Equipamentos vitalizadores de vizinhanças (a Loja Coop)
António Baptista Coelho
António Baptista Coelho
Infohabitar, Ano V, n.º 272
No presente artigo apontam-se alguns aspectos considerados significativos na caracterização de equipamentos e elementos vitalizadores de vizinhanças residenciais, tais como: núcleos comerciais; distâncias críticas à habitação para realizar compras diárias; posicionamento mais desejável dos equipamentos comerciais; e relação com pequenos equipamentos desportivos e de recreio e com parques infantis.
A existência de determinadas características de equipamento não é condição suficiente para que determinadas vizinhanças de proximidade ofereçam um quadro de vida residencial e urbano capaz de garantir verdadeira satisfação; outros aspectos são determinantes e até, por vezes, há um excesso de espaços disponíveis para equipamento térreo, que resulta em más influências na desvitalização dos espaços públicos contíguos. No entanto a disponibilização de um conteúdo de equipamento convivial estratégico, seja interior, seja exterior, é uma faceta fundamental de adequadas condições residenciais e nesta matéria há aspectos de apoio "básico" ao habitar, convívio, recreio e segurança que importa considerar com especial atenção.
Neste artigo não se faz uma abordagem sistemática da matéria, mas lançam-se alguns aspectos dessa temática considerados, por diversos autores, como importantes para a satisfação com o sítio que se habita.
Caracterização de núcleos comerciais atraentes
Para uma melhoria de condições de vitalidade em espaços comerciais concentrados, salientam-se as seguintes condições: grande variedade de tipos e alternativas de comércios e serviços; cuidadosa programação das sequências e das orientações das montras considerando os principais fluxos pedonais; aplicação de pavimentos "suaves", agradáveis e seguros para o uso pedonal e estabelecendo continuidades entre espaços interiores e exteriores; e existência de zona(s) para estar sentado, que seja(m) espacialmente diferenciada(s) das principais zonas de circulação, integrada(s) em espaços mais calmos e dispondo de assentos individuais e confortáveis; deverão ser previstos, também, outros tipos de lugares sentados com carácter mais informal e multifuncional, nomeadamente, em zonas mais movimentadas e com carácter mais público.
Fig. 01: O Largo do Ferrador, Olivais Sul, Lisboa.
Distâncias críticas à habitação para realizar compras diárias
Aceita-se habitualmente que entre cerca de 200 e 600m de distância, entre habitação e pontos de compras diárias, a satisfação admitida pelos utentes decresce regularmente à medida que a distância aumenta. Até 200m de distância ou cerca de 5 minutos a pé, 70% das pessoas consideraram a situação "muito boa", enquanto que quando a distância atinge os 600m apenas 10% das pessoas continuam a manter o mesmo juízo. É de considerar que esta constatação põe em relevo a importância do comércio em grande proximidade residencial.
As compras de um agregado familiar com quatro pessoas correspondem a uma média aproximada de 60kg por semana, cerca de 10 sacos de compras médios. Isto evidencia a importância da proximidade entre estabelecimentos comerciais de primeira necessidade e habitações, importância esta que assume um aspecto vital quando se trata de habitantes idosos, outros habitantes com mobilidade condicionada, ou pessoas sem veículo próprio.
Outra distância chave para tornar fácil as compras é aquela que separa a habitação da paragem de transportes colectivos, e que se considera poder chegar a 500m.
Equipamentos comerciais - posicionamento mais desejável de lojas
As lojas devem estar nas ruas e não no interior dos quarteirões. Esta condição refere-se a uma situação, que se considera básica, de abertura dos estabelecimentos comerciais à continuidade urbana, atribuindo-lhes um papel essencial nessa continuidade que se deverá traduzir em relações de vitalidade e dinamismo no uso do exterior público.
Naturalmente que as lojas e designadamente a “Loja Coop” poderá marcar e, quem sabe, estruturar um interior de quarteirão. Tal condição é desejável e poderá ser aproveitada, por exemplo, em termos do desenvolvimento de espaços de esplanada e de uma afirmada relação com outros equipamentos (ex., recreio e desporto). No entanto a presença da “Loja Coop” tem de ser claramente visível nas ruas contíguas, ela serve a vizinhança mas também, como já se salientou, a continuidade/vitalidade urbanas e não pode, assim, estar a qualquer título “escondida” ou menos visível.
