INFOHABITAR, ANO X, N.º 503
Antes do artigo da semana a Infohabitar tem todo o gosto de divulgar o
Seminário Internacional Planeamento Cultural Urbano em
Áreas Metropolitanas
Revitalização dos Espaços
Pós-Suburbanos
6 e 7 de Novembro 2014
Acessível em:
http://sipcuam-almada2014.fa.ulisboa.pt/openconf.php
Trata-se de uma temática extremamente atual e interessante, como fica claro no seguinte texto de apresentação e nos respetivos temas a tratar:
As cidades contemporâneas, que transformaram a sua imagem e economia, pensaram o seu renascimento na perspetiva de um desenvolvimento cultural, em resposta às mudanças económicas e sociais em curso. A arte e a cultura, entendidas em termos gerais, passaram a ser consideradas um requisito direto da qualidade de vida e um direito social.
Pode o Planeamento Cultural ser entendido como instrumento da política de ordenamento do território e do urbanismo, ao lado de outras figuras do planeamento e da construção das cidades?
Nas áreas metropolitanas, onde o património construído não possui tradição, pode o património cultural imaterial ser tomado como referência para uma estratégia de formação da identidade do território e das comunidades urbanas?
Sobre estas questões o Seminário "Planeamento Cultural Urbano em Áreas
Metropolitanas", pretende ser uma oportunidade de debate técnico e
científico na perspetiva da criação de uma engenharia da cultura que usando uma
análise contemporânea, examine como e porque as culturas têm sido planeadas e
de que forma tem sido considerada a inclusão das condições culturais no
planeamento das cidades, visando o desenvolvimento sustentado e a qualificação
dos espaços de crescimento rápido e não programado das áreas pós-suburbanas.
A economia cultural das cidades, associada ao turismo, à tecnologia e à mudança
social, tende a suportar a produção de uma indústria cultural, a qual cria por
sua vez uma poderosa vantagem competitiva que ajuda a reforçar o sentido de
identidade entre as comunidades urbanas.
Temas a tratar no Seminário:
Espaço pós-suburbano, património imaterial e movimento
associativo / Post-suburban space, intangible heritage and associative
movement.
Arte e cultura, factores de identidade urbana e ativação da
economia / Art and culture, factors of urban identity and economy activation.
Engenharia da cultura e planeamento urbano / Culture engineering
and urban planning.
Processos de inovação e criatividade na revitalização do espaço pós-suburbano / Inovation and creativity process in post-suburban space revitalization.
Artigo da semana da Infohabitar
Artigo LXII da Série habitar e viver melhor
Entrar na
habitação, o vestíbulo de entrada
António Baptista Coelho
Continuando a Série editorial sobre "habitar e viver
melhor", na qual temos acompanhado uma sequência espacial desde a
vizinhança de proximidade urbana e habitacional até ao edifício multifamiliar,
e neste os seus espaços comuns, vamos, agora, falar com algum detalhe sobre os
espaços que constituem os nossos “pequenos” mundos domésticos e privativos,
refletindo sobre as diversas facetas que os qualificam.
Primeiro viajaremos pelos espaços domésticos comuns, isto
é aqueles que são usados por todos os habitantes de uma dada casa ou
apartamento numa base geral de uso partilhado e de alguma comunidade; depois
iremos até aos espaços domésticos privativos, portanto aqueles mais amigos de
um uso individual, ou muito ligado ao casal.
São os seguintes os espaços domésticos comuns a abordar,
sequencialmente, em artigos desta série: vestíbulo de entrada, lavabo, corredor e zonas de passagem, sala ou zona
de estar, cozinha, áreas de serviço para arrumações, verdadeiras pequenas áreas
de serviço - lavandaria e rouparia, zona de refeições ou sala de jantar, casa
de banho, varanda e outras zonas exteriores privadas elevadas como pátios e
pequenos quintais, virtualidades domésticas do estacionamento em garagem.
