quarta-feira, novembro 09, 2022

Considerações sobre direitos e problemas dos idosos – versão de trabalho e base bibliográfica – Infohabitar # 838

Ligação direta (clicar no link seguinte) para aceder à listagem interativa de 800 Artigos editados na Infohabitar – edição de janeiro de 2022 com links revistos em junho de 2022 (38 temas e mais de 100 autores):

https://docs.google.com/document/d/1WzJ3LfAmy4a7FRWMw5jFYJ9tjsuR4ll8/edit?usp=sharing&ouid=105588198309185023560&rtpof=true&sd=true

 

Considerações sobre direitos e problemas dos idosos – versão de trabalho e base bibliográfica – Infohabitar # 838

 

Infohabitar, Ano XVIII, n.º 838

Edição: quarta-feira, 9 de novembro de 2022

Artigo XX da série editorial da Infohabitar “PHAI3C – Programa de Habitação Adaptável e Intergeracional através de uma Cooperativa a Custo Controlado”

 

 Caros leitores da Infohabitar,

Com o presente artigo continuamos a série editorial da Infohabitar especificamente dedicada a uma abordagem global e bibliográfica dos amplos, sensíveis e urgentes aspetos associados às necessidades, aos gostos e às potencialidades sociais e urbanas de uma reflexão prática sobre os espaços residenciais dedicados a pessoas idosas e fragilizadas, desejavelmente integrados em quadros intergeracionais, ativamente urbanos e dinamizados e convivializados pelas cooperativas que estão, desde há dezenas de anos, dedicadas à promoção de habitação de interesse social com expressiva qualidade e frequentemente associada a um amplo leque de variadas e vitais atividades vicinais e urbanas – as Cooperativas associadas à Federação Nacional de Cooperativas de Habitação Económica (FENACHE).

Lembra-se, como sempre, que serão sempre muito bem-vindas eventuais ideias comentadas sobre os artigos aqui editados e propostas de artigos (a enviar para abc.infohabitar@gmail.com).

Despeço-me, até à próxima semana, enviando saudações calorosas e desejos de força e de boa saúde para todos os caros leitores,    

 

Lisboa, em 9 de novembro de 2022

António Baptista Coelho

Editor da Infohabitar

 

Nota introdutória à temática do Programa de Habitação Adaptável Intergeracional – Cooperativa a Custos Controlados (PHAI3C)

Considerando-se o atual quadro demográfico e habitacional muito crítico, no que se refere ao crescimento do número das pessoas idosas e muito idosas, a viverem sozinhas e com frequentes necessidades de apoio, a atual diversificação dos modos de vida e dos desejos habitacionais, e a quase-ausência de oferta habitacional e urbana adequada a tais necessidades e desejos, foi ponderada o que se julga ser a oportunidade do estudo e da caracterização de um Programa de Habitação Adaptável Intergeracional (PHAI), adequado a tais necessidades e a uma proposta residencial naturalmente convivial, eficazmente gerida e participada e financeiramente sustentável, resultando daqui a proposta de uma Cooperativa a Custos Controlados (3C).

O PHAI3C visa o estudo e a proposta de soluções urbanas e residenciais vocacionadas para a convivência intergeracional, adaptáveis a diversos modos de vida, adequadas para pessoas com eventuais fragilidade físicas e mentais, mas sem qualquer tipo de estigma institucional e de idadismo, funcionalmente mistas e com presença urbana estimulante. O PHAI3C irá procurar identificar e caracterizar tipos de soluções adequadas e sensíveis a uma integração habitacional e intergeracional dos mais frágeis num quadro urbano claramente positivo e em soluções edificadas que possam dar resposta, também, a outras novas e urgentes necessidades habitacionais (ex., jovens e pessoas sós), num quadro residencial marcado por uma gestão participada e eficaz, pela convivialidade espontânea e social e financeiramente sustentável.

Trata-se, tal como se aponta no título do artigo, de uma “versão de trabalho e base bibliográfica” e, portanto, de um artigo cujos conteúdos serão, ainda, substancialmente revistos até se atingir uma versão estabilizada da temática referida no título; no entanto, em virtude da metodologia usada, que se considera bastante sólida, marcada pelo recurso a abundantes referências de fontes, devidamente apontadas e sistematicamente comentadas no sentido da respetiva aplicação ao PHAI3C, e tendo-se em conta a utilidade de se poder colocar à discussão os muitos aspetos registados no sentido da sua possível aplicação prática no PHAI3C, considerou-se ser interessante a divulgação desta temática/problemática nesta fase de “versão de trabalho”, que, no entanto, foi já razoavelmente clarificada – como exemplo do posterior tratamento para passagem a uma versão mais estável teremos, provavelmente, referências bibliográficas mais reduzidas e boa parte delas em português, assim como comentários mais desenvolvidos; mas mesmo este desenvolvimento irá sendo influenciado pelo(s) caminho(s) concreto(s) tomado(s) pelos diversos temas e artigos que integram, desde já, a estrutura pensada para o designado documento-base do PHAI3C, que surgirá, em boa parte, da ligação razoavelmente sequencial entre os diversos temas abordados em variados artigos.

