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Celeste Ramos
Palavras-chave – celebração – herança cultural – religião – paganismo – história – consagração do dia da Mãe
No mais fundo de ti, eu sei que traí, mãe!
Tudo porque já não sou o retrato adormecido no fundo dos teus olhos!
Tudo porque tu ignoras que há leitos onde o frio não se demora e noites rumorosas de águas matinais!
Por isso, às vezes, as palavras que te digo são duras, mãe, e o nosso amor é infeliz.
Tudo porque perdi as rosas brancas que apertava junto ao coração no retrato da moldura!
Se soubesses como ainda amo as rosas, talvez não enchesses as horas de pesadelos...
Mas tu esqueceste muita coisa! Esqueceste que as minhas pernas cresceram, que todo o meu corpo cresceu, e até o meu coração ficou enorme, mãe!
Olha - queres ouvir-me? -, às vezes ainda sou o menino que adormeceu nos teus olhos;
ainda aperto contra o coração rosas tão brancas como as que tens na moldura;
ainda oiço a tua voz: "Era uma vez uma princesa no meio de um laranjal..."
Mas - tu sabes! - a noite é enorme e todo o meu corpo cresceu...
Eu saí da moldura, dei às aves os meus olhos a beber.
Não me esqueci de nada, mãe. Guardo a tua voz dentro de mim. E deixo-te as rosas...
Celeste Ramos
Palavras-chave – celebração – herança cultural – religião – paganismo – história – consagração do dia da Mãe
"Poema à mãe"
Eugénio de Andrade *No mais fundo de ti, eu sei que traí, mãe!
Tudo porque já não sou o retrato adormecido no fundo dos teus olhos!
Tudo porque tu ignoras que há leitos onde o frio não se demora e noites rumorosas de águas matinais!
Por isso, às vezes, as palavras que te digo são duras, mãe, e o nosso amor é infeliz.
Tudo porque perdi as rosas brancas que apertava junto ao coração no retrato da moldura!
Se soubesses como ainda amo as rosas, talvez não enchesses as horas de pesadelos...
Mas tu esqueceste muita coisa! Esqueceste que as minhas pernas cresceram, que todo o meu corpo cresceu, e até o meu coração ficou enorme, mãe!
Olha - queres ouvir-me? -, às vezes ainda sou o menino que adormeceu nos teus olhos;
ainda aperto contra o coração rosas tão brancas como as que tens na moldura;
ainda oiço a tua voz: "Era uma vez uma princesa no meio de um laranjal..."
Mas - tu sabes! - a noite é enorme e todo o meu corpo cresceu...
Eu saí da moldura, dei às aves os meus olhos a beber.
Não me esqueci de nada, mãe. Guardo a tua voz dentro de mim. E deixo-te as rosas...
Fig. 00
Todas as civilizações do mundo – mesmo as já extintas – mesmo as que foram separadas territorialmente por razões de guerra e de colonização, sempre tiveram a sua cultura específica de raiz, que poderiam ou não ter assimilado uma parte ou o todo da civilização invasora para além da natural evolução cultural proposta pelo tempo histórico.
E sempre cada civilização fazia honra aos deuses ou a um só deus, tinha uma religião única ou coabitava com outras, como é o caso deste tempo de modernidade e globalização que se inicia, podendo embora ter havido situações em que a religião tinha de ser vivida na clandestinidade como sucedeu com a religião cristã, no tempo da Roma Clássica, em que os cristãos se encontravam às escondidas dos romanos, nas Catacumbas, ou como mais tarde em Portugal, de religião católica apostólica romana com ligação ao Estado através da Concordata, mas de que a seu tempo o país político se desligou no pós 25 de Abril, que foi país de perseguição à religião judaica, ou como sucede ainda hoje na Irlanda ou na Índia de Ghandi ou nas civilizações pelo menos do leste mediterrânico, que são matéria de guerras prolongadas entre homens do mesmo país e cultura.
Parece assim estar provado que nos tempos modernos religião e política têm de continuar a separar-se para bem da vivência democrática e do desenvolvimento e prosperidade dos povos e das suas diferenças religiosas.
Ao fim de tantos milhares de anos de Civilização, a Religião continua a ser motivo de guerra seja a oriente seja a ocidente, e da qual governantes se apropriam politicamente para separar os povos ou grupos sociais em cada comunidade.
Mas diremos que, não importa em que religião, há certos “momentos”, outrora de ritual religioso, que se vão “paganizando”, na medida em que religião, tradição e paganismo se assimilam e se revelam apenas como acto cultural e tradicional; momentos que vêm da origem dos tempos e das manifestações do homem quanto à sua dimensão de sagrado.
O profano e o sagrado integram-se, fenómeno a que a própria Igreja se teve de render sob pena de perder muitos dos seus fiéis.
