Nota editorial:
Com o presente artigo tem continuidade uma nova série editorial no Infohabitar, que à semelhança de outras séries da nossa revista, terá uma edição alternada por outros artigos tematicamente autónomos ou também integrados em séries editoriais específicas.
Iremos editar “Casos de Referência dos primeiros 5 anos do Prémio IHRU” – Prémio Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana –, numa iniciativa que irá divulgar imagens e comentários técnicos de descrição e análise sumária de alguns dos candidatos às primeiras cinco edições daquele Prémio e que se fundamenta no interesse que sempre teve, tem e terá a divulgação de boas práticas de habitat (num sentido lato e verdadeiro de habitat), neste caso associadas a quatro grandes linhas de actividade específicas e que são, em seguida, apontadas:
(i) Promoção de novos conjuntos de habitação de interesse social - numa faceta de actividade em que o Estado e os seus parceiros têm de continuar activos, embora numa perspectiva mais delimitada e provavelmente cada vez mais atenta à adequação das soluções específicas aplicadas e sua qualidade arquitectónica.
(ii) Reabilitação de velhos edifícios e de conjuntos edificados, também com o objectivo específico de disponibilização de habitação de interesse social – um objectivo cujo interesse aqui se sublinha de forma bem evidenciada – ou de outras categorias habitacionais; estas acções de reabilitação habitacional estão e devem estar estrategicamente integradas em centros históricos e em outras malhas urbanas carentes de vitalização e melhoria física, numa faceta de actuação que, hoje em dia, assume importância estratégica e multifacetada, seja para os respectivos habitantes, seja para a cidade que se quer urgentemente mais e melhor habitada.
(iii) Reabilitação de velhos edifícios não-habitacionais para melhoria das suas condições de uso e de conforto no uso, considerando a manutenção das suas funcionalidades básicas ou a respectiva reconversão, total ou parcial, a novos usos; uma faceta de actuação também vital numa perspectiva de melhoria consolidada e durável da globalidade do tecido urbano.
(iv) (e finalmente) Reabilitação de espaços exteriores públicos ou de uso público, numa faceta de actuação com uma importância igualmente estratégica e ainda não devidamente considerada na sua urgência, no seu interesse e nas suas exigências específicas de projecto, obra e manutenção/gestão; afinal, será de uma adequada redinamização do uso dos nossos espaços públicos urbanos, em termos de frequência e intensidade de uso, que decorrerá boa parte da vitalização urbana dessas áreas e não bastam arranjos “de aspecto” para assegurar o êxito destas operações.
Em termos informativos refere-se que o Júri do Prémio IHRU integra representantes das seguintes instituições: Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana, Laboratório Nacional de Engenharia Civil, Associação Portuguesa dos Arquitectos Paisagistas, Ordem dos Arquitectos e Ordem dos Engenheiros. Em 2007 e porque este Prémio constituiu uma edição única do Prémio INH/IHRU (o Instituto Nacional de Habitação deu lugar ao IHRU no decurso do Prémio), o Júri integrou, ainda, representantes ANMP, da AECOP, da ANEOP e da FENACHE.
Numa primeira reunião do Prémio IHRU é feita uma pré-selecção dos empreendimentos a visitar e é elaborado um programa de visitas. Na última reunião, efectuada após as deslocações aos empreendimentos seleccionados, e após a revisão comentada das respectivas visitas (imagens projectadas) e de uma natural e sistemática discussão técnica o Júri atribui os respectivos Prémios e Menções.
Mais se esclarece que os candidatos aos Prémio IHRU, um prémio exclusivamente honorífico, concorrem nas variantes Construção ou Reabilitação: sendo que na primeira variante (Construção), há várias vertentes/categorias de concurso - Promoção Municipal e Regional, Promoção Cooperativa e Promoção Privada – enquanto na variante Reabilitação há, actualmente (à data da escrita deste artigo), há também várias vertentes de concurso - Reabilitação Isolada de Imóveis, Reabilitação ou Qualificação de Espaço Público e Reabilitação Integrada de Conjuntos Urbanos.
