quarta-feira, novembro 03, 2021

Introdução à sala-comum doméstica – infohabitar # 796

Introdução à sala-comum doméstica – infohabitar # 796 

Ligação direta (clicar) para:  760 Artigos Interactivos, edição revista, ilustrada e comentada em janeiro de 2021- 38 temas e mais de 100 autores


Introdução à sala-comum doméstica – infohabitar # 796

Infohabitar, Ano XVII, n.º 796

Edição: quarta-feira, 3 de novembro de 2021

Artigo integrado na série editorial da Infohabitar “Habitar e viver melhor”


Caros leitores da Infohabitar,

Com o presente artigo retomamos a série editorial da Infohabitar especificamente dedicada a uma viagem sistemática pelos diversos espaços do habitar, que iniciámos na vizinhança, avançando, depois para os edifícios e seus espaços comuns (disponível no catálogo interativo da Infohabitar, no seu tema 6 intitulado Série habitar e viver melhor”) e “terminando” numa reflexão sobre os diversos tipos de organizações, opções e espaços domésticos.

Reflexão esta que esta semana é dedicada à, designada, sala-comum doméstica; matéria que nos irá ocupar, aqui na Infohabitar, durante três artigos, devido à sua evidente importância na estruturação e na vivência das nossas habitações.

E numa abordagem em três partes da matéria da sala-comum doméstica começamos por uma introdução, bastante livre, a esta matéria.

Depois da sala-comum os artigos desta série editorial irão abordar outros espaços específicos das nossas habitações.

 

Lembra-se, novamente, que serão sempre muito bem-vindas eventuais ideias comentadas sobre os artigos aqui editados e propostas de novos artigos (a enviar para abc.infohabitar@gmail.com , ao meu cuidado).

Considerando a continuidade de evolução da pandemia, e a grande capacidade de contágio da mais recente variante do vírus, mesmos entre vacinados, continuamos a reforçar a vital importância de cumprir com rigor os protocolos de vacina (n.º de doses e períodos temporais posteriores às mesmas) e de continuar com os cuidados de proteção próprios e dos outros, designadamente, em termos de limpeza de mãos, uso de máscara e distância social.

Despeço-me, até à próxima semana, enviando saudações calorosas e desejos de força e de boa saúde para todos os caros leitores,    

 

Lisboa, em 3 de novembro de 2021

António Baptista Coelho

Editor da Infohabitar


Introdução à sala-comum doméstica – infohabitar # 796

António Baptista Coelho

(texto e fotografias)


Resumo

Neste artigo, dedicado à temática geral de um adequado desenvolvimento das salas-comuns domésticas, faz-se, de início, um enquadramento e uma breve introdução geral ao tema; passa-se, depois, para uma abordagem às grandes opções e às associações mais frequentes nas salas-comuns; registando-se, a seguir, os usos e hábitos considerados mais frequentes naqueles espaços da habitação; seguindo-se a consideração dos “novos” usos a ter em conta na sala-comum, com destaque para o teletrabalho; e terminando-se o artigo com uma pequena reflexão sobre a importância da motivação do uso da sala-comum.

 

1. A modos de introdução à “noção” de sala-comum doméstica

Parece ser interessante refletir aqui, brevemente, sobre a própria “noção” de sala-comum, que resulta de ser um espaço que, por um lado, “é de todos” os moradores de uma dada habitação, é comum a todos eles – matéria esta que imediatamente nos leva para aspetos de espaciosidade e de apoio ao convívio doméstico –, mas também, talvez, por outro lado, de ser um espaço razoavelmente indiferenciado/comum, talvez um pouco “casual” e mesmo informal, associando diversas funções principais, como as referidas às refeições e o estar, e outras múltiplas talvez, habitualmente, menos importantes, como o lazer individual, a leitura, o trabalho em casa, a prática de passatempos específicos, etc.