Ainda um outro aspeto que se sublinha marcar, desde o início, o teor do referido documento-base do PHAI3C (a partir do qual serão gerados vários documentos específicos: mais de enquadramento e mais práticos) é o sentido teórico-prático que privilegia uma abordagem mais integrada e exemplificada da temática global da habitação intergeracional adaptável e cooperativa, apontando-se exemplos e ideias concretas logo desde as partes mais de enquadramento da abordagem da temática como as que se desenvolvem neste artigo.

Notas introdutórias ao presente conjunto de artigos sobre habitação integeracional

O presente artigo inclui-se numa série editorial dedicada a uma reflexão temática exploratória, que integra a fase preliminar e “de trabalho”, dedicada à preparação e estruturação de um amplo processo de investigação teórico-prático, intitulado Programa de Habitação Adaptável Intergeracional Cooperativa a Custos Controlados (PHAI3C); programa/estudo este que está a ser desenvolvido, pelo autor destes artigos, no Departamento de Edifícios do Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), e que integra o Programa de Investigação e Inovação (P2I) do LNEC, sublinhando-se que as opiniões expressas nestes artigos são, apenas, dos seus autores – o autor dos artigos e promotor do PHAI3C e os numerosos autores citados no texto.

Neste sentido salienta-se o papel visado para o presente artigo e para aqueles que o precederam e os que lhe darão continuidade, no sentido de se proporcionar uma divulgação que possa resultar numa desejável e construtiva discussão alargada sobre as muito urgentes e exigentes matérias da habitação mais adequada para idosos e pessoas fragilizadas, visando-se, não apenas as suas necessidades e gostos específicos, mas também o papel e a valia que têm numa sociedade ativa e integrada.

Nesta perspectiva e tendo-se em conta a fase preliminar e de trabalho da referida investigação, salienta-se que a forma e a extensão do texto que é apresentado no artigo reflete uma assumida apresentação comentada, minimamente estruturada, de opiniões e resultados de múltiplas pesquisas, de muitos autores, escolhidos pela sua perspectiva temática focada e por corresponderem a estudos razoavelmente recentes; forma esta que fica patente no significativo número de citações – salientadas em itálico –, algumas delas longas e incluídas na língua original.

Julga-se que não se poderia atuar de forma diversa quando se pretende, como é o caso, chegar, cuidadosamente, a resultados teórico-práticos funcionais e aplicáveis na prática, e não apenas a uma reflexão pessoal sobre uma matéria bem complexa como é a habitação intergeracional adaptável desenvolvida por uma cooperativa a custos controlados e em parte dedicada a pessoas fragilizadas.

Solicita-se a compreensão dos leitores para lapsos e problemas de edição que, sem dúvida, acontecem no texto que se segue, mas a opção era prolongar, excessivamente, o período de elaboração de um texto que, afinal, se pretende seja essencialmente prático; posteriores edições do mesmo texto serão complementarmente revistas e melhoradas.


Considerações sobre direitos e problemas dos idosos – versão de trabalho e base bibliográfica – Infohabitar # 838

António Baptista Coelho

António Baptista Coelho  – com base direta nos textos, ideias e opiniões dos autores referidos ao longo dos documentos que integram a listagem bibliográfica registada no final do artigo.

 

Resumo

As presentes notas de leitura e de reflexão partem de um enquadramento feito através de um importante relatório mundial sobre envelhecimento e saúde para se desenvolver uma referência ampla à importante Estratégia Nacional para o Envelhecimento Ativo e Saudável (ENEAS), e, depois, para uma abordagem sintética e global do direito à habitação na perspectiva do idoso, tendo por base diversos documentos. 


Introdução

As presentes notas de leitura e de reflexão sobre a temática integrada dos direitos e dos problemas dos idosos não pretende, naturalmente, avançar de forma evidenciada numa temática que, por si só, é “mãe” de teses, mas apenas alertar para situações extremamente complicadas e desumanas associadas a uma frequente ausência de direitos humanos dos idosos, situação onde se associa uma frequente redução ou mesmo ausência de direitos humanos gerais aplicados às pessoas idosas com um ainda mais frequente desconhecimento ou crítica despreocupação relativamente às necessidades e exigências específicas dos idosos em termos da sua vivência diária e global.