Sublinha-se, no entanto e desde já, que a apresentação dos casos de referência de candidatos ao Prémio IHRU, que irá sendo assegurada pelo Infohabitar, não dará importância significativa a estas vertentes “oficiais” do Prémio, preferindo salientar as quatro grandes linhas de actividade específicas acima apontadas, bem como aspectos específicos e interessantes de cada intervenção e optando por divulgar de forma não sistemática, não exaustiva, temporalmente não ordenada, e “em pé de igualdade” entre casos que obtiveram Prémios, outros que mereceram Menções Honrosas e ainda outros que não tiveram destaque especial no Prémio, mas que o autor destas linhas considera serem também casos com muito interesse e que, portanto, terá utilidade a sua divulgação; pois, afinal, a própria divulgação de casos de referência muito diversificados tem uma utilidade própria e, como bem sabemos, a cidade não se faz apenas de exemplos excepcionais, mas também de casos de referência com aspectos específicos e meritórios cuja divulgação é importante.
E de certa forma o Prémio IHRU tem a sua existência específica, que se vai cumprindo anualmente, e aqui no Infohabitar estamos num outro contexto de divulgação bem distinto e naturalmente mais flexível, até porque os comentários que acompanham as imagens dos conjuntos, edifícios e espaços que irão sendo divulgados, são apenas e naturalmente da responsabilidade do autor do artigo – com a excepção referida às citações das respectivas actas do Júri e/ou dos textos de apresentação dos respectivos catálogos do Prémio (devidamente assinaladas), que são anualmente ditados pelo IHRU.
Salienta-se, finalmente, que será fortemente privilegiada uma componente de ilustração e de imagens dos casos de referência editados, reduzindo-se os textos de comentário e reflexão ao máximo e caracterizando-os por uma perspectiva informal “de visitante” interessado da respectiva intervenção; e que se convidam os respectivos autores, promotores e habitantes a complementarem e a comentarem as respectivas obras e/ou os próprios comentários do Infohabitar, através de simples envios via e-mail à edição do Infohabitar, que, depois e logo que seja possível integrará os respectivos textos e, eventuais, imagens, nos respectivos artigos, ou, e em alternativa (casos de contribuições com dimensão e interesse significativos), poderá decidir pela sua edição autonomizada, se o respectivo autor autorizar esta possibilidade.
Considerando-se que não decorreu, ainda, a cerimónia de entrega dos Prémios IHRU 2011, não serão editados no Infohabitar até essa data candidaturas respeitantes a este anos de 2011.
O editor do Infohabitar
António Baptista Coelho
Casos de referência do Prémio IHRU – II: o Outeiro da Forca, em Portalegre
António Baptista Coelho
Fig. 01
Será, em seguida, comentado e globalmente apresentado, nos seus aspectos urbanos e arquitectónicos, o conjunto/quarteirão com 52 fogos no Outeiro da Forca, Portalegre, promovido pelo Município de Portalegre, com o projecto do Atelier de Arquitectura Carlos Gonçalves, Lda.
“Este conjunto de habitação colectiva, explorando as potencialidades do terreno, organiza-se a partir de um extenso pátio conformado por bandas de habitação e comércio que, através da adaptação à topografia e de um diálogo visual com a envolvente, se desenvolve em interessantes sequências espaciais. É de realçar a forma como é permitida a acessibilidade e a mobilidade em plataformas com diferentes níveis que, funcionando simultaneamente como espaços autónomos, definem e caracterizam o espaço central como unidade.
A partir de espaços conviviais de grande interesse, promovem-se relações de vizinhança de proximidade e, paralelamente, criam-se condições para que esta vivência comunitária se possa articular com os espaços envolventes, no sentido de continuidade urbana.”
Foi uma citação integral do texto de apresentação do catálogo do Prémio INH/IHRU 19.ª Edição; salienta-se que este texto de apresentação integra a acta do júri do respectivo Prémio, tendo sido, portanto, elaborado, conjuntamente, pelo respectivo Júri.
Fig. 02
Quando visitamos o Outeiro da Forca e o procuramos sentir com alguma calma, talvez que uma das primeiras ideias que retemos é que continua a valer a pena procurar estruturar e compor pequenas/humanas vizinhanças residenciais, globalmente marcadas por uma imagem com grande dignidade, uma dignidade que constitui uma vantagem importante para a respectiva integração urbana, tantos em termos físicos como sociais.
Fig. 03
Um aspecto que importa destacar é a pedonalização do miolo do quarteirão, criando-se um espaço de segurança e de agradabilidade, que é naturalmente seguro, porque envolvido por vãos domésticos, mas que se encontra estrategicamente acessível a partir das vias próximas, que envolvem o quarteirão alongado.