No presente artigo serão abordados diversos
aspetos a ter em conta no projeto de espaços de entrada habitacionais -
vestíbulos.
(Nota geral: porque boa parte dos textos que servem de
base a esta série editorial estão elaborados desde há algum tempo, eles não
cumprem as regras do Acordo Ortográfico).
Opções de vestíbulo
A definição de vestíbulo refere-se ao “espaço entre a via
pública e a entrada dum edifício”, ao “espaço entre a porta dum edifício e a
principal escadaria interior” e a “uma cavidade orgânica que serve de entrada a
outra” (Novo Dicionário da Língua Portuguesa, de Francisco Torrinha, Porto,
Domingos Barreira Editor, 1945).
Uma ideia que pode ficar é que o vestíbulo, ou espaço de
entrada numa habitação, corresponde a um espaço de limiar e de transição entre
o espaço público ou comum (no caso de se tratar de um edifício multifamiliar) e
o espaço doméstico privado, embora este considerado também numa perspetiva de
espaço doméstico comum.
Seja qual for a forma, a dimensão e as características de
maior ou menor encerramento ou de maior ou menor autonomia vivencial de um
vestíbulo doméstico é essencial, para que haja satisfação no seu uso, que ele
cumpra tais condições; condições que têm a ver, essencialmente, com algum
desafogo espacial próprio e com uma relação visual controlada com os restantes
espaços da habitação.
É, assim, importante que num vestíbulo doméstico seja
possível receber alguém estranho à casa numa situação de porta aberta ou, até,
eventualmente, entreaberta, sem haver a tendência natural a convidar essa
pessoa a entrar, o que obrigará a condições adequadas nos próprios patins
comuns. E será interessante que seja possível convidar o visitante a entrar,
mas recebendo-o, estritamente, no próprio vestíbulo, uma situação que obrigará
quer a um dimensionamento razoavelmente folgado deste espaço, quer a uma sua
situação na habitação que, num caso destes, não provoque uma desagradável
intrusão no espaço doméstico.
Associado a estes aspectos podemos concluir que o
vestíbulo é um espaço onde devemos poder mostrar o que queremos mostrar da
nossa casa, e, especificamente, os elementos de arranjo interior que mais
apreciamos e que mais revelam a identidade que queremos revelar a quem nos
visita; e para tal há que ter um mínimo de condições de espaciosidade e de
autonomia de arranjo deste espaço relativamente ao resto da casa.
Havendo espaço e ambiente para tais condições existirão,
sem dúvida, condições de funcionalidade para apoio a diversas actividades
associadas com o acesso ao nosso mundo doméstico e com a saída, deste mundo,
para a rua, que poderá, passar pelo espaço intermédio e comum do patim, da
galeria e dos restantes espaços de uso comum de um dado edifício.
E é muito interessante este papel de intermediação,
essencialmente doméstica, associado a um outro papel de intermediação comum ou
colectiva.
O espaço de entrada pode ser também um espaço integrado
com outro espaço da casa claramente afirmado, e é possível criarem-se
conjugações extremamente interessantes, seja, mais facilmente em edifícios
unifamiliares – em que o limite está na própria imaginação -, seja em
apartamentos de multifamiliares onde é, realmente, possível desenvolver
associações eficazes e estimulantes, por exemplo entre um espaço de cozinha convivial
e a única entrada na habitação, ou entre uma entrada mais “de cerimónia” e um
espaço de refeições mais cuidado, mas sempre desde que as condições de conforto
ambiental fundamentais estejam garantidas, por exemplo em termos de luz natural
e de ventilação.
Vestíbulo: associações interessantes
A existência de luz natural é uma das associações pouco
frequentes, nos casos de edifícios multifamiliares, mas muito estimulantes na
entrada de uma habitação.
Uma outra associação refere-se a uma equilibrada
continuidade ambiental entre os átrios privados e os espaços públicos, comuns
ou privados que lhes dão acesso.
