terça-feira, maio 28, 2019

688 - Sobre o conforto ambiental e a qualidade arquitectónica interior doméstica – Infohabitar 688

Infohabitar, Ano XV, n.º 688                      
Artigo da Série “Habitar e Viver Melhor”

Sobre o conforto ambiental e a qualidade arquitectónica interior doméstica – Infohabitar 688

por António Baptista Coelho (texto e imagens)

Sequem-se algumas notas gerais sobre a relação entre os isolamentos e outros cuidados ambientais e a qualidade de uso e arquitectónica do interior doméstico.


Integrar arquitectonicamente isolamentos e outros cuidados ambientais

Não iremos aqui tratar dos diversos aspectos técnicos do conforto ambiental associados ao isolamento higrotérmico e acústico, à adequação relativamente à ventilação natural, e à adequação/protecção relativamente à insolação e à luz natural dos espaços domésticos, pois tais aspectos estão bem desenvolvidos noutros trabalhos de índole técnica específica e, cada uma dessas temáticas, levar-nos-ia muito longe e bem fora do perfil de reflexão informal, que foi adoptado neste texto.
Dedicamos, sim, alguma atenção à ideia de que o espaço doméstico, a habitação privada: (i) deve ser um espaço bem protegido e que exprima e evidencie tal protecção; (ii) e que esteja estrategicamente aberto/condicionado relativamente às diversas condições naturais de conforto ambiental aplicáveis (higrotérmicas e sonoras, de ventilação e luz natural, e de insolação); e atenção que, tal como sabemos, todas estas matérias interagem umas com as outras quando se projecta um espaço doméstico.
Tais objectivos de protecção e adequada integração no ambiente natural devem marcar, sistemática e cuidadosamente, os espaços domésticos, tornando-os ambientalmente agradáveis e sustentáveis, mas numa perspectiva formal/funcional muito integrada no respectivo partido arquitectónico interior e exterior (as vistas exteriores respectivas), poderíamos até dizer, muito “natural”, nada “imposta”, perfeitamente harmonizada em termos de solução geral e de pormenorização e muito amigável e racional em termos das respectivas condições de controlo funcional corrente e de manutenção.
Julga-se que não se trata de um “lugar comum” ou de uma afirmação óbvia e desnecessária, pois são muito frequentes os casos de “esquecimento” destes aspectos no projecto geral e de pormenorização, um esquecimento que pode ser, infelizmente, muito global e crítico, ou parcial e “infeliz”, caracterizando “soluções” em que os cuidados de conforto ambiental são considerados e aplicados como algo separado da concepção arquitectónica, um pouco como quem aplica um remédio para curar uma doença que poderia ser evitada com um leque natural de cuidados prévios.
Poderíamos ainda referir que, de forma global, os isolamentos e os outros cuidados ambientais naturais que devem integrar as soluções domésticas, nos devem proporcionar a possibilidade de gozar os espaços da nossa habitação em condições, quer de forte separação/isolamento, quer de expressivo aproveitamento relativamente às condições ambientais naturais existentes no exterior – higrotérmicas, sonoras, de ventilação (e qualidade do ar) e de luz naturais, e de insolação.
E poderíamos ainda dizer um pouco mais, defendendo que tais soluções de adequada integração e aproveitamento doméstico das condições de conforto ambiental existentes no sítio da intervenção, podem marcar positivamente a respectiva solução arquitectónica global e pormenorizada.



Fig. 01


Um espaço doméstico que deve ser agradável, que nos deve fazer sentir bem e que nos faz bem à saúde, mas cujo desenvolvimento exige grandes cuidados

Tais exigências, que deveriam ser consideradas como básicas e naturais, proporcionam o desenvolvimento de um espaço doméstico extremamente adequado em termos de condições de luz natural e insolação bem controladas e direccionadas, conforto higrotérmico expressivo e bem controlado, ventilação constante e tão eficaz como pouco perceptível e bem controlável, eficaz e contínua ausência de cheiros e odores menos agradáveis ou intensos, e expressivo e global sossego acústico/sonoro.
E entenda-se que nada nestas condições se refere a um especial acréscimo de custos, mas somente depende de um projecto mais completo e adequado; e sendo que, a prazo, tais condições vão reflectir-se muito positivamente no bem-estar global e na saúde dos respectivos habitantes, com evidentes reflexos muito acrescidos em pessoas mais jovens, mais idosas e com problemas de saúde.
Salienta-se, no entanto, que o cumprimentos de tais exigências básicas de conforto ambiental doméstico obriga a uma formação específica e ao estudo cuidadoso das respectivas matérias, sendo que há problemas críticos a considerar: (i) seja no frequente e já referido pouco cuidado da concepção arquitectónica nestes assuntos; (ii) seja na frequente e deficiente formação que estas matérias, ainda, merecem ao nível universitário; (iii) seja na também, ainda, frequente ausência de documentação adequada e directamente dirigida para a relação entre estas matérias e a concepção arquitectónica, e , já agora, na reduzida divulgação das melhores obras existentes.
E o que dizer da própria capacidade projectual de integrar, muito positivamente, todas estas exigências de conforto ambiental num partido arquitectónico adequado e interessante: no mínimo, há que reconhecer que não é fácil, até porque esses aspectos devem ser harmonizados com outros importantes aspectos de projecto – tais como as vistas exteriores e interiores, a segurança no uso corrente, a espaciosidade funcional, a versatilidade doméstica, a privacidade e o convívio – mas trata-se de algo que tem de ser adequadamente desenvolvido e que, quando cumprido, é elemento muito valorizador e caracterizador da respectiva solução.