Equipamentos comerciais - situação estratégica
Em cada Vizinhança Próxima deve existir, pelo menos, um local público exterior, parcialmente encerrado e coberto, situado junto a um caminho importante e à vista de casas e lojas; este local pode estar ligeiramente elevado de modo a proporcionar uma vista melhorada sobre a sua envolvente, e deve dispor de diversos tipos de lugares sentados (alguns em posições "de conversação" informal, outros mais isolados, etc.) e de mesas; este local que pode ser do tipo “esplanada” deverá estar ligado a um estabelecimento de restauração e convívio.
Fig. 02: o miolo do quarteirão equipado da cooperativa Coobital, Alto de St. António, Faro, do Arq. Lopes da Costa.
Importância da diversidade de equipamento na vizinhança residencial
É fundamental a disponibilização de condições de recreio e desporto no espaço público residencial e designadamente nas vizinhanças de proximidade.
Tal disponibilização liga-se à dinamização do comércio diário e convivial pois, quer se trata de condições afins no objectivo de dinamizar relações de conhecimento mútuo e convívio natural entre residentes, quer se trata de condições que mutuamente se estimulam e mutuamente amplificam aspectos básicos de segurança, acompanhamento e agradabilidade no uso, que se deseja intenso, do exterior residencial.
Sendo o objectivo a dinamização pública dos conjuntos residenciais há que visar o comércio diário e convivial, através de comércio diário e convivial, mas articulando-o com um adequado tratamento e equipamento funcional do exterior contíguo.
Relação com pequenos equipamentos desportivos
Importa salientar que a, frequentemente invocada, falta de espaço para a instalação de recintos desportivos em zonas residenciais não tem real razão de ser, visto que mesmo em condições espaciais muito exíguas haverá sempre sítio para a instalação de: campos "mini" (ex., minibasquetebol e futsal/futebol de salão); "recantos" para prática de Basquetebol (ex., um cesto aplicado numa empena cega e uma zona de pavimento liso contígua); paredes para treinar Ténis; "peladinhas" para futebol com balizas simplificadas; e percursos para corrida e exercícios de manutenção aproveitando as diversas zonas pedonais.
Equipamentos desportivos – disposição geral
Os eixos dos campos de jogos devem concordar, aproximadamente, com uma orientação Norte-Sul, aceitando-se desvios até cerca de NW-SE e NE-SW; exceptuam-se os casos em que as práticas desportivas não impliquem "olhar alto", porque nestes casos o Sol já não é especialmente perturbador. Para a definição da orientação é também importante o regime de ventos dominante no local.
Equipamentos para crianças - caracterização de parques infantis
O estudo de um "parque infantil de vizinhança" usado como "atalho" pelos residentes e bem protegido da circulação e do estacionamento de veículos, revelou este ser usado como centro social e de informação para a vizinhança, com picos naturais de uso pela comunidade, em geral, aos fins de tarde e especialmente aos sábados. Entre as diversas características que foram consideradas responsáveis pelo êxito deste parque infantil destacam-se as seguintes:
Localização próxima da habitação (afastamento de cerca de 61m a um máximo de 91m), permitindo uso informal e frequente ("idas e vindas"); para além disto o "jardim" será tanto mais usado quanto mais visível ele for e quanto mais livre a sua utilização (sem horários).
Grande diversidade das brincadeiras e dos equipamentos propostos, tornando o "parque" bem identificável entre os seus congéneres.
Perfeita ligação com o restante espaço pedonal, considerando-se este equipamento como parte integrante do espaço contínuo de brincadeiras que é o espaço pedonal da área residencial.
Promoção dos agrupamentos humanos, tanto com bancos e zonas protegidas para os grupos se juntarem recatadamente, como pela existência de certos equipamentos bem relacionados com grupos etários mais velhos (ex., recintos desportivos), fortemente demarcados das zonas para os mais jovens, mas permitindo interacções mútuas (ex., vistas, comunicação vocalizada, etc.).
Relacionamento com outras actividades, também participadas por adultos, como realização de passatempos, artesanato, etc.
(E, podemos acrescentar, a boa acessibilidade a quiosques de venda de revistas e jornais, bem como a "cafés/pastelarias" e respectivas esplanadas).
É possível desenvolver com eficácia, pequenos parques infantis com equipamentos de jogo/recreio correntes e bem conhecidos, desde que estes sejam, pelo menos, três. Também terá êxito a implantação, cuidada, de uma estrutura múltipla de jogo/recreio, instalada numa grande caixa de areia a uma superfície adequada ao amortecimento de quedas dos utentes (ex., espaço 15x15m com estrutura multifuncional integrando cerca de 10 elementos de jogo/recreio infantil). Salienta-se o interesse que tem a possível articulação entre um tal dimensionamento e o dimensionamento mínimo de largura para “Futsal”, que é também 15m.