Segundo esta perspetiva seremos levados a privilegiar na sala-comum soluções espacial e funcionalmente versáteis e adequadas a essas diversas atividades, desenvolvendo-se ambientes interiores, basicamente, muito adaptáveis em termos passivos, isto é, aceitando variadas ocupações funcionais e de mobiliário, bem como um elevado potencial de apropriação (ex., quadros e outros elementos murais). E, desde já, esta reflexão põe em causa, imediatamente, espaços de sala-comum dimensionalmente exíguos, e tendencialmente monofuncionais e pouco apropriáveis, designadamente, por mobiliário.

Outro dois aspetos parecem ser ainda pertinentes numa discussão mais global sobre a conceção das salas-comuns: sendo um deles associado à possibilidade de não haver um único compartimento doméstico vocacionado para sala-comum, proporcionando-se escolhas entre, por exemplo, duas opções (de localização, de dimensão e de ambientes interiores); e sendo o outro a discussão, sempre possível, entre a partição dos principais conteúdos funcionais da sala-comum entre as “tradicionais” “sala de estar” e “sala de jantar” e/ou entre uma sala-comum mais formal e uma “sala de família”, que se pode associar, por exemplo, a uma zona de cozinha.


2. Sobre algumas das bases de previsão  e desenvolvimento da sala-comum doméstica

Como introdução à abordagem qualitativa e arquitectónica da sala-comum doméstica poderemos optar por registar que se trata de um compartimento da habitação e mesmo de um “atributo” espacial e ambiental muito valorizado na apreciação de qualquer habitação no que se refere, designadamente, à sua espaciosidade – associada,  por vezes, às noções de uma sala “desafogada” e com importante capacidade de arrumação de mobiliário –, e a aspetos paradigmáticos do seu conforto ambiental e de vistas exteriores, com destaque, julga-se, para a iluminação natural e a insolação, por um lado, e para a disponibilidade de vistas urbanas e paisagísticas agradáveis e estimulantes, por outro.

E é, desde já, essencial registar que estes aspetos estão mutuamente conjugados (luz, sol e vistas) e dependem não só de condições gerais de previsão (ex., orientação, contiguidade a zonas verdes, etc.), mas também das soluções e da pormenorização dos respectivos vãos exteriores (ex., janelas de sacada, peitoris não muito elevados, etc.); soluções estas que, por sua vez têm, habitualmente, críticas implicações em termos de segurança no uso (ex., risco de quedas).

E, assim, a qualidade global e real de uma sala-comum depende de um elaborado novelo de variados aspetos funcionais, ambientais e de apropriação, produzindo-se um resultado final que escapa ou derrapa, frequentemente, de um patamar desejavelmente bem qualificado, para situações e quadros qualitativos insatisfatórios, designadamente, a médio e longo prazos; quando houve já tempo para os habitantes experimentarem bem, “na pele” e na mente, esses condicionalismos específicos, passado o período de “estado de graça” que sempre acontece quando se habita uma “nova casa” e no qual, temporariamente, a habitação e o seu enquadramento são positiva e benevolentemente aceites pelos seus habitantes.

Numa outra perspetiva, talvez mais formal, de introdução à abordagem da sala-comum doméstica poderemos considerar e discutir, tal como foi já sinteticamente apontado neste artigo, a própria designação de “sala-comum”, assim referida talvez como proposta de síntese de dois espaços domésticos razoavelmente distintos, entre si, que são a “sala de estar” e a “sala de jantar”.

E nesta matéria será interessante considerar que o que unifica, em boa parte, as salas “de estar” e “de jantar” é a prática do estar e do convívio domésticos, sendo que, tradicionalmente e numa habitação com algum desenvolvimento: as refeições eram, com frequência, o tempo privilegiado de um convívio mais formal na sala de jantar e mais informal na cozinha, estando, frequentemente, associado à entrada na habitação; enquanto o estar, mais específico  muitas vezes não existia, ou existia associado a outras funções, como por exemplo as ligadas a uma zona de trabalhos domésticos e multifunções, ou a um escritório doméstico e/ou a uma saleta de visitas, espaço este praticamente nunca utilizado.

