Habitação de Interesse Social – Reunir esforços, Reunir Disciplinas e Soluções
por Samuel Gonçalves
Antes de passar à edição do artigo da semana, faz-se uma primeira divulgação de uma importante reunião técnica em língua portuguesa que terá lugar em Novembro de 2009 em São Carlos, Brasil.
Trata-se do I Simpósio Brasileiro de Qualidade do Projeto no Ambiente Construído [SBQP 2009]
Que será realizado em conjunto com o IX Workshop Brasileiro de Gestão do Processo de Projeto na Construção de Edifícios
Em São Carlos, São Paulo, de 18 a 20 de Novembro de 2009.
O evento tem como objetivos fomentar as pesquisas sobre qualidade do projeto no ambiente construído e estabelecer um fórum para publicação, apresentação e discussão de trabalhos de pesquisa inovadores nas áreas de gestão, avaliação e qualidade do projeto.
A promoção deste interessante evento é da responsabilidade da ANTAC (Associação Nacional de Tecnologia do Ambiente Construído)
E a organização é da responsabilidade do Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da EESC – USP
Salientando-se a já longa tradição de cooperação que existe entre o Laboratório Nacional de Engenharia Civil e o seu Núcleo de Arquitectura e Urbanismo (LNEC/NAU), e a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (USP); cooperação esta que, nos últimos anos, tem também contado com a intervenção de membros do Grupo Habitar (GH) de um e outro lado do Atlântico – e nesta perspectiva está já prevista a participação de um membro do NAU e do GH no SBQP 2009.
O I Simpósio Brasileiro de Qualidade do Projeto no Ambiente Construído terá lugar no Anfi-teatro Jorge Caron, da Escola de Engenharia de São Carlos - USP
O Site do evento está disponível em:http://www.arquitetura.eesc.usp.br/ocs/index.php/SBQP2009/SBQP2009
E o programa e temas do evento em:
Segue-se o artigo da semana no Infohabitar
Habitação de Interesse Social – Reunir esforços, Reunir Disciplinas e Soluçõespor Samuel Gonçalves
Estudante da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto (FAUP)
O presente texto não é um registo mais ou menos científico nem sequer de um estudo sobre o tema da habitação de interesse social. Apenas reúne um conjunto de ideias baseadas em observações pontuais motivadas por um interesse pelo tema.
Farei referência a dois casos particulares como forma de exemplificar modos de intervir conjugando medidas sociais e arquitectónicas na procura da melhor solução. Cito, para já, o Bairro das Alagoas na Régua. Actuou-se neste bairro, até então degradado e problemático, de um ponto de vista muito abrangente: recuperação arquitectónica e reinserção urbana e social. Assim, diminuíram-se as barreiras arquitectónicas entre o bairro e a cidade envolvente, houve uma preocupação com a manutenção do património físico e promoveu-se o dinamismo social (através de actividades recreativas, formações profissionais, …) envolvendo habitantes do bairro e a vizinhança do resto da cidade. Saliento o facto de o objectivo passar sempre pela tentativa de aproximar o bairro da cidade envolvente, tanto ao nível do tratamento do espaço público como do acompanhamento social.
De um ponto de vista disciplinar, para os técnicos do urbanismo e da arquitectura, esta intervenção aponta uma falha que muitos tendem a ignorar: a guetização subjacente à má produção de habitação de interesse social. Para tal contribuiu essencialmente a excessiva concentração de habitantes provenientes de locais e culturas muito diversas, uma resolução pontual para um problema político que leva à não identificação das pessoas com a sua nova morada, com os locais e eventualmente com as soluções arquitectónicas encontradas.
Agravando esta situação, muitas vezes as estratégias de inserção urbana são, frequentemente, deficientes ou, pelo menos, questionáveis: localizam-se estes pólos de habitação em massa em zonas periféricas da cidade, onde os terrenos representam um menor prejuízo para os municípios e afastam-se os bairros dos centros urbanos da cidade. Este afastamento geográfico rapidamente construirá o estigma do afastamento social, cultural e económico.