Nota importante: estas referências estão ligadas a aspectos gerais de concepção e têm de ser consideradas, integradamente, com a legislação existente e aplicável no desenvolvimento e gestão dos parques infantis.
Fig. 03: interior de quarteirão equipado e à escala humana, na Travessa do Sargento Abílio, Benfica, C. M de Lisboa, Arq. Paulo Tormenta Pinto.
Equipamentos para crianças - recreio de crianças e jovens em zonas pedonais
Os espaços pedonais devem ser desenhados tendo em vista tanto o uso normal por adultos, como o seu uso como espaço de brincadeiras.
Nas confluências de percursos e nas junções entre estes e acessos a grupos residenciais devem ser previstos grupos abrigados de assentos com mesas, de modo a promover-se o convívio de crianças e jovens.
Os principais pontos de encontro devem ser protegidos dos excessos climáticos e razoavelmente destacados das zonas mais usadas por adultos, evitando-se, assim, conflitos. Esta condição é fundamental e por vezes difícil de cumprir, porque, naturalmente, os jovens têm tendência a congregar-se perto ou junto das entradas dos seus edifícios, com inegáveis vantagens em termos de segurança; a solução pode estar na existência de boas condições de espaciosidade e de equipamento em átrios exteriores contíguos às portas dos edifícios. Ao longo dos percursos mais usados por crianças e jovens devem existir abrigos estrategicamente dispostos.
Equipamentos para crianças e jovens – caracterização geral
Devem existir zonas de jogos de crianças, bem equipadas e seguras, muito próximas dos edifícios e bem visíveis a partir deles.
As zonas de estadia e de jogos para crianças e jovens em grande ligação: com os espaços exteriores públicos e comuns mais usados pelos habitantes; e com os vãos de porta e de janela dos respectivos edifícios e unidades habitacionais.
A distância considerada crítica para esse tipo de vigilância natural deve fundamentar-se, tanto nas condições básicas de distância em percurso real relativamente às portas dos edifícios de habitação (considerando o maior número possível de habitações) e de afastamento relacionadas com a garantia de fácil reconhecimento visual de estranhos, pelas próprias crianças brincando no exterior (sempre muito distraídas), como nas condições de observação e comunicação vocalizada com as zonas de jogos das crianças a partir dos espaços mais usados, durante o dia, nas respectivas habitações, e também, embora de forma mais pontual e estratégica, com os equipamentos de uso diário na Vizinhança Próxima (ex., lojas com montras dando sobre parques infantis ou sobre zonas de acesso a esses parques).
Equipamentos para crianças e jovens - condições desejáveis de acessibilidade e uso
Alguns aspectos sobre acessibilidade e uso das áreas de jogos de crianças: uma distância de cerca de 1000m às habitações elimina cerca de 90% dos seus possíveis utentes com menos de 9 anos, para esses casos as distâncias desejáveis são da ordem de 100/200m; demasiado próximas são incómodas para as habitações; áreas de jogos atraentes evitam que as crianças usem espaços viários para brincar; a vigilância natural a partir das habitações próprias e/ou de certos fogos bem colocados, onde habitem pessoas conhecidas, só é eficiente em grupos de 20/30 alojamentos, porque a partir desse número os espaços são muito extensos e as pessoas conhecem-se mal; as áreas de jogos devem estar próximas de zonas pedonais muito usadas e ser relativamente centrais.
Parece que as áreas de jogos mais procuradas pelas crianças são as maiores e as que têm mais elementos de equipamento, considerando-se três o número mínimo. Os objectos modernos do tipo arquitectónico ou escultórico são essencialmente decorativos. As crianças preferem manusear objectos diversos ou brincar nos "jogos clássicos".
As crianças estão sentadas com frequência e são atraídas pelas escadas, merecendo estes aspectos um conveniente aproveitamento, tendo em vista tanto o convívio mais sossegado, como novos elementos de brincadeira.
As zonas de circulação pedonal devem considerar o recreio de crianças usando variados tipos de elementos (patins, skates, bicicletas de acrobacia, etc.) e podem ser desenvolvidos troços de percursos e espaços específicos muito adequados para estas actividades (salienta-se que estes espaços devem ser seguros, contra intrusos, porque de outro modo as crianças terão receio de usar estes "brinquedos caros" no exterior, ou os seus próprios pais terão esse tipo de receios e o resultado será idêntico).
Infohabitar, Ano V, n.º 272
Editor: Grupo Habitar
Coordenador editorial: António Baptista Coelho
Lisboa, Encarnação – Olivais Norte, 15 de Novembro de 2009
Edição de José Baptista Coelho
Sem comentários :
Enviar um comentário