o que ele queria dizer); e aliás outro amigo e mestre, o escultor Matos Simões, que foi quem me ensinou parte das bases práticas do desenho livre, também referia quase o mesmo, quando defendia que o papel não desenhado tem de estar perfeitamente limpo e que tem de haver sempre contrastes maximizados entre esse “branco” e zonas traçadas intensamente a “negro” e mesmo marcadas pela textura do lápis ou de qualquer outro elemento de desenho que usarmos.



Fig. 03: tal como se referiu na primeira parte deste artigo (parte “I”) , ilustra-se, neste esboço, uma vista de uma zona pedonal em Olivais Norte, Lisboa, “centrada” em um dos edifícios que correspondem ao Prémio Valmor e Municipal de Arquitectura de 1967, o primeiro (e julga-se que o único) Prémio Valmor atribuído a um edifício de habitação de interesse social, com projeto dos arquitectos Nuno Teotónio Pereira, António Pinto de Freitas e Nuno Portas – existem, julgo, cinco edifícios com este mesmo projeto, marcando as extremidades Sul e Norte de Olivais Norte.
Para quem não conheça esta solução edificada sublinha-se que ela é, de facto, excelente a variados níveis, conseguindo, designadamente: uma mistura tipológica assinalável de três tipologias em cada andar (1 T4, 2 T3 e 1 T1); um ambiente comum único marcado por um patamar extremamente amplo, em cada andar, desenvolvido praticamente como se fosse uma extensão da “rua” e tratado com um banco para sentar e um elemento artístico; e assumindo um atraente carácter em termos de imagem urbana, que se procura ilustrar no esboço, privilegiando um sentido de “peça única”, bem variada a toda a volta e em altura e que “joga” de modo extremamente cativante com a envolvente natural.
O esquisso procura receber tais “notas”, seja em termos dos rabiscos com continuidade que marcam a árvore em primeiro plano e o edifício em segundo, seja em termo do acentuar dos tons das aguadas; procurando-se que a “grafia”, as linhas ou traços, se vão prolongando entre o verde horizontal exterior, a árvore e o edifício.


Fig. 04: continua-se numa ilustração esquissada do mesmo edifício – aliás um dos temas que mais desenhei em Olivais Norte desde há anos, pois é excecionalmente apelativo, atraente; e neste caso, sendo outra estação do ano, podemos sentir que a harmonia que existia, acima, entre as verticalidades da construção (uma torre bem humanizada, e a este tema voltaremos em artigo específico) e da árvore despida de folhas, permanece, embora naturalmente com outros equilíbrios formais, quando o maciço arbóreo está em plena vegetação, “casando-se” natureza e edificado de modo extremamente sensível e efetivo; e neste resultado há também e evidentemente mérito para a arquitetura paisagista e para a integração local urbana e paisagística, conseguindo-se uma rara unidade entre natureza e construção – também assim mais humanizada.
O desenho em si procurou reforçar as manchas ocres esverdeadas e suas mudanças “livres” de tonalidades, apenas minimamente acentuadas com alguns traços sem continuidade e posteriormente realizados. A sombra mais escura das árvores, em primeiro plano, acentua estrategicamente o sentido de profundidade do desenho.


Fig. 05: um desenho quase livre de um recanto “verde” de Olivais Norte, cujo interesse se localiza mais em tentativas de “geometrizar” de modo razoável os elementos naturais e de conjugar a aplicação de aguadas com marcadores aguareláveis e de ponta larga.