Neste sentido o texto que se segue parte de um pequeno enquadramento feito a partir do  Relatório mundial de envelhecimento e saúde – 2015 da Organização Mundial de Saúde, para passar à apresentação comentada de alguns aspetos considerados na interessante e oportuna Estratégia Nacional para o Envelhecimento Ativo e Saudável (ENEAS) e em outras “figuras” documentais existentes fora de Portugal e consideradas essenciais ou muito interessantes para a matéria de uma adequada defesa dos direitos e necessidades dos idosos.


1. Breves notas sobre o relatório mundial de envelhecimento e saúde de 2015

A Organização Mundial da Saúde (OMS) no seu “Relatório mundial de envelhecimento e saúde – 2015” identifica e caracteriza aspetos fundamentais de um quadro global para uma saúde pública que vise um “envelhecimento saudável”; em seguida sumariamente citados: (1)

O quadro de saúde pública para o Envelhecimento Saudável identifica um objetivo comum para todas partes interessadas: otimizar a capacidade funcional. O relatório explora como isso pode ser alcançado em cinco domínios fortemente interconectados de capacidade funcional, essenciais para permitir que os adultos maiores realizem as tarefas que valorizam,

Estas são as habilidades para: Atender às suas necessidades básicas; Aprender, crescer e tomar decisões; Movimentarem-se; Construir e manter relacionamentos; e Contribuir.

É interessante fazermos aqui um pequeno exercício de introdução de um conjunto habitacional, adaptável, intergeracional e participativo – tal como se aponta no âmbito do PHAI3C – e parece haver uma forte confluência de condições e objetivos vivenciais com os aspetos julgados essenciais para o referido “envelhecimento saudável”, tal como está registado no referido Relatório da OMS e em seguida se cita:

Este relatório [da OMS] identifica três abordagens que atravessam quase todos os setores como prioridades para a implementação. São elas: 1. Combater a discriminação etária; 2. Permitir a autonomia; 3. Apoiar o Envelhecimento Saudável em todas as políticas e em todos os níveis de governo.

As pessoas maiores têm o direito de fazer escolhas e assumir o controle de uma série de questões, incluindo onde vivem, os relacionamentos que têm, o que vestem, como passam seu tempo e se submetem-se a tratamento ou não. O potencial de escolha e controle é moldado por muitos fatores, incluindo a capacidade intrínseca dos adultos maiores, os ambientes em que vivem, os recursos pessoais e financeiros que podem levar em consideração e as oportunidades disponíveis para eles. (pg. 22)

E mais uma vez parece que as condições defendidas pela OMS em termos de “envelhecimento saudável” estarão presentes num conjunto habitacional, adaptável, intergeracional e participativo .


2. Várias citações e algumas notas a partir da Estratégia Nacional para o Envelhecimento Ativo e Saudável (ENEAS)

2.1. ENEAS: aspetos de enquadramento

Considera-se que existe uma relação direta entre o conceito de “envelhecimento saudável”, defendido pela OMS em 2015, e o objetivo de “envelhecimento ativo e saudável” apontado, mais recentemente, em Portugal, no âmbito da interessante e oportuna Estratégia Nacional para o Envelhecimento Ativo e Saudável (ENEAS) de 2017.

A propósito da ENEAS e da associada “Estratégia e Plano de Ação Global para o Envelhecimento Saudável 2017-2025”, coordenada pela Direção-Geral da Saúde, e utilizando o documento a que se teve acesso desenvolvido pela respetiva Relatora, Andreia Silva da Costa, intitulado Estratégia e Plano de Ação Global para o Envelhecimento Saudável 2017-2025 (por nós resumido por EPAGES 25)citam-se, salientam-se e comentam-se, em seguida, neste item, alguns aspetos associados aos direitos/necessidades das pessoas idosas. (2)

Em termos de enquadramento a ENEAS sublinha e aqui se regista a importância de dois documentos: um deles de 2015 e da Organização Mundial de Saúde, intitulado United Nations Economic Comission for Europe, & European Comission. (2015). Active ageing index home; e o outro, de 2017, que já qui abordámos e iremos voltar a referir e comentar, intitulado “Guia Global das Cidades Amigas das Pessoas Idosas”, editado pela Fundação Calouste Gulbenkian; marcando-se, a negrito, o primeiro pois importa ainda avançar numa sua consulta mais elaborada.

No que se refere especificamente à ENEAS e, evidentemente, não perdendo de vista o objetivo específico do desenvolvimento de soluções habitacionais e urbanas intergeracionais e participadas, salientam-se os seguintes aspetos em seguida citados a partir do referido EPAGES 25, e muito brevemente comentados: (negrito e sublinhado nossos)

Os objetivos da ENEAS assentam na promoção da saúde e bem-estar das pessoas idosas, bem como no reconhecimento do facto de que os benefícios e a importância do envelhecimento ativo e saudável ao longo do ciclo de vida exigem a implementação de políticas intersectoriais e de uma abordagem holística na construção de uma “sociedade para todas as idades” (World Health Organization, 2002).

