terça-feira, março 26, 2019

680 - Pormenorização da arrumação doméstica – Infohabitar 680

Infohabitar, Ano XV, n.º 680
Pormenorização da arrumação doméstica – Infohabitar 680
Artigo da Série “Habitar e Viver Melhor”
por António Baptista Coelho (texto e imagem)

Nota editorial: continua-se, com este artigo, a publicação da Série editorial “Habitar e Viver Melhor”, cujo último artigo foi publicado, aqui na Infohabitar,  em fevereiro último, com o título: “O cromatismo residencial - Infohabitar 676”.


Pormenorização da arrumação doméstica

A arrumação doméstica já foi estudada, nesta série editorial, naturalmente integrada na abordagem dos espaços domésticos de uso basicamente comum, desta forma e em seguida apenas se irão referir alguns aspectos da arrumação muito associados a matérias de pormenorização.

Tal como salienta Claude Lamure "a disposição dos volumes de arrumação fixos e a sua incorporação no edifício permitem melhorar muito a economia de espaço habitável, a facilidade de manutenção e o conforto nas circulações". (1)

Fig. 01: a pormenorização da arrumação doméstica pode e deve ser uma forma de caracterização positiva dos respectivos espaços.


A arrumação relaciona-se com a área da habitação: cresce em fogos maiores e menores

A necessidade de arrumação cresce, naturalmente, consoante cresce a ocupação da habitação; uma condição raramente cumprida, tendendo-se a manter a capacidade de arrumação doméstica muito constante.

De certa forma a arrumação deve ser proporcional ao número de quartos da habitação, à semelhança do que acontece, regulamentarmente, com o número de casas de banho. 
Interessa, ainda, considerar que, no caso das habitações serem muito reduzidas, em termos de número de compartimentos e da sua área verdadeiramente habitável, também há que exigir a existência de uma significativa capacidade de arrumação, neste caso talvez mais “embutida” (ex., roupeiros integrados, mobiliário fixo), pois, de outra forma, essa reduzida espaciosidade poderá ficar, rapidamente, “obstruída” e infuncional, pela disposição dos mais diversos elementos de uso diário e ocasional.


Uma arrumação formalmente neutral

A capacidade de arrumação deve ser disponibilizada, por regra, através de soluções formais e funcionais extremamente neutrais e de grande sobriedade ou então de forma "camuflada", ou mesmo escondida, sendo sobriamente disponibilizada nos sítios certos e com as condições funcionais adequadas. Uma condição que deveria ser generalizada pois, por vezes, um determinado elemento de arrumação condiciona o tipo de arranjo doméstico do respectivo espaço, o que faz pouco sentido, afectando o potencial de apropriação da habitação, a partir da sua “mobilaridade”.

E, nesta perspectiva, sublinha-se, por exemplo, a integração entre portas normais e portas de roupeiros, que resulta, habitualmente, em soluções de grande continuidade e sobriedade, desenvolvendo-se um ambiente agradavelmente unificado e íntimo, por exemplo, no acesso a quartos e a casas de banho realizados como que através de roupeiros, como se se tratasse de passagens secretas.

Esta é uma matéria que pode inaugurar uma outra pequena faceta de desenvolvimento destas temáticas que influenciam um habitar mais feliz, pois trata-se de uma possibilidade de se conceberem habitações muito lúdicas no sentido de proporcionarem usos bem apropriados e múltiplos, e o desenvolvimento de vários níveis de uso gradativamente mais secretos, ou então inusitados na sua conjugação com outros espaços domésticos.


Uma arrumação atraente

Mas, no entanto, é sabido que uma boa capacidade de arrumação judiciosa e atraentemente disseminada pelos diversos compartimentos, com "pontes fortes" e tipologicamente bem distintos, na cozinha, copa, casas de banho, entrada, quartos e escritório, é um forte argumento na atractividade de uma dada proposta doméstica.

Teremos assim uma arrumação sóbria e atraente, o que nos conduz, com naturalidade, a soluções caracterizadamente funcionais ou mesmo funcionalistas.


A arrumação no mobiliário

Nunca será excessivo registar que a principal parte de uma arrumação doméstica deve ser cumprida, de forma integrada, em diversos elementos de mobiliário que equipam os diversos compartimentos e espaços domésticos; sendo que o principal factor para uma boa capacidade de mobiliário, na habitação, tem a ver com a disponibilidade de muitos metros de paredes lineares, sem vãos próprios e livres de manobras de vãos contíguos.