E ainda nesta matéria, muito referida à própria “natureza básica” da sala-comum doméstica, importa ter em conta que, recentemente, aconteceu uma pequena revolução nos conteúdos funcionais e espaciais de muitas salas-comuns, que tiveram de integrar condições (pelo menos mínimas) para o teletrabalho e para o tele-estudo, de, por vezes, famílias inteiras e isto, por vezes, em salas-comuns pouco mais do que mínimas e com dimensionamentos muito pouco versáteis em termos de uma integração de novos elementos de mobiliário e de alteração dos arranjos de mobiliário; e lembremos que assim, muitas vezes, aconteceu, porque nos restantes espaços da habitação, frequentemente, também aconteciam essas mesmas dimensões quase-mínimas e pouco versáteis em termos de capacidade de utilização e mudanças de utilização – ex., cozinhas estritamente “de preparação”, sem espaços complementares e multifuncionais; quartos também quase-mínimos e agora, por vezes, quase globalmente ocupados por camas sobredimensionadas; corredores estritamente para circular, não proporcionando margens para outros usos, e mesmo casas de banho também plenamente ocupadas pelas respetivas peças sanitárias e não permitindo, assim, uma sua “desmultiplicação” funcional com a instalação de parte do tratamento de roupas (ex., máquina de lavar roupa, máquina de secar roupa).

E assim acontece que as disponibilidades ou indisponibilidades funcionais e espaciais das diversas zonas domésticas interagem, mutuamente, influenciando, neste caso uma maior ou uma menor capacidade das zonas associadas à sala-comum para responderem melhor, ou pior, a variadas solicitações funcionais e de apropriação, para lá das mais diretamente ligadas às funções de estar e de refeições.

 

3. Sala-comum: grandes opções e associações frequentes

A sala-comum pode constituir-se ou, talvez, deva constituir-se como elemento estruturador e/ou caracterizador da respectiva solução doméstica, imprimindo-lhe, por exemplo, um sentido mais informal ou mais formal e/ou uma tónica marcada por uma perspectiva mais convivial ou mais “repartida” na atribuição das variadas zonas ambientais e funcionais da habitação.

Tais opções podem realmente marcar o carácter de uma dada habitação, um carácter que deve, sempre, assumir aspetos formais e funcionais e que poderá influenciar na sua apropriação e, consequentemente, na sua identidade.

Globalmente e com um certo sentido de história recente podemos considerar a previsão de diversas condições espaciais, funcionais e ambientais no desenvolvimento dos espaços de estar e de jantar/refeições formais que acabaram por se fundir na designada “sala-comum”:

(i) sala de estar e sala de refeições separadas e mutuamente autonomizadas, podendo estar, até, mutuamente afastadas;

(ii) sala dupla, ou em dois espaços, em que, habitualmente a sala de estar e a sala de jantar comunicam por um amplo vão marcado por uma gola, mas mantendo-se cada um dos espaços, mais de estar e mais de refeições, com autonomia e idênticas condições de importância na habitação – em termos de localização, de dimensionamento e de pormenorização e conforto ambiental;

(iii) “sala-comum”, uma sala unificada nos seus espaços mais de estar e mais de refeições, que podem ser definidos apenas por instalaçãoo de mobiliário ou podem corresponder a determinadas configurações espaciais que acolham essas duas zonas formais e funcionais; esta situação é aquela atualmente generalizada e frequentemente subdimensionada, quer em termos de dimensões lineares, quer em termos de áreas gerais, numa situação que se tende a agravar pela tendência dimensional crescente que tem caracterizado alguns elementos de mobiliário e de equipamentos (ex., grandes sofás e televisões panorâmicas).