Quando a relação é feita, directamente, com o espaço
exterior a entrada poderá ser decomposta numa zona de passagem que funciona
como “quebra-vento”, conseguindo-se, tanto um melhor isolamento térmico e
acústico do interior do fogo e a sua acrescida privatização, como uma maior
funcionalidade/limpeza do interior doméstico; nesse espaço as pessoas limpam-se
da sujidade que arrastam da rua, preparando-se para entrar num espaço mais
protegido e íntimo.
Vestíbulo:
hábitos interessantes
Em termos de situações que eram habituais e que faziam
algum ou muito sentido, deseignadamente, num habitar tradicional salienta-se a
possibilidade de se entrar quase directamente para uma zona de referições mais
formal, um pouco numa ideia de se ser recebido e de se passar, com
naturalidade, para uma recepção à mesa, bem acompanhada e calorosa; e esta é
uma possibilidade que pode ter interessantes aproveitamentos seja quando há
áreas reduzidas, seja quando há um espaço exterior privativo na continuidade do
vestíbulo.
Ainda uma outra associação refere-se, naturalmente, a uma
relativa continuidade entre o entrar em casa e o espaço de estar, situação que
pode ter aproveitamentos espaciais estimulantes, mas que, no entanto, estará
sempre associada à existência de um outro acesso à habitação, um acesso
alternativo que propicie relações mais discretas e íntimas.
Vestíbulo:
aspectos motivadores
Segundo Sven Thiberg, a entrada pode subdividir-se em
duas zonas, sendo uma delas um vestíbulo de entrada apenas integrando a porta
de entrada e equipamentos de apoio à entrada e à saída na habitação (não
existindo outras portas nesta zona), e sendo a outra um espaço em continuidade
com o primeiro, mas servindo já, e fortemente, a circulação interior no fogo (1);
desta forma desenvolve-se como que uma relação estratégica e simultânea de
separação e de ligação.
Vestíbulo:
problemas correntes
Os problemas mais frequentes
estão ligados, naturalmente, à falta de espaço, e não se assumindo uma clara
ausência de vestíbulo, obrigando-se as pessoas a manobras, quase "ridículas",
quando entram e saem, aspectos estes que se tornam ainda mais críticos quando
há visitas.
Associada a esta matéria temos
os problemas, frequentemente graves, da falta de privacidade que podem gerar a
quase inutilização do uso de uma sala-comum para a qual abra, sem qualquer
protecção visual, a porta da habitação.
E há que considerar que esta
questão da privacidade é fundamental, no sentido de se procurar uma verdadeira
satisfação doméstica, num bom equilíbrio entre privacidade e sociabilidade,
pois quando não existe um vestíbulo que bloqueie vistas indesejadas sobre o
interior doméstico não é só o “à vontade” da vivência na habitação que fica em
risco, mas também a possibilidade do convívio, nunca bem-vindo, porque sempre
“obrigatório”.
Finalmente, os problemas também
se ligam ao desenvolvimento de amplos espaços de entrada sem condições para
poderem ser usados como espaços úteis (por exemplo, sem luz natural e sem uma
configuração adequada), mas dispondo de um amplo dimensionamento e que acabam,
assim, por constituir verdadeiras zonas "mortas" no “centro
estratégico” da habitação.
Vestíbulo:
questões levantadas (dimensionais e outras)
A questão do dimensionamento da
entrada tem muito a ver com as condições de espaciosidade disponíveis nos
espaços comuns do edifício, pois são muito diferentes as condições
proporcionadas por um pequeno “hall” privado servido por um grande patim comum
com uma zona semi-privatizada contígua à porta do fogo, ou aquelas condições
permitidas por um pequeno “hall” de entrada privado e contíguo a um espaço
comum apertado e basicamente de passagem.
Considera-se interessante que
num vestíbulo se possa conversar guardando distâncias convenientes, entre os
interlocutores, e que se possa abrir e fechar a porta, a partir do interior da
habitação, facilitando a entrada a outra pessoa que transporte, por exemplo, um
objecto volumoso.