Fig. 02

Um interior doméstico, tipo "concha de caracol", mas equilibrado

Ainda um outro aspecto que importa ter em conta nesta ampla matéria da relação íntima entre o mundo do conforto ambiental doméstico e o mundo da respectiva apropriação espaço-funcional é que devemos poder gozar um interior doméstico, tipo "concha de caracol", portanto, extremamente adequado ao modo como o vivemos pessoalmente em grupo, nas mais diversas ocasiões, um mundo doméstico que nos protege e acompanha quase como uma segunda pele e que também até nos caracteriza, exactamente, como sendo uma segunda pele; mas, no entanto, esse mesmo mundo doméstico também deve ser algo que “vive por si”, com equilíbrios próprios e adequados, um pouco como um nosso grande aliado, mas que também, um outro dia será aliado de outro(s), ganhando, assim, uma espécie de interessante identidade urbana e doméstica própria e desejavelmente estimulante – e nestes sentidos o mundo doméstico também ganhará com um relativo distanciamento em termos da sua possível “personalização” e, nesta matéria, parece que o seu conteúdo “mais técnico” (embora bem domesticado) pode ser um bom aliado neste objectivo de concepção.

Sobre as diversas dimensões do conforto ambiental doméstico: algumas (poucas) notas complementares

O isolamento/condicionamento higrotérmico está minimamente garantido em termos regulamentares designadamente no que refere à nova construção, mas há, frequentemente, uma tendência para o condicionamento mecânico do ar, em detrimento de soluções mais naturais e positivamente passivas.
A questão da ventilação natural e da respectiva estratégia não é um dado adquirido, embora dependa de aspectos tão óbvios como fazer janelas estanques ao ar, mas integrando dispositivos de ventilação específicos e que tenham, depois, “seguimento”, em percursos de ar no interior da habitação (ex., bandeiras de iluminação e ventilação sobre portas).
Quanto ao isolamento sonoro ele depende tanto de cuidados construtivos específicos e nada especiais na constituição de determinadas paredes, das lajes e dos vãos exteriores, como de uma estratégia de distribuição das zonas funcionais do edifício que não faça vizinhos espaços ruidosos de outros onde o sossego seja fundamental (exemplo ascensores e quartos) e que tenha cuidado com os sítios onde passam as instalações de águas e esgotos, numa mesma lógica de os afastar e/ou isolar relativamente a espaços mais sossegados da habitação. E, naturalmente, que terá de haver, também, uma estratégia adequada de vizinhanças dos diversos espaços domésticos relativamente aos espaços exteriores contíguos, mais e menos ruidosos
Relativamente à recepção da radiação solar de forma equilibrada, ela depende, também, de uma adequada estratégia organizativa da habitação, que faça que os compartimentos a recebam, tendencialmente, mais nas horas e nas estações onde ela é bem-vinda, e aqui é possível orientar os diversos tipos de compartimentos consoante a sua utilização preferencial, por exemplo, com os quartos de dormir mais a nascente, salas mais a sul, cozinhas a norte e casas de banho a poente, sendo que há, também, a possibilidade de tratar o exterior do edifício com pequenas palas (ou outros elementos funcionais) que produzam sombra no Verão e não no Inverno, e nada disto é mais caro do que fazer mal, não ligando a estes aspectos; só que dá um pouco mais de trabalho em fase de projecto, e, naturalmente, numa cidade nunca será possível orientar as habitações todas da mesma maneira – até porque as próprias ruas urbanas também ganham com uma adequada estratégia de sombreamento.
Mas grandes a janelas a poente, impossíveis de serem protegidas no Verão, habitações apenas com janelas numa parede (sem ventilação cruzada entre duas paredes opostas), casas de banho interiores e janelas sem vãos específicos de ventilação, isso, por favor, nunca mais, quando se trata de nova habitação.
Destaca-se, ainda, a questão da fundamental abundância de luz natural, que deveria ser uma condição básica em qualquer habitação, mas infelizmente tal não acontece, parecendo que estamos ainda na altura em que quaisquer 5 centímetros a mais na largura das janelas era condição de fracasso financeiro da operação.
E finalmente há que referir que palas verdadeiramente úteis (bem salientes e desenhadas com cuidado, (por exemplo, no pormenor do lacrimal), são elementos fundamentais para a conjugação de aspectos de agradabilidade e, já agora, de alguma cuidadosa atractividade no respectivo projecto de arquitectura.

Notas editoriais:
(i) Embora a edição dos artigos editados na Infohabitar seja ponderada, caso a caso, pelo corpo editorial, no sentido de se tentar assegurar uma linha de edição marcada por um significativo nível técnico e científico, as opiniões expressas nos artigos e comentários apenas traduzem o pensamento e as posições individuais dos respectivos autores desses artigos e comentários, sendo portanto da exclusiva responsabilidade dos mesmos autores.
(ii) De acordo com o mesmo sentido, de se tentar assegurar o referido e adequado nível técnico e científico da Infohabitar e tendo em conta a ocorrência de uma quantidade muito significativa de comentários "automatizados" e/ou que nada têm a ver com a tipologia global dos conteúdos temáticos tratados na Infohabitar e pelo GHabitar, a respetiva edição da revista condiciona a edição dos comentários à respetiva moderação, pelos editores; uma moderação que se circunscreve, apenas e exclusivamente, à verificação de que o comentário é pertinente no sentido do teor editorial da revista; naturalmente , podendo ser de teor positivo ou negativo em termos de eventuais críticas, e sendo editado tal e qual foi recebido na edição.