EIXOS ESTRATÉGICOS

A ENEAS consolida-se num conjunto de Linhas Orientadoras da Ação e Medidas estruturadas a partir de 4 Eixos Estratégicos, focadas na implementação de intervenções nos sistemas de saúde, social e outros, assentes na abordagem intersectorial e multidisciplinar, tendo sempre em consideração os valores e princípios que devem nortear a ação.

SAÚDE – Promoção de iniciativas e práticas que visem reduzir a prevalência, adiar o aparecimento e controlar o agravamento e o impacto das doenças crónicas e da redução das capacidades físicas e mentais nas pessoas idosas e potenciar a sua autonomia.

PARTICIPAÇÃO – Promoção da educação e formação ao longo do ciclo de vida incluindo estratégias de promoção da literacia em saúde e incentivo à criação de ambientes físicos e sociais protetores e potenciadores da integração e da participação das pessoas idosas na sociedade e nos processos de decisão que afetam a sua vida.

SEGURANÇA – Apoio a iniciativas e práticas que visem minimizar riscos e promover o bem-estar e a segurança das pessoas idosas.

MEDIÇÃO, MONOTORIZAÇÃO E INVESTIGAÇÃO – Promoção da investigação científica na área do envelhecimento ativo e saudável, potenciando o levantamento de necessidades, o desenvolvimento, monitorização e avaliação de intervenções e a disseminação de boas práticas e da inovação. (pg. 20)

Parece ficar já aqui evidenciado o interesse que poderão ter as soluções residenciais intergeracionais e participadas, urbanisticamente vitalizadas, numa expressiva contribuição para o avanço da sociedade nestes quatro eixos estratégicos, mas centrando-nos, agora, especificamente na defendida “criação de ambientes potenciadores da integração e participação” dos idosos teremos, ainda com base na EPAGES 25: (negrito nosso)

Em 2010, a OMS criou a Rede Global de Cidades e Comunidades Amigas das Pessoas Idosas com o objetivo de conectar cidades, comunidades e organizações em todo o mundo com a visão comum de fazer das comunidades um ótimo lugar para envelhecer. Esta rede atua ao nível local, promovendo a plena participação das pessoas idosas na vida comunitária ...

Numa cidade amiga das pessoas idosas, as políticas, serviços, configurações e estruturas de apoio permitem o envelhecimento ativo, uma vez que reconhecem as capacidades e recursos das pessoas mais velhas, antecipam e respondem com flexibilidade às necessidades e preferências relacionadas com o envelhecimento, respeitam as suas decisões e escolhas de estilo de vida, protegem os que são mais vulneráveis e promovem a sua inclusão e contribuição em todos os aspetos da vida da comunidade ...

Estas questões da amigabilidade do espaço urbano deveriam ser tratadas, julga-se, a montante das preocupações com os cidadãos idosos, e numa perspetiva de uma cidade muito mais amiga de todos os seus habitantes e designadamente daqueles mais sensíveis em termos de necessidades de apoio e proteção, que são os peões idosos e muito jovens, e especialmente quando circulam com à vontade na contiguidade e proximidade das suas habitações e equipamentos mais usados e, acresce ainda, numa perspetiva de apoio efetivo, em termos físicos e regulamentares, a uma gradual continuidade no uso seguro e estimulante da cidade.

Pensa-se que só assim estaremos a pensar e a agir corretamente e não num sentido eternamente funcionalizado e pouco coerente de atender a situações “de exceção” num meio urbano feito para o veículo motorizado e até para as bicicletas a circularem rapidamente (o que também é perigoso para o peão).

De certa forma seria avançar numa perspetiva global de humanização reforçada do espaço urbano tornando-o gradual e estrategicamente mais amigável para o peão e mesmo mais afetuoso para o habitante, sendo que, em casos específicos, tais cuidados terão de ser acrescidos e tornados mais “garantidos”.

E em tudo isto e olhando agora especificamente para os habitantes mais idosoa haverá sempre que optar entre: um caminho tendencialmente integrado em termos vivenciais, um caminho onde a habitação será sempre “habitação”, ainda que naturalmente “embebida” pelos cuidados e reservas funcionais adequados aos diversos apoios que os idosos vão, gradualmente, necessitando; e um já “velho” e absurdo caminho de transformação “instantânea” da habitação, onde vivíamos e onde tínhamos o nosso mundo pessoal e familiar, numa situação de alojamento num equipamento com apoios funcionais diversificados e à medida da nossa carteira.

