quarta-feira, setembro 17, 2025

Da habitação ao Habitat – infohabitar # 949

Da habitação ao Habitat – infohabitar # 949

Informa-se que para aceder (fazer download) do mais recente Catálogo Interativo da Infohabitar, que está tematicamente organizado em mais de 20 temas e tem links diretos para os 922 artigos da Infohabitar, existentes em janeiro de 2025 (documento pdf ilustrado e com mais de 80 pg), usar o link seguinte:

https://drive.google.com/file/d/1vw4IDFnNdnc08KJ_In5yO58oPQYkCYX1/view?usp=sharing

Infohabitar, ano XXI, n.º 949

Edição: quarta-feira 17 de setembro de 2025 

 

 

Editorial

Tal como foi referido desde há algumas semanas, continuamos a divulgar uma série de artigos realizados por novos autores ainda não editados aqui na Infohabitar e ligados à recente revitalização do GHabitar Associação Portuguesa para a Promoção da Qualidade Habitacional – antigo Grupo Habitar, uma associação técnica e científica sem fins lucrativos que tem estado a redinamizar a sua ação com diversas atividades por todo o País e que irão sendo aqui divulgadas, salientando-se, desde já, a sessão que terá lugar em Lisboa a 25 de setembro com as participações apontadas na imagem que se segue.

 


Temos, portanto, o gosto muito especial de passar, em seguida, ao artigo que nos foi enviado pela colega Conceição Melo, atual Vice-Presidente da Direção do GHabitar, a quem saudamos de forma muito cordial, texto este intitulado “Da habitação ao Habitat” e que constituiu a sua Comunicação apresentada no 16ª Congresso dos Arquitetos | Qualidade e Sustentabilidade: Construir o [nosso] futuro e na respetiva Sessão Setorial 3 – Habitação e Inclusão, que foi realizada em 3 de março de 2023, no Auditório do Teatro Micaelense, Centro Cultural e de Congressos, Ponta Delgada, São Miguel, Açores.

O texto é editado na sua versão completa, apresentada no referido Congresso; aproveitando-se, finalmente, a oportunidade para dar as boas-vindas à colega Conceição Melo ao grupo dos autores Infohabitar e, naturalmente, para lhe agradecer esta importante contribuição.

Aproveita-se para fazer uma nota prática importante, relativamente à RENOVADA disponibilização na margem direita da edição da Infohabitar de uma listagem ilustrada dos artigos mais lidos e respetivos links

Lisboa, 17 de setembro de 2025

António Baptista Coelho

Editor da Infohabitar



Da habitação ao Habitat – infohabitar # 949

Conceição Melo

 

 

1. Reflexão

“Segundo a OMS, as condições de vida, nas quais se inclui a habitação, contribuem 29% para as desigualdades em saúde das pessoas, uma percentagem superior à da prestação de cuidados de saúde (11%), por isso a saúde tem que estrar em todas as políticas. Diria até que uma política de habitação tem potencialmente mais impacto na saúde das pessoas do que mais médicos de família”. Declarações do médico João Magalhães ao jornal Expresso no artigo “Ilhas: o lado de lá da habitação digna”, publicado a 15 de julho de 2022.

Apesar de cada vez mais esta ser uma constatação evidente, haja em vista a experiência da pandemia, não estamos a tomar as medidas necessárias à sua resolução.

A resolução do problema da Habitação não se resume à resolução das situações de indignidade habitacional ( embora estas não se possam esquecer nem negligenciar). Não se pode continuar a tratar a habitação como um caso à parte e com programas circunstanciais e próprios. É necessário encarar de frente o problema, percebendo que o desafio é global, se estende a toda a sociedade e que implica a sua integração efetiva nas políticas territoriais.

As iniciativas relativas à habitação, por parte do Estado, por si só ou em conjunto com as autarquias, têm sido ao longo dos anos, na sua maioria, resposta a problemas prementes e/ou a estímulos exteriores (vejamos o mais recente caso do Plano de Recuperação e Resiliência - PRR), onde a urgência de não perder fundos, se sobrepõe à definição de políticas estruturais.

Este é um problema de fundo que respostas imediatas não resolvem. As respostas para hoje, têm que ser encontradas pensando no futuro e têm que ser integradas nas políticas territoriais.