Tal como aqui se acabou de referir, a principal associação que caracteriza a sala é desenvolvida com a mais importante zona de refeições domésticas, passando, assim, da designação de sala de estar para a de sala-comum, o que corresponderá a uma certa vulgarização das funções desta sala, e que, na prática, acaba por tender a fazer menorizar as funções de estar e/ou de refeições formais sempre que há limitações de áreas, o que é frequente,  pois as mesas de refeições não podem “encolher” significativamente – a não ser que se utilizem soluções estratégicas com mesas dobráveis e que mudam de posição quando fechadas ou abertas – enquanto o estar pode reduzir-se de um conjunto de vários sofás até, por exemplo, um simples sofá duplo frente à incontornável TV.

Esta situação dá que pensar e poderá levar à previsão, de forma mais sistemática, de uma alternativa à zona de refeições integrada na sala-comum, por exemplo, num espaço próprio, ou numa cozinha ampla e convivial, permitindo-se, assim, a possibilidade do exercício de um verdadeiro estar, quem sabe, até harmonizável com a prática de outras atividades como será o caso do teletrabalho.

Uma outra frequente relação da sala acontece com a entrada na habitação, situação que obriga a uma efetiva privatização visual destas entradas diretas, sem o que se perderá, praticamente, a totalidade das funções de estar em sossego e em convívio familiar que devem caracterizar as salas, mantendo-se, apenas, as funções de convívio mais alargado, que não se ressentem com tais acessos diretos.

Nesta matéria há ainda e sempre que referir que quanto menor for o espaço disponível, mais cuidado deve ser investido na privatização das entradas diretas na habitação, através da sala-comum, pois o desafogo espacial é uma condição que pode substituir, em boa parte, as soluções de privatização e de encerramento.



Fig. 01: Sala espacialmente estimulante em termos de sub-espaços e relações com outras zonas domésticas de uma habitação do conjunto urbano "Bo01 City of Tomorrow", desenvolvido no âmbito da exposição que teve lugar em Malmö em 2001 (ver nota final) - H 13-14, Arquitetura: Charles Moore, Ruble, Yudell, Bertil Öhrström; neste caso assume-se a sala-comum como verdadeiro espaço "central" e distribuidor da habitação, fortemente marcado pela escada.


Continuando nesta perspetiva de uma sala-comum que serve também como espaço de comunicação, ela pode servir de acesso aos quartos, através de uma zona de circulação obrigatória que, tal como foi atrás comentado, não inviabilize a adequada vivência de diversas zonas da sala-comum; uma solução que dificilmente se harmoniza com espaços pouco desafogados e que, por outro lado, inviabilizará um acesso aos quartos recatado e independente do uso da zona de estar.

Esta situação parece, no entanto, aceitável em situações de reduzidos números de quartos numa dada habitação, de certo modo configurando soluções de grande relação entre a sala-comum e um quarto, uma solução que é sempre muito interessante numa perspetiva de eventual conversão destes dois espaços num único e amplo compartimento multifuncional.

E esta situação pode configurar, “no limite”, uma solução doméstica de grande convivialidade e sentido gregário, marcando uma zona “central” de sala comum multifuncional, que serve como coração de vivência e de circulaçãoo da habitação.

Naturalmente, quando existe um compartimento aberto para a sala, as suas utilizações devem ser bem ponderadas (por exemplo, prolongamento da sala, quarto de reserva, sala de jantar, escritório, etc.).

Em termos de pormenor há que garantir uma comunicabilidade muito específica da sala com o exterior, nomeadamente, através de peitoris baixos e de janelas de sacada para varandas (1); e esta é uma daquelas condições de conceção que, por vezes, parecem ser inacreditavelmente esquecidas pelos projetistas.


4. Usos e hábitos frequentes na sala-comum

Na designada sala-comum desejamos praticar múltiplas atividades ou sub-atividades, mas tratando-se de um espaço comum a diversas pessoas há que cuidar da respectiva harmonização mútua, o que dificilmente se consegue: (i) sem uma adequada espaciosidade global; (ii) sem adequadas condições específicas de dimensionamento “linear”; (iii) e sem adequadas condições de múltipla e/ou comum apropriação (por mobiliário e “parietal”), proporcionadas por uma positiva pormenorização arquitectónica.