Por esta razão hoje muitas festas da Igreja continuam a poder celebrar-se separadamente dos cânones da religião até porque entendo que mesmo o “pagão”, que assim se denomina, tem alto grau de espiritualidade e sensibilidade sem se rotular especificadamente como devoto de qualquer religião.
E estão como exemplo a maioria das Festas e Romarias portuguesas, carregadas de história, de simbolismo e de religiosidade em ligação às vidas de trabalho na terra, no rio e no mar. E está também nesta situação o próprio Natal que se celebra em todas as casas portuguesas e no mundo.
Neste mês de Maio e da Celebração de Fátima se faz também a celebração do dia da Mãe que é igualmente festa religiosa e pagã e da qual, como de todas as outras, o comércio se apropriou incluindo-a já numa linha de turismo específica, curiosamente das mais antigas do mundo, a do turismo religioso ou turismo das peregrinações realizadas também por pessoas não religiosas que se deslocam por motivação cultural.
Fig. 01: Foto in http://www.spoil.pt/
A celebração do Dia da Mãe remonta à mitologia da Grécia Clássica com comemorações de primavera à deusa Rhea mulher de Cronos (o tempo), a mãe de todos os deuses, sendo que em Roma as festas eram dedicadas a Cybele, a deusa correspondente à deusa grega, mãe dos deuses romanos, festas que remontam a mais de 250 anos a.C.
Com o advento do cristianismo a celebração respeitava à Igreja Mãe e à sua força espiritual que se foi desenhando como celebração da mãe terrena e, ainda há poucos anos, o dia da mãe em Portugal era comemorado durante décadas em data fixa, dia 8 de Dezembro, dia de Nossa Sr.ª da Imaculada Conceição, dia santo e de feriado nacional, mas retomando só recentemente o tempo primaveril para ser celebrado; e este ano de 2007 o Dia da Mãe é a 6 de Maio, o primeiro domingo do mês.
Em Inglaterra o Dia da Mãe remonta ao séc. XVII e é celebrado no segundo domingo de Maio.
Nos Estados Unidos, se a ideia foi sugerida em 1872 por causa da crueldade da guerra e da morte de seus filhos mais jovens (e faz pensar na revolta das mães de Maio na Argentina do séc. XX), foi só no início do séc. XX e a partir de um caso particular de morte de sua mãe, que alguém do sexo feminino – mesmo em tempo em que a mulher “ainda não tinha voz” –, ao longo de 3 anos, conseguiu convencer políticos e religiosos e outras personalidades de influência, para determinar um dia nacional para celebrar como Dia da Mãe; com a particularidade de serem usados cravos brancos como homenagem a mães vivas e cravos vermelhos para as já desaparecidas, simbolizando o branco a pureza e o vermelho a força interior da mulher-mãe, promovendo por outro lado centragem em pensamento mais activo em data especial dedicada às mães do mundo; e tendo a acção sido tão bem sucedida que a partir de 1914 foi declarado o 2º domingo de Maio como o Dia da Mãe, a mesma data de Inglaterra.
Mais de um século depois perdeu-se a origem desta celebração mas o mais importante é que ela perdura para celebrar e lembrar a mãe-terrena que, para alguns, se confunde com a mãe-divina.
O Dia da Mãe é também designado o Dia do Amor
Fig. 02:
MÃE - MIGUEL TORGA **
Mãe:Que desgraça na vida aconteceu,Que ficaste insensível e gelada?Que todo o teu perfil se endureceuNuma linha severa e desenhada?
Como as estátuas, que são gente nossaCansada de palavras e ternura,Assim tu me pareces no teu leito.Presença cinzelada em pedra dura,Que não tem coração dentro do peito.
Chamo aos gritos por ti - não me respondesBejo-te as mãos e o rosto - sinto frio.Ou és outra, ou me enganas, ou te escondesPor detrás do terror deste vazio.
Mãe:Abre os olhos ao menos, diz que sim!Diz que me vês ainda, que me queres.Que és a eterna mulher entre as mulheres.Que nem a morte te afastou de mim!
Fig. 03
Maria Celeste d’Oliveira Ramos
Lisboa Bairro de Santo Amaro
05 de Maio
Participação na ilustração por António Baptista Coelho
Fontes dos poemas:
* in http://openroad.blogs.sapo.pt/arquivo/407396.html
** in http://fumacas.weblog.com.pt/arquivo/103507.html
Sites de instituições portuguesas para apoio à maternidade:
http://www.ajudademae.com/
http://www.ajudadeberco.pt/
As imagens 00 e 03 são de ABC
Revisão para publicação por ABC em 2007-05-09
Editado por José Baptista Coelho em 2007-05-10
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