E não será que a preferência de muitos de nós em continuar a viver na sua habitação, quando envelhecemos, não terá a ver em boa parte com sabermos que a alternativa mais provável é essa de deixarmos de habitar para passar a sermos residentes institucionalizados de equipamentos para idosos?

Voltando citações da ENEAS, a partir do respetivo relato, atrás referido, realizado por Andreia Silva da Costa e aqui designado por EPAGES 25 : (negrito nosso)

É muito importante lembrar que a preferência dos adultos mais velhos é continuar a viver no seu bairro e na sua casa à medida que envelhecem. Criar condições habitacionais para responder às necessidades físicas, psicológicas e sociais, permitindo que se mantenham autónomos e independentes junto da família e dos amigos é imperativo

A proximidade da família e da comunidade possibilita a facilidade de criação de ambientes de intergeracionalidade, fundados no princípio basilar de que todos os seus elementos, independentemente da idade e ou grau de dependência, são cidadãos de pleno direito.

Num contexto de relações e solidariedades intergeracionais, a inclusão das pessoas idosas no quotidiano e na transmissão de conhecimentos e saberes, estímulos, valores e tradições é uma mais-valia para as gerações mais novas, mas também estas são enriquecedoras nesta relação. Na perspetiva da pessoa idosa esta interação é potenciadora de bem-estar, integração e reconhecimento social.

Combater o idadismo através de campanhas que promovam os aspetos positivos do envelhecimento, promovam o maior conhecimento sobre as formas de discriminação, identifiquem os contributos das pessoas idosas para a sociedade e as vantagens das relações intergeracionais;

Promover o desenvolvimento de programas no âmbito da interação social através da criação de espaços intergeracionais e ações tendentes a destacar o valor social e económico da solidariedade intergeracional na família e na comunidade …

Promover o desenvolvimento de programas e espaços intergeracionais

Incentivar o envelhecimento no contexto de proximidades da pessoa idosas (ageing in place); (pg 29 e 30)

A noção que temos a partir destas citações é que se está no caminho certo quando estudamos e procuramos estruturar conjuntos residenciais e urbanos intergeracionais e participados, ainda que tais soluções hoje em dia sejam muito pouco frequentes, talvez com a exceção de bairros e vizinhanças tradicionais onde seja possível uma proximidade intergeracional e uma mistura funcional bem integradas e marcadas por uma adequada paisagem urbana pormenorizada; e mesmo aqui haverá que solucionar variadas questões de acessibilidade e segurança, afinal, tal como a própria ENEAS também aponta e aqui se cita a partir da referida EPAGES 25: (negrito nosso)

Promover uma política de construção de habitações e ambientes promotores de acessibilidade total... Facilitar a execução de pequenas obras de adaptação para conforto, acessibilidade e segurança das pessoas idosas de baixos recursos económicos. (pg. 33)


2.2. ENEAS: algumas medidas específicas

Na área, agora mais concreta, do incentivo à criação de “ambientes físicos e sociais protetores e potenciadores da integração e participação das pessoas idosas”, matéria esta que se considera “nuclear” na reflexão sobre o PHAI3C , usando ainda a Estratégia Nacional para o Envelhecimento Ativo e Saudável (ENEAS) e a associada “Estratégia e Plano de Ação Global para o Envelhecimento Saudável 2017-2025”, coordenadas pela Direção-Geral da Saúde e continuando a utlizar o documento a que se teve acesso desenvolvido pela respetiva Relatora, Andreia Silva da Costa, intitulado Estratégia e Plano de Ação Global para o Envelhecimento Saudável 2017-2025 (por nós resumido por EPAGES 25), citam-se, em seguida, algumas das medidas específicas aí apontadas, mais dirigidas para a referida criação de ambientes adequados. (negrito nosso) (3)

Promover o desenvolvimento de programas no âmbito da interação social através da criação de espaços intergeracionais e ações tendentes a destacar o valor social e económico da solidariedade intergeracional na família e na comunidade;

Promover o desenvolvimento de programas e espaços intergeracionais;

Promover programas de fortalecimento das relações familiares através da dinamização de atividades de avós, pais e netos;

Divulgar e incentivar a participação e integração das pessoas idosas em ações de voluntariado, atividades culturais, desportivas e recreativas, sociais e de aprendizagem, organizadas e dinamizadas com a participação ativa das pessoas idosas de uma comunidade, como forma de promover inclusão social e o bem-estar (e.g. universidades sénior e voluntariado sénior);

Promover o associativismo sénior;

Incentivar o envelhecimento no contexto de proximidades da pessoa idosas (ageing in place)

Criar, organizar e divulgar redes de prestação de cuidados prestados no domicílio e em ambulatório, e apoiar nas necessidades pontuais de manutenção do conforto no domicílio das pessoas idosas;