 

2. Contexto legislativo

O (RJIGT), define o PDM como“o instrumento que estabelece a estratégia de desenvolvimento territorial municipal”, mas ao lermos o artigo 96º, que determina o seu conteúdo material, verificamos que, enquanto para as atividades industriais, turísticas, comerciais e serviços, o PDM exige a definição de estratégias, para a habitação é apenas necessário identificar e delimitar os programas na área habitacional. A habitação é, assim, um dado justaposto ao Plano e não um eixo estratégico que o determina. A meu ver, esta condição reflete, por um lado, a indeterminação da responsabilidade na governação desta matéria (cabe ao Estado, cabe às autarquias ou cabe ao mercado?) e, por outro, a falta de articulação entre as políticas setoriais e a sua dimensão de integração territorial. ( Este é um problema endémico do nosso ordenamento do território, exacerbado no caso da habitação).


 3. Sabemos que a Constituição determina que todos tem direito, “para si e para a sua família, a uma habitação de dimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade familiar”  O n.º 2 do artigo 65ª da Constituição atribui responsabilidade ao Estado Português. O Estado engloba o poder central e o poder local. Esta indeterminação justifica muito do estado atual (ainda agora como tudo se confunde:  O 1º direito, está centralizado no IHRU; O programa Maia Habitação ingere-se claramente nas competências municipais).

Mas constitui a Nova Geração de Políticas de Habitação e agora, o recente pacote + Habitação, uma oportunidade para integrar a Habitação nas políticas territoriais?

A Nova Geração de Políticas de Habitação inclui, entre outros, o programa 1.º Direito o Programa de Apoio ao Alojamento Urgente; e o Programa de Arrendamento Acessível, financiados pelo PRR, todos destinados a estratos sociais muito baixos.

Qual é a relação entre as Estratégias Locais de Habitação (ELH), documento de elaboração obrigatória pelos municípios para acesso ao 1º Direito, e as ORU’s?

Estão, em razão de localização, de tipologia de soluções, as propostas contidas nas ELH a contribuir para a concretização dos objetivos das ORU?

Foi essa condição tida em conta na elaboração, pelos municípios, e na aprovação pelo IHRU, das ELH´s?

Onde estão a ser construídos os fogos para arrendamento acessível?

Estas são questões que vão sendo postas nos diversos fóruns de discussão, cuja resposta, ainda que não expressa, nos leva à conclusão de que os instrumentos com impacto territorial são diversos e não estão coordenados e articulados, sendo a habitação o parente mais pobre das políticas territoriais, com todas as consequências que daí advêm.

A Habitação tem que ser mais! Tem que ser um recurso, que deve ser usado para a concretização de uma estratégia e de um modelo territorial, que qualifica o território por igual, contribuindo para a coesão social e territorial. E tem que ser um tema nobre na requalificação urbana. A habitação, ainda que dita social, não pode ser atirada para as periferias, para as sobras de loteamentos ou para terrenos de reservas de grande valor ambiental. O Direito à Habitação é o direito a uma envolvente equipada e qualificada.


4. A lei de Bases da Habitação – da habitação ao Habitat

É na LBH que se dá o salto. A LBH, constitui o “edifício” agregador das políticas, definidor da articulação de poderes e respetivas responsabilidades, que garantirá, quando for aplicada, o cumprimento do Direito Constitucional.

A implementação da LBH, tem como consequência a definição de uma Política Nacional de Habitação, assente no conhecimento efetivo da realidade, para a qual contribuem as Políticas Regionais e Locais de Habitação, que por sua vez são revertidas nos Instrumentos de Gestão Territorial (IGTs), nomeadamente nos PDMs. São as Cartas Municipais de Habitação, a realizar pelos municípios, o instrumento adequado para fazer a articulação dos diversos níveis, estatal, regional e local, da politica da habitação com o território, através dos PDM e de outros instrumentos de gestão ou de política territorial.

E é a Lei de Bases que alarga o âmbito do direito à habitação estendendo-o ao Habitat, incluindo-se nele a existência de condições de salubridade, segurança, qualidade ambiental, integração social, disponibilidade de espaços e equipamentos de utilização coletiva, contribuindo para a qualidade de vida e bem-estar dos indivíduos numa relação saudável e equilibrada entre homem e natureza. Neste sentido, a criação de condições de habitação é também uma oportunidade de regeneração dos espaços públicos e de criação de comunidades.