Infohabitar, Ano XV, n.º 688

Sobre o conforto ambiental e a qualidade arquitectónica interior doméstica – Infohabitar 688


Infohabitar
Editor: António Baptista Coelho
Arquitecto/ESBAL, doutor em Arquitectura/FAUP – Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto, Investigador Principal com Habilitação em Arquitectura e Urbanismo/LNEC – Laboratório Nacional de Engenharia Civil



Revista do GHabitar (GH) Associação Portuguesa para a Promoção da Qualidade Habitacional Infohabitar – Associação com sede na Federação Nacional de Cooperativa de Habitação Económica (FENACHE).

terça-feira, maio 21, 2019

687 - As janelas e o interior doméstico – Infohabitar 687

Infohabitar, Ano XV, n.º 687                      

As janelas e o interior doméstico – Infohabitar 687

Artigo da Série “Habitar e Viver Melhor”
por António Baptista Coelho (texto e imagens)

Sequem-se algumas notas sobre a relação entre o interior doméstico e os respectivos vãos de janela, considerados estes vãos como importantes elementos de construção, acabamento, e qualidade arquitectónica do interior doméstico.


Pensar as janelas como elementos de composição dos alçados/volumetrias, mas também como elementos multifuncionais e de composição do interior doméstico.

Quando abordamos as janelas domésticas, do ponto de vista da respectiva concepção, parece haver, frequentemente, uma tendência para as considerarmos, de forma privilegiada, essencialmente como elementos de composição dos respectivos alçados e volumetrias.

Naturalmente, que esta é uma perspectiva genérica, mas é interessante considerá-la no que se refere ao relativo “esquecimento” que ela pode induzir, seja, numa primeira linha, no que se refere aos diversos conteúdos funcionais que podem e devem ser assegurados por uma janela, seja no que se refere à própria integração e ao papel formal das janelas na estruturação e na composição dos interiores domésticos.

É, basicamente, este lembrete o que corresponde à matéria tratada nos textos que se seguem, que devem, no entanto, ser tomados, basicamente, como uma reflexão muito livre sobre o assunto; e que decorre de alguma prática profissional de projectista e de uma muito longa prática profissional como agente de análise pormenorizada de centenas de casos práticos de edifícios habitacionais.

Breves notas sobre as janelas domésticas como elementos de composição dos alçados/volumetrias

Não sendo, aqui, o sítio adequado para uma reflexão alongada sobre o papel das janelas domésticas como elementos de composição dos respectivos alçados/volumetrias, pois estamos, agora, no mundo do interior doméstico e não nos níveos da vizinhança residencial, importará, no entanto, considerar que a formalização pormenorizada das janelas de peito e de sacada, bem como as associadas pormenorizações de varandas e balcões, não respeita, frequentemente, um equilíbrio formal e funcional marcado por significativos aspectos de integração local, escala humana e caracterização residencial.

A opção faz-se, frequentemente, por soluções normalizadas e pouco harmonizadas com a escala e o carácter do respectivo edifício residencial, e o que dizer de uma ausência de uma pormenorização que, para além de servir tais preocupações de integração e de escala, pudesse realmente valorizar a solução global de alçados e de volumetria numa perspectiva de solução verdadeiramente global, integrada nos seus elementos e na envolvente e expressivamente caracterizadora daquele edifício ou conjunto edificado específicos: sendo esta última opção, naturalmente, aquela que é marcada por uma adequada qualidade arquitectónica.

Sabemos, evidentemente, que uma tal opção tem importantes implicações económicas (ex., pormenorização específica para um dado edifício), mas por vezes até em soluções sem expressivas preocupações de economia ela não existe e, em outros casos, fica muito evidente não ter havido uma adequada pesquisa das múltiplas soluções-tipo disponíveis e não tenhamos dúvida que, hoje em dia (ao contrário do que acontecia há algumas dezenas de anos), há inúmeras soluções de catálogo disponíveis para se poderem “montar” soluções específicas de fenestração bem integradas e valorizadoras da respectiva solução arquitectónica global.

Fig. 01: janela com ampla luz natural, com enquadramento de vistas do exterior, com vão de correr manobrável, com vidro de segurança abaixo do parapeito ...

Notas sobre a multifuncionalidade das janelas domésticas

Um outro aspecto que importa, sempre, lembrar quando se aborda a temática da fenestração doméstica, refere-se à fundamental multifuncionalidade que deve marcar a respectiva concepção, considerando-se, designadamente, os seguintes aspectos formais/funcionais:

- adequadas condições de relação com o exterior, a partir do interior doméstico e também, um pouco, “vice-versa”, através de adequadas “transparências” e expressões funcionais dos espaços interiores domésticos sobre as respectivas vizinhanças de proximidade;

- adequadas condições de conforto ambiental interior – boa luz natural e adequadas condições de obscurecimento, bom isolamento térmico e sonoro e boa ventilação natural;

- adequadas condições de segurança: no uso, designadamente, por crianças e idosos, e visando-se, especificamente, riscos de queda no uso normal e quando em acções de manobra e manutenção; e por previsão do respectivo encerramento (segurança contra intrusões);

- e adequadas condições de possibilidade de uso de espaços exteriores e interiores contíguos; seja de forma independente (ex., só espaços exteriores, ou só espaços interiores); seja de forma integrada, através de estimulantes continuidades entre interiores e exteriores domésticos.