E, naturalmente, uma tal complexidade funcional, espacial, ambiental e de caracterização agrava-se em condições de menor espaciosidade e no quadro de intervenções arquitectónicas menos positivas.

Afinal, a sala-comum é, de certo modo, o lugar onde tudo pode/poderia acontecer e onde, frequentemente, pouco acontece:

.     porque nela se concentram múltiplas atividades – poderá e deverá haver alguma diversificação de espaços de estar;

.     porque o espaço não é, frequentemente, abundante e porque os dimensionamentos lineares e de sub zonas funcionais são, frequentemente, críticos – dimensões mínimas, espaço muito alongado, espaço inutilizado por circulações obrigatórias – condições estas que são difíceis ou mesmo impossíveis de ultrapassar, mesmo com uma criatividade muito forte em termos de decoração/ arquitectura de interiores, e/ou dependem de soluções muito complexas e dispendiosas (projeto e execução), designadamente, através de mobiliário e elementos de apropriação feitos especificamente e por medida.

  porque a omnipresente televisão anula muito do que poderia acontecer na sala seja em termos de convívio, seja em termos de multiplicidade de atividades – o que levará a imaginar por um lado que é positivo a disponibilização de diversos monitores de TV e que será de ponderar a própria estruturação da sala-comum favorecendo-se decididamente duplos espaços que proporcionem a simultaneidade de outras atividades com o ver televisão; e atente-se que o atual e crescente crescimento dos écrans de TV, para dimensões por vezes cinematográficas, acrescenta uma enorme “presença” e monofuncionalidade a salas-comuns pouco espaçosas e dificilmente organizadas em mais do que uma ou duas zonas;

  porque, hoje em dia, para lá da TV outros ecrãs existem, designadamente, no apoio ao teletrabalho;

  e porque o complexo de subactividades associadas ao estar e às refeições poderá ter de “conviver” com um outro complexo de atividades associada ao teletrabalho e/ou ao tele-estudo.



Fig. 02: Sala espacialmente estimulante em termos de sub-espaços e relações com outras zonas domésticas de uma habitação do conjunto urbano "Bo01 City of Tomorrow", desenvolvido no âmbito da exposição que teve lugar em Malmö em 2001 (ver nota final) - H 13-14, Arquitetura: Charles Moore, Ruble, Yudell, Bertil Öhrström; neste caso salienta-se a solução de partição ligeira e amovível para criar uma subzona de estar.


5. Os “novos” usos da sala-comum e o teletrabalho

Esta é uma temática que, como outras, nos leva longe, pois o tele-trabalho e o tele-estudo, para serem harmonizáveis no ambiente doméstico e designadamente na sala-comum, que é provavelmente o sítio da habitação onde existirá, ainda, alguma margem de espaciosidade e versatilidade, deverão ser, pelo menos, razoavelmente compatíveis com as principais funções da sala-comum e, designadamente, com o estar, pois considera-se que as refeições constituem períodos de intervalo do trabalho e do estudo, embora se estas atividades acontecerem na mesa de refeições haverá que solucionar a respetiva simultaneidade de ocupações (por refeições e por trabalho e estudo).

Uma forma adequada e razoavelmente tipificável de resolver esta situação será considerar no elenco “mínimo” de mobiliário de uma sala-comum uma peça do tipo mesa de trabalho, ou escrivaninha (que pode ser rebatível ou embutida); e neste caso prever possibilidades de introdução desta “nova” peça de mobiliário da sala-comum numa subzona que pode ser pequena, mas que deve ter adequadas condições de conforto ambiental e de vistas e não estar integrada no fluxo das circulações domésticas; e este será sempre um “trunfo” funcional e ambiental da sala-comum pois integra um conteúdo multifuncional e enriquecedor da própria caracterização deste espaço.