Incrementar a domiciliação dos cuidados através de uma abordagem integrada que inclua, entre outras, saúde, segurança social, autarquias, entidades/organizações do setor social e solidário;

Identificar e avaliar sistematicamente os fatores externos que contribuam para as vulnerabilidades em saúde das pessoas idosas com comorbilidades;

Desenvolver sistemas de informação que garantam a integração e continuidade de cuidados;

Criar ambientes de suporte físico e social nos bairros, permitindo a permanência das pessoas idosas em suas casas e comunidades o maior tempo possível;

Desenvolver sistemas de telemonitorização que permitam o “ageing in place” com qualidade

Incentivar a aprendizagem e utilização de tecnologias de informação e comunicação por parte das pessoas idosas (e-inclusão) com o objetivo de facilitar o processo designado por “ageing in place";

Incentivar o desenvolvimento de tecnologia e do design inclusivo/universal na construção e adaptação de edifícios habitacionais e no mobiliário urbano que seja promotor de atividade física e autonomia das pessoas idosas;

Preparar zonas pedonais que facilitem a deslocação de pessoas independentemente da sua capacidade de mobilidade (a pé ou em cadeiras de rodas);

Promover espaços de convívio e de atividades que mobilizem a participação; Dotar essas zonas de boa iluminação, segurança, mobiliário urbano adequado e promotor de descanso, convívio e atividade física;

Incentivar a adesão das autarquias e freguesias aos princípios das cidades e vilas amigas das pessoas idosas e dos cidadãos com mobilidade reduzida. (pg. 31  32)

Como breve, mas essencial, comentário aponta-se que tendo em conta a julgada quase ausência de recomendações relativas ao urgente desenvolvimento de melhores condições habitacionais para um grande número de idosos, esta listagem constitui um elemento básico de fundamentação “oficiosa” de muitos dos aspetos que estão na base do PHAI3C – habitação, adaptável, intergeracional, participada e convivial.


3. Notas sobre os idosos e o direito à habitação

A defesa que se está a fazer de soluções residenciais intergeracionais, participadas e urbanisticamente vitalizadas, vidando-se, especificamente, a “criação de ambientes potenciadores da integração e participação” dos idosos, mas sempre num natural quadro intergeracional e funcionalmente adequado e misto, terá a ver sempre com a questão do direito a um habitar adequado e humanamente positivo.

Poderá considerar-se este aspeto uma “evidência”, mas neste caso trata-se de uma evidência muito esquecida, pois se muitas condições habitacionais são críticas em relação a pessoas adultas e em boas condições de saúde, o que dizer da influência de más condições habitacionais em pessoas mais sensíveis, como é o caso das crianças e dos idosos; e se as crianças vão avançando, com a idade, em termos da sua autonomização e capacidade de movimentação e orientação, os idosos vão, com a idade, reduzindo tais capacidades, numa situação que, evidentemente, faz salientar a sua frequente ausência de condições básicas habitacionais, negando-se, assim o que deveria ser o seu direito a um habitar adequado, que não se limita acondições de vivência doméstica, mas emgloba, evidentemente, condições de vivência na vizinhança e na cidade.

Lembra-se e cita-se a propósito o Artigo 25.1 da Declaração Universal dos Direitos Humanos: (negrito nosso)

Everyone has the right to a standard of living adequate for the health and well-being of himself and his family, including food, clothing, housing and medical care and necessary social services, and the right to security in the event of unemployment, sickness, disability, widowhood, old age or other lack of livelihood in circumstances beyond his control.”

Salienta-se, também, que as novas iniciativas internacionais relativas aos direitos habitacionais salientam, para além dos aspetos de sustentabilidade ambiental as questões vitais da sustentabilidade social das soluções habitacionais e urbanas, focando-se, especificamente, aspetos do direito a um adequdo standard de vivência habitacional e a uma não discriminação neste contexto.

E é interessante ter em conta que nas WHO Housing and health guidelines, de 2018 (4), as questões da relação entre habitação e saúde ultrapassam as habituais recomendações mais “racionalizadas”, por exemplo em termos de temperatura, isolamentos, segurança no uso e quedas, focando aspetos de sobreocupação, acessibilidade, apoio a atividades diárias e mesmo “qualidade de vida”, participação e diversas consequências psicológicas.

E não podemos ter qualquer dúvida de que se tudo isto é verdade para pessoas no pleno uso das suas faculdades físicas, mentais e de perceção, então tem importância crítica quando somos idosos e especialmente quando somos idosos e temos diversos condicionamentos.