Fig. 02: uma janela dupla perfeitamente enquadrada com móvel aparador, estruturando a sala-comum.

Reflexões sobre as janelas como elementos de composição do interior doméstico

As janelas domésticas devem ser encaradas como elementos cujas características formais e funcionais estejam adequadamente harmonizadas com a caracterização global de um ambiente/quadro doméstico e com um muito amplo leque de opções em termos de arranjos domésticos, condição esta que obrigará a um sensível cuidado em termos de soluções formais de janelas que sejam, pelo menos, compatíveis com esse amplo leque de arranjos.

Há, no entanto, aspectos básicos a considerar na fenestração, de forma privilegiada ou estruturadora da organização doméstica e entre estes  sobressai a capacidade de mobilar os diversos compartimentos e espaços, associada, designadamente, à expressiva disponibilização de paredes para encostar mobiliário, mas também associada a questões de dimensionamentos versáteis, que proporcionem, por exemplo, mobilar e circular, e ainda associada a adequadas relações geométricas entre paredes e vãos de janela e de porta, proporcionando a sua respectiva manobra mas também a boa integração de mobiliário (ex., aproveitando bem os cantos dos compartimentos).
Um exemplo interessante deste tipo de preocupações encontra-se em tradicionais soluções de fenestração, cujas folhas envidraçadas e portadas de segurança ficam praticamente “embebidas” na espessura das paredes, em vãos tão funcionais como fortemente expressivos pela sua capacidade simbólica e marcante de uma relação interior/exterior bem enquadrada e enquadradora.

É essencial pensar, pelo menos, na materialidade das soluções de fenestração e na sua expressão formal mais marcante; uma preocupação que nos pode levar a escolher vãos de janela com perfis de caixilharia reduzidos, material e cromaticamente neutros (no que se refere ao seu potencial de harmonização com variados arranjos interiores) e com superfícies envidraçadas maximizadas; opções estas que, no entanto, não devem comprometer outras exigências a ter com os vãos exteriores, essencialmente no que se refere ao conforto ambiental interior, designadamente, no que se refere ao sombreamento e à ventilação natural.

Uma das soluções historicamente consolidadas em termos da harmonização interior de soluções de fenestração liga-se ao uso, nesta fenestração e nos seus elementos associados, de materiais, texturas e acabamentos naturais (ex., aço, madeira, tecidos naturais e “lisos”, etc.), sendo que, com sentido contrário, as soluções marcadas pela artificialidade (ex., plásticos) podem comprometer significativamente a referida harmonização interior doméstica entre fenestração e os mais diversos tipos e conteúdos de arranjos. 

Há, ainda, um aspecto essencial a considerar na previsão da fenestração doméstica, “pelo interior”, que é a fundamental adequação dos vãos relativamente à sua orientação solar, tendo-se em conta a necessidade de dispositivos específicos de controlo da insolação, da luz natural e da ventilação natural, muito ligados às características específicas de orientação de cada vão e que também devem cumprir as referidas condições de harmonização com um amplo leque de potencias arranjos interiores domésticos.

Também um importante aspecto a ter em conta na boa integração da fenestração nas diversas soluções de espaços domésticos interiores, refere-se às respectivas condições de “securização” dos vãos contra intrusões; matéria sensível e complexa, pois as soluções de portadas interiores deixaram de ter, actualmente, expressiva aplicabilidade e sendo que as soluções baseadas em alarmes acabam por ser diversas nas condições disponibilizadas, não proporcionando uma clara expressão de um sentido de segurança directa contra intrusões.


Notas editoriais:
(i) Embora a edição dos artigos editados na Infohabitar seja ponderada, caso a caso, pelo corpo editorial, no sentido de se tentar assegurar uma linha de edição marcada por um significativo nível técnico e científico, as opiniões expressas nos artigos e comentários apenas traduzem o pensamento e as posições individuais dos respectivos autores desses artigos e comentários, sendo portanto da exclusiva responsabilidade dos mesmos autores.
(ii) De acordo com o mesmo sentido, de se tentar assegurar o referido e adequado nível técnico e científico da Infohabitar e tendo em conta a ocorrência de uma quantidade muito significativa de comentários "automatizados" e/ou que nada têm a ver com a tipologia global dos conteúdos temáticos tratados na Infohabitar e pelo GHabitar, a respetiva edição da revista condiciona a edição dos comentários à respetiva moderação, pelos editores; uma moderação que se circunscreve, apenas e exclusivamente, à verificação de que o comentário é pertinente no sentido do teor editorial da revista; naturalmente , podendo ser de teor positivo ou negativo em termos de eventuais críticas, e sendo editado tal e qual foi recebido na edição.