Considera-se, assim, que o
vestíbulo deve proporcionar um desafogo espacial equilibrado no apoio a um
conjunto de acções de recepção e de passagem entre a habitação e o seu
exterior, afectando-se ao mínimo a vida doméstica; havendo desafogo espacial o
vestíbulo pode assumir funções específicas como mais um compartimento da
habitação, mas para tal deve ter adequadas condições ambientais e de
configuração, caso contrário acaba por ser um espaço quase “perdido”.
Vestíbulo:
novidades, dúvidas e tendências (ex., trabalho em casa; idosos, etc.)
Uma questão importante é que o
vestíbulo proporcione a melhor visibilidade e o melhor controlo possível
relativamente ao acesso à habitação, uma matéria que deverá ser aprofundada de
modo a poder-se ter um máximo de visibilidade desde o interior da habitação, com
a porta fechada, sobre a zona contígua e exterior à habitação, com um mínimo de
espaços onde seja possível a alguém esconder-se.
Considerando-se o
desenvolvimento, cada vez mais frequente, do trabalho profissional em casa,
será de privilegiar a existência de vestíbulos bem separados do restante espaço
doméstico com excepção de um compartimento ou de parte de um compartimento onde
se possa desenrolar essa actividade; zonas estas que poderão ser,
eventualmente, ainda mais autonomizadas da restante habitação, gozando, por
exemplo, de um acesso autónomo e da relação directa com uma pequena casa de
banho. E é interessante que uma tal possibilidade poderá permitir, em
alternativa ou cumulativamente, o apoio ao desdobramento familiar (por exemplo,
jovens ou idosos vivendo junto da restante família, mas com autonomia).
E é interessante lembra que na
era das tecnologias de informação pode ser que o vestíbulo doméstico possa ser
ainda caracterizado por outros aspectos que façam sobressair a relação
estimulante com a vizinhança e, indirectamente, com a cidade.
Finalmente, importa sublinhar
que o vestíbulo doméstico deve ser um espaço de algumas funcionalidades e de um
máximo de identidade(s), e deve ser também, verdadeiramente, um limiar, que nos
privatize em nossa casa e que nos relacione estrategicamente com o seu
exterior.
Notas:
(1) Sven
Thiberg(Ed.), "Housing Research and Design in Sweden", p. 164.
Notas editoriais:
· (i) Embora
a edição dos artigos editados na Infohabitar seja ponderada, caso a caso, pelo
corpo editorial, no sentido de se tentar assegurar uma linha de edição marcada
por um significativo nível técnico e científico, as opiniões expressas nos
artigos e comentários apenas traduzem o pensamento e as posições individuais
dos respectivos autores desses artigos e comentários, sendo portanto da
exclusiva responsabilidade dos mesmos autores.
· (ii) De
acordo com o mesmo sentido, de se tentar assegurar o referido e adequado nível
técnico e científico da Infohabitar e tendo em conta a ocorrência de uma
quantidade muito significativa de comentários "automatizados" e/ou
que nada têm a ver com a tipologia global dos conteúdos temáticos tratados na
Infohabitar e pelo GHabitar, a respetiva edição da revista condiciona a edição
dos comentários à respetiva moderação, pelos editores; uma moderação que se
circunscreve, apenas e exclusivamente, à verificação de que o comentário é
pertinente no sentido do teor editorial da revista; naturalmente , podendo ser
de teor positivo ou negativo em termos de eventuais críticas, e sendo editado
tal e qual foi recebido na edição.
INFOHABITAR Ano X, nº 503
Artigo LXII da Série habitar e viver melhor
Entrar na habitação, o vestíbulo de entrada
Editor: António Baptista Coelho – abc.infohabitar@gmail.com
GHabitar
(GH) Associação Portuguesa para a Promoção da Qualidade Habitacional
Edição: José Baptista Coelho - Lisboa, Encarnação - Olivais
Norte.
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