E ao teletrabalho e ao tele-estudo dedicaremos, provavelmente, um artigo específico desta série editorial que o enquadre numa perspetiva doméstica ampla e funcionalmente mista de habitar, trabalhar, gozar o lazer, realizar passatempos, etc.


6. Motivar o uso da sala-comum

O presente subtítulo parecerá, numa primeira leitura, talvez um pouco forçado, mas, no entanto, todos conhecemos salas-comuns cujas características gerais são, evidentemente, muito pouco adequadas para a motivação de um seu uso/habitar intenso e diversificado.

E tal acontece, habitualmente, devido a muitos dos aspetos já apontados neste artigo com destaque para os problemas dimensionais, de capacidade de apropriação de pisos e de paredes e de reduzido conforto ambiental e ligação estratégica com o exterior.

Tal como apontei num livro editado no LNEC - "Do bairro e da vizinhança à habitação - ITA2 - que tenho citado com frequência nesta série editorial, entre as características mais desejáveis nas salas ou zonas de estar salientam-se as seguintes:

.    Possibilitarem variadas conjugações de peças de mobiliário (atender às dimensões e tipos de sofás e de estante de sala existentes ou pretendidos, se são de corpo único ou por elementos) e a correta instalação dos equipamentos e aparelhos para lazer e tempos livres (por exemplo a posição ideal da televisão não deve refletir a luz das janelas).

.    Poderem receber o mobiliário necessário e uma ou outra peça de mobília mais volumosa, sem ficarem com um "ar  atravancado" e sem prejudicarem a circulação das pessoas.

.    Terem um carácter polivalente (em ambiente e zonas de atividade), permitindo diversos tipos de ocupação; sala só para estar e conviver ou também para atividades de leitura, jogo, ouvir música e ver televisão, estudo e trabalho em "recantos" próprios e, até, brincadeiras de crianças, quando a casa é pequena.

.    Aceitarem variados números de ocupantes; salas adaptáveis e espaçosas que acolham tão bem a respetiva família, no seu dia a dia, como, esporadicamente, as festas e as reuniões alargadas.

.    Serem relativamente independentes do resto dos compartimentos da casa, não recebendo nem transmitindo ruídos incómodos.

.    Serem servidas por casas de banho, sem que para isso as visitas sejam obrigadas a penetrar nas zonas mais íntimas (quartos) da habitação.

.    Estarem próximas dos vestíbulos de entrada nas casas e formando, com eles, amplos conjuntos de espaços de receção e convívio.

E acrescentam-se, agora, mais algumas características:

.    Os aspetos de um amplo e exigente conforto ambiental, designadamente, em termos de luz natural e artificial, existência e controlo da insolação, ventilação natural, equilíbrio higrotérmico e conforto acústico; pois o espaço da sala-comum deve constituir-se como uma reserva de conforto na vivência da habitação.

.    Uma adequada relação visual e física com o exterior, em termos de vistas e de contiguidade com espaço exterior privado; pois o espaço da sala-comum é o lugar privilegiado para uma extensão da vida doméstica sobre o exterior.

.    E a existência de um potencial leque de condições específicas no que se refere à prática do trabalho profissional e do estudo em casa, designadamente, num quadro de teletrabalho – condições estas diversificadas, seja em termos de espaço, seja de posicionamento e conforto ambiental desse espaço, seja de redes disponíveis nesse espaço.

 

Notas:

(1) MHOP; LNEC, "Instruções para Projectos de Habitação Promovidos pelo Estado - IPHPE/Fundo de Fomento da Habitação - FFH, Documento 5", p. 29.

 

Notas editoriais ao artigo:

O presente artigo corresponde a uma edição ampliada e modificada do artigo que foi editado na Infohabitar, em 15/02/2015, com o n.º 520.