Infohabitar, Ano XV, n.º 687

As janelas e o interior doméstico – Infohabitar 687


Infohabitar
Editor: António Baptista Coelho
Arquitecto/ESBAL, doutor em Arquitectura/FAUP – Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto, Investigador Principal com Habilitação em Arquitectura e Urbanismo/LNEC – Laboratório Nacional de Engenharia Civil




Revista do GHabitar (GH) Associação Portuguesa para a Promoção da Qualidade Habitacional Infohabitar – Associação com sede na Federação Nacional de Cooperativa de Habitação Económica (FENACHE).

terça-feira, maio 14, 2019

686 - Guardas, parapeitos e peitoris domésticos – Infohabitar 686

Infohabitar, Ano XV, n.º 686                      

Guardas, parapeitos e peitoris domésticos e qualidade arquitectónica – Infohabitar 686

Artigo da Série “Habitar e Viver Melhor”
por António Baptista Coelho (texto e imagem)


Sequem-se algumas notas sobre a relação entre entre guardas, parapeitos e peitoris, considerados como importantes elementos de construção e de acabamento, e a qualidade de uso e arquitectónica do interior doméstico.



Guardas, parapeitos e peitoris domésticos: aspectos gerais ligados à qualidade arquitectónica

A constituição e configuração das guardas, parapeitos e peitoris domésticos refere-se, naturalmente a um elemento de projecto que importa harmonizar, seja considerando o efeito/composição global e pormenorizado dos respectivos alçados e volumetrias, em termos de vistas exteriores gerais e de aproximação;

seja considerando o seu efeito/composição pormenorizado em termos das vistas interiores domésticas em que se incluam os respectivos vãos;

seja no que se refere ao seu efeito em termos de vistas de enquadramento e de comunicabilidade/”atravessamento”, que são possíveis a partir do interior sobre o exterior;

seja considerando as suas influências directas e indirectas em termos das condições de segurança no uso, iluminação natural e ventilação natural dos espaços interiores servidos;

seja no que se refere a suas eventuais funcionalidades diversificadas, por exemplo: estar no exterior, debruçar sobre o exterior, ocupar com contentores e vasos de plantas, etc.;
seja no que se refere às respectivas condições de segurança no uso – matéria esta, que, devido à sua importância, é, em seguida, um pouco mais desenvolvida.

Será, talvez, oportuno apontar aqui que a qualidade arquitectónica integrada de uma dada solução de guardas, parapeitos ou peitoris, dependerá do nível, desejavelmente expressivo, de conjugação dessas soluções na totalidade do respectivo projecto/obra, atingindo-se, desejavelmente, situações em que essas soluções não têm presença autonomizável, mas apenas totalmente “embebida” na solução arquitectónica respectiva e global, e mesmo valorizando-a em termos da percepção da respectiva pormenorização.

Uma condição de expressiva integração da pormenorização na solução geral, que, hoje em dia, estará talvez um pouco mais facilitada pela disponibilização de um grande leque de soluções formais, funcionais e variadamente “materializadas”, mas que exige sempre uma grande sensibilidade e um grande cuidado na respectiva pormenorização e no vaivém obrigatório que tem de acontecer entre ela e a expressão do projecto global.


Fig. 01: guardas, parapeitos e peitoris domésticos: segurança e visibilidades estratégicas


Guardas, parapeitos e peitoris domésticos: segurança e visibilidades estratégicas

Nota importante: as reflexões que se seguem, designadamente referidas às condições de segurança em guardas, parapeitos e peitoris domésticos, não são exaustivas e, portanto, não substituem uma pesquisa bibliofráfica e documental adequada.
A constituição e configuração das guardas e peitoris deve ter em conta um máximo de condições de segurança em termos de altura ao pavimento, características "à prova de subida de crianças", e distâncias máximas de segurança entre elementos verticais constituintes; trata-se de matéria que não estando talvez ainda adequadamente regulamentada deve ser objecto da máxima atenção por parte dos projectistas.

Por esta razão apontam-se, em seguida, alguns aspectos de configuração de guardas que contribuem para a prevenção de quedas: (1)

"Abaixo da altura de protecção não existirão aberturas com dimensões maiores do que 0.12m, para evitar a passagem de uma criança, frestas rasantes ao pavimento maiores do que 0.05m, nem elementos que facilitem a escalada do parapeito ou da guarda; quando abaixo da altura de protecção existirem encerramentos em chapa de vidro, este deverão ser temperados, ou armados com malha metálica ou laminado plástico." 

E há que ter em conta que as guardas opacas despertam a curiosidade nas crianças, levando-as, por vezes, a subirem ao parapeito.

No entanto, e tal como foi registado no estudo no LNEC que tem sido referido nesta série editorial (ITA 2 – Do Bairro e da Vizinhança à Habitação”), os parapeitos devem permitir vistas ao longe e ao perto, sobre o exterior envolvente, e para isso devem ser relativamente baixos, também porque devem considerar a visibilidade de uma pessoa sentada perto da janela, condição esta que evidencia o interesse das janelas de sacada, ou das janelas com peitoril bastante baixo.

E não tenhamos quaisquer dúvidas de que um adequado tratamento "cénico" das vistas exteriores proporcionadas de uma dada habitação, considerando-se a possibilidade de reconfiguração dos seus vãos exteriores, produz efeitos verdadeiramente inesperados e com enorme impacto na vivência doméstica, sendo que, quando esta vida doméstica é vivida longa e intensamente, como acontece, frequentemente, no caso dos habitantes mais idosos e/ou de pessoas doentes e/ou com mobilidade condicionada, a possibilidade de se poderem usufruir vistas exteriores relativamente “mergulhantes” a partir de posições sentadas e próximas das janelas, tal possibilidade pode passar a ser uma quase-exigência para se cumprir uma concepção e uma qualidade arquitectónica vivencial interior verdadeiramente adequadas.