Continuando no âmbito desta informal e muito resumida abordagem dos aspetos que podem ser associados a uma adequada definição, divulgação e implementação dos direitos dos idosos, muito especificamente no que se refere aos seus mundos residenciais e vicinais, que são por eles intensa e longamente usados, citam-se e comentam-se, brevemente, em seguida, alguns elementos constantes do oficial e muito interessante Estatuto do Idoso, publicado no Brasil, já em 2003, atente-se. (5) e (6) (negrito nosso)

(Estatuto do Idoso - itens que focam, especificamente, as matérias habitacionais) 

CAPÍTULO IX Da Habitação

Art. 37. O idoso tem direito a moradia digna, no seio da família natural ou substituta, ou desacompanhado de seus familiares, quando assim o desejar, ou, ainda, em instituição pública ou privada. § 1º A assistência integral na modalidade de entidade de longa permanência será prestada quando verificada inexistência de grupo familiar, casa-lar, abandono ou carência de recursos financeiros próprios ou da família. § 2º Toda instituição dedicada ao atendimento ao idoso fica obrigada a manter identificação externa visível, sob pena de interdição, além de atender toda a legislação pertinente. § 3º As instituições que abrigarem idosos são obrigadas a manter padrões de habitação compatíveis com as necessidades deles, bem como provê-los com alimentação regular e higiene indispensáveis às normas sanitárias e com estas condizentes, sob as penas da lei.

Art. 38. Nos programas habitacionais, públicos ou subsidiados com recursos públicos, o idoso goza de prioridade na aquisição de imóvel para moradia própria, observado o seguinte: 7 I – reserva de pelo menos 3% (três por cento) das unidades habitacionais residenciais para atendimento aos idosos; II – implantação de equipamentos urbanos comunitários voltados ao idoso; III – eliminação de barreiras arquitetônicas e urbanísticas, para garantia de acessibilidade ao idoso; IV – critérios de financiamento compatíveis com os rendimentos de aposentadoria e pensão.

O comentário natural é que é bem oportuna a consideração desta prioridade dos idosos no acesso a habitações, com apoio público, financeira e funcionalmente adequadas.

Voltando a sublinhar que a abordagem dos direitos “oficiais” habitacionais dos idosos é aqui, no presente trabalho sobre o PHAI3C, muito informal e resumida, pois sendo essencial exigirá uma atenção específica e detalhada, aproveita-se um estudo de 2014, com autoria de Renato Amorim Damas Barroso, expressivamente intitulado “Há Direitos dos Idosos?”, para incluir, em seguida, um conjunto de citações muito oportunas e que serão, depois, muito brevemente comentadas: (7) (negrito nosso)

Todavia e apesar da inexorabilidade desta alteração demográfica, nunca em Portugal se delineou uma política integrada que reconheça a necessidade de atualizar a legislação portuguesa, de modo a que incorpore uma preocupação real sobre a pessoa idosa na sociedade portuguesa.

O artigo 72º da Lei Fundamental, com a desajustada epígrafe “Terceira idade”, até invoca a existência de uma política, mas na realidade ela não existe, nem nunca existiu. (pg. 117)

As soluções para estas questões são, todas elas, bem nossas conhecidas, na medida em que estão plasmadas nos Princípios das Nações Unidas, na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e na nossa Constituição da República Portuguesa, ainda que, em muitas situações, não respeitadas. (pg. 118)

O comentário não é realmente necessário, fica a questão do porquê desta  situação , e isto quando estamos já dentro de um exponencial crescimento da população idosa e muito idosa e prestes a entrar numa situação crítica em termos de ausência de respostas habitacionais adequadas em termos quantitativos, qualitativos e diversificados para essas necessidades.

E Renato Barroso, no mesmo estudo, aprofunda a questão constatando que o enfoque do problema está centrado nos aspetos funcionais básicos e imediatos do alojamento dos idosos não se abordando matérias ligadas e essenciais como as patrimoniais; pois, afinal, muitos idosos até têm meios imobiliários que poderiam mobilizar para a melhor resolução das suas necessidades, tal como se cita em seguida:

... o enfoque do problema reside na satisfação das necessidades básicas imediatas, esquecendo que nesse ínterim e com a necessidade de administrar o património alheio e que um dia será necessariamente meu, se vão tomando decisões de carácter irreversível, sobre a pessoa e os bens do incapaz. (pg. 121)

Dito de outra forma.

A capacidade não se perde de um momento para o outro, nem se perde ao mesmo tempo a capacidade de tomar toda e qualquer decisão, sendo indiscutível que entre o momento do diagnóstico, cada vez mais, realizado mais e mais precocemente, até à perda total de capacidade, podem decorrer vários anos, durante os quais a pessoa tem discernimento suficiente para tomar as suas decisões de forma livre esclarecida, ou, pelo menos, para tomar algumas delas. (pg. 123)

E a propósito desta interessante possibilidade de participação dos idosos na resolução dos seus próprios problemas habitacionais, que tudo tem a ver com o processo apontado pelo PHAI3C, citamos, ainda, Renato Barroso, no estudo em referência, quando este traduz um texto retirado do  Alzheimer Europe Report — The use of advance directives by people with dementia. Alzheimer Europe, 2006 : (negrito nosso)

A capacidade não é um fenómeno de tudo ou nada. Defendemos que deve ser sempre considerada e avaliada em relação a decisões específicas ou categorias de decisões (a pessoa pode ser capaz de tomar a decisão A mas já não ser capaz de tomar a decisão B,etc.).