E a propósito deste aspecto, ou desta importante qualidade doméstica ligada à respectiva capacidade para integrar mobiliário, há que sublinhar que ela é cumulativamente determinante da capacidade de apropriação que toda a habitação deve proporcionar e em “quantidade”; sendo que, no limite, ela poderá ser suficiente para as necessidades de arrumação domésticas, afinal, cumprindo-se a velha tradição de não haver grandes elementos fixos, sendo tudo ou quase tudo arrumado em “móveis”.

E ainda a propósito deste assunto não se resiste a comentar que mesmo um aspecto “tão funcional” como a arrumação doméstica, tem uma dimensão tão humana e qualitativa como aquela associada à apropriação.


E, porque não, uma arrumação multifuncional?

Esta é uma temática cuja abordagem terá de ficar, aqui, um pouco pelos aspectos mais gerais, mas será sempre interessante reflectir em soluções espaço-funcionais em que determinados “recantos” domésticos possam ser apropriados por arrumações ou por outros usos domésticos, numa opção que pode marcar períodos específicos da “vida” da habitação, e que deve ter suporte em soluções construtivas que sejam facilmente reversíveis.


A arrumação: habitual parente pobre, mas, realmente, o grande aliado de uma boa estruturação doméstica

Embora a arrumação tenda a ser um pouco esquecida nas soluções domésticas importa sublinhar que uma sua adequada e estratégica provisão proporciona o adequado funcionamento da habitação e confere-lhe um elevado potencial de adaptabilidade funcional e a diversos modos de vida.

E nunca é de desperdiçar, tal como sublinha Christopher Alexander, o reforço do isolamento acústico entre compartimentos e espaços contíguos (quartos/quartos, quartos/salas, quartos/circulações e circulações/salas) que pode ser proporcionado pela interposição de roupeiros embutidos. (2)

Nas pequenas habitações, dimensionalmente muito contidas, será aconselhável que a integração dos dispositivos de arrumação se faça numa total aliança com a pormenorização arquitectónica responsável pela própria configuração da espacialidade e da ambiência interior.

Referimo-nos s uma estruturação doméstica que seja verdadeiramente “resiliente”, apoiando e facilitando excelentes e bem evidentes condições de arrumação e “limpeza” espacial, associadas a estimulantes condições de clareza e atractividade na leitura dos diversos espaços e subespaços; e que aceite um grau bastante sensível de desarrumação corrente (resultante de uma casa bem “vivida”), mas sem perder o essencial dessa clareza e atractividade de leitura de espaços razoavelmente arrumados e estruturados.


Notas:
(1) Claude Lamure, "Adaptation du Logement à la Vie Familiale", p. 195.
(2) Christopher Alexander; Sara Ishikawa; Murray Silverstein; et al, "A Pattern Language/Un Lenguaje de Patrones", pp. 799 e 800.




Notas editoriais:
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(ii) De acordo com o mesmo sentido, de se tentar assegurar o referido e adequado nível técnico e científico da Infohabitar e tendo em conta a ocorrência de uma quantidade muito significativa de comentários "automatizados" e/ou que nada têm a ver com a tipologia global dos conteúdos temáticos tratados na Infohabitar e pelo GHabitar, a respetiva edição da revista condiciona a edição dos comentários à respetiva moderação, pelos editores; uma moderação que se circunscreve, apenas e exclusivamente, à verificação de que o comentário é pertinente no sentido do teor editorial da revista; naturalmente , podendo ser de teor positivo ou negativo em termos de eventuais críticas, e sendo editado tal e qual foi recebido na edição.

Infohabitar, Ano XV, n.º 680
Pormenorização da arrumação doméstica – Infohabitar 680

Infohabitar
Editor: António Baptista Coelho

Arquitecto/ESBAL, doutor em Arquitectura/FAUP – Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto, Investigador Principal com Habilitação em Arquitectura e Urbanismo/LNEC – Laboratório Nacional de Engenharia Civil



Revista do GHabitar (GH) Associação Portuguesa para a Promoção da Qualidade Habitacional Infohabitar – Associação com sede na Federação Nacional de Cooperativa de Habitação Económica (FENACHE).

Apoio à Edição: José Baptista Coelho - Lisboa, Encarnação - Olivais Norte.

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