Salienta-se a distinção que Neufert faz entre parapeitos baixos para salas elevadas e com boas vistas (altura 0.50m, idêntica à altura proposta por Alexander) e parapeitos normais para salas e quartos de trabalho.(2) Há assim aqui uma evidente tendência para janelas domésticas com parapeito baixo, muito mais "paisagístico" do que o seguro parapeito com cerca de 90cm de altura, mas haverá aqui um trabalho a fazer para tornar seguros esses parapeitos mais baixos , por exemplo, com vidro de segurança e dispositivos específicos de fecho das respectivas janelas.

Tal como aponta Alexander uma outra solução, que evita a ambiguidade das janelas de sacada, que podem parecer portas, está em janelas com peitoris baixos entre 0.30 e 0.50m (convenientemente protegidos) e em "janelas francesas ou à francesa" (com soleiras a cerca de 0.10/0.15m de altura do pavimento interior), que permitem vistas mergulhantes sobre o exterior próximo até cerca de 0.60m de distância do vão. (3)

E importa sublinhar a necessidade urgente de se desenvolverem, aprofundarem e apontarem aspectos essenciais de segurança na configuração e constituição de guardas, parapeitos e peitoris domésticos, pois trata-se de matéria crítica que, infelizmente, vai pontuando notícias trágicas que surgem, periodicamente, em meios de comunicação social. 

E não se trata de se visar uma segurança “total”, mas tão somente inviabilizar ou dificultar muito os riscos de acidente mais frequentes e mais críticos – ex., quedas por atravessamento, por escalamento ou por parapeitos/peitoris baixos, ferimentos por quebra e queda de vidros, etc.

E um aspecto também muito importante nesta matéria de uma maior segurança no uso de guardas, parapeitos e peitoris domésticos e á consideração dos seus respectivos aspectos de durabilidade e de manutenção regular, pois também não é de aceitar seja a reduzida durabilidade das soluções seja que as operações de manutenção regular sejam feitas com risco das condições de segurança dos respectivos agentes de manutenção.


Guardas, parapeitos e peitoris domésticos: apropriação e variadas potencialidades

Para além de todos estes aspectos mais "objectivos" e funcionais há uma outra verdadeira dimensão dos espaços disponibilizados em alguns parapeitos e em muitos peitoris e zonas de soleira de janelas, que merece uma atenção muito específica, pois acaba por proporcionar uma boa parte da capacidade de apropriação oferecida pela habitação.

Estamo-nos a referir a aspectos aparentemente tão comezinhos como haver espaço para encher parapeitos com pequenos vasos com plantas e com os mais diversos objectos decorativos, personalizando e marcando, por exemplo, vãos de janela e criando assim zonas de "descompressão/limiar" com grande capacidade de atractividade e de identidade, tanto quando vistas do exterior como do interior doméstico.

E tais pequenas zonas são também espaços de expansão visual e virtual dos compartimentos onde se situam e nestes aspectos muito ganham com uma sua formalização rebaixada e/ou com o seu desenvolvimento em encalços ou vãos profundos, uma profundidade que era construtivamente justificada, até meados do século XX, e que hoje em dia ganhou algum fôlego, seja com a previsão de paredes mais espessas por incorporarem recheios isolantes, seja com o relativo "prolongamento" dos vãos através de elementos que os protegem da radiação solar excessiva - embora haja que ter cuidado com a largura de encaixe das escadas portáteis dos bombeiros.

O que aqui se defende é que é necessário tratar, arquitectonicamente, e suscitar a apropriação de uma margem relativamente espessa no contorno do espaço doméstico e especificamente nas zonas de relação entre este espaço e o exterior, ganhando-se, assim, sentido de protecção, sentido de espaço e de volume, maior espaciosidade aparente e um ambiente interior verdadeiramente mais qualificado, porque elaborado, rematado e singular. E afinal trata-se, "apenas", de recuperar o sentido amplo, formal e funcional, que deve ter qualquer abertura da habitação sobre o exterior, uma abertura que deve ser sempre muito mais do que um simples "vão".

Notas:
(1) Ministerio de Obras Publicas y Urbanismo (MOPU), "Normas Tecnicas de Diseño y Construccion de las Viviendas Sociales", p. 27.
(2) Ernest Neufert, "Arte de Projetar em Arquitetura", p. 110.
(3) Christopher Alexander; Sara Ishikawa; Murray Silverstein; et al, "A Pattern Language/Un Lenguaje de Patrones", pp. 910 e 911.

Notas editoriais:
(i) Embora a edição dos artigos editados na Infohabitar seja ponderada, caso a caso, pelo corpo editorial, no sentido de se tentar assegurar uma linha de edição marcada por um significativo nível técnico e científico, as opiniões expressas nos artigos e comentários apenas traduzem o pensamento e as posições individuais dos respectivos autores desses artigos e comentários, sendo portanto da exclusiva responsabilidade dos mesmos autores.
(ii) De acordo com o mesmo sentido, de se tentar assegurar o referido e adequado nível técnico e científico da Infohabitar e tendo em conta a ocorrência de uma quantidade muito significativa de comentários "automatizados" e/ou que nada têm a ver com a tipologia global dos conteúdos temáticos tratados na Infohabitar e pelo GHabitar, a respetiva edição da revista condiciona a edição dos comentários à respetiva moderação, pelos editores; uma moderação que se circunscreve, apenas e exclusivamente, à verificação de que o comentário é pertinente no sentido do teor editorial da revista; naturalmente , podendo ser de teor positivo ou negativo em termos de eventuais críticas, e sendo editado tal e qual foi recebido na edição.