5. Qualidade

A LBH alia o direito à habitação ao direito a um habitat de qualidade. Hoje qualidade implica inevitavelmente, que o Habitat seja sustentável, responda e mitigue as alterações climáticas, seja eficiente energeticamente e garanta o bem-estar social. Por isso faz todo o sentido a iniciativa visionária da Comissão Europeia New European Bauhaus (NEB), assente no tripé: Beautiful, Sustainable and Together. Nunca o Habitat precisou tanto de inovação: inovação a projetar, a construir e a gerir. Bonito, Sustentável e com as Pessoas.

Inovação a projetar:

Incorporando as novas tecnologias, em particular o BIM, ferramenta com implicações em todo o ciclo de vida dos espaços construídos e essenciais na adoção da circularidade. Refletindo sobre os espaços de habitar, tornando-os mais inclusivos e adaptados à atual estrutura demográfica, com soluções que respondam à integração de idosos, por exemplo.

Optando pela reabilitação urbana, reduzindo assimetrias entre a cidade qualificada, inacessível à maioria das pessoas e a periferia desqualificada.

Explorando novos materiais e métodos construtivos que reduzam custos, energia e emissões de CO2.

Inovação a construir, garantindo qualidade na encomenda pública, optando por contratar bons projetos, privilegiando a qualidade em detrimento do menor preço. Ao construir estamos a criar património, que tem maior valor quanto mais durável e reutilizável na totalidade ou nas suas componentes for.

Inovação a gerir, apostando em métodos colaborativos, de partilha de informação em equipas multidisciplinares e intersectoriais.

Fomentando o associativismo e o cooperativismo, estudando e aplicando os bons exemplos que temos nesta área.

Aproximando os cidadãos das decisões, apoiando processos participativos que aumentam a consciência e responsabilidade social e ambiental e alteram comportamentos.

Consequência do que atrás foi dito, em particular das políticas centralistas e desfasadas dos problemas reais lêem-se neste mapa.

Há grandes assimetrias regionais, tanto pelo lado das carências como da capacidade de as resolver.

Segue-se Mapa de Aitor Varea Oro sobre carências habitacionais:

 

 

Esta reflexão leva-me a três conclusões/ necessidades:

Precisamos de mais partilha e georreferenciação da informação.

Os dados não podem estar na posse das instituições têm que ser partilhados. E ela existe!

A informação é importante para:

·       definir as estratégias (como podemos por no mercado casas devolutas se não sabemos se elas estão onde estão as necessidades?).

·       Territorializar as políticas

·       Encontrar as respostas.

·       Medir a execução e os resultados

·       Garantir a transparência e a confiança

Precisamos de Respostas Multinível, que integrem o local, (o regional)e o nacional:

O aumento de escala das políticas é essencial: como posso resolver os problemas habitacionais do Porto se não integrar os municípios envolventes? A integração dos municípios envolventes nessa estratégia implica uma governação regional. O que traz um problema por falta de legitimidade do nível de governação regional.

Respostas tecnicamente integradas/Criação de Equipas Multidisciplinares e Intermunicipais assentes nas associações de municípios

Tratar as diferentes componentes da habitação de forma integrada contrariando as políticas multifundos: como se pode tratar a eficiência energética, sem tratar a envolvente e a integração urbana e a qualidade espacial do fogo?

Criar brigadas a exemplo do SAAL, que integrem as diversas valências técnicas necessárias à resolução dos problemas que ultrapassam a dimensão do projeto técnico.

As questões jurídicas a par das sociais são muitas vezes os grandes óbices à resolução de problemas. Por isso estas brigadas têm que incluir necessariamente, assistentes sociais, juristas, engenheiros e arquitetos, para além de outras.

 

6. Mais Bairros Saudáveis / Cultura Territorial

A falta de qualidade da habitação e do habitat não se deve apenas à ausência de uma Política Nacional Habitação ou ao desinvestimento do Estado nesta matéria, deve-se também à falta de Cultura Territorial.

Esta debilidade, já identificada no Plano Nacional da Política de Ordenamento do Território (PNPOT), manifesta-se não só nas instituições, mas também na população em geral, sendo disso exemplo o défice de associativismo, nomeadamente no campo da habitação, que se traduz na incapacidade de reivindicação do direito à habitação e à cidade.