Quando, por outro lado, estes bairros se constroem numa maior proximidade do centro das cidades, é frequente verificar-se um conjunto de soluções urbanas que estão muito distantes daquilo que deveria ser a consciência mínima de princípios que regem as estratégias de produção da cidade contemporânea. Assim, surgem blocos, muitas vezes coloridos e negativamente iconográficos, deslocados do desenho urbano, com ruas que não se inserem condignamente na estrutura viária da cidade e com espaços de lazer interiorizados em relação à vizinhança.
Essas infra-estruturas que poderiam representar uma mais valia para a própria cidade acabam por se tornar de uso quase exclusivo dos habitantes do bairro, transformando-se em espaços pouco habitados, degradados, repulsivos e veículos de exclusão.
(imagem retirada por problemas editoriais)
A meu ver, o que importa salientar é que o planeamento e a produção de habitação de interesse social devem ser feitos a partir dos mesmos pressupostos que a habitação corrente, isto é, os bairros sociais têm de fazer parte da cidade e não podem ser encarados como excepções do tecido urbano.
Uma das aparentes resoluções para este problema poderá estar num maior esforço em realojar famílias necessitadas em casas desocupadas nos centros históricos. A título exemplificativo, posso citar o caso da Guarda, onde se realojaram 13 famílias através desta solução. No seu boletim municipal podia ler-se: "A cidade da Guarda, tal como outras no nosso país, necessita de intervir na recuperação dos edifícios e também de lhes atribuir uma nova funcionalidade, por forma a dar vida ao centro histórico." Esta intervenção representa, sem dúvida, uma medida política aliciante.
Contudo, a esta aparente solução imediata juntam-se alguns problemas como o recente inflacionamento dos preços da habitação nessas zonas - o que torna difícil a intervenção pública em propriedades privadas que mesmo degradas têm um valor de mercado elevado - e a inflexibilidade regulamentar que obriga a alterações arquitectónicas dispendiosas e demoradas, o que amortece as perspectivas de desenvolvimento deste tipo de iniciativas.
(imagem retirada por problemas editoriais)
Acredito que esta fórmula – Realojamento+Reabilitação – e as diferentes estratégias para conseguir a sua aplicação efectiva deverão ser temas incontornáveis no debate e na reflexão sobre o tema intemporal da habitação de interesse social.
Nota editorial:É com um gosto muito especial que o Infohabitar publica este artigo de um futuro arquitecto, que demonstra o interesse que as matérias da Arquitectura residencial de interesse social e os seus reflexos urbanos e sociais específicos continuam a despertar em alguns dos nossos jovens.
Eu próprio testemunhei este interesse ao participar, há poucos meses, em algumas palestras e sessões na Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto, realizadas por iniciativa de um dinâmico grupo de alunos, entre os quais estava o Samuel Gonçalves, que têm conseguido harmonizar as sempre bem presentes temáticas do desenho com as fundamentais matérias do desenhar para quê, para quem, em que contextos práticos e ao serviço de quais desígnios.
Deixam-se, assim, aqui os votos de que tais iniciativas possam continuar e desenvolver-se, seja na FAUP, seja noutras Escolas de Arquitectura que queiram redescobrir a importância de um habitar humanizado e sensível à sociedade, e salienta-se que o Infohabitar e o Grupo Habitar estarão sempre disponíveis para participar e apoiar (n)estas iniciativas,
O editor do Infohabitar
António Baptista Coelho
Infohabitar, Ano V, n.º 256
Lisboa, Encarnação – Olivais Norte, 25 de Julho de 2009
Edição de José Baptista Coelho
1 comentário :
Samuel, você poderia me dar o seu contato ou e-mail? Estou fazendo um mestrado na USP, em São Paulo, sobre a reabilitação habitacional do Centro da cidade de São Luís -Maranhão, de onde vim. Estou plenamente de acordo com seu texto e extremamente empolgada em continuar trabalhando com esse tema. Muito obrigada.
Tayana
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