Infohabitar, Ano XV, n.º 686

Guardas, parapeitos e peitoris domésticos e qualidade arquitectónica interior – Infohabitar 686


Infohabitar
Editor: António Baptista Coelho
Arquitecto/ESBAL, doutor em Arquitectura/FAUP – Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto, Investigador Principal com Habilitação em Arquitectura e Urbanismo/LNEC – Laboratório Nacional de Engenharia Civil



Revista do GHabitar (GH) Associação Portuguesa para a Promoção da Qualidade Habitacional Infohabitar – Associação com sede na Federação Nacional de Cooperativa de Habitação Económica (FENACHE).

Apoio à Edição: José Baptista Coelho - Lisboa, Encarnação - Olivais Norte.

terça-feira, maio 07, 2019

685 - Vãos de porta e qualidade arquitectónica interior – Infohabitar 685

Infohabitar, Ano XV, n.º 685                      
Vãos de porta e qualidade arquitectónica interior – Infohabitar 685
Artigo da Série “Habitar e Viver Melhor”
por António Baptista Coelho (texto e imagens)


Vãos de porta e qualidade arquitectónica interior

Sequem-se algumas notas sobre a relação entre os vãos de porta, considerados como importantes elementos de construção e de acabamento, e a qualidade de uso e arquitectónica do interior doméstico.


Vãos de porta – aspectos mais gerais

Vamos separar aqui as portas da habitação, que a separam e ligam relativamente aos espaços públicos ou comuns exteriores ou interiores, das outras portas interiores domésticas, e como veremos até acaba por haver alguns pontos comuns entre as duas tipologias.
Há aspectos, aparentemente óbvios, mas que proporcionam mudanças potencialmente muito positivas nos ambientes domésticos, é o caso da concepção das portas domésticas; e aqui a questão estará tanto na altura, como nas características de opacidade e de acabamento destes vãos.
De certa forma poderemos comentar que um vão de porta doméstico deverá cumprir basicamente os seguintes aspectos espaço-funcionais, de conforto, de segurança e de apropriação:
- os seus aspectos funcionais específicos, que são bem diferentes tratando-se, por exemplo, de uma porta exterior de acesso principal, de uma porta interior de uma sala-comum, ou de uma porta interior de um quarto;
- uma adequada relação com o conforto ambiental e a segurança dos espaços contíguos que são por ela directamente servidos;
- e uma adequada relação com a caracterização arquitectónica global e pormenorizada da respectiva intervenção.
Naturalmente que há soluções-tipo para condições espaço-funcionais tipificáveis, mas importa ter sempre presente esse “pequeno” leque exigencial, que, na prática, é, em boa parte, o responsável por muitas das melhores soluções domésticas de arquitectura de interiores: com portas de entrada que nos dão as boas-vindas ao nosso mundo doméstico e que igualmente qualificam os espaços comuns do edifício e com portas interiores que asseguram boa parte do conforto ambiental interior (ex., luz natural, isolamento sonoro), mas também boa parte da caracterização arquitectónica da solução doméstica.

(Fig. 01) As portas de entrada na habitação devem integrar-se muito positivamente na respectica composição global. 

Portas principais da habitação

Idealmente, a principal porta que nos liga e separa relativamente a espaços privados mas exteriores ou relativamente a espaços comuns ou públicos deve  oferecer resistência e isolamento ao ruído e a vistas incómodas, mas também pode/deve facultar alguma transparência e deve caracterizar-se por uma aparência atraente, identificável e apropriável, em si própria, e em eventuais aspectos de pormenor que lhe sejam contíguos.
Este último sentido de identidade e mesmo de representação é de sobremaneira importante na concepção destes vãos de porta, numa perspectiva que pode, naturalmente, variar, entre aspectos de maior sobriedade ou de maior representatividade, uma escolha que estará, naturalmente, condicionada em edifícios multifamiliares, onde se privilegia uma atraente uniformidade de tratamento de todos os vãos de porta que abrem sobre os respectivos espaços comuns; e uma escolha – entre mais sobriedade ou mais representatividade – que deverá ser, sempre, marcada por uma adequada e afirmada boa integração global e pormenorizada, havendo aspectos programados que devem servir a identidade/representatividade de cada porta/fogo, seja pontualmente bem integrados na solução, seja deixados à livre iniciativa dos respectivos habitantes (ex., locais adequados para vasos com plantas).
Importa ainda referir que, nos últimos anos, e designadamente com o cresci emento das preocupações com a segurança doméstica tem sido desenvolvida uma linha de soluções de portas de segurança que parece não ter, ainda, devidamente integrada uma adequada preocupação com as respectivas condições de aspecto e de apropriação.
Parece portanto haver, actualmente, na promoção multifamiliar uma espécie de crise na oferta de soluções verdadeiramente atraentes de portas de entrada, que acabam por se reduzir à sua função de segurança, aliás numa triste continuidade de ausência de pormenorização e de agradáveis condições de conforto ambiental (exemplo, luz e ventilação naturais) que, também por regra, caracteriza os respectivos patins comuns de acesso; e não tenhamos dúvidas de que não se trata aqui de qualquer fatalidade, mas sim de escolhas em termos de concepção e de se encarar o habitar multifamiliar numa completa e renovada perspectiva de qualidade arquitectónica.
Passando, agora, a algumas observações conclusivas e de maior pormenor, que podem abrir linhas para posteriores desenvolvimentos, e segundo Alexander, a marcação do momento de passagem entre dois espaços bem distintos, e, nomeadamente, da entrada em casa, pode ser acentuada, , por um vão de porta baixo (cerca de 1.90m) e largo (porque a largura aumenta a sensação de redução de altura); poderíamos pensar, ainda, em vãos que simulem os tradicionais, parecendo ainda mais baixos, quando nos aproximamos deles. (1)
E é interessante sublinhar que soluções deste tipo, que, de certo modo, querem transformar o simples vão numa espécie de “vão/espaço” bem caracterizado, podem ser criadas nos vãos principais da habitação, mas também em zonas “estratégicas” do interior da casa onde se queira reforçar a reserva no acesso e o grau de intimidade dos espaços e compartimentos a que se tem acesso (ex., recanto da lareira, escritório, quarto de dormir, acesso entre quarto e casa de banho privada); e é possível associar tais aspectos, por exemplo, a bandeiras superiores e/ou laterais que fazem transparecer a luz natural.