Nota importante sobre as imagens que ilustram o artigo:

As imagens que acompanham este artigo e que irão, também, acompanhar outros artigos desta mesma série editorial foram recolhidas pelo autor do artigo na visita que realizou à exposição habitacional "Bo01 City of Tomorrow", que teve lugar em Malmö em 2001.

Aproveita-se para lembrar o grande interesse desta exposição e para registar que a Bo01 foi organizada pelo “organismo de exposições habitacionais sueco” (Svensk Bostadsmässa), que integra o Conselho Nacional de Planeamento e Construção Habitacional (SABO), a Associação Sueca das Companhias Municipais de Habitação, a Associação Sueca das Autoridades Locais e quinze municípios suecos; salienta-se ainda que a Bo01 teve apoio financeiro da Comissão Europeia, designadamente, no que se refere ao desenvolvimento de soluções urbanas sustentáveis no campo da eficácia energética, bem como apoios técnicos por parte do da Administração Nacional Sueca da Energia e do Instituto de Ciência e Tecnologia de Lund.

A Bo01 foi o primeiro desenvolvimento/fase do novo bairro de Malmö, designado como Västra Hamnen (O Porto Oeste) uma das principais áreas urbanas de desenvolvimento da cidade no futuro.

Mais se refere que, sempre que seja possível, as imagens recolhidas pelo autor do artigo na Bo01 serão referidas aos respetivos projetistas dos edifícios visitados; no entanto, o elevado número de imagens de interiores domésticos então recolhidas dificulta a identificação dos respetivos projetistas de Arquitetura, não havendo informação adequada sobre os respetivos designers de equipamento (mobiliário) e eventuais projetistas de arquitetura de interiores; situação pela qual se apresentam as devidas desculpas aos respetivos projetistas e designers, tendo-se em conta, quer as frequentes ausências de referências - que serão, infelizmente, regra em relação aos referidos designers -, quer os eventuais lapsos ou ausência de referências aos respetivos projetistas de arquitetura.


Notas editoriais gerais:

(i) Embora a edição dos artigos editados na Infohabitar seja ponderada, caso a caso, pelo corpo editorial, no sentido de se tentar assegurar uma linha de edição marcada por um significativo nível técnico e científico, as opiniões expressas nos artigos e comentários apenas traduzem o pensamento e as posições individuais dos respectivos autores desses artigos e comentários, sendo portanto da exclusiva responsabilidade dos mesmos autores.

(ii) No mesmo sentido, de natural responsabilização dos autores dos artigos, a utilização de quaisquer elementos de ilustração dos mesmos artigos, como , por exemplo, fotografias, desenhos, gráficos, etc., é, igualmente, da exclusiva responsabilidade dos respetivos autores – que deverão referir as respetivas fontes e obter as necessárias autorizações.

(iii) Para se tentar assegurar o referido e adequado nível técnico e científico da Infohabitar e tendo em conta a ocorrência de uma quantidade muito significativa de comentários "automatizados" e/ou que nada têm a ver com a tipologia global dos conteúdos temáticos tratados na Infohabitar e pelo GHabitar, a respetiva edição da revista condiciona a edição dos comentários à respetiva moderação, pelos editores; uma moderação que se circunscreve, apenas e exclusivamente, à verificação de que o comentário é pertinente no sentido do teor editorial da revista; naturalmente , podendo ser de teor positivo ou negativo em termos de eventuais críticas, e sendo editado tal e qual foi recebido na edição.

 

 

Introdução à sala-comum doméstica – infohabitar # 796

Infohabitar

Editor: António Baptista Coelho

Arquitecto/ESBAL – Escola Superior de Belas Artes de Lisboa –, doutor em Arquitectura/FAUP – Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto –, Investigador Principal com Habilitação em Arquitectura e Urbanismo no Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), em Lisboa.

abc.infohabitar@gmail.com

abc@lnec.pt

Revista do GHabitar (GH) Associação Portuguesa para a Promoção da Qualidade Habitacional Infohabitar – Associação com sede na Federação Nacional de Cooperativas de Habitação Económica (FENACHE).


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