É necessário mudar a cultura das instituições, abrindo-as a práticas multidisciplinares e colaborativas, arriscando uma atitude mais experimental e aplicada aos casos concretos. Práticas de natureza participativa, desde a sua preparação inicial à avaliação final da sua execução, nas quais pequenas verbas de dinheiro entregues diretamente às pessoas, organizadas em associações, podem fazer a diferença na melhoria das suas condições de vida e nos territórios. Esta é a marca distintiva, face aos instrumentos de financiamento mais comuns, que primam pela carga burocrática assente na desconfiança da utilização dos dinheiros públicos.


7.  A adoção da Agenda  para o Desenvolvimento Sustentável de 2030 e os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável proporcionaram um enquadramento para reforçar as ações destinadas a melhorar a saúde e o bem-estar de todos e assegurar que ninguém é deixado para trás (…) Este relatório identifica cinco condições essenciais necessárias à criação e apoio de uma vida saudável para todos: serviços de saúde de boa qualidade e acessíveis, segurança nos rendimentos e proteção social, condições de vida dignas, capital social e humano e condições de trabalho e emprego dignas. São necessárias ações políticas para abordar todas as cinco condições.”(1)

 

Notas:

([1]) Tradução livre do “Healthy, prosperous lives for all: the European Health Equity Status Report “ da Organização Mundial de Saúde.

 

Notas editoriais gerais:

(i) Embora a edição dos artigos editados na Infohabitar seja ponderada, caso a caso, pelo corpo editorial, no sentido de se tentar assegurar uma linha de edição marcada por um significativo nível técnico e científico, as opiniões expressas nos artigos e comentários apenas traduzem o pensamento e as posições individuais dos respectivos autores desses artigos e comentários, sendo portanto da exclusiva responsabilidade dos mesmos autores.

(ii) No mesmo sentido, de natural responsabilização dos autores dos artigos, a utilização de quaisquer elementos de ilustração dos mesmos artigos, como , por exemplo, fotografias, desenhos, gráficos, etc., é, igualmente, da exclusiva responsabilidade dos respetivos autores – que deverão referir as respetivas fontes e obter as necessárias autorizações.

(iii) Para se tentar assegurar o referido e adequado nível técnico e científico da Infohabitar e tendo em conta a ocorrência de uma quantidade muito significativa de comentários "automatizados" e/ou que nada têm a ver com a tipologia global dos conteúdos temáticos tratados na Infohabitar e pelo GHabitar, a respetiva edição da revista condiciona a edição dos comentários à respetiva moderação, pelos editores; uma moderação que se circunscreve, apenas e exclusivamente, à verificação de que o comentário é pertinente no sentido do teor editorial da revista; naturalmente , podendo ser de teor positivo ou negativo em termos de eventuais críticas, e sendo editado tal e qual foi recebido na edição.

(iv) Oportunamente haverá novidades no sentido do gradual, mas expressivo, incremento das exigências editoriais da Infohabitar, da diversificação do seu corpo editorial e do aprofundamento da sua utilidade no apoio à qualidade arquitectónica residencial, com especial enfoque na habitação de baixo custo.



Da habitação ao Habitat – infohabitar # 949

Informa-se que para aceder (fazer download) do mais recente Catálogo Interativo da Infohabitar, que está tematicamente organizado em mais de 20 temas e tem links diretos para os 922 artigos da Infohabitar, existentes em janeiro de 2025 (documento pdf ilustrado e com mais de 80 pg), usar o link seguinte:

https://drive.google.com/file/d/1vw4IDFnNdnc08KJ_In5yO58oPQYkCYX1/view?usp=sharing

Infohabitar, ano XXI, n.º 949

Edição: quarta-feira 17 de setembro de 2025

Editor: António Baptista Coelho

Arquitecto/ESBAL – Escola Superior de Belas Artes de Lisboa –, doutor em Arquitectura/FAUP – Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto –, Investigador Principal com Habilitação em Arquitectura e Urbanismo pelo LNEC.

abc.infohabitar@gmail.com

 Os aspetos técnicos do lançamento da Infohabitar e o apoio continuado à sua edição foram proporcionados por diversas pessoas, salientando-se, naturalmente, a constante disponibilidade e os conhecimentos técnicos do doutor José Romana Baptista Coelho.

Revista do GHabitar (GH) Associação Portuguesa para a Promoção da Qualidade Habitacional Infohabitar – Associação com sede na Federação Nacional de Cooperativas de Habitação Económica (FENACHE).

 

Sem comentários :