(Fig. 02) A porta de entrada deve enquadrar e valorizar o respectivo interior doméstico, direccionando e resguardadndo vistas; e a porta de entrada fechada deveria fazer transparecer um pouco da vida interior, ainda que seja, apenas, um pequeno sinal de vida.

Portas interiores da habitação

As portas interiores domésticas são, também, ilustres esquecidas no corrente pensar da habitação, pois tanto as suas características formais específicas, como a sua solução global podem ser reconsideradas, em termos da sua própria constituição, opaca ou total ou parcialmente transparente ou translúcida, e da existência de bandeiras superiores e/ou laterais; e os respectivos efeitos finais nos respectivos, compartimentos, corredores e vestíbulos contíguos, são bem distintos; e o que dizer da caracterização do respectivo espaço doméstico? Pois não haverá dúvida na grande diferença entre uma estrutura de circulação doméstica marcada, praticamente, pelo mesmo vão de porta opaco e uma outra estrutura de circulação doméstica, que se torna num verdadeiro espaço de estruturação e circulação, pois é bem servido e caracterizado por um leque bem adequado de diversas soluções de portas (mais opacas, mais translúcidas, com ou sem bandeiras, etc.).
Segundo Alexander, as portas interiores envidraçadas têm uma aplicação adequada não só em grandes compartimentos representativos, mas também em pequenos compartimentos que ganham, interiormente, com essa abertura, parecendo maiores, porque mais ligados ao resto do fogo (2); e complementa-se esta reflexão com a ideia de se poder "preencher" os ambientes interiores de características bem distintas, através deste tipo de cuidados, por exemplo criando-se uma zona de trabalho em casa, cuja porta, envidraçada e translúcida, qualifica de forma muito mais adequada, até através de uma gravação sóbria no vidro do respectivo tipo de ocupação.
A questão da programação de bandeiras envidraçadas e proporcionando a circulação do ar num sistema global e permanente, em toda a habitação (através de dispositivos de ventilação específicos), deve ser adequadamente considerada no projecto, matéria que deve levar a uma reflexão sobre a altura livre entre piso e tecto (pé-direito); e não tenhamos dúvida que haverá muito a ganhar em termos de conforto ambiental e de ambiente geral doméstico com este simples cuidados.
Um outro aspecto que deve ser regra é que as portas sejam definidas de modo a que propiciem uma maximização das condições de acessibilidade e de integração de mobiliário nos compartimentos; e, a este propósito, lembra-se que Neufert considera a posição mais correcta para abertura de portas, aquela que proporciona a sua abertura em direcção a uma parede próxima, de modo a que a rotação mínima para se entrar possa ser reduzida a cerca de 45º, contra cerca de 110º na direcção oposta; e quanto às distâncias mínimas entre a porta aberta, ortogonalmente à parede do seu vão, e a parede, Neufert define 0.68m, como espaço adequado para um armário com cerca de 0.60m de profundidade. (3)
Notas:
(1) Christopher Alexander; Sara Ishikawa; Murray Silverstein; et al, "A Pattern Language/Un Lenguaje de Patrones", pp. 916 e 917.[1]           
(2) Christopher Alexander; Sara Ishikawa; Murray Silverstein; et al, "A Pattern Language/Un Lenguaje de Patrones", p. 959.
(3) Ernest Neufert, "Arte de Projetar em Arquitetura", p. 116.


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Infohabitar, Ano XV, n.º 685
Vãos de porta e qualidade arquitectónica interior – Infohabitar 685

Infohabitar
Editor: António Baptista Coelho
Arquitecto/ESBAL, doutor em Arquitectura/FAUP – Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto, Investigador Principal com Habilitação em Arquitectura e Urbanismo/LNEC – Laboratório Nacional de Engenharia Civil



Revista do GHabitar (GH) Associação Portuguesa para a Promoção da Qualidade Habitacional Infohabitar – Associação com sede na Federação Nacional de Cooperativa de Habitação Económica (FENACHE).

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