Fig. 06: começando-se, neste caso, mais pelo desenho e fazendo-se uma autocrítica, considera-se que este apontamento poderá ser melhorado com uma “simples” reaplicação de algumas linhas negras verticalizadas e acentuando os troncos das árvores que parecem dançar e que proporcionam um excelente e orgânico contraponto com o edifício muito regular e “pacífico” em segundo plano.
Abordando-se, agora, sinteticamente aspetos de urbanismo e habitar, regista-se que o apontamento se refere a um dos  “impasses-tipo” que marcam uma larga zona de cintura de Olivais Norte, caracterizados pelo desenvolvimento de simples edifícios extremamente baratos em termos de construção, mas com um excelente traçado arquitetónico, contíguos a vias de tráfego misto (peões e veículos) e a troços de verde urbano bem intensos e judiciosos em termos da sua plantação e objetivos formais; e sublinha-se o caráter pioneiro deste tipo de espaços em Portugal pois trata-se da década de 1960 – e também a estas matérias pretendemos voltar com mais vagar e pormenor.


Fig. 07: finalmente e tal como aconteceu na Parte “I” deste artigo, com o presente esquisso sublinha-se, essencialmente, a diversidade estruturante entre dois tipos de espaço urbano – modernista e “tradicional” – através uma vista esquissada sobre a Colina do Castelo em Lisboa, deixando de haver espaço entre edifícios, a não ser, concentradamente, em praças/largos urbanos; edifícios que passam a surgir, basicamente, como uma verdadeira colina edificada, e, note-se que, por regra, sem edifícios protagonistas a não ser, talvez o Castelo e um ou outro elemento urbano um pouco distinto do conjunto.
Em termos específicos do esboço procurou-se cumprir a regra de deixar espaços bem “brancos” – céu e algumas paredes de edifícios e zonas pavimentadas mais soalheiras – e de marcar alguns espaços e elementos bem “negros”, neste caso algumas rodovias, paredes e vãos em sombra e um elétrico e sua sombra bem em primeiro plano, reforçando-se contrastes e sublinhando-se a profundidade urbana, aliás acentuada por uma via que atravessa e penetra parte da colina edificada.

Notas editoriais:
(i) Embora a edição dos artigos editados na Infohabitar seja ponderada, caso a caso, pelo corpo editorial, no sentido de se tentar assegurar uma linha de edição marcada por um significativo nível técnico e científico, as opiniões expressas nos artigos e comentários apenas traduzem o pensamento e as posições individuais dos respectivos autores desses artigos e comentários, sendo portanto da exclusiva responsabilidade dos mesmos autores.
(ii) No mesmo sentido, de natural responsabilização dos autores dos artigos, a utilização de quaisquer elementos de ilustração dos mesmos artigos, como , por exemplo, fotografias, desenhos, gráficos, etc., é, igualmente, da exclusiva responsabilidade dos respetivos autores – que deverão referir as respetivas fontes e obter as necessárias autorizações.
(iii) Para se tentar assegurar o referido e adequado nível técnico e científico da Infohabitar e tendo em conta a ocorrência de uma quantidade muito significativa de comentários "automatizados" e/ou que nada têm a ver com a tipologia global dos conteúdos temáticos tratados na Infohabitar e pelo GHabitar, a respetiva edição da revista condiciona a edição dos comentários à respetiva moderação, pelos editores; uma moderação que se circunscreve, apenas e exclusivamente, à verificação de que o comentário é pertinente no sentido do teor editorial da revista; naturalmente , podendo ser de teor positivo ou negativo em termos de eventuais críticas, e sendo editado tal e qual foi recebido na edição.


Infohabitar, Ano XVI, n.º 725

Desenhos a sépia de velhos/novos espaços urbanos e naturais (II) – Infohabitar # 725


Infohabitar
Editor: António Baptista Coelho
Arquitecto/ESBAL – Escola Superior de Belas Artes de Lisboa –, doutor em Arquitectura/FAUP – Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto –, Investigador Principal com Habilitação em Arquitectura e Urbanismo no Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), em Lisboa.


Revista do GHabitar (GH) Associação Portuguesa para a Promoção da Qualidade Habitacional Infohabitar – Associação com sede na Federação Nacional de Cooperativa de Habitação Económica (FENACHE).

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