Fig. 04
Outro aspecto importante é a própria imagem geral do quarteirão, uma imagem digna e atraente na sua relação com a cidade e uma imagem marcada por uma escala geral humanizada, predominantemente marcada por edifícios de rés-do-chão mais dois ou, no máximo três pisos; e edifícios multifamiliares que continuam a relacionar-se com algumas memórias de um fazer de arquitectura tradicional, designadamente, nos seus extensos panos brancos, nos seus socos bem marcados e nos seus vão evidenciados e bem recortados.
Mas um outro aspecto importa ainda ser salientado ao nível desta nova vizinhança urbana, que é tratar-se de um quarteirão numericamente equilibrado em termos do número de habitações que integra: 52 fogos, um número muito próximo do que é aconselhado por diversos autores, quando se pretende proporcionar um conjunto de condições adequadas para o desenvolvimento do convívio vicinal – primeiro entre crianças e, depois, talvez entre adultos.
Fig. 05
E, finalmente, e ainda ao nível de uma urbanidade de proximidade, quando este conjunto foi visitado, verificou-se estarmos em presença de um quarteirão equipado/recheado com diversas actividades municipais e de outros tipos o que se considera ser um caminho muito meritório no sentido da vitalização local. Se estas actividades se mantiveram, como se deseja, será matéria para outra visita.
Fig. 06
Passando, agora, ao edifício salienta-se a opção por uma solução em que os dois fogos existentes em cada piso são estrategicamente separados por uma reentrância de “espaço vazio”, o que tem uma dupla vantagem: assegura total separação entre esses fogos, pois não têm paredes contíguas (são separados por esse espaço vazio e pelas escadas comuns); e proporciona aos espaços comuns horizontais (patins de acesso às habitações) excelentes condições de luz natural, vista sobre o espaço público e natural capacidade e apropriação. De certa forma e sem dúvida de modo bem premeditado houve aqui um ensaio de procurar que estes pequenos edifícios multifamiliares pudessem ter características, em parte, aproximadas às dos edifícios unifamiliares, num assumir de um reforço da individualidade das habitações e da sua relação mais directa com o espaço livre.
Fig. 07
Finalmente ao nível da habitação estamos em presença de uma solução muito positivamente racionalizada na sua atribuição de espaços domésticos específicos e, assim, naturalmente, uma solução com significativo potencial de adaptabilidade a diferentes modos de vida, através d diversas atribuições funcionais dos compartimentos; e isto num quadro de espaciosidade bastante económico.
Fig. 08
Ainda ao nível das opções domésticas sublinha-se o interesse do expressivo desenvolvimento da cozinha, que poderá funcionar um pouco como zona de convívio e que é caracterizada por excelentes e pouco frequentes condições de iluminação natural através de janelas em duas paredes, que atribuem a este espaço um sentido de “clareza/alegria”, fazendo-o parecer maior do que é e possibilitando que o próprio estendal exterior e acessível por uma dessas janelas esteja expressivamente retirado da vista mais pública (encontram-se “embebidos” na tal reentrância “vazia” do edificado que separa os dois fogos existentes em cada nível).
Fig. 09
Finalmente, duas últimas notas: uma para o interesse da pormenorização arquitectónica onde se destacam, naturalmente, os “lugares-janela” que para além de estarem ligados à identidade específica desta intervenção, de certa forma, proporcionam uma intensa e económica repetição de vãos sem os problemas de monotonia associados, habitualmente, a uma tal condição ; e a outra, uma breve referência a ter-se evidenciado nesta análise, essencialmente, a qualidade do projecto de arquitectura urbana aqui aplicado.
Notas finais:
- a intervenção no Outeiro da Forca foi Menção Honrosa do Prémio INH/IHRU 2007
Bibliografia:
PAMPULHA, Rogério; PEREIRA, Teresa; FORJAZ, Isabel - Prémio INH/IHRU 19.ª Edição. Lisboa, Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana, 2007 (Dep. Legal 261148/07)
Notas editoriais:
(i) Embora a edição dos artigos editados no Infohabitar seja ponderada, caso a caso, pelo corpo editorial, no sentido de se tentar assegurar uma linha de edição marcada por um significativo nível técnico, as opiniões expressas nos artigos apenas traduzem o pensamento e as posições individuais dos respectivos autores.
Infohabitar, Ano VII, n.º 358
16 de Agosto de 2011
Editor: António Baptista Coelho
Edição de José Baptista Coelho
Lisboa, Encarnação - Olivais Norte
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