Acresce ainda que a capacidade pode ser parcial. Na demência, a pessoa habitualmente não perde de repente a capacidade de decidir sobre tudo, mas vai-a perdendo gradualmente. Nalguns tipos de demência a capacidade de tomar decisões pode flutuar com o tempo. Por todas estas razões, a capacidade deve ser avaliada caso a caso, em relação a áreas específicas da tomada de decisões e tomando em consideração a condição geral da pessoa.”

 

Notas bibliográficas

(1) Organização Mundial da Saúde - Relatório mundial de envelhecimento e saúde - 2015

(2) Andreia Silva da Costa (Relatora), Direção-Geral da Saúde - Estratégia Nacional para o Envelhecimento Ativo e Saudável (ENEAS) - Estratégia e Plano de Ação Global para o Envelhecimento Saudável 2017-2025. Lisboa, DGS, 2017

(3) Andreia Silva da Costa (Relatora), Direção-Geral da Saúde - Estratégia Nacional para o Envelhecimento Ativo e Saudável (ENEAS) - Estratégia e Plano de Ação Global para o Envelhecimento Saudável 2017-2025. Lisboa, DGS, 2017

(4) WHO Housing and health guidelines. Geneva: World Health Organization; 2018. Licence: CC BY-NC-SA 3.0 IGO.

(5) https://redededireitos.org/velhos/direitos-dos-idosos/

(6) Brasil - LEI Nº 10.741, DE 1º DE OUTUBRO DE 2003 (Estatuto do Idoso) Dispõe sobre o Estatuto do Idoso e dá outras providências. Brasília (DF): Senado Federal.

(7) Renato Amorim Damas Barroso - HÁ DIREITOS DOS IDOSOS?- JULGAR - N.º 22 – 2014, Coimbra Editora, pg. 117 a 127


Notas editoriais gerais:

(i) Embora a edição dos artigos editados na Infohabitar seja ponderada, caso a caso, pelo corpo editorial, no sentido de se tentar assegurar uma linha de edição marcada por um significativo nível técnico e científico, as opiniões expressas nos artigos e comentários apenas traduzem o pensamento e as posições individuais dos respectivos autores desses artigos e comentários, sendo portanto da exclusiva responsabilidade dos mesmos autores.

(ii) No mesmo sentido, de natural responsabilização dos autores dos artigos, a utilização de quaisquer elementos de ilustração dos mesmos artigos, como , por exemplo, fotografias, desenhos, gráficos, etc., é, igualmente, da exclusiva responsabilidade dos respetivos autores – que deverão referir as respetivas fontes e obter as necessárias autorizações.

(iii) Para se tentar assegurar o referido e adequado nível técnico e científico da Infohabitar e tendo em conta a ocorrência de uma quantidade muito significativa de comentários "automatizados" e/ou que nada têm a ver com a tipologia global dos conteúdos temáticos tratados na Infohabitar e pelo GHabitar, a respetiva edição da revista condiciona a edição dos comentários à respetiva moderação, pelos editores; uma moderação que se circunscreve, apenas e exclusivamente, à verificação de que o comentário é pertinente no sentido do teor editorial da revista; naturalmente , podendo ser de teor positivo ou negativo em termos de eventuais críticas, e sendo editado tal e qual foi recebido na edição.

 

Considerações sobre direitos e problemas dos idosos – versão de trabalho e base bibliográfica – Infohabitar # 838

 

Infohabitar, Ano XVIII, n.º 838

Edição: quarta-feira, 9 de novembro de 2022

Artigo XX da série editorial da Infohabitar “PHAI3C – Programa de Habitação Adaptável e Intergeracional através de uma Cooperativa a Custo Controlado”

Infohabitar – a revista da GHabitar

Editor: António Baptista Coelho

Arquitecto/ESBAL – Escola Superior de Belas Artes de Lisboa –, doutor em Arquitectura/FAUP – Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto –, Investigador Principal com Habilitação em Arquitectura e Urbanismo no Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), em Lisboa

 

abc.infohabitar@gmail.com

abc@lnec.pt

 

Revista da GHabitar (GH) Associação Portuguesa para a Promoção da Qualidade Habitacional Infohabitar – Associação com sede na Federação Nacional de Cooperativas de Habitação Económica (FENACHE).

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